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sexta-feira, 27 de novembro de 2015

Devotos de Superfície



                                   "E eu rogarei a meu Pai, e ele vos enviará outro Consolador, a fim de que fique eternamente convosco." Jesus (João, 14:16).

            A Doutrina Espírita, em sua destinação de Consolador Prometido, apresta-se, diante da Humanidade, em atendimento ao seu desiderato, abraçando a responsabilidade histórica na marcha da civilização.

            Não se detém unicamente particularizando conforto e consolo, socorro e estímulo aos encarcerados nas dores dos resgates indispensáveis. Descerra às criaturas os infindáveis campos  da renovação interior, na lavoura do apoio recíproco e da fraternidade verdadeira, promovendo, intensamente, o conúbio de forças dos dois planos da vida, num sintomático e decisivo apelo ao Amor.

            Paulatinamente, a Revelação Espírita desdobra-se em informações e ensinamentos dosados e adequados aos nossos níveis de compreensão e maturidade.

            Instrutores do Infinito Bem, apóstolos da perfeição moral, benfeitores da luz divina integram-se no mesmo afã evangélico de lastrear os caminhos humanos com a palavra do bom ânimo e da transformação para melhor.

            O ensino espírita faz-se respeitado no seio das comunidades, pela contínua atualidade de seus conceitos quanto pelo acervo inalienável de seu patrimônio educacional.

            Lamentavelmente, entretanto, temos observado que dilatado número de corações abeira-se da fonte conservando os odres vazios...

            Impulsionados, muitos deles, pelos dolorosos acicates do sofrimento, encontraram o bálsamo para suas chagas íntimas, postando-se, ainda hoje, de mãos estendidas e corações súplices, quais indigentes da viciação sistemática, que abarrotam os saguões de instituições socorristas terrestres. Mostram-se incapazes de refletir e raciocinar; porém, são ávidos em receber.

            Outros, quais frágeis avezinhas pressentindo o sopro das adversidades, pousaram suas esperanças nos troncos robustecidos do amparo moral que a Doutrina a todos proporciona e aquietaram-se, quais filhotes implumes, à espera do alimento pronto, sem a mais leve intenção de reanimarem-se para as realidades do esforço próprio. Louvam a excelência do amparo dos Benfeitores Celestes, embora não se distanciem da inércia espiritual onde se acotovelam.

            Outros mais, que se achegaram aos esteios luminosos do Espiritismo, quais cigarras estonteantes de entusiasmo e gratidão ante a fenomenologia abundante e convincente, experimentam as vacilações da fé passageira que não recebeu senão as insuflações das primeiras horas, satisfazendo-se, tão-só, à tepidez do arrebol, em observações de superfície, sonegando o imprescindível apoio à fornalha da razão pelo exercício do estudo sistematizado. Cantaram louvores à imortalidade comprovada, contudo, deixaram-se cair, exangues, incapazes de pressentir, na ação do tempo, as vizinhanças do inverno na alma.

            Quantos espíritas ainda não se dignaram adentrar o vasto campo do conhecimento que a Doutrina lhes oferece, pervagando, indiferentes ou tumultuosos, entre as superficialidades do trivial e do passageiro! Há de lhes chegar o momento grave, quando difícil abatimento ou decepção lhes espicaçará a tibiez espiritual que os impediu à boa marcha, sob o império da vontade resoluta, no estudo e no conhecimento das verdades superiores.

            São eles os devotos de superfície, desejosos de se repletarem nos favores imediatistas.

            Os celeiros do Espiritismo estão abarrotados, sim, de consolo e de esperança, de estímulo e de bom ânimo, trazendo, igualmente, as advertências em torno do valor do tempo e das oportunidades que a vida nos confere, para que nos fortaleçamos no conhecimento e na sabedoria que nos equilibrarão, frente ao amor, para os Cimos da Vida.

            Quem adia o esforço pessoal na dinâmica das horas não assimilou, por enquanto, a verdadeira noção do tempo.

            Temos os espíritos ainda tão carentes de entendimento e disciplina, quanto reconhecemos nossas organizações somáticas necessitadas de pão.

            Aprofundemo-nos na Doutrina Espírita, valorizando, em nós, as bênçãos do livre-arbítrio em nome do estudo enobrecedor que nos alimenta os espíritos.

            O passe ser-nos-á valioso auxílio de refazimento e alívio; a água fluidificada será o veículo propício aos benefícios suscitados em preces; as notícias dos familiares ou amigos domiciliados no além arregimentar-nos-ão júbilos espirituais e trégua às saudades lancinantes; a orientação medicamentosa nos proporcionará justo alívio à enfermidade pertinaz; o núcleo assistencial surgira a nossa frente como indispensável oficina de adestramento de corações; mas, tudo isto não passará de recursos de superfície, se o espiritista, cônscio de seus deveres fundamentais diante da vida, não enriquecer o mundo íntimo no conhecimento indispensável e sustentador.

            Não se pode substituir a cirurgia enérgica por paliativo de barbitúricos intoxicantes, quando a extirpação do mal é indispensável ao equilíbrio físico. O bisturi fará a assepsia definitiva onde a droga é impotente para agir. De igual modo, não poderemos adiar o aprofundamento na instrução espírita, reconhecidos de que somente o esforço próprio, despendido no estudo e na meditação eficaz, nos removerá os óbices à nossa saúde integral... E o Livro Espírita aí está, como instrumento oportuno do Consolador Prometido, qual fórceps sublime, desentranhando-nos das sombras de nossa mediocridade evolutiva para os luzeiros da consciência esclarecida, sob a escolta do coração operoso.

Devotos de superfície
Guillon Ribeiro
por Júlio Cezar Grandi Ribeiro

Reformador (FEB) Março de 1977

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