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segunda-feira, 17 de fevereiro de 2014

Tudo o que ligardes na Terra...


Tudo o que
ligardes na Terra...                  

18,15 Se teu irmão houver faltado a ti, vai e repreende-o entre ti e ele somente. Se  te  ouvir,  terás  ganho  um  irmão.
18,16 Se não te escutar, toma contigo uma ou duas pessoas, a fim de que toda a questão se resolva para decisão de duas ou três testemunhas.
18,17 Se recusas ouvi-los, dizei-o à igreja, seja ele para ti como um pagão e um publicano.
18,18 Em verdade vos digo: Tudo o que ligardes sobre a terra será ligado no céu, e tudo o que desligardes sobre a terra  será também  desligado  no céu.

          Para Mt (18,18), -Tudo o que ligardes na Terra será ligado também no céu..encontramos a palavra de Emmanuel por Chico Xavier em  “Lindos Casos”, de Ramiro Gama:

            “Na noite do Ano Bom de 1950, vários irmãos de Belo Horizonte, reunidos em Pedro Leopoldo, em companhia do Chico, comentavam a importância das riquezas para a extensão do bem:
            Aqui, desejava-se o salário farto...
            Acolá, falava-se em dinheiro da loteria...

            Chegada a hora da prece, Emmanuel, pelo lápis do médium, endereça aos presentes a seguinte mensagem:

O Tesouro da Fraternidade

            Não desprezes as pequeninas parcelas de carinho para que atinjas a tesouro da fraternidade.

            Uma palavra confortadora.
            O gesto de compreensão e ternura.
            A frase de incentivo.
            O presente de um livro.
            A lembrança de uma flor.
            Cinco minutos da palestra reconfortante.
            O sorriso do estímulo.
            A gota do remédio.
            A informação prestada alegremente.
            O pão repartido.
            A visita espontânea.
            Uma carta de entendimento e amizade.
            O abraço do irmão.
            O singelo serviço em viagem.
            Um ligeiro sinal de cooperação.

            Não é com o ouro fácil que descobrirás os mananciais ignorados e profundos da alma.

            Não é com a  autoridade do mundo que conquistarás a renovação real de um amigo.
            Não é com a inteligência poderosa que colherás as flores ocultas da confiança.

            Mas, sempre que o teu coração se inclinar para um mendigo ou para um príncipe, envolvido na luz sublime da boa vontade, ajudando e servindo em nome do Bem, olvidando a ti mesmo para que os outros se elevem e se rejubilem, guarda a certeza de que tocaste o coração do próximo com as santas irradiações das tuas pérolas de bondade e caminharás no mundo, sob a invencível couraça da simpatia, para encontrar o divino tesouro da fraternidade em plenos céus.
           
           

            

XXVII - 'Apreciando a Paulo'



XXVII
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec – 1958

“Que os homens nos considerem como ministros do Cristo,
e dispenseiros dos ministérios de Deus.
Além disso, requer-se nos dispenseiros que cada um se ache fiel.
Todavia, a mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós,
ou por algum juízo humano;
nem eu tampouco a mim mesmo me julgo.
Porque em nada me sinto culpado;
mas nem por isto me considero justificado,
pois quem me julga é o Senhor.”
(Paulo - 1ª Epístola aos Coríntios, 4:1 a 4)


            Nós, espíritas cristãos, que nos dedicamos com sinceridade à Terceira Revelação de Deus, somos também, como o apóstolo - embora longe dele em estatura moral -, ministros do Cristo, a serviço de sua causa, que é a da verdade e do amor espiritual.

            Paulo fala aqui nos “mistérios de Deus”. Sendo a inteligência humana limitada, muitos mistérios para nós continuarão a existir, como frutos de nossa percepção restrita ou apoucada.

            Sabemos que os mistérios são consequência de nossa ignorância; porém, à medida que o homem evolui, eles vão desaparecendo, porque as trevas da incompreensão são espanca das pela luz do entendimento. O estudo e a reflexão, ao lado de um procedimento reto, dão à criatura humana a serenidade de espírito para compreender e sentir a justiça de Deus, que sempre se manifesta na vida.

            Cada um é artífice de sua evolução e sacerdote de si mesmo.

            Se somos deuses, como está nas Escrituras (Isaías, 41:23; Salmos, 82:6) como Jesus mesmo repetiu (João, 10:34); se nosso estado espiritual ainda é de imperfeições, mas se buscamos a fonte perene de amor e de verdade, que é nosso Pai Celestial, algum dia os mistérios desaparecerão e tudo compreenderemos, quando nossa cultura e nossa moral atingirem, através dos séculos, a perfeição Sideral.

            Todavia, antes de entender os aspectos fundamentais da verdade, que só o Espiritismo logicamente esclarece o homem tem inquietações e temores. Mas depois que a fé raciocinada, lhe dá a certeza da imortalidade da alma e a elucidação dos pontos básicos da filosofia da vida, depois que adquire a convicção da justiça e da misericórdia da lei divina, ele trabalha, confia e espera, sem quaisquer dúvidas que lhe toldem o Espírito.

