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sexta-feira, 18 de maio de 2018

Deus e a igreja católica



Deus e a igreja católica
Rodolpho Calligaris
Reformador (FEB) Dezembro 1939

Somos dos que acham que a seara espírita é extremamente grande e devoluta, constituindo insensatez de nossa parte o deixá-la frequentemente para excursionarmos pelas searas alheias.
Por outras palavras, há no Espiritismo muita matéria a examinar e estudar, que deve e precisa ser divulgada, com maior proveito para a causa, do que a discussão de questões e assuntos que não lhe dizem respeito.
Os fatos, porém, com que nos vamos ocupar são de tal ordem, que não resistimos ao ímpeto de alinhavar este breve arrazoado.
Em dias do ano passado, teve lugar na catedral de Diamantina a sagração de D. José André Coimbra, nomeado bispo da Barra do Piraí, sendo a cerimônia dirigida por D. Serafim Comes Jardim, arcebispo de Diamantina, e bispos de Montes Claros e Arassuaí, dioceses sufragâneas daquela arquidiocese.

Tudo decorreu com aquela pompa e aquele aparato peculiares a solenidades que tais. Duas chapas foram batidas: uma a porta do Palácio
Arquiepiscopal, quando, sob o pálio, aqueles prelados se dirigiam à catedral e outra focalizando o pálio já em plena rua. Até aqui nada de extraordinário.

Acontece porém, que, ao serem reveladas as ditas chapas, notou-se em ambas a presença, nítida e perfeita, de um "extra", identificado como sendo o Espírito de D. Joaquim Silvério de Souza, falecido cerca de seis anos antes da referida Sagração.

D. Joaquim Silvério de Souza fora, em vida, patrono de uma associação cuja finalidade é custear o estudo de seminaristas pobres, sendo que era grande aspiração sua ver algum desses seminaristas sagrado bispo. Dizia então que, quando tal se verificasse, ele próprio seria o oficiante.

A sagração do primeiro de seus pupilos, D. José André Coimbra, deu-se seis anos depois de sua morte, circunstância que, conforme o atestam as fotografias em apreço, não o inibiu de ver cumprido aquele seu ardente desejo.

A igreja católica, que não perde vasa para as suas especulações, entendeu de explorar o caso, aliás conhecidíssimo dos adeptos do Espiritismo, servindo-se do embuste grosseiro do milagre para poder enganar e conseguir o fim que tem sempre em mira. Este "fim" é ilaquear a boa fé dos tolos e ignorantes e impingir-lhes milhares da milagrosa fotografia em "troca" de uma esmolinha, o que, certamente, não deixará de dar pingues resultados...

Um panfleto de propaganda do milagre, contendo uma das fotografias, só agora reveladas ao público, datada de Diamantina aos 20-9-1938, traz os seguintes dizeres por nós destacados propositadamente para que os nossos presumíveis leitores lhe apreciem a lógica genuinamente católica, apostólica, romana:

"Só os católicas são dignos, ante a face imutável de Deus, de receber tamanha graça, em tão estupendo milagre. Os espíritas costumam dizer que os mortos se comunicam, se deixam fotografar, mas nós continuaremos a dizer: Isto é falso, pois sendo as leis de Deus imutáveis,  iguais para todos os filhos de Deus, só para os católicos há exceção... Porque Deus violenta o seu próprio estatuto para operar o milagre! Aí está a prova de que os mortos não se deixam fotografar, a menos que tenham sido católicos e como tal tenham morrido."

Que tal, hein? "Só os católicos são dignos", "só para os católicos há exceção" e "só para os católicos Deus violenta o seu próprio estatuto". E nós que estávamos quase acreditando que "as leis de Deus são, mesmo, imutáveis e iguais para todos"...

Que ingenuidade, a nossa!

Esta outra tirada é ainda mais formidável: "Aí está a prova de que os mortos não se deixam fotografar...” e para corroborar aquilo que dizem, a fim de que não subsistam quaisquer dúvidas, apresentam... a fotografia em que aparece o Espírito de D. Silvério, morto seis anos antes!!!

É verdade que ressalvam:  “...a menos que tenham sido católicos e como tal tenham morrido". O inteligente leitor, porém, saberá dar a essa ressalva o apreço que merece ...

É extraordinário o ponto a que chegou o desplante e a impavidez do clero!

Fenômenos idênticos, verificados por um Aksakof, um Crookes, um Richet, não passam de ilusão, fraude, mentira ou sugestão; agora, o caso de D. Silvério é milagre!

Felizmente, porém, "os tempos são chegados" e a lógica dos fariseus já não convence a muita gente...

É deixá-los; acabarão falando sozinhos ...

*

O outro fato que deu ensejo a estas linhas não é menos interessante.

O general Franco, chefe da revolução que cobriu de luto a bela e heroica pátria de Cervantes, ofereceu a Deus a sua espada vencedora, tendo recebido, a propósito, a seguinte carta do cardeal primaz da Espanha, que transcrevemos do "Correio da Manhã", de 12 de Julho de 1939:

"Julgo de meu dever dar o maior relevo ao gesto nobilíssimo de cristã edificação que teve V. Ex. ao entregar, na qualidade de representante da Igreja na Espanha, a sua espada vencedora, como tributo de gratidão a Deus, que, com Sua Amorosa Providência, auxiliou os que lutaram por Sua Honra e pela da Espanha, e como veneração à Santa Igreja Católica da qual V. Ex. é filho ilustre e fidelíssimo.

