Não
podemos, assim, apoiar a tese do Sr. ..., segundo a qual até mesmo a palavra
cristão e suas derivadas são de origem duvidosa, de vez que, no seu entender,
as fontes do Cristianismo se perdem na densa floresta dos mitos e dos dogmas
das antigas e esquecidas religiões. Para o Sr. ..., bastam ao Espiritismo seus
dois princípios fundamentais: o da sobrevivência e o da comunicação entre o mundo espiritual e o material. De nossa parte, achamos,
ao contrário, que isso é importante, mas não é tudo. O fato de uma criatura
saber que sobreviverá à morte física e que pode comunicar-se com aqueles que a
precederam na chamada grande viagem, não a torna mais moralizada, nem a coloca
necessariamente em relação de amor e gratidão com Deus. E qual o objetivo da
vida senão a busca incessante de Deus? Cada passo que damos, nós nos
aproximamos d'Ele. Embora não O possamos compreender, sabemos que Ele está à
nossa espera, quando alcançarmos o patamar da perfeição moral. Esse
esvaziamento do Espiritismo anglo-saxônico tem sido um dos grandes empecilhos
ao seu progresso. Tal caminho arenoso e sombrio só poderá levar à aridez do deserto.
Para lá também caminha a Parapsicologia dos modernos pesquisadores. Não tardará
muito o dia em que os cientistas também aceitarão as provas irrefutáveis da
sobrevivência
e da comunicabilidade entre os dois mundos - o espiritual e o material. Estará
assim emparelhada com a seção do movimento espírita de que o Sr. ... é um dos
expoentes. E daí? perguntamos nós, um tanto aflitos. É só isso? Achamos que
não. Há uma cadeia infinita de consequências de ordem moral, religiosa e
filosófica, que parte daquelas afirmativas iniciais. Se o Espírito sobrevive,
como está demonstrado, então precisamos de saber
quais as condições de sua vida no Além, o que deverá fazer nesta vida para
merecer uma situação mais tranquila na próxima. E, como sobrevive, é eterno. E,
como é eterno, não pode ficar contido por uma única existência material que
possa decidir, num instante da eternidade, todo o seu destino post-mortem.
Qual, assim, a melhor moral? Qual a melhor filosofia religiosa a seguir, para
ordenar toda a nossa trajetória espiritual no sentido da
evolução contínua e segura para o Alto? A resposta está no Evangelho de Jesus.
A experiência nos ensina que é assim, e a lógica o confirma, porque a revelação
das verdades espíritas, filtrada pela inteligência superior dos Espíritos de
luz, não poderia enganar-se, nem enganar-nos, ao cabo de quase dois mil anos de
espera ansiosa e angustiada. Ao contrário do Sr. ..., sustentamos
veementemente que ciência e religião são a mesma coisa, as duas faces da mesma
realidade final. Não é preciso aproximá-las nem será possível separá-las como o
desejaria o autor- Já nasceram juntas; apenas à nossa incurável cegueira elas
parecem distintas. Ao contrário do que defende o Sr. Shaw, entendemos que
somente nossa imaturidade espiritual tem impedido de perceber essa verdade
transcendental: a de que estamos caminhando fatalmente, inevitavelmente, graças
a Deus, na direção de uma religião científica que é também uma ciência
religiosa. Depois que conseguirmos despojar a pregação de Jesus de todas as
suas deformações e interpolações interesseiras, veremos que nela se contêm os
princípios fundamentais de uma ciência profundamente religiosa e autêntica. Não
desejamos cair no extremo oposto de julgar que somente dentro do Cristianismo
espírita, ou do Espiritismo cristão, é possível encontrar Deus. Mas estamos
convencidos de que a orientação doutrinária de Allan Kardec é a que melhor
atende aos profundos anseios do espírito sinceramente interessado na sua
própria evolução. Aqueles que se sentem preparados para acompanhar esse curso
superior de prática religiosa, não se contentariam com as formas elementares
das demais.
Reformador
(FEB) Novembro 1961
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