            O Divino Mestre aconselhou mesmo, como regra de conduta:

            “Não se turbe o vosso coração; credes em Deus, crede também em mim. (João, 14:1)

            Aquele que tem fé, jamais pode mostrar-se perturbado; assim, quem crê em Deus verdadeiramente, não se irrita e nem se contraria, mas confia sempre no Senhor, que ampara os que o buscam com pureza de coração e firmeza de propósitos.

            O próprio mal que nos sucede, é sempre para nossa evolução, ou seja, para nosso bem. Será resgate ou experiência, expiação ou provação. Mas se o Espírito suportar a prova resignadamente (certo de que Deus não dá a cruz superior às forças), galgará mais um degrau em sua trilha evolutiva, que o conduzirá mais tarde às regiões de luz e de felicidade eternas. Fomos criados para uma destinação sublime e não para o sofrimento; se padecemos, sendo Deus bom, é porque necessitamos de tal, como meio imprescindível para nosso adiantamento moral.

            Mas “requer-se nos dispenseiros que cada um seja fiel”, como adverte Paulo, nesta sua Primeira Epístola aos Coríntios.

            É preciso calma, humildade e resignação, e não sentimento de revolta, que, além de nada resolver, ainda complica os acontecimentos. Portanto, é indispensável muita fidelidade aos ensinamentos de Jesus Cristo, Mestre querido, roteiro de nossa salvação.

            Podemos enganar os homens, mas não a Deus. Ele lê em nosso íntimo, e sabe da sinceridade de nossos propósitos. Assim, que nosso coração jamais se turbe - sejam quais forem os acontecimentos da vida -, pois que a angústia ou a revolta é falta de fé ou de confiança em nosso Pai Celestial.

            Se sofremos injustiças, é porque já fizemos injustiças, nesta ou em vidas pregressas. É preciso que a lei se cumpra para nosso resgate e elevação espiritual.

            Mas, por outro lado, no cumprimento do dever, não nos preocupemos com o juízo dos homens, conforme Paulo aqui nos ensina.

            É certo que o julgamento duro ou perverso, o ato de injustiça ou de ingratidão, quando parte de companheiro ou de familiar, dói profundamente. As feridas morais, não resta dúvida, são as mais profundas. Contudo, o discípulo não é maior, nem melhor do que o Mestre, como disse o divino Rabi. Se Jesus sofreu as incompreensões e as maiores iniquidades, por que não poderemos passar por provações semelhantes? Destarte, se quisermos ser cristãos, sigamos seu exemplo, fazendo tudo para não murmurar.

            Se o julgamento injusto de um confrade, por exemplo, nos afastar do serviço divino, é porque nosso propósito de trabalhar ainda não era sincero, mas fraco ou indeciso. E como na parábola do semeador, vieram os espinhos e sufocaram a semente. Qualquer pretexto serviria, porque a palavra que tínhamos no coração caíra em pedregais e não eram profundas as raízes...

            É aconselhável sempre que nos abstenhamos de julgar. Quem sabe se, em situação igual, não procederíamos pior? Há sempre circunstâncias que revestem os fatos, às vezes ocultas, e que passam despercebidas pelo julgado leviano.

            Mas se nosso semelhante errar mesmo, digno é de nossa piedade, de nosso perdão e de nosso amor. Quanto maior for a culpa, maior deve ser a misericórdia para com o pecador. Escorraçá-lo do grupo é demonstrar grande falta de caridade. O irmão que erra deve ser cercado de carinho e não de censuras acres, a fim de que possa retroceder e voltar ao aprisco. Lembremo-nos de que Jesus pediu perdão ao Pai Celestial até para seus algozes, muitos dos quais somos nós, os que nos encontramos aqui na Terra, em processo de reencarnação e de ascensão espiritual pelo sofrimento.

            Mas é difícil o homem apontar o lado bom de seu semelhante, porém está sempre pronto para criticar o que lhe parece digno de censura na conduta do irmão, e às vezes o faz com palavras veementes ou rigorosas, quase sempre pelas costas, estraçalhando a reputação alheia. Esses devem lembrar-se de que, portando-se assim, não estão agindo como cristãos, mas como inimigos da obra de Deus, que é de perdão e de misericórdia. Não basta frequentar sessões, nem a elas presidir ou falar bonito. É necessário ao espírita, sobretudo, que busque sua própria transformação moral, lembrando-se de que, “fora da caridade não há salvação”. E precisamos cultivar a caridade, deixando de comentar a conduta dos que erram, mesmo porque não somos perfeitos. E só mereceremos misericórdia de Deus, se usarmos de misericórdia também.

            Portanto, evitemos julgar! O Cordeiro Imaculado, que tem a suprema autoridade, afirma: “Eu a ninguém julgo.” (João, 8,15).

            Ele sabe que a lei divina é tão perfeita, que prescinde de qualquer julgamento, pois “a cada um será dado segundo as suas obras.” (Mateus, 16:27)

            Além disto, o Cristo de Deus, cheio de generosidade, não veio para julgar o mundo, mas para salvar o mundo, como Ele mesmo declarou (João, 12:47).

            Recordemos ainda São Paulo, a tal propósito:

            “A mim mui pouco se me dá de ser julgado por vós, ou por algum juízo humano, nem eu tampouco a mim mesmo me julgo.”

