Pesquisar este blog

terça-feira, 21 de abril de 2015

Da História do Espiritismo

Da História do Espiritismo
Reformador (FEB) Agosto 1973

            Foi a 7 de Junho de 1936 que o médium Francisco Cândido Xavier veio, pela primeira vez, ao Rio de janeiro. Aqui chegando, foi recebido por Manuel Quintão, compareceu, na quarta-feira,dia 11, ao Grupo Ismael, Célula-Máter da FEB. Chico Xavier psicografou sucessivamente sonetos de Cruz e Souza, Auta de Souza  e Hermes Fontes, bem como excelente página doutrinária, em prosa, do Espírito Bittencourt Sampaio.

                

Meus amigos,

            Glória a Deus nas alturas e paz na Terra aos homens de boa vontade. Meu coração se afoga subitamente no pranto, lembrando-me de que todos nos poderíamos encontrar no divino banquete. O mundo, porém, atraiu grande parte dos nossos companheiros com as seduções de seus efêmeros prazeres. Entretanto, os baluartes do Templo de Ismael permanecem inabaláveis, edificados na rocha das grandes e consoladoras verdades do Evangelho de Jesus.
            Minha voz, amigos, é hoje mais familiar e mais íntima. Substituindo, no momento, aquele cuja tarefa vem sendo penosamente cumprida, está o nosso irmão Xavier, para vos transmitir a minha palavra de companheiro e de amigo. Não me dirijo a vós senão para vos falar ao coração, muitas vezes despedaçado, ao longo do caminho, pelas perfídias atrozes de todos aqueles que concentram suas energias no ataque ao instituto do Bem, à palavra do Evangelho e ao estatuto da Verdade.
            Mas, filhos, se o espaço que vos é vizinho está cheio de organizações poderosas do mal, objetivando a destruição da obra comum, há uma esfera divina, de onde partem os alvitres valiosos, a inspiração providencial, para quantos aqui mourejam com o propósito de bem servirem à causa da luz e da verdade.
            Não necessito alongar-me em considerações sobre a grande e sublime tarefa do Brasil, como orientador, no seio dos povos, da revivescência do Cristianismo, restabelecendo-lhe as verdades fecundas, nem preciso encarecer a magnitude da obra do Evangelho, problemas esses de elevado interesse espiritual para as vossas coletividades e cuja solução já procurei indicar, trazendo-vos, espontaneamente, a minha palavra humilde de miserável servo de Jesus.
            Agora, amigos, cabe-me solicitar a vossa atenção para a continuidade do nosso programa, traçado há mais de cinquenta anos. A Federação não pode prescindir da célula primordial do seu organismo, representada pelo Santuário de Ismael, onde cada um afina a sua mente para a tarefa do sacrifício e da abnegação, em prol da causa da Verdade, nem pode desviar-se do seu roteiro, delineado dentro do Evangelho, com o objetivo da formação da mentalidade essencialmente cristã.
            Todas as questões científicas, no seio da Doutrina, repetimo-lo, têm caráter secundário, servindo apenas de acessórios na expansão das realidades espiritualistas.
            Na atualidade, mais do que tudo, necessita-se da formação dos espíritas, da disciplina cristã, da compreensão dos deveres individuais, ante as excelências da Doutrina, a fim de que se possam atacar os grandes cometimentos.
            Firmai-vos na orientação que vindes observando, sem embargo das ideologias ocas que vos espreitam no caminho das experiências penosas. Somente dentro das características morais e religiosas pode o Espiritismo cooperar na evolução da Humanidade.
            As criaturas humanas se envenenaram com o excesso de investigações e de empreendimentos científicos, para os quais não prepararam seus corações e seus espíritos. Derivativo lógico dessa ânsia mal dirigida de conhecer a verdade é o estado atual de confusionismo, em que se debatem todos os setores das atividades terrenas, no campo social e político. Não que condenemos a curiosidade, porquanto ela representa os pródromos de todos os conhecimentos; mas, é que acima de tudo se faz necessário o método e a legitimidade da compreensão individual e coletiva.
            Preparai-vos, portanto, preparando simultaneamente os vossos irmãos em Humanidade, dentro do ensinamento cristão, e amanhã compreendereis, se não puderdes entender ainda hoje, a sublimidade da nossa tarefa comum e a grandeza dos seus objetivos.
            Que Maria derrame sobre os vossos Espíritos a sua bênção e que o divino Mestre agasalhe sob o manto acolhedor da sua misericórdia todas as esperanças e anseios de vossos corações.


F. L. Bittencourt Sampaio
(Transcrita do "Reformador" de julho de 1967, págs. 161/162.)  

Manuel Quintão




domingo, 19 de abril de 2015

Dor: lei de equilíbrio e educação

Dor: 
lei de equilíbrio e educação

Sylvio Brito Soares
Reformador (FEB) Maio 1971

                        A dor é o constante espantalho da Humanidade. Ninguém com ela se conforma. Não há neste mundo quem não a tenha sentido física ou moralmente.

            O certo é que, através dos tempos, por cima dos séculos, "rola a triste melopéia dos
sofrimentos humanos".

            A dor, queiram ou não, segue, obstinadamente, todos os nossos passos. E, no entanto, o amor é a lei do Universo, e por amor foi que Deus formou os seres.

            Neste caso, é lógico e curial que o homem pergunte por que existe a dor.

            Nenhuma religião conseguirá dar uma explicação aceitável, principalmente no que concerne à sua distribuição, que a todos se afigura discricionária.

            E que diz a Doutrina Kardequiana a esse respeito?

            Diz pura e simplesmente que a dor é uma lei de equilíbrio e educação.

            Sem dúvida, as falhas do passado, isto é, de nossas existências pretéritas, recaem sobre nós com todo o seu peso e determinam as condições de nosso destino.