"Fiz entrega da histórica espada ao Cabido da Catedral Primaz em cujo tesouro deve ficar guardada. Peço a Deus do fundo d’alma que dê todas as Suas bênçãos a quem ofereceu tal exemplo de religiosidade à Espanha e ao mundo, e que dê a V. Ex. luz e força para triunfar nas árduas tarefas da paz, como triunfou nos dias heroicos da guerra. Deus guarde a v. ex. muitos anos." (Os grifos são nossos),

Algum leitor menos avisado que deparasse com tal noticia, sem se inteirar da data de sua publicação, poderia, com justíssimas razões, confundir-se e supor tratar d’algum acontecimento ocorrido na infância da humanidade. Efetivamente, entregar um instrumento de guerra a Deus, em sinal de gratidão pelo seu auxilio ao massacre e destruição de milhares de filhos desse mesmo Deus, é coisa que aberra dos mais comezinhos princípios de moral e religião. O Deus que porventura aceitasse tal oferenda poderia quando muito ser o deus Marte, da mitologia antiga, mas nunca o Deus de amor e de justiça de que nos fala o Evangelho de Jesus. O qual não só ditou o "Não matarás", como condenou toda e qualquer forma de violência e desprezo para com os semelhantes, por constituir infração ao "amai-vos uns aos outros", mandamento que resume toda a lei e os profetas.

Por mais paradoxal que pareça, trata-se, porém, de um facto recentíssimo, passado num país que se diz civilizado e essencialmente católico, constituindo mesmo um magnífico exemplo de "religiosidade" oferecido ao mundo do século XX por um dos mais "ilustres e fidelíssimos filhos da santíssima igreja católica, apostólica, romana"!

Muito edificante, pois não!

Como vemos, a mentalidade católica d’aquém e d’além mar é a mesma. Aqui, é deus que "violenta o seu estatuto para operar um milagre-católico", provando destarte que "só os católicos são dignos e só para eles há exceção.

Acolá, é o mesmo deus que, "com Sua Amorosa Providência." (triste ironia), desce de seu sólio de astros e de estrelas, protege e auxilia o chefe de horrível guerra fratricida, para, depois de saciado em sua sede de sangue e morte, conduzi-lo finalmente à ambicionada vitória!

Semelhante deus, francamente, mais se parece com Satanás...

quarta-feira, 16 de maio de 2018

A ilusão do discípulo



A Ilusão do discípulo
Humberto de Campos por Chico Xavier
Reformador (FEB) Dezembro 1939

            Jesus havia chegado a Jerusalém sob uma chuva de flores.
De tarde, após a consagração popular, caminhavam Tiago e Judas, lado a lado, por uma estrada antiga, circundada de oliveiras, que conduzia às casinholas alegres de Betânia.
Judas Iscariote deixava transparecer no semblante uma íntima inquietação, enquanto no olhar sereno do filho de Zebedeu fulgurava a luz suave e branda que consola o coração das almas crentes.
- Tiago - exclamou Judas, entre ansioso e atormentado - não achas que o Mestre é demasiado simples e bom para quebrar o jugo tirânico que pesa sobre Israel, abolindo a escravidão que oprime o povo eleito de Deus?
- Mas - replicou o interpelado - poderias admitir no Mestre as disposições destruidoras de um guerreiro do mundo?
- Não tanto assim. Contudo, tenho a impressão de que o Messias não considera as oportunidades. Ainda hoje, tive a atenção reclamada por doutores da lei que me fizeram sentir a inutilidade das pregações evangélicas, sempre levadas a efeito entre as pessoas mais ignorantes e desclassificadas. Ora, as reivindicações do nosso povo exigem um condutor enérgico e ativo, - Israel - retrucou o filho de Zebedeu, de olhar sereno - sempre teve orientadores revolucionários; o Messias, porém, vem efetuar a verdadeira revolução, edificando o seu reino sobre os corações e sobre as almas!.. "       
Judas sorriu, algo irônico, e acrescentou: - Mas, poderemos esperar renovações, sem conseguir o interesse e a atenção dos homens poderosos?
- E quem haverá mais poderoso do que Deus, de quem o Mestre é o enviado divino?
Em face dessa invocação, Judas mordeu os lábios, mas prosseguiu:
- Não concordo com os princípios de inação e creio que o Evangelho somente poderá vencer com o amparo dos prepostos de Cesar, ou das autoridades administrativas do Templo, as quais, em Jerusalém, nos governam o destino. Acompanhando o Mestre nas suas pregações em Cesaréia, em Sebaste, em Corazim e Betseida, quando das suas ausências de Cafarnaum, jamais o vi interessado em conquistar a atenção dos homens mais altamente colocados na vida. É certo que de seus lábios divinos sempre brotaram a verdade e o amor, por toda parte; mas, só observei leprosos e cegos, pobres e ignorantes, abeirando-se de nossa fonte.
- Jesus, porém, já nos esclareceu -obtemperou Tiago com brandura - que o seu reino não é deste mundo.
Imprimindo aos olhos inquietos um fulgor estranho, o discípulo impaciente revidou com energia:
- Vimos hoje o povo de Jerusalém atapetar o caminho do Senhor com as palmas da sua admiração e do seu carinho; precisamos, todavia, impor a figura do Messias às autoridades da Corte Provincial e do Templo, de modo a aproveitar esse surto de simpatia. Notei que Jesus recebia as homenagens populares sem participar do entusiasmo febril de quantos o cercavam, razão por que necessitamos multiplicar esforços, em lugar dele, a fim de que a nossa posição de superioridade seja reconhecida, em tempo oportuno.
- Recordo-me, entretanto, de que o Mestre nos asseverou que o maior na comunidade será sempre aquele que se fizer o menor de todos.
- Não podemos levar em conta esses excessos de teoria. Interpelado que vou ser hoje por amigos influentes na política de Jerusalém, farei o possível por estabelecer acordo com os altos funcionários e homens de importância, a fim de imprimir novo movimento às ideias do Messias.
- Judas! Judas!.. observou-lhe o irmão de apostolado, com doce veemência. - Vê lá o que fazes!.. Socorreres-te dos poderes transitórios do mundo, sem um motivo que justifique esse recurso, não será, desrespeito à autoridade de Jesus? Não terá o Mestre visão bastante para sondar e conhecer os corações? O hábito dos sacerdotes e a toga dos dignitários romanos são roupagens para a Terra... As ideias do Mestre são do céu e seria sacrilégio misturarmos a sua pureza com as organizações viciadas do mundo! . . . Além de tudo, não podemos ser mais sábios e mais amorosos do que Jesus e Ele sabe o melhor caminho e a melhor oportunidade para a conversão dos homens!.. As conquistas do mundo são cheias de ciladas para o espírito e, entre elas, é possível que nos transformemos em órgão de escândalo para a verdade que o Mestre representa.
 Judas sienciou, atormentado.
No firmamento, os derradeiros raios do Sol batiam nas nuvens distantes, enquanto os dois discípulos tomavam rumos diferentes.