            O complemento do problema é o indivíduo não se julgar importante ou indispensável à obra, que é de Deus. O Senhor quer nosso serviço, mas nós precisamos muito mais d'Ele, do que Ele de nós. Nosso dever é o de trabalharmos com humildade, embora com a certeza de que nos estamos conduzindo bem (na medida de nossa relatividade ou de nossas imperfeições) e de que a justiça virá de cima e não de baixo, de Deus e não dos homens. E quando provenha destes, é porque Deus assim o quis. Tudo o que somos, tudo o que sofremos, tudo o que gozamos, está dentro da lei e d'Ele provém. Como Jó, saibamos agradecer tudo, porque EIe é justo e bom.

            Já de uma feita escrevi, repetindo o ensinamento de um Espírito sincero, que só Deus encarna em si mesmo, simultaneamente, os atributos de bondade e de justiça. Porque nós, quase sempre, sendo justos, deixamos de ser bons; e, sendo bons, deixamos de ser justos. É difícil o equilíbrio perfeito entre tais virtudes. Eis porque o julgamento só a Ele compete. Só Ele sabe ser justo e bom, ao mesmo tempo.

            Jesus Cristo, ensinando aos homens que não era Deus, declarou:

            “Não há bom senão um só, que é Deus.” E completou a lição: “Se queres, porém, entrar na vida, guarda os mandamentos.” (Mateus, 19:17, in fine.)

            Tenhamos a convicção, contudo, de que:

            “O que semeia pouco, pouco também ceifará; e o que semeia em abundância, em abundância também ceifará.” (II Coríntios, 9:6)

            Mas é preciso que a semeadura seja isenta de orgulho ou de vaidade, sem propósitos de superioridades. Porém, ainda aí o problema é individual e dispensa julgamento, porque só Deus conhece os corações. Geralmente, nem nós mesmos conhecemos nosso mérito ou demérito. Ele é quem dá valor ao trabalho, porque é o dono da lavoura e nós somos simples trabalhadores, sujeitos ao seu arbítrio, em que podemos confiar.

            Entretanto, não devemos trabalhar com os olhos fitos na recompensa, porque faltará aí a pureza de coração, para abundar o interesse, que diminui o grau do amor.

            Sobre o julgamento, a regra geral é:

            “Não julgueis para que não sejais julgados. Porque com o juízo com que julgardes sereis julgados,  e com a medida com que tiverdes medido vos hão de medir a vós.” (Mateus, 7:1 e 12)

            Tais palavras de nosso querido Mestre deviam ser sempre objeto de recordação por parte de todos os cristãos, pois somos muitas vezes apressados nas apreciações ou no juízo que fazemos de nosso semelhante. É preferível que olhemos e que louvemos seu lado bom, pois toda criatura de Deus o possui, em estado evolutivo,

            E se há propensão ao mal ou ao erro, é certo que todos a possuímos, em maior ou menor dose, sem que saibamos exatamente nosso grau evolutivo. Portanto, sejamos rigorosos conosco, cada um estudando a si mesmo e combatendo suas próprias imperfeições, mas sendo misericordioso com o irmão, para merecer a misericórdia de Deus.

            Se a regra geral é não julgar, há, todavia, casos excepcionais em que devemos julgar. Tal é a missão do juiz, do professor, do perito etc., daquele que se vê, por força do cargo ou das circunstâncias, compelido a esse dever, a que não deve fugir. Para esses casos, Jesus dá também a regra: “Não julgueis segundo a aparência, mas julgai segundo a reta justiça.” (João, 7:24)

            Quando formos compelidos a julgar, façamo-lo com ponderação e critério, com o propósito sincero de fazermos justiça. A função do julgador é nobre, mas cheia de responsabilidade moral. Tenhamos presente que daremos contas a Deus de todos os nossos atos. Conhece-se o cristão pela conduta e não somente pela fé. É através de nossos atos que atestaremos viver o Evangelho. Ao julgarmos, conseguintemente, procedamos de acordo com nossa consciência, pois cada um possui dentro de si o discernimento entre o bem e o mal, o justo e o injusto, que é a característica do ser consciente.

            E procuremos dar a César o que é de César, como damos a Deus o que é de Deus.

            Paulo de Tarso termina os versículos que comentamos, dizendo:

            “Em nada me sinto culpado; mas nem por isto me considero justificado, pois quem me julga é o Senhor.”

            Por mais acertada que seja nossa conduta, nada de vanglórias, nem de jactâncias, que são orgulho ou vaidade. Sejamos humildes e confiantes em Deus. Esforcemo-nos por ter uma conduta cristã; sejamos sinceros para com o Senhor.