            Léon Denis, cuja vida lhe foi pródiga de sofrimento, disse, no entanto, que ele não é muitas vezes mais do que a repercussão das violações da ordem eterna; mas, sendo partilha de todos, deve ser considerado como necessidade de ordem geral, como agente de desenvolvimento, condição de progresso. Todos os seres têm de, por sua vez, passar por ele. Sua ação é benfazeja para quem sabe compreendê-lo; mas somente podem compreendê-lo aqueles que lhe sentiram os poderosos efeitos.

            O notável poeta francês Alfred de Musset, após a ruptura havida entre ele e
George Sand, em Veneza, regressou só, para Paris, em abril de 1834. Durante algum tempo sofreu amargamente esse isolamento, o qual, no entanto, fez que se tornasse o grande poeta que todos nós conhecemos.

            Alfred de Musset, com essa separação de George Sand, compreendeu o real papel que o sofrimento representa em nossas vidas: e então, inspiradamente, cantou:

L'homme est un apprendi, la douleur est son
maitre,
Et nul ne se connait, tant qu'il n'a pas
souffert.

            E Guerra Junqueiro, outro sensitivo e também inspirado, afirmou,  pleno de convicção, que a dor eleva, a dor exalta, a dor diviniza!

            Quem, todavia, melhor nos poderia dizer, com conhecimento de causa, senão os nossos irmãos que já se encontram libertos das gangas carnais?

            Ouçamos, por exemplo, o testemunho do Espirito da poetisa muito querida Carmen Cinira, em seu "Poema da Dor”, do qual extraímos estes versos:

Enquanto não se sofre e vai-se andando
Pela vida
Como que a esmo,
Olhando tudo e nada penetrando
A alma é um lago de ignotas profundezas ...

Só depois, à medida
Que sentimos ferido o coração,
A Dor (sempre tão mal compreendida.)
Tal como linda e legendária fada
Nos descobre os tesouros , e as belezas
Com a sua varinha de condão...
E refletindo as coisas fielmente
A alma torna-se um laço transparente...

            E para mais reforçar o conceito de que a dor bem compreendida é luz para o coração, vamos apresentar outro testemunho, o do Espírito Cruz e Souza, cuja permanência aqui na Terra foi um sofrer constante e, não obstante, lá da Espiritualidade, nos enviou um hino à Dor, do qual separamos estes versos:

Dor, és tu que resgatas, que redimes
Os grandes réus, os míseros culpados,
Os calcetas dos erros, dos pecados,
Que surgem do pretérito de crimes.
.....................................................
Bendita seja a hora em que me pus à espera
De ser, em vez de réprobo que eu era,
O missionário dessa Dor suprema! .

Realmente, como bem disse o Espírito Emmanuel, só a dor nos ensina a ser humanos.  


Mediunidade Sublimada


Mediunidade Sublimada

por Francisco Thiesen
Reformador (FEB) Maio 1971

            “A mediunidade não requisitará desenvolvimento indiscriminado, mas sim, antes de tudo, aprimoramento da personalidade mediúnica e nobreza de fins, para que o corpo espiritual, modelando o corpo físico e sustentando-o, possa igualmente erigir-se em filtro leal das Esferas Superiores, facilitando a ascensão da Humanidade aos domínios da luz"
("Evolução em dois Mundos", Espírito André Luiz,
médiuns Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, pág. 137, 3ª edição da FEB).


            Francisco do Monte Alverne (Espírito), colaborador da obra da renascença da fé religiosa no coração humano, em mensagem simples e sábia nos lembra que "se há leis que presidem ao desenvolvimento do corpo, há leis que regem o crescimento da alma". "Cristo-Homem veio plasmar o Homem-Cristo". "Com ele começa a agir o escopro do verdadeiro bem, operando sobre a dureza da animalidade o gradual aperfeiçoamento da alma divina". "0 Evangelho é, por isso, o viveiro celeste para a criação de consciências sublimadas" ("Falando à Terra" médium Francisco Cândido Xavier págs. 37-8 – 2ª edição da FEB).

            A integração do médium na harmonia das leis eternas da evolução anímica é cometimento dos mais nobilitantes, mas implica a reformulação da própria existência, que passará a ser pautada no estudo e no trabalho, na renúncia de si mesmo e na dedicação ao próximo... É a trilha difícil e áspera de quem demanda as plagas do espírito, restaurando em plena viagem os danos infligidos a outrem em frustradas experiências do pretérito. Muitos se enganam, mal avaliando a extensão dos deveres que os aguardam e subestimando as investidas daqueles que os espreitam às margens do caminho.

            Ninguém enfrentará regiões desconhecidas e distantes, na Terra mesmo, sem o prévio cuidado de inteirar-se sobre os seus habitantes, usos e costumes, vantagens e inconvenientes de nelas excursionar. Por igual, nenhuma criatura criteriosa se entregará à prática medi única sem antes instruir-se a respeito das suas faculdades, dos ensinos morais da Doutrina Espírita, do Mundo Invisível e da natureza e dos fins do programa a que deverá vincular-se para sempre.

            Preliminarmente, o médium não deverá ignorar que, no Espiritismo, “a fé é raciocinada" e que tudo será examinado e ponderado, construtivamente, para que dolorosos desenganos o não surpreendam no futuro. Portanto, deverá "vigiar e orar" continuamente. "Porque a Doutrina Espírita é em si a liberalidade e o entendimento, há quem julgue seja ela obrigada a misturar-se com todas as aventuras marginais e com todos os exotismos, sob pena de fugir aos impositivos de fraternidade que veicula. Dignifica a Doutrina que te consola e liberta, vigiando-lhe a pureza e a simplicidade, para que não colabores, sem perceber, nos vícios da ignorância e nos crimes do pensamento" ("Religião dos Espíritos", Emmanuel, médium Francisco Cândido Xavier, edição da FEB). Médium algum lucrará espiritualmente participando de trabalhos de grupos e centros cujas diretrizes se não estribarem no estudo sistemático do Evangelho de Nosso Senhor Jesus-Cristo e das obras básicas da Codificação Kardequiana, e cujos programas não derem ênfase à disciplina de horário, assiduidade, autocontrole e amor cristão a todas as criaturas. Não lucrará, outrossim, dispersando atividades e energias na frequência a mais de um centro ou grupo, pois somente os mais experimentados conseguem manter-se em equilíbrio psíquico frente a variações de correntes mediúnicas.