Sem embargo das carinhosas exortações de Tiago, Judas Iscariote passou a noite tomado de angustiosas inquietações.
Não seria melhor apressar o triunfo mundano do cristianismo? Israel não esperava um Messias que enfeixasse nas mãos o conjunto de todos os poderes! Valendo-se da doutrina do Mestre, poderia tomar para si as rédeas do movimento renovador, enquanto Jesus, na sua bondade e simpleza, ficaria, entre todos, como um símbolo vivo da ideia nova.
Recordando suas primeiras conversações com as autoridades do Sinédrio, meditava na execução dos seus sombrios desígnios.
A madrugada o encontrou decidido, na embriaguez de seus sonhos ilusórios. Entregaria o Mestre aos homens do poder, em troca da sua nomeação oficial para dirigir a atividade dos companheiros. Teria autoridade e privilégios políticos. Satisfaria às suas ambições, aparentemente justas, a fim de organizar a vitória cristã no seio de seu povo. Depois de atingir o alto cargo com que contava, libertaria a Jesus e lhe dirigiria os dons espirituais, de modo a utilizá-los para a conversão de seus amigos e protetores prestigiosos.
O Mestre, a seu ver, era demasiadamente humilde e generoso para vencer sozinho, por entre a maldade e a violência.
Ao desabrochar a alvorada, o discípulo imprevidente demandou o centro da cidade e, após horas, era recebido pelo Sinédrio, onde lhe foram
hipotecadas as mais relevantes promessas.
Apesar de satisfeito com a sua mesquinha gratificação e desvairado no seu espírito ambicioso, Judas amava ao Messias e esperava, ansiosamente, o instante do triunfo para lhe dar a alegria da Vitória cristã, através das manobras políticas do mundo.
O prêmio da vaidade, porém, esperava a sua desmedida ambição.
Humilhado e escarnecido, seu Mestre bem amado foi conduzido à cruz da ignomínia, sob vilipêndios e flagelações.
Daqueles lábios, que haviam ensinado a verdade e o bem, a simplicidade e o amor, não chegou a escapar-se uma queixa. Martirizado na sua estrada de angustias, o Messias só teve o máximo de perdão para os seus algozes.
Observando os acontecimentos, que lhe contrariavam as mais íntimas suposições, Judas Iscariote se dirigiu a Caifás, reclamando o cumprimento de suas promessas. Os sacerdotes, porém, ouvindo-lhe as palavras tardias, sorriram com sarcasmo. Debalde recorreu às suas prestigiosas relações de amizade: teve de reconhecer a falibilidade das promessas humanas. Atormentado e aflito, buscou os companheiros de fé. Encontrou-os vencidos e humilhados; pareceu-lhe, porém, descobrir em cada olhar a mesma exprobração silenciosa e dolorida.


Já se havia escoado a hora sexta, em que o Mestre expirara na cruz, implorando perdão para os seus verdugos.
De longe, Judas contemplou todas as cenas humilhantes e angustiosas do Calvário. Atroz remorso lhe pungia a consciência dilacerada. Lágrimas ardentes lhe rolavam dos olhos tristes e amortecidos. Malgrado à vaidade que o perdera, ele amava intensamente ao Messias.
Em breves instantes, o céu da cidade impiedosa se cobriu de nuvens escuras e borrascosas. O mau discípulo, com um oceano de dor na consciência, peregrinou em derredor do casario maldito, acalentando o propósito de desertar do mundo, numa suprema traição aos compromissos mais sagrados de sua vida.
Antes, porém, de executar seus planos tenebrosos, junto à figueira sinistra ouvia a voz amargurada do seu tremendo remorso.
Relâmpagos terríveis rasgavam o firmamento, trovões cavernosos os pareciam lançar sobre a terra criminosa a maldição do céu vilipendiado e esquecido.
Mas, sobre todas as vozes confusas da natureza, o discípulo infeliz escutava a voz do Mestre consoladora e inesquecível, penetrando-lhe os refolhos mais íntimos da alma: - "Eu sou o Caminho, a Verdade e a Vida. Ninguém pode ir ao Pai, senão por mim!.. "


sexta-feira, 11 de maio de 2018

Direitos e Deveres



Direitos e Deveres  
por Vinícius 
Reformador (FEB) Novembro 1939

Todas as rixas, leves ou graves, entre os povos e indivíduos, se originam da defesa ou da disputa de direitos. Ninguém quer abrir mão dos que tem, todos querem conquistar os que não têm.

Jesus foi o único que abdicou de todos os direitos próprios, para cumprir os deveres alheios. Em tal se funda sua escola: cumprir deveres e renunciar a direitos. Semelhante doutrina é a loucura da cruz, que os sábios e prudentes do século não podem conceber nem aceitar.

O homem primitivo desconhece deveres: usa e abusa do direito, única forma de ação que concebe. O homem do presente cumpre alguns deveres e exerce todos os direitos que pode. O homem do futuro cumprirá deveres e desistirá de direitos.