            Mas se o apóstolo dos gentios, aquele gigante da fé, tinha dúvidas sobre seu próprio mérito, quanto mais nós, pequenos trabalhadores da seara do Cristo?



terça-feira, 11 de fevereiro de 2014

Males do corpo, medicina da alma


Males do corpo,
medicina da alma
Rodolfo Calligaris
Reformador (FEB) Janeiro 1963

            Relata João, o evangelista, cap. 5, V. 2-9,14:

            "Em Jerusalém está o tanque das ovelhas, que em hebreu se chama Betesda, o qual tem cinco alpendres. Nestes jazia uma grande multidão de enfermos, de cegos, de coxos, dos que tinham os membros ressecados, todos os quais esperavam que se movesse a água, porque um anjo do Senhor descia em certo tempo ao tanque, e movia-se a água. E o primeiro que entrava no tanque, depois de se mover a água, ficava curado de qualquer doença que tivesse.
            Esteve também ali um homem que havia trinta e oito anos se achava enfermo. Jesus, que o viu deitado, e soube estar ele doente há tanto tempo, disse-lhe: Queres ficar são?
            O enfermo lhe respondeu: Senhor, não tenho homem que me ponha no tanque quando a água for movida, porque, enquanto eu vou, outro entra primeiro do que eu.
            Disse-lhe Jesus: Levanta-te, toma a tua cama e anda.
            E no mesmo instante ficou são aquele homem; tomou a sua cama e começou a andar.
            Depois, achou-o Jesus no templo e disse-lhe: Olha que já estás são; não peques mais, para que te não suceda alguma coisa pior."

            Como se depreende claramente dessa afirmativa do Mestre, as moléstias e os desarranjos físicos que infelicitam a Humanidade - exceto aqueles derivados do meio ambiente e os estados mórbidos resultantes da idade - são efeitos de enfermidades da alma. Até mesmo as doenças atribuídas aos excessos de toda espécie ou aos maus hábitos, como o de fumar, o de ingerir bebidas alcoólicas, etc.

            Sim, porque os abusos, da mesma forma que as tendências para os vícios, são consequências de desejos. Ora, quem deseja é a alma: e não o corpo; este é apenas o veículo através do qual aquela se manifesta.

            Escusar-se alguém de seus erros, sob a alegação de que "a carne é fraca", não passa de sofisma.

            A carne, destituída de pensamento e vontade, não pode prevalecer jamais sobre o espírito, que é o ser moral a quem cabe a responsabilidade de todos os atos.

            A alma, quando sã, governa o corpo, disciplina-o e só lhe concede o que convenha à sua saúde. Já aquela que transige com os apetites carnais, permitindo sejam criados usos e costumes nocivos ao seu indumento físico, é uma alma em estado de enfermidade.

            Nos mundos elevados, onde não há almas enfermas, também não há corpos enfermiços; aqui na Terra, porém, onde elas constituem imensa maioria, os aleijões, os cânceres, as chagas, os tumores, enfim, toda a sorte de flagelos conhecidos e catalogados pela ciência médica subsistirão por longo tempo ainda, até que os homens se convençam dessa verdade e busquem o único remédio capaz de curá-los: a higiene da alma!

            Nada do que existe é inútil; portanto, se as enfermidades existem em nosso mundo é porque Deus assim há determinado, para que, pelas dores, aflições e angústias da destruição orgânica, a Humanidade se cure de suas fraquezas e acelere a sua evolução.

            Se os que se deixam dominar pelas más tendências anímicas não conhecessem, como consequência de seus desregramentos, as moléstias e a infelicidade, não se empenhariam em corrigir-se, continuariam sempre na mesma situação de ignorância ou de maldade, retardando indefinidamente seu progresso espiritual.

            Sofrendo, existência pós existência, os acúleos das enfermidades, para as quais não encontram remédio (e quando conseguem a cura de uma, logo surge outra desconhecida), os homens são levados a investigar a causa de sua desventura, e, descobrindo-a finalmente, cuidam de extirpá-Ia e não mais reincidir nos antigos erros.

*

            As enfermidades, além de corrigirem os desacertos e os vícios de que os terrícolas, em geral, ainda se ressentem, constituem, também, a única terapêutica eficaz para sanar lhes defeitos e imperfeições outras, mais graves, de que resultam danos e sofrimentos a outrem.

            O intelectual, por exemplo, que coloca sua inteligência a serviço da corrupção, da mentira e de outras formas do mal, será presa da demência ou da idiotia para que, de futuro, aprenda a fazer bom uso de tão nobre faculdade.

            O orgulhoso e o déspota, não há como abatê-los e domá-los, senão por meio de enfermidades asquerosas que os segreguem do convívio social. Conhecendo-as, suas altanarias cederão lugar à humildade, virtude esta indispensável ao aprendizado da ciência do bem.

            O egoísta, o insensível, aqueles que nunca estão dispostos a auxiliar o próximo, para que evoluam até o polo oposto - o altruísmo, terão que ser provados pela desgraça ou pela falta de saúde em uma série de existências, nas quais, privados de recursos, verão quanto é penoso depender de que outros os atendam e sirvam em suas necessidades.

            O avarento e o usurário, que, para amealharem mais uma moeda, impõem, aos que deles dependem, sacrifícios e privações inomináveis, que chegam, às vezes, às raias do depauperamento, como aprenderão a movimentar os bens em proveito da coletividade sem que sofram, a seu turno, os horrores de semelhante trato?

            O voluntarioso, o pouco resignado, como hão de adquirir paciência, conformidade e submissão à vontade divina sem que sejam trabalhados pelas doenças, principalmente aquelas que lhes tolhem a capacidade de locomoção?