            O Espírito André Luiz, às págs. 165-6 do livro "Mecanismos da Mediunidade", recebido por Francisco Cândido Xavier e Waldo Vieira, nos diz que "visto a distância, o homem, na arena carnal, pode ser comparado a um viajor na selva de pensamentos heterogêneos, aprendendo, por intermédio de rudes exercícios, a encontrar o próprio caminho de libertação e ascese. Mentalmente exposto a todas as influências psíquicas, é imperioso se eduque para governar os próprios impulsos, aperfeiçoando-se moral e intelectualmente, para que se lhe aprimorem as projeções". "Na floresta mental em que avança, o homem frequentemente se vê defrontado por vibrações subalternas que o golpeiam de rijo, compelindo-o à fadiga e à irritação, sejam elas provenientes de ondas enfermiças, partidas de desencarnados em posição de angústia e que lhe respiram o clima psíquico, ou de oscilações desorientadas dos próprios companheiros terrestres desequilibrados a lhe respirarem o ambiente".

            As obras de André Luiz constituem curso precioso sobre a vida espiritual e seu intercâmbio, sob todas as angulações, com a esfera dos encarnados. Noutra delas ("Nos Domínios da Mediunidade", recebida por Francisco Cândido Xavier), colhemos estes ensinos: "Cada consciência marcha por si, apesar de serem numerosos os mestres do caminho. Devemos a nós mesmos a derrota ou a vitória. Almas e coletividades adquirem as experiências com que se redimem ou se elevam ao preço do próprio esforço. O homem constrói, destrói e reconstrói destinos, como a Humanidade faz e desfaz civilizações, buscando a melhor direção para responder aos chamados de Deus". "Assim considerando, vemos no planeta milhões de criaturas sob as teias da mediunidade torturante, milhares detendo possibilidades psíquicas apreciáveis, muitas tentando o desenvolvimento dos recursos dessa natureza e raras obtendo um mandato mediúnico para o trabalho da fraternidade e da luz".

            Na verdade, o conhecimento do Espiritismo é vasto e sua aquisição se faz com estudo perseverante e aprimoramento espiritual ao longo do tempo, em condições, por vezes, as mais adversas, segundo as necessidades cármicas de cada espírito ou conforme a natureza das experiências individuais de cada consciência nas vias da sublimação ambicionada. Porque, conforme ensinamento de Emmanuel, "os ociosos do entendimento não são dignos do pão do espírito".

            O livro da médium Yvonne A. Pereira, "Recordações da Mediunidade", inspirado pelo Espírito Bezerra de Menezes, é repositório de grande valia aos médiuns, contendo as experiências de uma vida humana dedicada ao trabalho e ao estudo, com as peripécias próprias de quem entra em comunhão com o mundo invisível e busca decifrar lhe os segredos. As desilusões, os tropeços, as surpresas, episódios de outras vidas e suas consequências de acordo com a lei de ação e reação, as admoestações e conselhos dos guias, tudo nele se encontra narrado, com simplicidade, na forma de memórias da própria médium.

            A seriedade da Doutrina dos Espíritos é a garantia da tranquilidade dos seus profitentes, e só quando assim entendida e vivida assegura consolação e alegria. A sua finalidade é a transformação espiritual da Humanidade, desencarnada e reencarnada, não constituindo, por isso, mais uma religião entre as muitas que o mundo conhece, mas a Religião, o Cristianismo restaurado, vivo, atuante, buscando recolher ao redil do Senhor quantos ainda se demoram nos precipícios da ilusão e do erro.

            Os espíritas e os médiuns precisam estar sempre atentos aos problemas da obsessão, chaga terrível quase generalizada nesta época de grandes transições por que atravessa o nosso orbe. O desempenho e a orientação da atividade mediúnica não se efetuam com suficiente proveito em inexistindo razoável entendimento dos fenômenos obsessivos, sua técnica, seus mecanismos; e, inversamente, sua profilaxia, tratamento e cura, através do desdobramento de vasta, dinâmica e sábia movimentação de recursos e valores morais no campo da desobsessão. Os que lerem "Libertação", "Nos Bastidores da Obsessão" e "Dramas da Obsessão", livros recebidos pelos médiuns Francisco Cândido Xavier, Divaldo P. Franco e Yvonne A. Pereira, adquirirão conhecimentos satisfatórios à compreensão de
assunto tão complexo.

            Completando este trabalho, destinado a orientar a seleção de boas obras sobre mediunidade e obsessão aos companheiros que não dispõem de muito tempo para pesquisas, apresentamos, ainda de "Mecanismos da Mediunidade", de André Luiz, estes esclarecimentos:

            "Em Jesus e em seus primitivos continuadores, encontramos a mediunidade pura e espontânea, como deve ser, distante de particularismos inferiores, tanto quanto isenta de simonismo. Neles, mostram-se os valores mediúnicos a serviço da Religião Cósmica do Amor e da Sabedoria, na qual os regulamentos divinos, em todos os mundos, instituem a responsabilidade moral segundo o grau de conhecimento, situando-se, desse modo, a Justiça Perfeita, no íntimo de cada um, para que se outorgue isso ou aquilo, a cada Espírito, de conformidade com as próprias obras.