Fato curioso: quem acaba adquirindo maior soma de direitos são justamente aqueles que mais se dispõem a despojar-se deles. Renunciar é uma espécie de riqueza que quanto mais se espalha mais se ajunta e multiplica. Quem desiste de um direito que legitimamente lhe assiste, lança no coração da humanidade uma semente que vai produzir cento por um e, assim centuplicada, voltará um dia às mãos do semeador.

Existem muitas escolas de Direito. Delas procedem os jurisconsultos, os juristas, os magistrados e os causídicos. Todos eles proclamam o grande valor dessa ciência de cuja interpretação se dizem mestres. Não há, no entanto, um templo para o Dever, nem uma academia onde se aprenda essa disciplina. Não é, pois, de admirar que os homens não se entendam e vivam em constantes querelas e disputas à cata da justiça.


quinta-feira, 10 de maio de 2018

Fim do Materialismo



Fim do materialismo
Ismael Gomes Braga
Reformador (FEB) Agosto 1955

Em outro artigo já nos referimos de passagem ao profundo prefácio de Emmanuel para o novo livro de André Luiz - Nos Domínios da Mediunidade -, mas não citamos as palavras textuais do nosso Irmão Maior. Diz:

...Químicos e físicos, geômetras e matemáticos, erguidos à condição ele investigadores da verdade, são hoje, sem o desejarem. sacerdotes do Espírito, porque, como consequência de seus porfiado estudos, o materialismo e o ateísmo serão compelidos a desaparecer, por falta de matéria, a base que lhe assegurava as especulações negativistas.

Os laboratórios são templos em que a inteligência é concitada ao serviço de Deus, e, ainda mesmo quando a cerebração se perverte, transitoriamente subornada pela hegemonia política, geradora de guerras, o progresso da Ciência, como conquista divina, permanece na exaltação do bem, o glorioso porvir.
O futuro pertence ao Espírito!

Todo o edifício materialista é construção sobre areia movediça, porque a matéria não é uma realidade, é apenas uma forma passageira de energia condensada, e a energia é dirigida pela mente, ou pelo Espírito, que tem força de dar-lhe formas, de agregá-la e desagregá-la a seu talante.

Quem tenha assistido aos fenômenos de materialização e desmaterialização, que é quase um brinquedo para os Espíritos, tem que perder sua fé na matéria e passar a confiar só no Espírito, em Deus como Espírito Universal, Força criadora e transformadora.

O novo livro de André Luiz é uma janela aberta para esse amplo porvir, no qual o Pan-materialismo será substituído nas consciências pelo Pan-espiritualismo e, consequentemente, pela mais sublimada moral; porque o homem verificará por toda a parte as leis morais em ação, prendendo a uns na jaula atroz da expiação, elevando a outros à suma felicidade do amor universal, sem meio algum de serem enganadas ou subornadas essas leis divinas, inexoráveis em sua perfeita justiça.

O livro relata uma excursão de dois aprendizes desencarnados, André Luiz e Hilário, guiados por um mestre, Aulus, pelos domínios da mediunidade em todas as suas mais variadas, infinitas manifestações. Visitam sessões espíritas de diversos tipos, desde as mais altas até as de tristes serviços (ou ilusões de serviços) puramente materiais, às quais afluem pedidos de empregos, de andamento de processos em repartições, de rusgas amorosas etc., e que lembram a triste situação de obscuros crentes católicos que "fazem promessas" aos santos de sua devoção, a fim de obterem tudo que espiritualmente lhes prejudicaria e seus pastores certamente desaconselhariam. Mas não se limitam a sessões espíritas; estudam a mediunidade igualmente na rua, na taverna de viciados, nos lares infelizes e felizes, por toda a parte em suma onde existe o homem, porque onde há um ser humano há um médium em ação.

Estuda o vampirismo como uma realidade concreta e não como o faz a crendice popular.

O vampiro é um Espírito muito grosseiro, apegado às sensações materiais inferiores, mais comumente ao alcoolismo, que subjuga um ser humano encarnado que possua tendências semelhantes às suas, para lhe servir de médium em sua incontinência, e desce com sua vítima aos mais profundos abismos da sensualidade e do crime.

As casas de diversões, as tavernas, todos os meios de viciados, estão repletos de vampiros e de vítimas.

Acompanhar em sua excursão os dois aprendizes e seu Excelso Mestre, através das páginas do livro, não só é muito instrutivo, mas também muito sedutor como literatura. Tem um sabor de "Divina Comédia", mas em prosa simples e clara, e não nos versos muitas vezes obscuros de Dante Alighieri. E muitas cenas que ocorrem
em nosso meio, sem que as compreendamos, são tão penosas como as do Inferno de Dante.

Se todos os livros de André Luiz são excelentes, este mais recente é, em certo sentido, melhor do que todos os outros, segundo nossa humilde apreciação, constituindo inegavelmente um compêndio prático para nos libertar de tremendos perigos que nos envolvem por todos os lados.
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Do Blog: Que tal fazer deste livro sua próxima leitura?


quarta-feira, 9 de maio de 2018

Do berço ao túmulo


Do berço ao túmulo
por Nicolás Reyes Esquivel
Reformador (FEB) Maio 1954

Berço, Túmulo, dois extremos da vida.

O Berço é ave mensageira de plumagens brancas, que traz um companheiro para vida.

O Berço é para o mortal, alegria, entusiasmo, dia de festa para os que esperam, e que não sabem se o que chega é enfermo da alma, criminoso com todas as agravantes humanas e divinas, ou acrisolada virtude em alma pura, com importante missão a cumprir junto dos homens. Os que esperam sabem somente que é a inocência: sua pequenez, seus movimentos, seus gemidos, seus instintos de conservação, seus olhares puros e outros mil pormenores próprios da criança, de um ser indefeso, envolto em fraldas - sejam elas de algodão ou de seda - dizem-nos apenas que é nosso filho, um irmão, parente ou amigo e ao qual nos cabe prodigalizar os cuidados necessários.