            Não se creia que estejamos a forjar tal filosofia. É o Evangelho que assim no-lo ensina. Além daquela afirmação do Cristo, a que já nos referimos, vejamos o que Paulo, apóstolo, nos diz a respeito.

            Em sua II epístola aos Coríntios, 12:9, declara ele textualmente: "a virtude se aperfeiçoa pela enfermidade", e em Hebreus, 12:5-11, assim se expressa:       

            "Filho meu, não desprezes a correção do Senhor, nem te desanimes quando por ele és repreendido (provado no sofrimento), porque o Senhor castiga ao que ama e açoita a todo o que recebe por filho. Perseverai firmes na correção. Deus se vos oferece como a filhos; porque, qual é o filho a quem não corrige seu pai? Além disso, se, na verdade, tivemos a nossos pais carnais, que nos corrigiam e os olhávamos com respeito, como não obedeceremos muito mais ao Pai dos espíritos, e viveremos? E aqueles, na verdade, em tempo de poucos dias nos corrigiam segundo a sua vontade, mas este castiga-nos, atendendo ao que nos é proveitoso para receber a sua santificação. Ora, toda a correção ao presente, na verdade, não parece ser de gozo senão de tristeza, mas ao depois dará um fruto mui saboroso de justiça aos que por ela têm sido exercitado."

            Não maldigamos, pois, as enfermidades; elas desempenham missão purificadora e redentora para as nossas almas. Tratemos, antes, de suportá-las cristãmente, sem protestos e sem revoltas contra Deus, porque, a não ser assim, longe estaremos de alcançar a saúde completa a que todos aspiramos.

            Finalizando este estudo, cumpre ressalvar que nem sempre uma existência prenhe de amarguras e padecimentos significa expiação de faltas anteriores. Às vezes, são provas buscadas pelo espírito, a fim de concluir sua depuração e ativar o seu progresso. Pode ocorrer também que algum ser, de grande elevação, se haja determinado vir à Terra em missão, e não em cumprimento de penas, suportando com exemplar resignação os maiores reveses da vida, qual Jó, para ensinar a nós outros, míseros calcetas, de que maneira se deve sofrer, para tirar do sofrimento o abençoado fruto da evolução espiritual.




O Pensamento de Hermínio Miranda



                   Não podemos, assim, apoiar a tese do Sr. ..., segundo a qual até mesmo a palavra cristão e suas derivadas são de origem duvidosa, de vez que, no seu entender, as fontes do Cristianismo se perdem na densa floresta dos mitos e dos dogmas das antigas e esquecidas religiões. Para o Sr. ..., bastam ao Espiritismo seus dois princípios fundamentais: o da sobrevivência e o da comunicação entre o mundo espiritual e o material. De nossa parte, achamos, ao contrário, que isso é importante, mas não é tudo. O fato de uma criatura saber que sobreviverá à morte física e que pode comunicar-se com aqueles que a precederam na chamada grande viagem, não a torna mais moralizada, nem a coloca necessariamente em relação de amor e gratidão com Deus. E qual o objetivo da vida senão a busca incessante de Deus? Cada passo que damos, nós nos aproximamos d'Ele. Embora não O possamos compreender, sabemos que Ele está à nossa espera, quando alcançarmos o patamar da perfeição moral. Esse esvaziamento do Espiritismo anglo-saxônico tem sido um dos grandes empecilhos ao seu progresso. Tal caminho arenoso e sombrio só poderá levar à aridez do deserto. Para lá também caminha a Parapsicologia dos modernos pesquisadores. Não tardará muito o dia em que os cientistas também aceitarão as provas irrefutáveis da sobrevivência e da comunicabilidade entre os dois mundos - o espiritual e o material. Estará assim emparelhada com a seção do movimento espírita de que o Sr. ... é um dos expoentes. E daí? perguntamos nós, um tanto aflitos. É só isso? Achamos que não. Há uma cadeia infinita de consequências de ordem moral, religiosa e filosófica, que parte daquelas afirmativas iniciais. Se o Espírito sobrevive, como está demonstrado, então precisamos de saber quais as condições de sua vida no Além, o que deverá fazer nesta vida para merecer uma situação mais tranquila na próxima. E, como sobrevive, é eterno. E, como é eterno, não pode ficar contido por uma única existência material que possa decidir, num instante da eternidade, todo o seu destino post-mortem. Qual, assim, a melhor moral? Qual a melhor filosofia religiosa a seguir, para ordenar toda a nossa trajetória espiritual no sentido da evolução contínua e segura para o Alto? A resposta está no Evangelho de Jesus. A experiência nos ensina que é assim, e a lógica o confirma, porque a revelação das verdades espíritas, filtrada pela inteligência superior dos Espíritos de luz, não poderia enganar-se, nem enganar-nos, ao cabo de quase dois mil anos de espera ansiosa e angustiada. Ao contrário do Sr. ..., sustentamos veementemente que ciência e religião são a mesma coisa, as duas faces da mesma realidade final. Não é preciso aproximá-las nem será possível separá-las como o desejaria o autor- Já nasceram juntas; apenas à nossa incurável cegueira elas parecem distintas. Ao contrário do que defende o Sr. Shaw, entendemos que somente nossa imaturidade espiritual tem impedido de perceber essa verdade transcendental: a de que estamos caminhando fatalmente, inevitavelmente, graças a Deus, na direção de uma religião científica que é também uma ciência religiosa. Depois que conseguirmos despojar a pregação de Jesus de todas as suas deformações e interpolações interesseiras, veremos que nela se contêm os princípios fundamentais de uma ciência profundamente religiosa e autêntica. Não desejamos cair no extremo oposto de julgar que somente dentro do Cristianismo espírita, ou do Espiritismo cristão, é possível encontrar Deus. Mas estamos convencidos de que a orientação doutrinária de Allan Kardec é a que melhor atende aos profundos anseios do espírito sinceramente interessado na sua própria evolução. Aqueles que se sentem preparados para acompanhar esse curso superior de prática religiosa, não se contentariam com as formas elementares das demais.