            "O Evangelho, assim, não é livro de um povo apenas, mas o Código de Princípios Morais do Universo, adaptável a todas as pátrias, a todas as comunidades, a todas as raças e a todas as criaturas, porque representa, acima de tudo, a carta de conduta para a ascensão da consciência à imortalidade, na revelação da qual Nosso Senhor Jesus-Cristo pregou a mediunidade sublime como agente de luz eterna, exaltando a vida e aniquilando a morte, abolindo o mal e glorificando o bem, a fim de que as leis humanas se purifiquem e se engrandeçam, se santifiquem e se elevem para a integração com as Leis de Deus". 

Grifos do Blog!

sábado, 18 de abril de 2015

A Religião Pura

A Religião Pura
por Almerindo Martins de Castro
Reformador (FEB) Maio 1972

            Uma das mais belas e verdadeiras conquistas da consciência contemporânea é, sem dúvida, a ressurreição dos imortais princípios do Evangelho, mostrados em toda a grandeza da sua moral inexcedível e na simplicidade eloquente das leis que regem as coisas do mundo espiritual.

            Foi em vão que durante os séculos decorridos os doutores das igrejas procuraram a interpretação da palavra divina e tentaram fixá-la em tortuosos compêndios teológicos, criando preceitos, dogmas, mandamentos, penalidades, bênçãos, recompensas, anátemas, regulamentando a Fé, legislando sobre a misericórdia de Deus.

            Correram os tempos, rolaram no pó os sábios da “ciência religiosa", apagaram-se da memória da época as doutrinas que serviram de bandeira às guerras, perseguições e carnificinas.

            Só a Verdade permaneceu incorruptível à ação destruidora das religiões, panaceias que à sombra do nome de Deus exploram e enganam as consciências, ensinando preceitos que elas próprios fraudam, quando precisam afastar os perigos dos concorrentes ao monopólio das “graças celestiais”.

            Surgem as lutas; destroem-se os homens, derramando sangue fraterno, para reabilitação de pretensas verdades; renovam-se, substituem-se as fórmulas religiosas, corrompem-se os preceitos que o Senhor revelou, mas a Verdade permanece sob as cinzas dessas fogueiras de ódios, erros e intolerâncias, para ressurgir mais pura e mais gloriosa na  fulgente grandeza que Deus lhe deu.

            E a cada estágio de evolução espiritual, à medida que as criaturas evoluem para os estados mais perfeitos, na escala ascensional da regeneração, a Verdade emerge mais transparente, despida dos atavios grosseiros com que a pseudo sabedoria dos homens pretendeu vesti-la e apresentá-la aos olhos da humanidade.

            Volvendo as vistas para o passado, podemos verificar os sistemas religiosos que  naufragaram nas revoltas águas da ignorância e superstição, quando os corifeus da “ciência religiosa" pretenderam regulamentar, com frágeis disciplinas humanas, os preceitos divinos, cujas menores palavras são maiores que toda a filauciosa onisciência terrena.

            E hoje, que se opera em todo o orbe o renascimento da Palavra de Deus, vemos ruir todas as muralhas erguidas, à semelhança de fronteiras, para fechar dentro delas a alma humana, acorrentada aos falsos preceitos que criaram intermediários religiosos entre a miséria das criaturas e a misericórdia do Senhor.

            A Verdade avança, derruindo todos os preconceitos, mesmo os da Ciência oficial, afirmando-se, pela sua origem divina, através das revelações que nos vem de um mundo  fora da matéria palpável. Verdade que vive - esfíngica para uns, diáfana para outros - nos fatos contemporâneos, que desmentem a sabedoria dos homens, desde as intangíveis leis da gravidade, da Física, até as sagradas liturgias das igrejas.

            E é em nome da Verdade, invicta e incruenta, que uma Nova Revelação vem dizer às criaturas que Deus não conhece seitas, nem templos, nem amaldiçoa, nem renega.

            Deus é Espírito e em Seu seio acolhe todos os Espíritos que, à semelhança do filho pródigo da parábola evangélica, esbanjando os cabedais paternos e são de novo tocados pelo amor ao Pai a Quem haviam voltado as espaldas, mas ao lar do qual voltam cheios de remorso e arrependimento, regenerados pelas dores e pelas agruras sofridas nas existências áridas e trevosas em que nunca viram brilhar a luz miraculosa da Verdade. 

            É em nome dessa Verdade que uma Nova Revelação vem dizer às criaturas: Abrindo os corações à Fé, seguindo os preceitos marcados nos Dez Mandamentos, rogando - com palavras inspiradas pela sua própria inteligência - a misericórdia e as bênçãos de Deus, fazendo aos outros aquilo que desejarmos nos façam, fugindo ao mal e procurando atrair o bem por meio de bons pensamentos, teremos assegurado a felicidade eterna da Alma imortal que, sendo uma centelha divina, precisa manter-se pura par regressar à fonte de origem imaculada.

            A Nova Revelação vem dizer ao formigueiro humano: Não se busque a Verdade
entre os erros da Terra. A Verdade está em Deus, Deus é Espírito e em Espírito deve ser procurado, compreendido e amado.