O recém-chegado é inconsciente. Está aturdido. Para ele não há explicação possível: revela sua presença apenas por um gemido doloroso - o mais cruel – depois, muitos outros gemidos, dolentes. A um Espírito livre que se tornou prisioneiro, preso pelos laços de sua vestidura carnal, tudo se lhe obscurece. A partir desse momento ele sofre o tormento da vida.

Viver para tornar a morrer e progredir sempre (Tal é a Lei), disse um filósofo. Ele viveu nos espaços siderais, contemplou mundos de luz e de trevas; viu suas humanidades e não ignora que as há selvagens e também infinitamente sábias. Quanto mais evolvido, melhor conhece esse laboratório infinito da vida espiritual. Hoje, porém, que baixou à prisão, hoje que se tornou preciso morrer, nas alturas, para seguir sempre adiante, ele não sabe nada. Um véu denso, terrível, espantoso, mais terrível e espantoso que o sepulcro, o envolve por todos os lados circunscrevendo-o aos cinco miseráveis sentidos focos imperfeitos e deficientes, quando comparados com os psíquicos da vida espiritual. E ainda mais: pode vir mudo, surdo-mudo ou carente de todos os sentidos. Pode vir louco.

Não obstante, sentimo-nos satisfeitos com a sua chegada, desde que as condições se mostrem favoráveis, ou profundamente entristecidos se nos chega organicamente atrofiado. Nada sabemos a respeito de sua alma, unicamente que é um inocente. Doloroso seria, querido irmão, caso pudéssemos adivinhar qual o valor espiritual que este viajante desconhecido traz à Terra!

Talvez haja embarcado para fazer uma viagem neste mundo. Ela, porém, é tão perigosa! O caminho a percorrer está juncado de obstáculos, basta que se desvie um pouco, para cair no abismo sem fundo. Contudo, ali não perecerá, porque a vida não se acaba, mas terá, isto sim, que reiniciá-la, e em cada uma delas com provas sempre em consonância com as suas quedas.
Este caminhante não pode descuidar-se e nem parar; tem de afastar os obstáculos que surgem, pois que, à medida que avança, eles se vão tornando mais numerosos, daí ser indispensável, sempre e sempre, redobrar esforços até chegar ao extremo do caminho. Uma voz o adverte então e diz: “Chamo-me consciência e acompanho-te sempre”: A seu lado seguem entidades, aconselhando-o, dando ânimo e forças, a fim de que continue o seu carreiro, mas que não tomarão parte em suas lutas, pois que ele próprio deve ser quem se coroe, ao término da viagem. Se deixar de ouvi-las, sua consciência se obscurece, não toma precauções, desvia-se do roteiro seguro e irá precipitar-se no abismo. Por isso, ao começar teu calvário, ó alma! o grito é doloroso. Tal viagem é pior que a morte. É a experimentação que te conduz à mansão dos bem-aventurados ou aos recintos da desolação e da tristeza onde moram os Espíritos sem luz. Porém, ó alma! eu já te disse: quantas vezes fracassares, tantas outras terás de voltar - não importa o tempo -, porque aí está a Eternidade.

Venceste, mas também caíste. E na verdade quem não caiu? Todas as vezes que caias, redobravas teus esforços e aplanavas o caminho; cada Vez desapareciam esses obstáculos e, quando afastaste a maior parte deles, então não mais tiveste que fazer esforços! bastou-te a vontade.

Muitas vezes iniciaste o percurso, terminando-o sem que ficasse em tua vida material uma recordação. São os dois polos da existência. Nascer e morrer. Berço e Túmulo. Resultado: amor e ciência. Deus é o amor, Deus é a ciência. Pelo amor e pela ciência chegarás a Deus.

Luta, irmão: o berço e o túmulo são os cenários de tuas existências para progredires. Não necessitas de ouro, nem de prata em teus alforjes, nem da coroa de rei, nem do bolso do avarento; podes ir humilde, mas escutando sempre a voz de tua consciência que te dita: amor, honradez justiça.. Não te macules com o orgulho do déspota, nem com a crueldade do tirano, nem com a vaidade do ignorante, por serem a lepra da desgraça.

Assim falou o filósofo, para que medites.

(Traduzido de Voz Informativa, do México, número de Dezembro de 1953)

