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sexta-feira, 22 de julho de 2011

'A vitória sobre nós mesmos'



‘A vitória sobre nós mesmos’

Livro: ‘Rumos Doutrinários’ (pg. 79 e seguintes - 1ª Ed. FEB - 1994)

Autor:  Indalício Mendes
             
                Muita gente supõe que todos aqueles que pregam a Doutrina, nas tribunas e nos jornais, são mestres ou criaturas tocadas de infalibilidade. Tal não acontece, entretanto. São geralmente viajores comuns, lutando como nós, pela reabilitação. A responsabilidade desses pregadores é bem maior e bem mais pesada a cruz, se não souberem ou não puderem exemplificar, pelo menos tanto quanto suas imperfeições e deficiências o permitam, as lições de que são incumbidos pelo Alto de transmitir. Assim, quanto mais fraca for a exemplificação, mais sensível é a prova da fraqueza espiritual. O que se deve exigir, além da Doutrina exemplificada, é a sinceridade do trabalho.
                Se fôssemos perfeitos, infalíveis, integrais na exemplificação doutrinária, seríamos já verdadeiros discípulos do Cristo. Mas, pobres de nós! Estamos seguindo a mesma trilha de todos aqueles que desejam progredir e que por isto mesmo tentam, caindo e levantando dia-a-dia, acertando hoje, errando amanhã e procurando sempre corrigir-se, tentam, repetimos, superar as dificuldades criadas por sua própria carência espiritual.
                Um médium, seja de maior ou menor experiência, é sempre um médium, isto é, sempre, sempre sujeito a provas e provações que podem surgir de muitas formas e em condições diversas e imprevisíveis.   
                E justamente pode acontecer-nos e acontece sofrermos uma espécie de obnubilação mental, quando, em certos momentos graves de testemunho decisivo, não chegamos a enxergar o precipício diante de nós, pronto a engolir-nos, destruindo animadores esforços despendidos com sacrifício e coragem.
                Há ocasiões em que, devido a essas falências intermitentes, que reclamam maior vigilância, bem o sabemos, severos irmãos, também falíveis como nós, tanto que nos censuram acremente por havermos caído, usam de frases candentes, avançam criticas profundas que, no fim das contas, acabam por nivelar os nossos erros aos que eles cometem, na suposição de que nos estão dando oportunidade para uma reabilitação. Semelhantes atitudes servem para evidenciar que todos estamos sujeitos a falir.
                 Não faz muito tempo, ouvimos – e procuramos aceitar com humildade a reprimenda – que cometemos erros por não estarem ainda amadurecidos os nossos cabelos brancos. Há na frase o sentido claro e insofismável, que apreendemos logo, de que, embora avançados nos anos, continuamos atrasados na rota que empreendemos pela redenção. Acreditamos que isso seja verdade. Aceitamos a censura e procuraremos transformá-la, um dia, se possível, numa “escada de Jacob”, nas diuturnas tentativas para trocar a poeira da vulgaridade pelo céu da sublimação espiritual. Até lá, porém, de quantas encarnações precisaremos, fracos, falhos, incapazes, viciados e inúteis, como somos?
                Não se pode julgar uma criatura humana pelo tempo fisiológico da sua presença física neste planeta. O que vale é o “tempo espiritual”. Muitas vezes um ser humano jovem possui maturidade espiritual que um bem mais idoso não pode ainda alcançar. É até possível estejamos nesse caso. 
                Os fatos que marcam a existência humana nem sempre se armam simplesmente na Terra. Na grande maioria dos casos, as tramas são feitas no mundo invisível, quase sempre com a aquiescência de todos os seus participantes. Como desconhecemos ou esquecemos esse valioso pormenor, deixamo-nos levar por causas aparentes e incidimos em erros que, depois, com a meditação, identificamos tardiamente e deploramos.