Os Segredos do Túmulo


Os Segredos do Túmulo
Frederico Francisco 
(Yvonne A. Pereira)
Reformador (FEB) Maio 1972

            Temos recebido cartas de aprendizes da Doutrina Espírita tratando de um ponto doutrinário dos mais melindrosos, que alarma o leitor iniciante quando não bem esclarecido. É de notar, porém, que, com tantos livros excelentes, existentes na bibliografia espírita, como os livros assinados por um Allan Kardec, um Léon Denis, um Ernesto Bozzano, um Gabriel Delanne, um Conan Doyle, um Alexandre Aksakof e tantos outros de idêntico renome, há quem se embrenhe em dúvidas incomodativas sobre pontos que, comumente, acarretam erros de interpretação que o impedem de distinguir o verdadeiro do falso. Está-nos a parecer, pois, que determinados leitores desprezam o verdadeiro estudo doutrinário, preferindo aceitar o Espiritismo por ouvirem dele falar. Depreende-se, então, que as obras de base, dos variados autores citados, nunca foram consultadas, ou o foram superficialmente, o que é lamentável e quiçá prejudicial ao prestígio da própria Doutrina. O certo é que têm chegado às nossas mãos consultas em que leitores fazem as seguintes perguntas:

            “Um Espírito que foi abnegado quando encarnado, que praticou o bem e o amor ao próximo e viveu para a caridade, ao desencarnar poderá sofrer o fenômeno da retenção no cadáver, supondo-se sob a terra junto dele, sentindo-se devorar pelos vermes que roem o corpo a decompor-se? É isso possível? Para que se há de, então, ser bom e abnegado neste mundo, se a desencarnação se processa idêntica à dos grandes criminosos? Não valerá mais a pena gozar-se a vida do melhor modo possível, do que sacrificar-se, uma vez que nem a abnegação livrará dos tormentos, na vida invisível?”

            Lembraremos aos prezados missivistas justamente o que os códigos responsáveis pela Doutrina autêntica esclarecem a respeito e também o que o senso e as sessões sérias, legítimas, de Espiritismo prático mostram à observação. Jesus definiu o nosso destino em geral com a irreversível sentença: “A cada um será dado segundo as próprias obras”.  Em mais de uma passagem evangélica, somos informados do que nos aguarda na existência de além-túmulo, em consonância com o nosso gênero de vida neste mundo, e Allan Kardec, o mestre escolhido pelo Alto para instrutor terreno da Nova Revelação, dá os seguintes esclarecimentos em “O Livro dos Espíritos”, além de outros pormenores dignos de serem relembrados (Cap. III, questões 149 a 165):

            “A observação demonstra que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente; que, ao contrário, se opera gradualmente e com uma lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é bastante rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é mais ou menos o da libertação. Em outros, naqueles sobretudo cuja vida foi toda material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido, durando algumas vezes dias, semanas e até meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade, nem a possibilidade de volver à vida, mas uma simples afinidade com o Espírito, afinidade que guarda sempre proporção com a preponderância que, durante a vida, o Espírito deu à matéria. É, com efeito, racional conceber-se que, quanto mais o Espírito se haja identificado com a matéria, tanto mais penoso lhe seja separar-se dela; ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo durante a vida do corpo, de modo que, em chegando a morte, ele é quase instantâneo. Tal o resultado dos estudos feitos em todos os indivíduos que se têm podido observar por ocasião da morte. Essas observações ainda provam que a afinidade, persistente entre a alma e o corpo, em certos indivíduos, é, às vezes, muito penosa, porquanto o Espírito pode experimentar o horror da decomposição. Este caso, porém, é excepcional e peculiar a certos gêneros de vida e a certos gêneros de morte. Verifica-se com alguns suicidas”. (155).

            “Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos. Aqueles que, desde quando ainda viviam na Terra, se identificaram com o estado futuro que os aguardava, são os em quem menos longa ela é, porque esses compreendem imediatamente a posição em que se encontram.”

            “A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem, que se conserva calmo, semelhante em tudo a quem acompanha as fases de um tranquilo despertar. Para aquele cuja consciência ainda não está pura, a perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam à proporção que ele da sua situação se compenetra.” (165).

            Compreende-se, pois, que o indivíduo de vida normal (não precisa nem mesmo ser abnegado) tem o despertar mais ou menos tranquilo na vida espiritual; que somente os criminosos, os sensuais, que viveram da matéria e para a matéria, certos tipos de suicidas e vítimas de outras mortes violentas passam pelos penosos fenômenos acima citados. Salvo exceções que somente o conhecimento minucioso do processo pode explicá-las. Por sua vez, o genial analista Ernesto Bozzano, em suas preciosas monografias “A Crise da Morte” e “Fenômenos Psíquicos no Momento da Morte”, esclarece de modo insofismável o assunto, dando-nos a compreender que o despertar do indivíduo de caráter normal, em além-túmulo, é tranquilo, e até feliz, e que, portanto, o “abnegado”, sendo superior ao normal, certamente melhor ainda terá o seu despertar...  a menos que se trate de um refinado hipócrita que enganou o mundo e pretendeu enganar também a Deus.

            Além do mais, o que presenciamos nas sessões práticas de Espiritismo, quando bem organizadas, outra coisa não nos dá a compreender senão o seguinte: em princípio, só os maus, os devassos, os suicidas sofrem penosas situações após a morte. Os normais, os bons, os virtuosos despertam tranquilamente, felizes, “antegozando as delícias da vida espiritual”. Um Espírito que neste mundo viveu para o bem do próximo, que foi ao sacrifício da abnegação, muito provavelmente não experimentará os “horrores da decomposição” do próprio cadáver, pois já era, com certeza, desprendido das coisas terrenas antes da desencarnação, já vibrava em harmonia com a lei de Deus e, portanto, praticava o intercâmbio mental com os bons Espíritos. A não ser que, malgrado toda essa conquista, guarde ainda afinidades muito fortes com o corpo somático ou com deleites materiais que cercam a existência no planeta terreno, como acentuou Kardec. Não se pode esquecer jamais que, em Espiritismo, não há regras. Cada caso é um caso diferente.