sexta-feira, 4 de maio de 2018

Em Cristo


Em Cristo
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1954

Cristianismo será, sobretudo, nós em Cristo, tanto quanto o Cristo vive em nós.
A fim de alcançar, porém, essa fórmula de integração divina, para que o apostolado santificante da Boa Nova se estenda a toda a Terra, através de nossa fé renovadora, não basta a confissão exterior do nosso modo de crer.
É imprescindível nos ajustemos ao ideal, à ação, à conduta e à atitude do Mestre perante a vida, convertendo-nos, assim, em refletores de sua vontade misericordiosa e justa.
O Evangelho não ê um florilégio de afirmativas filosóficas, a caminho dos museus literários e, sim, roteiro vivo, que nos cabe observar, negando a nós mesmos, tomando a cruz de nossas responsabilidades individuais e seguindo ao encontro de nossa união com o Benfeitor Celeste.
Para isso, contudo, não nos compete indagar e sim obedecer.
Não desfrutamos, por enquanto, o direito de tudo compreender, no quadro de nossas presunções científicas, mas atingimos, por graça do Senhor, a oportunidade de servir em Seu Nome.
Nesse sentido, não vemos o Cristo, em sua gloriosa passagem no mundo, internado no labirinto das inquirições sem propósito, acerca da natureza divina, nem mergulhado na teorização quanto a esse ou àquele setor do incognoscível, mas em todos os instantes extremamente consagrado a Deus na pessoa das criaturas, exemplificando o imediatismo do bem, no reerguimento das almas, dando-nos, assim, a entender que a extensão do Reino do Céu à comunidade humana é serviço afeto à nossa própria responsabilidade de espíritos endividados à frente do mundo - milenária escola de nossas consciências - que tudo nos têm dado e que espera de nós a conjugação do verbo ressarcir.
Enquadrando-nos, desse modo, nos padrões de ordem moral que Jesus nos legou, abandonemos a pesada concha do "eu" que nos retém nas trevas do egoísmo esterilizante e avancemos na direção do Alto, alongando braços e corações, no culto da verdadeira fraternidade, para com o próximo mais próximo.
Desce a luz - para clarear as sombras.
Corre a fonte - para fertilizar a terra seca.
Amadurece o fruto - para alimentar.
Surge o remédio - para socorrer.
Brilha a sabedoria - para eliminar a ignorância.
Nasce o amor - para a desintegração do ódio.
Floresce, vitoriosa, a fé viva - para aquecer as almas enregeladas na indiferença.
O cristão igualmente é uma dádiva do Céu à Terra, para que a vida se faça melhor e mais digna de ser vivida.
Cristianismo, pois, sem atividade regeneradora dos aprendizes que o esposam, é pregação morta no túmulo adornado das bibliotecas sem proveito ou no cárcere da inteligência sem amor.
Compete-nos, portanto, avançar para a frente, centralizados em Jesus, em favor de nossa integral comunhão com Ele e a benefício da redenção total do mundo.
Nós em Cristo, para que o Cristo reine em nós.

Alma e Corpo



Alma e corpo
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1955

Não nos esqueçamos de que o corpo na Terra é o filtro vivo de nossa alma.
Nossos pensamentos expressar-se-ão, segundo sentimos, tanto quanto nossos atos serão exteriorizados, conforme pensamos.
            Todos os processos emocionais de nosso coração atingem o cérebro, de onde se irradiam para o campo das manifestações e das formas.
Sensações e atitudes mais íntimas se mostram, invariavelmente, em nossa vida de relação.
A gula produz a deformidade física.
            O orgulho estabelece a neurastenia sistemática.
A vaidade conduz, apressadamente, à loucura.
A cólera dá origem à congestão e à apoplexia.
O ciúme arrebata ao ridículo.
            A maldade encontra sempre a casa escura do crime.
A inveja situa o homem na preguiça e na maledicência.
O desânimo alimenta o caruncho da inutilidade.
A ignorância faz a miséria.
A tristeza prolongada deixa na alma o cupim das moléstias indefiníveis.
O vício gera monstruosidades.
Os hábitos deploráveis trazem a antipatia em torno de quantos a eles se afeiçoam.
A paixão, não raro, conduz à morte.
Cada sentimento emite raios e forças intangíveis que lhe são característicos.
Cultivemos, assim, a bondade, a compreensão e a alegria, porquanto nelas possuímos o manancial das energias de soerguimento e elevação da nossa alma eterna para Deus, nosso Pai e Misericordioso Senhor.
Nem corpo inteiramente mergulhado na Terra, nem espírito integralmente absorvido na contemplação do firmamento.
A árvore produz para o mundo, sustentando a vida, de raízes imersas no solo e de copa florida a espraiar-se em pleno céu.
Aprendamos com a Natureza.
A situação ideal será sempre a do equilíbrio com a vigilância concentrada por dentro. Por isso mesmo, há muitos séculos, já nos afirmava a profecia: - "Guardar com carinho e cuidado o coração, porque realmente dele procedem as correntes da Vida."

Oração à Mulher



Oração à Mulher
Meimei por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1954

Missionária da Vida:
Ampara o homem para que o homem te ampare.
Não te conspurques no prazer, nem te mergulhes no vício.
A felicidade na Terra depende de ti, como o fruto depende da árvore,
Mãe, sê o anjo do lar.
Esposa, auxilia sempre.
Companheira, acende o lume da esperança.
Irmã, sacrifica-te e ajuda.
Mestra, orienta o caminho,
Enfermeira, compadece-te.
Fonte sublime, se as feras do mal te poluíram as águas, imita a corrente cristalina que, no serviço infatigável a todos, expulsa do próprio seio a lama que lhe atiram.
Por mais te aflija a dificuldade, não te confies à tristeza ou ao desânimo.
Lembra os órfãos, os doentes, os velhos e os desvalidos da estrada que esperam por teus braços e sorri com serenidade para a luta.
Deixa que o trabalho tanja as cordas celestes do teu sentimento para que não falte a música da harmonia aos pedregosos trilhos da existência terrestre.
Teu coração é uma estrela encarcerada.
Não lhe apagues a luz, para que o amor resplandeça sobre as trevas.
Eleva-te, elevando-nos.
Não te esqueças de que trazes nas mãos a chave da vida, e a chave da vida é a glória de Deus.


quinta-feira, 3 de maio de 2018

Na ausência/ na presença do amor



Na ausência do amor
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1954

"Mas aquele que aborrece a seu irmão está em trevas e anda em trevas e não sabe para onde deva ir, porque as trevas lhe cegaram os olhos ." - João, 2:11

