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quarta-feira, 29 de julho de 2015

A Vontade de Deus

             A quem supunha que o livre arbítrio do homem seja absoluto, incontrastável , e que, no uso dessa prerrogativa, ser-lhe-ia possível fazer ou deixar de fazer o que bem entendesse, até mesmo rejeitar os planos de Deus, ou colocar-se ostensivamente contra eles, sem que houvesse meio de dobrar-lhe a cerviz.

            A teologia tradicional assim o ensina e uma vasta literatura, dita cristã, também o confirma, ao apregoar que a vontade de Deus está sendo frustrada constantemente pelo homem aqui na Terra, como já o fora por grande número de anjos lá no céu.

            Puro engano.

            Deus quer que o homem tenha o mérito da glória para a qual o destinou e por isso, a par das revelações progressivas com que lhe há iluminado a consciência, concede-lhe relativa liberdade, a fim de que cada qual a alcance por si mesmo, pelo próprio esforço. Insipiente, pode ele, então, tal qual o filho pródigo da parábola evangélica, enveredar por ínvios carreiros (os erros e crimes de toda espécie), distanciando-se da retidão (o cumprimento das leis de Deus).

            Cada vez, porém, que isso acontece, sofre tropeços, quedas e acúleos que o fazem retornar ao bom caminho.

            Destarte, esses transviamentos temporários, com as agruras e lacerações que lhes são consequentes, constituem experiências que ele vai adquirindo para melhor conduzir-se no futuro e não mais fugir ao roteiro que lhe cumpre palmilhar.

            A única coisa, pois, que o homem pode escolher, a seu talante, lemos algures, é o modo de cumprir a vontade de Deus; apenas isso.

            Quem, como Jesus, haja conseguido harmonizar o seu querer pessoal com a vontade divina, cumpre-a com gozo, deleitosamente, como se estivesse a participar de um esplêndido banquete. Daí as suas palavras: "O meu manjar é cumprir a vontade d'Aquele que me enviou" (João, 4: 34).

            Os que, entretanto, em razão de seu atraso espiritual, ainda se mostram recalcitrantes, uma vez escoado o "prazo de espera" que as Leis Divinas concedem a todos para que se submetam espontaneamente ao seu império, terão que cumpri-las, quer o queiram quer não, ainda que com sofrimento, dolorosamente, porque acima do alvedrio humano vige um Determinismo Superior, a regular e a garantir a ordem universal.

            O equívoco dos que acreditam seja possível ao homem deixar de cumprir os desígnios de Deus reside na ideia corrente de que ele é "essencialmente mau", e pode querer manter-se eternamente afastado do Supremo Bem.

            Essa ideia, todavia, é falsa e insustentável.

            Filho de Deus, criado à "imagem e semelhança" d'Ele, o homem não é, nem poderia ser mau por natureza; pelo contrário, é "essencialmente bom", potencialmente idêntico ao Criador, e, pela evolução, dia virá - embora longínquo - em que se tornará uno com Ele.

            Esta conclusão, que pode escandalizar a muitos, nada tem de extraordinária. Um recém-nascido, malgrado sua fragilidade e inconsciência, é um ser adulto em potencial. O homem, semelhantemente, em que pese a suas limitações atuais, possui em germe todas as faculdades que hão de deificá-lo. Questão de tempo, trabalho e perseverança nos bons propósitos. Assim não fora, e o Cristo não teria feito esta exortação: "Sêde perfeitos, como perfeito é o vosso Pai Celestial".

            Há ainda um outro fator de suma importância que impede a cristalização do homem na rebeldia: o desejo de ser feliz.

            A felicidade é sua maior e mais profunda aspiração.

            Todo homem quer possuí-la, anseia tê-la por companheira inseparável de sua existência.

            Por outro lado, não há um só que possa ter o desejo mórbido de ser infeliz para sempre, renunciando em definitivo às delícias da bem-aventurança.

            Ora, como "ser feliz" é uma decorrência de "ser bom", tanto quanto "ser infeliz" o é de "ser mau", segue-se que o homem, por mais embrutecido e perverso que seja, há de, infalivelmente, cansar-se de sofrer, por descumprir as Leis Divinas, buscando, afinal, aquela felicidade verdadeira e indestrutível que consiste em fazer o bem, ou seja, em cumprir, com amor, a vontade do Pai Celestial.

A vontade de Deus
Rodolpho Calligaris

Reformador (FEB) Agosto 1971

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