            Será, pois, de utilidade para todos, constantes consultas às obras de base, maior observação nos ensinamentos superiores dos Espíritos, mais atenção ao que se passa nas sessões chamadas “de caridade”, pois tudo isso é necessário ao esclarecimento doutrinário.


quinta-feira, 16 de abril de 2015

Auxílio no auxílio

Auxílio no auxílio
Emmanuel
por Chico Xavier

Reformador (FEB)  Maio 1971

"Amados, se Deus de tal maneira nos amou,
devemos nós também amar uns aos outros" - João.
(I João, 4 :11.)

            Há quem pergunte como auxiliar os outros sem recursos materiais. E, dentre as muitas formas de amparar sem apoio amoedado, falar para o bem é uma delas.

            Recorda o tesouro das boas palavras que transportas contigo.

            Basta ligar os dispositivos da memória e o verbo edificante se te derramará da boca, à feição de uma torrente de luz.

            Ajuda aos que ajudam, a benefício do próximo, criando o clima do otimismo e da esperança indispensável à sustentação da alegria e da paz.

            Não pronuncies a frase de pessimismo ou desencanto, reprovação ou amargura.

            A dificuldade, sem dúvida, estará presente, mas se forjamos confiança na força espiritual que nos é característica, de modo a transpô-la ou desfazê-la, conseguiremos liquidá-la muito mais facilmente, de vez que estaremos mobilizando o poder da cooperação.

            A enfermidade estará golpeando fundo no irmão que a suporta; no entanto, se projetamos, em favor dele, um pensamento de reequilíbrio ou de fé, será essa medida providencial que o habilitará, por fim, a iniciar a marcha mental para a justa restauração.

            Não desencorajes, seja a quem seja. Feridas reviradas agravam o sofrimento. Erros comentados estendem a sombra. Cada consciência é um mundo por si, com obstáculos e problemas próprios.

            Cada qual de nós - os espíritos em evolução na Terra - temos qualidades nobres que acumulamos e imperfeições de que nos devemos desvencilhar.

            Lembremo-nos do auxílio que podemos aditar ao auxílio daqueles que se consagram a auxiliar para o bem dos semelhantes.


            Se nos propomos colaborar, na edificação do Reino de Deus, comecemos pela caridade sublime e silenciosa de não complicar e nem desanimar ninguém. 

Algo mais de Casimiro Cunha...



Se aspiras a triunfar,
Maneja as armas do amor.
Jesus, cansado e vencido,
Foi o grande vencedor.

Casimiro Cunha
por Chico Xavier
Reformador (FEB) Maio 1956

domingo, 12 de abril de 2015

Bezerra e "Os Quatro Evangelhos"


Bezerra e “OS Quatro Evangelhos

Boanerges da Rocha
(Indalício Mendes)


Reformador (FEB) Março 1972


            "No Brasil nenhum outro espírito ainda se destacou mais da que Bezerra de Menezes, o consolidador da Federação Espírita Brasileira e o orientador e chefe da cristianismo espírita entre nós" - escreveu o erudita confrade Canuto de Abreu.

            Dessa forma, reafirmou com clareza e ênfase a autoridade moral e espiritual daquele que, muita justamente, é chamada o "Kardec brasileiro". Essa autoridade positiva e sem sombras, o Doutor Adolfo Bezerra de Menezes a construiu à força de demonstrações cotidianas da pureza de seu caráter, da bondade de seu coração, da espontaneidade de sua caridade, enfim, da legitimidade, que nem os mais renitentes de seus desafeiçoados gratuitos ousaram subestimar ou contestar, da sua perfeita integração com os princípios evangélicos do Cristo Jesus, que o Espiritismo cristão veio restabelecer no mundo.

            Consequentemente, Bezerra de Menezes, como homem, era inatacável, pelas peregrinas virtudes que exornavam o seu caráter adamantino. Como Espírito, ninguém desconhece a sua extraordinária atividade caritativa, por este Brasil imenso, no exercício do bem, vivendo o Evangelho no trabalho puramente cristão, com a mesma dedicação de quando ainda se encontrava encarnado, porém, com uma amplitude desmedida, graças aos recursos favorecidos por sua condição na Espiritualidade.

            Em suma, Bezerra de Menezes, antes de ser, como Espírito desencarnado, o grande servidor de Deus, socorrendo a humanidade pela via mediúnica, havia sido, na Terra, como ser humano, um magnífico exemplo de espírita cristão, cheio de qualidades, transbordando humildade e renúncia, caridade e disposição de servir, sem olhar sacrifícios. Pedro Richard, outro espírita evangélico que deu de si o máximo na seara da Terceira Revelação, deixou este depoimento consagratório, excelentemente sintetizado: "Difícil era saber-se o que mais se devia admirar naquele meigo espírito, se as virtudes, se o talento." Bezerra, um "espírita de nascença", conquistara a respeito geral, inclusive como o "Médico das Pobres". Das Anais da Conselho Municipal do antigo Distrito Federal, consta a Ata da 23ª sessão ordinária, realizada em 16 de abril de 1900, que reproduz o discurso proferido pela então Conselheiro Honório Gurgel, a propósito da desencarnação do eminente e altamente evangelizado Doutor Adolfo Bezerra de Menezes, discurso do qual extraímos o seguinte trecho : ... "a prova da pureza de sua alma deu-a o ilustre morto quando, abandonando a vida pública, foi viver para os pobres, repartindo com os necessitados as migalhas que possuía: Vi-o sempre correr pressuroso ao tugúrio dos pobres, onde houvesse um mal a combater, levando ao aflito o conforto da sua palavra de bondade, o recurso da sua ciência de médico e o auxílio da sua bolsa minguada e generosa”.

            Por onde passara, um rastro luminoso do seu grande coração permanecia indelével, inapagável. Até no ambiente politico, onde as vicissitudes não a pouparam, sobraram testemunhas, como a acima citada, do seu enorme valor moral, da sua cultura vasta, da sua inteligência brilhante e do seu amor à verdade, virtudes que ornaram de invulgar encanto  a sua personalidade extraordinária.