Se não sabes cultivar a verdadeira fraternidade, serás atacado fatalmente pelo pessimismo, tanto quanto a terra seca sofrerá o acúmulo de pó.
Tudo incomoda àquele que se recolhe à intransigência.
Os companheiros que fogem às tarefas do amor são profundamente tristes pelo fel de intolerância com que se alimentam.
            Convidados ao esforço de equipe, asseveram que os homens respiram em bancarrota moral.
Trazidos ao culto da fé, supõem reconhecer, em toda a parte, a maldade e a desilusão.
Chamados à caridade, consideram nos irmãos de sofrimento inimigos prováveis afastando-se irritadiços.  
Impelidos a essa ou àquela manifestação de contentamento, recuam, desencantados, crendo surpreender maldade e lama nas menores exteriorizações de beleza festiva.
Caminham no mundo entre a amargura e a desconfiança.
Não há carinho que lhes baste. Vampirizam criaturas por onde estagiam, chorando, reclamando, lamentando...
Não possuem rumo certo. Declaram-se expulsos da sociedade e da família.
É que, incapazes do amor ao próximo, jornadeiam pela Terra, sob o pesado nevoeiro do egoísmo que nos detém tão somente no círculo estreito de nossas necessidades sem qualquer expressão de respeito para com as necessidades alheias.
            Afirmam-se incompreendidos, porque não desejam compreender.
Ausentes do amor, ressecam a máquina da Vida, perdendo a visão espiritual.
            Impermeáveis ao bem, fazem-se representantes do mal.
Se o pessimismo começa a abeirar-se de teu espírito, recolhe-te à oração e pede ao Senhor te multiplique as forças na resistência, ante o assalto das trevas.
Aprendamos a viver com todos, tolerando para que sejamos tolerados, ajudando para que sejamos ajudados e o amor nos fará viver, prestimosos e otimistas, no clima luminoso em que a luta e o trabalho são bênçãos de esperança.


Na presença do amor
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1954

"Aquele que ama a seu irmão está na luz e nele não há escândalo." João, 2:10

Quem ama o próximo sabe, acima de tudo, compreender. E quem compreende sabe livrar os olhos e os ouvidos do venenoso visco do escândalo, a fim de ajudar, ao invés de acusar ou desservir.
            É necessário trazer o coração sob a luz da verdadeira fraternidade para reconhecer que somos irmãos uns dos outros, filhos de um só Pai.
Enquanto nos demoramos na escura fase do apego exclusivo a nós mesmos, encarceramo-nos no egoísmo e exigimos que os outros nos amem. Nesse passo infeliz, não sabemos querer senão a nós próprios, tomando os semelhantes por instrumentos de nossa satisfação.
            Mas se realmente amamos o companheiro de caminho, a paisagem da vida se modifica, de vez que a claridade do amor os banhará a visão.
            Ama, pois, e assim como a lama jamais ofende a luz, a ofensa não mais te alcançará.
Saberás que a miséria é fruto da ignorância e auxiliarás a vítima do mal nela encontrando o próprio irmão necessitado de apoio e entendimento.
A prenderás a ouvir sem revolta ainda mesmo que o crime te procure os ouvidos e cultivarás a ajuda ao adversário, ainda mesmo quando te vejas dilacerado, porque o perdão com esquecimento absoluto dos golpes recebidos surgirá espontâneo em teu espírito, assim como a tolerância aparece natural na fonte que acolhe no próprio seio as pedras que lhe atiram.
Ama e compreenderás.
Compreende e servirás sempre mais cada dia, porque então permanecerás sob a glória da luz, inacessível a qualquer incursão das trevas.


Variações sobre a caridade



Variações sobre a Caridade
Emmanuel por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1954

Caridade que socorre e não perdoa é introdução à crueldade.
Caridade com repetidas lamentações é caminho para o desânimo.
Caridade que beneficia desesperando é inquietação e impaciência.
A caridade legítima jamais aparece concorrendo aos tributos de gratidão, nunca reclama, não se ensoberbece, não persegue, não se lastima, não odeia e a ninguém desencoraja...
Caridade que anuncia os próprios méritos é serviço ameaçado pela vaidade.
Caridade que ajuda para furtar-se às obrigações do trabalho é inclinação à preguiça.
            Caridade que auxilia para dominar o pensamento e a conduta dos outros é tirania do espírito.
Caridade que ampara com o objetivo de mostrar-se superior é fruto valioso mas isolado em espinheiros do orgulho.
Caridade que pede remuneração é fonte poluída pelo fel da negligência.
Caridade que dá para receber é bondade com interesse inferior.

Caridade limitada aos familiares e amigos é simples paixão.

Se desejamos caminhar em companhia da divina virtude, cultivemo-la, em silêncio, no coração, à maneira do Herói do Amor Infinito que, para revelar-nos a caridade pura, entregou-se, confiante, à Vontade de Deus, sob a morte na cruz.

"Espiritismo Cristão" e "Espírita Cristão"



“Espiritismo Cristão” e “Espírita Cristão”
 A Redação
Reformador (FEB) Maio 1955

“É de fato indubitável que o Espiritismo é mais estorvado pelos que o compreendem mal, do que por aqueles que dele nada entendem e até mesmo pelos seus inimigos declarados; e os primeiros tem geralmente a pretensão de compreenderem melhor que os outros. Esta pretensão, que denuncia orgulho por si mesma uma prova evidente da ignorância dos verdadeiros princípios da Doutrina." – ALLAN KARDEC.

No Brasil, graças à Federação Espírita Brasileira, à direção que sempre lhe deu a ela o Espírito de Ismael, o Espiritismo predominante é aquele que se orienta pelos ensinamentos do Cristo, interpretados segundo o espírito que vivifica, qual o recomendou o próprio Cristo e qual o fez o grande e iluminado Codificador: Allan
Kardec.

Há por aqui, não há dúvida, mas em pequeníssimo número, confrades que do Espiritismo só querem os prodígios, os "milagres", os fenômenos psíquicos, e que enfaticamente se dizem adeptos do a que chamam Espiritismo científico. Para esses o fenômeno é tudo, e nele quase sempre ficam sem se preocuparem com a finalidade
dessa mesma fenomenologia. Estacionam e não querem ir além, à procura de alguma coisa mais. Pouco lhes importam as deduções filosóficas e as conclusões religiosas a que ela conduz, julgando-se todos esses confrades uns superespíritas, hiper-científicos, os únicos de bom senso e equilíbrio mental.