                                                                                  Reformador (FEB) Novembro 1961

O Pensamento de Hermínio Miranda



                  Desligado da moral sublime do Cristo, o Espiritismo não passaria de um conjunto de fenômenos mais ou menos interessantes e curiosos, sem grande alcance filosófico. A prova está em que um século de pesquisa, endossada pelos mais abalizados mestres da deusa Ciência, não conseguiu ainda implantar nas orgulhosas academias internacionais a aceitação da existência do espírito humano, quanto mais sua sobrevivência e comunicabilidade entre "vivos" e "mortos". Isso porque a observação fria do fenômeno, sem o sopro da moral superior, é absolutamente estéril. E não se diga que não foi oferecida evidência suficiente. Foi. E em quantidade e qualidade indiscutíveis. 

                                                                                                                              Reformador (FEB) Novembro 1961

O Pensamento de Hermínio Miranda


                
               ... a compreensão das leis espirituais que nos governam, e ao mundo que nos cerca, nos leva a "respeitar o espírito que há em cada pessoa - gostemos ou não delas. Com isso, conseguimos viver melhor com o nosso semelhante, de maneira muito mais satisfatória que numa fraternidade insincera". 


Reformador (FEB) Novembro 1961

Parnaso de Além-Túmulo


'Parnaso de Além Túmulo'
(Espíritos Diversos)
por Chico Xavier
Sobrecapa da 4ª edição (1944)

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

1. Capas de Livros.


Algumas capas de livros editados pela FEB 
e que vem moldando nosso 
entendimento doutrinário através dos anos.













domingo, 2 de fevereiro de 2014

Crença Viva


Religião Viva

Vinélius Di Marco (Indalício Mendes)

Reformador (FEB) Janeiro 1962

            Qualquer religião só tem importância social se consegue fazer que a criatura humana evolua moralmente, aperfeiçoando seus sentimentos, a ponto de se tornar útil à família, à comunidade em que vive e à Humanidade em geral. Fora disso, com a doutrina asfixiada pelos dogmas, não será mais do que uma religião morta, estratificada pelas seitas dela derivadas e sem função social, sem função moral, sem função evolutiva.

            Uma religião que prive o homem do convívio com a razão, está condenada. O Espiritismo é uma religião que respeita e estimula todas as faculdades mentais do homem. Disse Kardec que "fé inabalável só o é a que pode encarar frente a frente a razão, em todas as épocas da Humanidade". Não se trata de uma frase destinada a ornamentar uma ideia, mas de uma frase básica, que estabelece a verdadeira natureza do Espiritismo, religião intrinsecamente votada ao progresso moral da Humanidade, sem peias dogmáticas nem restrições ao intelecto. "A verdade não pode entrar na alma humana senão pela razão; portanto, os que creem reconhecer a verdade graças à fé, e não à razão, atribuem a esta um papel contrário à sua natureza, o de julgar com toda a independência para saber em que doutrina, que faz passar por certa, se deve crer. A razão não pode julgar o que é preciso crer ou não crer, mas pode, e este é seu verdadeiro papel, comprovar a exatidão do que se afirma." São palavras de Leão Tolstoi.

            Foi José Ingenieros que afirmou: "Enquanto o homem pensa, é livre." Entre os bens inalienáveis que a Humanidade precisa defender heroicamente, a liberdade constitui dos maiores. E nenhum homem pode ser livre se não tem o direito de usar a razão.

            No mundo de hoje, em que o materialismo domina até mesmo os governos que, por interesse político, mencionam frequentemente o nome de Deus e do Cristo, sente-se que a falência moral dos homens vai muito adiantada. Porquê? Porque a educação por eles recebida é deficiente. Baseada em moldes antiquados, em que Deus aparece como um bicho papão que se deve temer; baseada em princípios religiosos corrompidos ou desmoralizados; assente em práticas religiosas incompatíveis com o adiantamento intelectual do século ou por elas ainda influenciada, a educação não prepara convenientemente os homens para a vida.

            Então, o homem ficou neste dilema: ou se agarra à religião dominante, renunciando à razão, ou se lança ao materialismo, sacrificando a razão a conceitos ilusórios, por falsos.