            Sílvio Brito Soares, em "Vida e Obra de Bezerra de Menezes", transcreve trechos da "Esboço do Espiritismo na Brasil" da qual, com a devida vênia, nas permitimos reproduzir algumas linhas a respeito do "Kardec brasileiro":  "Bezerra de Menezes era, além disso, como todo trabalhador do pensamento, médium inspirado, contando, para maior brilho de sua oratória, com uma assistência espiritual de primeira ardem, daí - como muito bem acentuou outro grande e inolvidável Presidente da Federação Espírita Brasileira, Leopoldo Cirne - resultando que "a sua eloquência nas assuntos doutrinários empolgava e convencia." E o autor da obra supramencionada recorda estas outras palavras de Cirne: "Era um missionário - e não há exagera na qualificação – talhado para, ao mesmo tempo que salvava da ruína material, que não afetava o seu programa doutrinário, absolutamente respeitável, a Federação Espírita Brasileira, encaminhá-la, todavia, na rumo, a nosso ver, mais adequado à finalidade suprema da Nova Revelação, isto é: implantar na sociedade central, que seria a eixo de coordenação das associações nacionais, o culto dos ensinamentos evangélicos."

            A colônia portuguesa, tocada pela grandeza de tão grande homem, prestou-lhe significativa homenagem, num cartão de prata, com as seguintes palavras: “Tributo do maior respeito e consideração que, em homenagem ao grande talento e honrado caráter do Dr. Adolfo Bezerra de Menezes) consagram os súditos portugueses, residentes nesta Corte. - Rio de Janeiro, 8 de dezembro de 1879." Esse cartão de prata foi colocado na moldura de um retrato de Bezerra, a óleo, em tamanho natural, que, frisa Sílvio Brito Soares, "deve continuar a fazer parte da coleção pictórica da hoje Assembleia do Estado da Guanabara", pois, aduz. "figurava na Câmara Municipal do Rio de Janeiro, situada na Praça Floriano".

            Do mesmo modo, Canuto de Abreu, em suas notas biográficas sobre Bezerra de Menezes, realça o saliente papel por ele desempenhado no ingente trabalho de divulgação da Doutrina Espírita, escrevendo em "O Paiz", sob o pseudônimo de Max: "Os artigos de M,ax, pseudônimo de Bezerra de Menezes, marcaram a época de ouro da propaganda no Brasil. De novembro de 1886 a dezembro de 1893, fim do quarto período, escreveu ininterruptamente, ardentemente. A nosso ver, e desafiamos contestação, nunca esses artigos foram superados por outros, antes ou depois. Chamamos para eles a atenção não só dos velhos, como principalmente dos novos, que usam da palavra e da pena em prol do Espiritismo. Não possuímos em língua brasileira maior repertório doutrinário do Kardecismo. Ninguém falou com maior eloquência, maior sinceridade, maior lógica. Seus formosos pensamentos deviam ser repetidos e propalados amiúde, pois somente relendo e divulgando Max poderão os seus discípulos compreender quanto de errado, quanto de confuso e quanto de ignorância se tem propalado depois dele em nome da mesma doutrina que ele elevou às culminâncias. A leitura de Max devia ser obrigatória, como a leitura de Kardec, para todos que entram."

            Parece-nos estar fixada a altitude moral e intelectual de Bezerra de Menezes, nas linhas acima.

            Entristece-nos, pois, mais do que nos espanta, a afirmativa leviana de alguns poucos correligionários contrários à obra mediúnica "Os Quatro Evangelhos", recebida pela médium sonambúlica Emília Collignon, senhora de respeitáveis virtudes, e, por determinação dos Espíritos superiores que a ditaram, entregue ao Doutor Jean-Baptiste Roustaing, homem de ilibada moral, espírita convicto, figura de enorme prestígio no mundo jurídico francês de sua época, para coordená-la e divulgá-la, para esclarecimento da humanidade, no que concerne ao Evangelho de Jesus e à doutrina codificada pelo querido mestre Allan Kardec; entristece-nos, sim, mais do que nos espanta, a ousada e leviana afirmativa de ser a monumental obra proveniente de Espíritos mistificadores.

            Acabrunha-nos, ainda que já não mais nos surpreenda, a contradita fundada na
repetição de argumentos cediços, sem base lógica, tantas vezes destruídos, ponto por
ponto, sem a necessidade de evitar ou ultrapassar o âmbito dos ensinamentos do Espiritismo, pois confrades do gabarito de Leopoldo Cirne, Manoel Quintão, Guillon Ribeiro,  Ismael Gomes Braga, que não podem honestamente sofrer quaisquer restrições, quer de ordem moral, intelectual e doutrinária, demonstraram, comprovaram a inanidade - pois não queremos ir além desta expressão - dos raciocínios empregados reiteradamente, denunciando lamentável intolerância incompatível com os princípios da própria Doutrina, ou uma hostilidade de caráter obsessivo digna, sem dúvida, da misericórdia divina.

            É claro que não se pode exigir de ninguém a sobriedade e a elegância que teve
Kardec ao apreciar tão admirável trabalho mediúnico, opondo suas restrições pessoais sobre alguns pontos. que "em nada diminuem a importância da obra" (sic), mas de certo modo recomendando-a, ao dizer que "será consultada com proveito pelos espíritas conscienciosos". Todavia, cada qual tem o direito de pensar como queira, pois "o Espiritismo proclama a liberdade de consciência como direito natural; reclama-a para si e para todo o mundo, respeita a convicção sincera e pede reciprocidade" ("Obras Póstumas").