A maioria, porém, a grande maioria, a quase totalidade dos espíritas brasileiros felizmente já não pensam de igual modo. Esses oram e têm o estudo do Evangelho como uma necessidade e um dever mesmo...

Estranha, no entanto, é a atitude daqueles "fenomenistas", pois constantemente se nos apresentam como defensores de Kardec e neste procuram, através de interpretações vagas, incoerentes e por vezes capciosas, provar que o Codíficador disse isso e aquilo, citando-lhe trechos isolados, com a finalidade tão só de justificarem o ponto de vista dessa meia dúzia de confrades.

Dizendo-se baseados naquele iluminado filho de Lyon, de quando em vez voltam, por exemplo, a repetir que o Espiritismo nada tem de comum com o Cristianismo e que errados andam desde muito os homens da Federação Espírita Brasileira e errados andam também Emmanuel e outros elevados mensageiros da Espiritualidade, quando empregam, com espírito de deturpação - frisam aqueles confrades - as expressões que servem de título a esta croniqueta.

Vejamos, porém, o que de próprio punho nos legou Allan Kardec.

Três anos antes de sua desencarnação, escrevia ele em sua Revue Spirite, 1866, pág. 114:

"Inscrevendo no frontispício do Espiritismo a lei suprema do Cristo, abrimos o caminho do Espiritismo cristão; sob este ponto de vista tratamos, então, de desenvolver os princípios bem como os caracteres do verdadeiro espírita."

Já em 1861, nessa mesma revista, à página 377, Kardec considerava:

...ora, nem um nem outro estaria no caminho do verdadeiro Espiritismo, isto é, do Espiritismo cristão. Aquele que acredita possuir uma opinião mais justa que a dos outros, mais facilmente a tornará aceita pela doçura e pela persuasão; o desabrimento seria de sua parte uma péssima cartada."

Nesse mesmo ano, afirmava o mestre a páginas 341, 343 e 384 da citada publicação:

Pág. 341: ''Porque, pois, o Espiritismo, que outra coisa não é que o desenvolvimento e a aplicação da ideia cristã, não triunfaria de alguns escarnecedores, ou de antagonistas, que até o presente, apesar de seus esforços, apenas lhe têm oposto uma negação estéril?"

Pág. 343: "O lado mais belo do Espiritismo é o lado moral; é por suas consequências morais que ele triunfará, porque aí está a sua força e por ai é invulnerável. Ele inscreveu em sua bandeira: Amor e Caridade, e ante este paládio, mais poderoso que o de Minerva, porque vem do Cristo, a própria incredulidade se inclina."

Pág. 384: "Que seja, então, uma escola, já que eles assim o querem; nós nos ufanamos de inscrever no frontispício: -École du Spiritisme moral, philosophique et chrétien e para aí convidamos todos os que tomam por divisa: amor e caridade. Àqueles que seguem essa bandeira, dedicamos todas as simpatias, e a nossa cooperação jamais lhes faltará."

E anteriormente, em 1860, escreveu na página 300 da quase centenária Revue Spirite o trecho com que terminaremos essas transcrições:

"Há, senhores, três categorias de adeptos: uns se limitam a crer na realidade das manifestações, e buscam antes de tudo os fenômenos; para esses o Espiritismo é simplesmente uma série de fatos mais ou menos interessantes.

"Os segundos veem algo mais que os fatos: reconhecem neles o lado filosófico; admiram a moral que deles resulta, mas não na praticam: para esses a caridade
cristã é uma bela máxima, e nada mais.

"Os terceiros, afinal, não se contentam em admirar a moral: eles a praticam, aceitando-lhe todas as consequências. Certíssimos de que a existência terrestre é
uma prova passageira, eles tratam de aproveitar esses curtos instantes para avançar na via do progresso que os Espíritos lhes traçam, esforçando-se por fazer o bem e
por reprimir seus maus pendores; a caridade é em tudo a regra de conduta deles; esses são os verdadeiros Espíritas, ou melhor, os Espiritas cristãos."

Todo esse trecho, com alguns acréscimos todavia, se acha reproduzido n"O livro dos Médiuns", item 28. E cerca de dez meses após a publicação desta obra, num longo trabalho sobre a "Organização do Espiritismo", dado à luz na Revue Spirite de Dezembro de 1861, Kardec relembrava, com novas adições, a mencionada distinção dos espíritas, declarando-lhe a importância para o tema de que se ocupava. Aí, na Revue Spirite de 1861, o mestre acrescenta, depois dessas últimas palavras - "ce sont les vrais Spirites, ou mieux, Ies Spirites chrétiens":

"Se se compreendeu bem o que precede, compreender-se-á também que um grupo exclusivamente formado de elementos dessa última classe estaria em melhores condições, porque é somente entre pessoas que praticam a lei de amor e de caridade que um laço fraternal verdadeiro pode estabelecer-se. "

Como vemos, o Codificador, talvez na supervisão das coisas, esclareceu de maneira inconfundível de como se deveria, para o futuro, qualificar aqueles que se dissessem adeptos da nova Revelação...

Não cabe, portanto, à Casa Máter do Espiritismo no Brasil, e nem a respeitáveis médiuns, a criação "anti-doutrinária", conforme dizem, das expressões que servem de epígrafe a esse despretensioso artigo. Foi, como vimos, o próprio mestre da 3ª Revelação quem as cunhou pelas julgar necessárias e procedentes.

Se a palavra do Codificador Iionês merece algum respeito, esperamos que esses nossos amigos e confrades não continuem a repetir suas próprias ideias, torcendo, desvirtuando o pensamento do excelso missionário do Espiritismo cristão.