                Quando se diz que devemos “contar até dez” antes de tomar uma atitude séria, é para que o nosso espírito possa “esfriar”, dominando o “respeito humano”, e vestir-se com a clâmide da serenidade, de modo a suportar com paciência as incitações por atos ou palavras, evitando, assim, consequências que posteriormente lamentaremos. Eis aí quando a humildade se faz necessária. Temos errado muitas vezes porque ainda não sabemos ser humildes no momento azado. Tememos o julgamento dos nossos semelhantes e reagimos. Reagindo, ficamos á mercê de sentimentos que desejamos sufocar, sentimentos que podem ser explorados pela treva. Esses sentimentos, contidos durante longo tempo, encontram numa brecha o caminho da fuga. E ocorre o inevitável que a reflexão teria... evitado. É como acontece com um recipiente cheio de gás.  Se suas paredes são fortes e podem resistir à pressão progressiva do gás acumulado, tudo estará bem, desde que não ajamos com imprudência. Mas, se houver uma frincha no recipiente, o gás se expande a pouco e pouco, até que a sua pressão transforme a insignificante rachadura numa fratura completa. Desde que as paredes do recipiente sejam frágeis, o resultado será pior: ocorrerá a explosão violenta com resultados irremediáveis para quantos delas se achem próximos. 
                Não raro, em nossos solilóquios, nos perguntamos: quando deixaremos de ser, espiritualmente, um Sísifo, levando sempre, ladeira acima, a grande pedra das nossas imperfeições, sem que ela se detenha lá e volte a rolar para baixo, eternizando a nossa ingente e dolorosa tarefa de reconduzi-la ao ponto de onde caiu?
              Quantas encarnações necessárias ainda a esse trabalho tremendo? Deus o sabe. No fim de tudo, o que nos falta é mesmo humildade. Pelo menos a humildade necessária nos momentos cruciais da vida. E é tão difícil adquiri-la! O que às vezes nos parece humildade nada mais é, com certeza, do que inconsciente simulação. Tal como acontece a certos médiuns, que se iludem com o “animismo”, sucede com a maior parte de todos nós: somos “humildes” quando tudo vai bem, mas não somos humildes quando nos vemos envolvidos pelos conflitos do mundo, e a nossa vaidade, ou orgulho, porque ambas as deficiências se confundem, nos tornam cegos e obtusos. Tudo que aqui está na primeira pessoa do plural é para ser lido como sendo na primeira pessoa do singular...
                Graças a esse par maléfico – Orgulho – Vaidade, muita coisa desagradável acontece, por nossa iniciativa ou por iniciativa de outrem, sem que tenhamos podido imunizar o nosso espírito com humildade sincera.
                Está em “O Evangelho segundo o Espiritismo”, essa obra admirável, eminentemente cristã, que podemos considerar, com justa propriedade, “o livro branco do Cristianismo redivivo”, estas palavras de uma comunicação mediúnica de Adolfo, bispo de Argel, em Marmande, 1862: “A humildade é virtude muito esquecida entre vós. Bem pouco seguidos são os exemplos que dela se vos têm dado. Entretanto, sem humildade, podeis ser caridosos com o vosso próximo? Oh! não, pois que este sentimento nivela os homens, dizendo-lhes que todos são irmãos, que se devem auxiliar mutuamente, e os induz ao bem. Sem a humildade, apenas vos adornais de virtudes que não possuís, como se trouxésseis um vestuário para ocultar as deformidades do vosso corpo. Lembra-vos dAquele que nos salvou; lembrai-vos da sua humildade, que tão grande o fez, colocando-o acima de todos os profetas.”
                Que fazer? Somos como aquele homem cheio de entusiasmo e disposição, que se julgava apto a alcançar a outra margem de um rio, fiado apenas no seu desejo de consumar a proeza. Mas experimentava a força da correnteza e compreendia que a sua capacidade natatória era ainda insuficiente. Lançava-se de novo à água, mais tarde, tentava dominá-la, porém logo se via impotente para prosseguir. Mas nunca deixou de fazer tentativas. A cada uma delas, avançava mais um pouco. Algum dia, sem dúvida alguma, logrará seu intento.
                Então, conhecerá a alegria de uma vitória que somente dependerá dele, que somente ele poderá alcançar. Quando assim for, seu coração vibrará de júbilo, seus olhos se encherão das lágrimas da alegria e ele poderá exclamar, erguendo os braços para o alto:
                - Estou salvo!   

              


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