            Estávamos, na parte anterior deste artigo, ocupados em relembrar a figura inconfundível do Doutor Adolfo Bezerra de Menezes, ainda hoje reverenciada por milhões de espíritas, dentro e fora do Brasil, que se curvam humildemente ante seus atributos de benfeitor da humanidade, quando encarnado e até hoje, na Espiritualidade, a cumprir a benemérita missão de verdadeiro discípula de Jesus, mitigando dores e aflições com a sua falange de bondosos colaboradores. Pois bem. Foi Bezerra de Menezes que, "após catorze anos de estudos, então presidente da Federação, resolveu publicar a tradução da obra de Roustaing, iniciando a publicação em "Reformador" de 15 de janeiro de 1898, ou seja - nos fins do século XIX", "livro que só muito mais tarde foi publicado, diante do elevado custo por que ficaria a impressão".  Todavia, antes mesmo que fosse fundada a Federação, já eram "Os Quatro Evangelhos" estudados por diversos confrades, juntamente com as obras da Codificação, como continua sendo metodicamente feito na Federação Espírita Brasileira, seguindo orientação das mensagens mediúnicas que assim recomendavam: "Reunidos em nome de Ismael, não tendes outros deveres senão estudar os Evangelhos à luz da Santa Doutrina" (Allan Kardec). "A missão dos Espíritas, no Brasil, é divulgar o Evangelho em espírito e verdade" (Ismael). "A cada povo a sua tarefa. A vossa, a maior, é o Evangelho: tendes de educar os corações" (Urias).

            É crível que um Espírito da elevação de Bezerra de Menezes, encarnado para uma missão sublime, cometesse o erro tremendo de ofender o nome de Jesus, aceitando uma obra, a que se ligou o nome de Roustaing, ditada por Espíritos mistificadores? É crível que, depois de regressar ao Mundo Invisível, insistisse no ultraje de apoiar uma doutrina sacrílega, com o beneplácito do Anjo Ismael e de outras personalidades espirituais que estão infinitamente acima daqueles que, na Terra, ainda se debatem nas próprias limitações?

            Também o nobre Espírito Bittencourt Sampaio, que foi homem de elevado caráter na Terra, espírita militante e acatado, referiu-se a "Os Quatro Evangelhos", através da mediunidade sonambúlica do famoso médium Frederico Júnior, desta maneira clara, insofismável, positiva:

            ..."a "Revelação da Revelação", que os Evangelistas Mateus, Marcos, Lucas, João, assistidos pelos Apóstolos, transmitiram pelo lúcido médium Sra. Collignon, em 1861, a João Baotista Roustaing., REVELAÇÃO CONFIRMADA pelos nossos Protetores e Guias, SEM DISCREPÃNCIA DE UMA VÍRGULA, e que, portanto, MERECE TODA FÉ, COMO VERDADE INCONTESTÁVEL", etc. (grifos e destaques em versal, nossos).

            Bezerra de Menezes sempre nutriu profundo respeito por Allan Kardec, como homem e como missionário do Espiritismo, o que, entretanto, sem faltar à consideração devida ao ilustre Codificador, não o impediu de por os pontos nos ii, em atenção à verdade, de que sempre se fez servo: "Allan Kardec, Espírito preposto por Jesus para reunir em um corpo de doutrina ensinos confiados, pelo mesmo Jesus, ao Espírito de Verdade, constituído por uma legião de Altíssimos Espíritos, só apanhou o que estes deram - e estes só deram o que era compatível com a compreensão atual do homem terreal." E: "Eis aí que já apareceu Roustaing, o mais moderno missionário da lei, que em muitos pontos vai além de Allan Kardec, porque é inspirado como este, mas teve por missão dizer o que este não podia, em razão do atraso da Humanidade. Não divergem no que é essencial, mas sim no modo de compreender a verdade, porque esta, sendo absoluta, nos aparece sob mil fases relativas ao nosso grau de adiantamento intelectual e moral, que um não pode dispensar o outro, como as asas de um pássaro não se podem dispensar, para o fim de ele se elevar às alturas."

            Para reforçar seu pensamento prodigiosamente forte, Bezerra de Menezes ajuntou: "Roustaing confirma o que ensina Allan Kardec, porém adianta mais que este, pela razão que já foi exposta acima." E frisa, de modo definitivo: "É, pois, um livro precioso e sagrado o de Roustaing; mas o autor, não possuindo, como homem, a vantagem que faz sobressair o trabalho de Allan Kardec, de clareza e concisão, torna-o bem pouco acessível às inteligências de certo grau para baixo". (Essas considerações, Bezerra as fez ao salientar o valor do livro "Elucidações Evangélicas", de Antônio Luiz Sayão).

            Poderíamos acrescentar maiores elementos comprobativos. Este artigo, no entanto, se alongou em demasia. Queremos apenas dizer que, considerar mistificadores os espíritos que ditaram “Os Quatro Evangelhos”, é escarnecer da sabedoria de Deus e tripudiar sobre a tarefa bela e profunda de que o meigo Nazareno foi incumbido, assim como da eficiência com que Espíritos portadores de grande humildade desempenharam, sujeitos à contingências humanas, cada qual em seu setor, dentro de suas respectivas posições, o papel que lhes reservara o Cristo.

            Acoimar de mistificadores os Espíritos que deram à humanidade obra de tão excepcional valor é desconhecer os princípios morais que ela contém, é menoscabar o discernimento daqueles que a adotaram como obra verdadeiramente subsidiária, além de denotar ausência de respeito à gigantesca empreitada de esclarecimento e de ensino ao mundo terreno, executada sob a direção da Espiritualidade mais alta.

            Muita, muitíssima razão teve o valoroso Espírito Bittencourt Sampaio ao dizer, com o caráter de providencial advertência: “LER, ESTUDAR, COMPREENDER E PRATICAR: EIS O GRANDE PROBLEMA”.

                                                                                                                                                                      Indalício Mendes