            No século passado e no começo do século atual, o homem compreendeu que a religião que lhe ofereciam não tinha base lógica. Assentava-se na ficção ou na realidade comprometida pela fantasia. Desde que pôde examinar cuidadosamente os esteios dessa religião, capacitou-se de que ela não possuía, evidentemente, base racional para lhe dar a garantia moral de um futuro melhor. Tudo ou quase tudo se revestia de um aspecto miraculoso. Partia-se do sobrenatural exagerado para o misticismo irracional e incongruente. Os crentes, em sua maioria, não eram verdadeiramente crentes. Tanto assim que, logo aos primeiros embates com o materialismo, perderam a confiança naquilo que aprenderam desde a infância, e se transferiram para o materialismo, levando consigo a semente da incredulidade, desde então semeada no mundo, através da literatura e da poesia realista (?).

            Desde quando uma dessas religiões abandonou o ambiente santificante em que se originara, para consorciar-se com a política, sua influência benéfica foi decrescendo até desaparecer. Passou a ser uma religião de tradição. De família em família, de geração em geração, ela surgia como uma espécie de hábito tradicional. E chegamos, assim, ao que hoje se vê: figura como a predominante no país, continua amparada por interesses que não são propriamente religiosos, mas cada vez perde mais substância, cada vez se vê mais preterida na intimidade dos corações. É a religião dos lábios, mas não a do coração.

            "Por isto, não só não se deve temer o exame da fé que nos foi inculcada na infância, mas, pelo contrário, deve-Se submetê-la a uma revisão minuciosa, comparando-a com outras religiões, para só admitir o que se acha de acordo com a razão, por mais antiga e solene que seja a tradição transmitida. Depois destes exames, quem quiser livrar-se da falsa religião inculcada em si, desde sua infância, deve repudiar tudo o que for contrário ao seu juízo razoável, sem duvidar um só instante de que o contrário, à razão não pode ser certo. Uma vez livre desta mentira, aquele que quiser viver, segundo a doutrina do Cristo, não deve, nem pela palavra, nem pelo exemplo, nem pelo silêncio, permitir o suborno das crianças, mas denunciar, como lhe seja possível, essa adulteração, conforme ensinava o Cristo, que se apiedava dos pequenos, dos quais se ganha a confiança." (Leão Tolstoi.)

            O Espiritismo não teme confrontos nem evita que sua doutrina e a aplicação desta pelos verdadeiros espíritas sejam examinadas. Antes, aconselha a quantos o procuram que, antes de adotá-lo, façam um exame de consciência. É preciso compreender que o Espiritismo não é nem deve ser nunca um "estado de espírito"; é imprescindível que seja um "estado de consciência". O esforço que o Espiritismo realiza, para restabelecer no mundo a verdadeira fé cristã, não tem sido inútil. O desenvolvimento que elevem alcançando no Brasil, principalmente, e em muitos outros países, apesar de todos os obstáculos que lhe são criados, é testemunho da ressurreição do vero Cristianismo . " ...a fé cristã começou a perder seu verdadeiro sentido na época da conversão de Constantino, quando as divindades e os templos pagãos foram cristianizados e apareceu o mafomismo como reação contra a pretensa pluralidade dos deuses cristãos." Daí para cá...      

            Compreende-se quando uma religião está viva, não pelo número de adeptos que afirme possuir, não pelo poder-político que representa, não pela coação que possa exercer sobre as chamadas "religiões da minoria", mas pela realidade prática que ela apresenta. Uma religião que divida suas atenções com a política e os negócios, tem muito pouco tempo para devotar a seus seguidores. Torna-se, por isto mesmo, uma religião sem alma, uma falsa religião, sustentada pela ignorância dos que não sabem ou não querem usar a razão, com medo de irem para o imaginário inferno.

            O Espiritismo não se arreceia do progresso da Ciência, do desenvolvimento intelectual do homem nem das descobertas que destroem velhos e errôneos ídolos. É ainda Tolstoi quem afirma: "o homem deve lembrar-se de que o único meio de conhecer que possui a razão, e que, portanto, qualquer conhecimento que se afaste da razão será mistificação e uma tentativa para afastá-lo do meio do conhecimento dado por Deus."

            Se o Pai deu a todas as criaturas o divino uso da razão, coartá-la constitui, consequentemente, um ato sacrílego. Por isto, o Espiritismo é uma religião viva, pois defende e respeita o uso da razão, como prerrogativa primacial do homem. Quem se diz espírita, seguindo a trilha de religiões falidas, não é espírita. Pensa que o é, apenas. E ao Espiritismo não interessa apenas quantidade, mas, especialmente, qualidade, isto é, adeptos que se familiarizem com a Doutrina e a pratiquem convictamente, pois seu futuro moral não dependerá jamais de milagres, mas do modo pelo qual a exemplifiquem

Contra Senso


Contra senso
Valérium
por W. Vieira
Reformador (FEB) Jan 1962

            Alguém bate à porta principesca.
            Ela, a dona da casa, atende.
            Abre a porta e encontra pobre velhinho à frente.
            Andrajoso. Cansado. Feridento.
            É um pedinte que roga auxílio,
            Fria e insensivelmente, ela despede o visitante, dizendo nada ter que possa dar.
            E volta resmungando à intimidade doméstica, maldizendo o infeliz.
            - É malandro: - declara.
            E acrescenta:
            - Para vadios, só a cadeia.

            Nisso, pequeno rato desliza-lhe pelos pés.
            Assustadíssima, clama por socorro. Chora.
            Fecha-se, superexcitada, em quarto próximo, a lastimar-se.
            Bate-lhe o coração fortemente, as mãos tremem, a face está lívida e, por fim, depois de um copo d’água, procura o festejado gato de estimação para exterminar o camundongo.

                                                                       *

            Assim são muitas de nossas comoções.
            Não vibramos ante os quadros dolorosos que pedem ajuda e agitamo-nos, agoniados, diante de incidentes banais.         

                                                                       *

            Amigo, controle a sensibilidade, vigiando reações e policiando as ideias, para que o rendimento maior dos seus dias, à luz do Evangelho Vivo, seja realidade em seu caminho.

            Recorde que muita gente na Terra enfeita gatinhos prediletos e se enoja diante de irmãos em luta.

            E há milhares de almas outras que exibem clamorosa frieza ante os apelos do bem e mostram imensa emoção à frente de um rato.




Maravilhas do Evangelho


Maravilhas do Evangelho

Sylvio Brito Soares
Reformador (FEB) Janeiro 1962

            O homem, ou melhor, nós que nos encontramos na Terra, para lutar contra nossos próprios pendores e sentimentos, impeditivos, por sua natureza, do nosso progresso espiritual, quase sempre nos deixamos embair pelas exterioridades, e, através dessa simples e superficial observação, firmamos conceitos relativamente às coisas e às pessoas que nos cercam.

            Essa maneira de proceder leva-nos muitas vezes, a quedas dolorosas, decepções amargurantes e a situações delicadíssimas.

            Paulo, o grande apóstolo dos gentios, já advertia sobre esse erro de observação, ao escrever, em sua II Epístola aos Coríntios (10-7): Olhais as coisas segundo a aparência.

            E no entanto estas palavras do extraordinário apóstolo eram, "mutatis mutandis", as registradas por Samuel, em seu 1º Livro, (16-7), em que diz: "Olhas para o que está diante dos olhos, mas Jeová olha para o coração.”

            Desde que procuremos, neste mundo em que prolifera tanta miséria moral e tantas indignidades, ler nos corações humanos, verificaremos, jubilosos, que nem tudo está perdido, pois que existem muitas criaturas, embora humildes e de vida simples, que são verdadeiras fontes de amor, desse amor que perfuma espíritos, encantando-os pelas suas maravilhosas fragrâncias!

            Manuel Bernardes, exaltando a necessidade de não nos deixarmos seduzir pelas falsas aparências, contou-nos um episódio, cuja citação vem muito a propósito. Em síntese, é o seguinte:

            Certo Rei, em passeio com o faustoso acompanhamento de sua Corte, encontrou dois homens, vestidos mui desprezivelmente.

            Saltando da viatura, abraçou os com visíveis demonstrações de afeição muito sincera. Escandalizaram-se os cortesãos, fazendo sentir ao Rei que, com esse proceder, envilecia sua real pessoa, mas o Rei permaneceu em silêncio e prosseguiu a jornada. Mais adiante, porém, mandou ele confeccionar quatro cofres de madeira; dois deles mui ricamente forrados com pregaria, fechaduras, e chapeados de ouro e prata; e dois, tão toscos, que foram breados com pez e betume. Dentro de uns e outros meteu o que julgou aconselhável. De regresso a palácio, determinou que fossem à sua presença aqueles cortesãos que se haviam escandalizado com a sua maneira de proceder. Mostrou-lhes os cofres, ordenando ao mesmo tempo que dissessem quais deles estimavam mais.

            Responderam; todos, que os dois dourados deviam ter, em seu bojo, joias e tesouros reais, que os outros breados nem para ver eram dignos quanto mais para serem colocados na sala real.

            Bem sabia qual seria o vosso julgamento, obtemperou o Rei, porque facilmente vos deixais impressionar pelas aparências exteriores.

            Abertos os cofres dourados, deles exalou-se um fétido intolerável, pois estavam cheios de ossos de defuntos. Esses, disse-lhes o Rei, são os que se portem ao estilo do mundo: por fora, pompa e fausto; por dentro, vícios e misérias. E, a seguir, ordenou que abrissem os dois outros cofres indignos, como alegaram, da sala palacial.

            Abertos, e com surpresa geral, deles saiu uma fragrância suavíssima, e isto porque, além de muito ouro, prata e pedras preciosas, continham espécies aromáticas de alto preço.

            Estes são os que vivem desprezados pelo mundo, porque, renunciando às suas grandezas falíveis procuram encher-se de virtudes, que são os tesouros imperecíveis.

            Magnífica lição, e que ela nos seja proveitosa, porque o homem simples, humilde e virtuoso passa, geralmente, despercebido pelos caminhos do mundo, em razão de sentirmos, infelizmente, certo atrativo e sedução por tudo aquilo que não tem curso nem valor na pátria espiritual, olhamos as coisas segundo as aparências, sempre enganadoras e falíveis!