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domingo, 24 de novembro de 2013

Divórcio



Divórcio

José Monteiro Lima
Reformador Agosto 1946

            Muito se tem comentado acerca do divórcio, que hoje está mais uma vez em evidência. Os que o defendem, dentro ou fora da Constituinte, apresentam argumentos históricos, jurídicos e sociais que justificam a sua aplicação, e os que o combatem quase sempre o fazem por sistema ou, então, como os católicos, para fazer valer a autoridade da sua Igreja, que acredita poder, com a indissolubilidade do casamento, evitar o adultério e conservar a estabilidade da família.

            Na Caldéia, o homem comprava a mulher, se bem que esta teria de trazer um dote. Não obstante, o marido podia repudia-la quando bem quisesse, devolvendo-lhe o dote que trouxera, dizendo-lhe: "Não sois mais minha mulher". E mandava-a de volta para a casa dos pais com um escrito declarando a ruptura do laço matrimonial. Quando se tratava de mulher do povo, de escravas ou prisioneiras de guerra, a situação era mais grave, ficando a mulher à mercê do marido, que poderia conserva-la ou expulsa-la de casa quando bem quisesse.

            Na Grécia antiga o divórcio era quase desconhecido, mas na época clássica se tornou frequente. No Egito era também raro nas classes altas, em virtude das pesadas obrigações dos casais, mas se tornara comum nas classes baixas. Moisés, que certamente encontrara o divórcio em vigor entre o povo judeu, procurou regulamenta-lo, estabelecendo que o homem podia repudiar sua mulher desde que não lhe agradasse, e, uma vez liberta, poderia ela casar-se com outro homem, mas, ao primeiro marido não era permitido, de nenhum modo, retoma-la. Isso, certamente, teve por fim restringir a sua prática, porquanto o marido, não podendo retomar a mulher repudiada, refletia antes de decidir-se ao divórcio. Estipulara ainda Moisés que o marido teria de entregar à mulher uma declaração escrita, mas como em geral os judeus naquele tempo não sabiam escrever, era necessário recorrer a um sacerdote ou a um levita, o que dava à mulher as melhores garantias. O sacerdote poderia recusar-se a escrever a carta de divórcio quando havia abuso da parte do marido . Apesar dessas medidas, os abusos eram frequentes.

            Flavius Josefo, célebre historiador do primeiro século, admitia o divórcio por qualquer coisa, acrescentando, ingenuamente, que os homens achariam com facilidade os motivos. Ele mesmo declarara que havia despedido sua mulher, mãe de três filhos, porque, não lhe agradava mais, e que havia tomado outra. Hiller, célebre doutor judeu da mesma época, que também era favorável ao divórcio, admitia-o desde que houvesse antipatia, e até pelos motivos mais fúteis, Um prato mal preparado, um assado que queimasse, um descuido, ter saído sem véu, a divulgação de um segredo, etc., eram suficientes para o divórcio. O rabi Akiba autorizava mesmo o divórcio a favor do marido que encontrasse uma mulher mais bonita que a sua.

            A questão do divórcio foi apresentada nessa época ao Divino Mestre, quando os fariseus lhe perguntaram se era permitido repudiar a mulher por qualquer motivo. Jesus respondeu: "Não tendes lido que o Criador desde o princípio os fez homem e mulher? Por esta razão o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá a sua mulher, e os dois se tornarão uma só carne. Assim já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus ajuntou, não o separe o homem." (Mat., 1,9:3-6) - (Salvo, por adultério. Mat., 19:9).

            "Então - voltaram a perguntar - porque mandou Moisés dar-lhe carta de divórcio e repudia-la?" Jesus respondeu-lhes: "Moisés, por causa da dureza dos vossos corações, vos permitiu repudiar vossas mulheres, mas no princípio não foi assim."

            Jesus sabia que para evitar os abusos era necessário restringir o divórcio, isto é, a separação propriamente, Hoje, porém, o divórcio que se discute tem por fim separar legalmente o que de fato já estava separado. Deste modo, o divórcio e um novo casamento poderão legalizar muitos casos de uniões ilícitas, que subsistirão mesmo sem divórcio.'

            Não há dúvida, porém, de que o único recurso capaz de fortalecer os laços matrimoniais e evitar o divórcio, legal ou ilegal, é a evangelização dos lares, a educação espiritual da família. Educar a família sob base essencialmente cristã, iluminar os espíritos para que se tolerem e saibam suportar com resignação o fardo da vida que lhes foi dada para o progresso dos seus Espíritos, eis o recurso para a solução do magno problema.


Humanismo

Zamenhof, ao centro

Humanismo
Porto Carreiro Neto
Reformador Dezembro 1946

            "A mais alta Força, incompreensível para mim, que é a causa das causas no mundo material e no moral, posso designar pelo nome "Deus" ou por outro qualquer, mas sinto que a essência dessa Força cada qual tem o direito de imaginá-la do modo pelo qual lhe ditem a razão e o coração ou os ensinamentos de sua igreja. Não devo jamais odiar ou perseguir quem quer que seja por ser diferente da minha a sua crença em Deus.

            ''Sinto que a essência dos verdadeiros mandamentos religiosos reside no coração de todo homem sob forma de consciência, e que o primeiro princípio desses mandamentos, obrigatórios para todos, é: procedei para com outrem da mesma sorte que desejaríeis que outrem procedesse convosco."

            A "regra de ouro", formulada por estas últimas palavras, é bem conhecida de todos nós; o preceito acima, porém, não foi colhido da narrativa da passagem do Maior Mestre, Jesus, nem de outro Espírito superior de que nos dá notícia a História: representa a tradução para o nosso vernáculo, de um dos "princípios" da doutrina "Homaranismo", imaginada pelo grande Zamenhof, o genial criador do idioma auxiliar internacional Esperanto; e se atentarmos nos dois princípios supra traduzidos, veremos que grau, na infinita hierarquia dos filhos de Deus, ocupa esse admirável Espírito.

            Intraduzível é o nome com o qual Zamenhof assinalou o corpo de princípios que concebera, para que nesse "terreno neutro" todos os homens se aproximassem, se entendessem e se estimassem. O vocábulo se compõe, de uma raiz e de três sufixos, além da terminação "o" dos substantivos, a saber: "hom", homem (em geral, pessoa); "ar", conjunto; "an", membro; "ism" , sufixo para se designar doutrina, sistema; significará, pois, aproximadamente, "doutrina (ou sistema) que liga os membros da família humana". Ao dizermos "doutrina", o leitor não pense que se trate de formulário destinado a derruir os princípios em que se firme cada um de nós para se conduzir dentro da sua ética própria ou das regras de sua religião; Zamenhof declara mesmo: "Devemos lembrar-nos de que o "humanismo" não quer, de nenhum modo, substituir as religiões e templos existentes por quaisquer outros ... " Voltando ao equivalente de "homaranismo": traduzimo-lo aqui por "humanismo", sem com isto querer dizer que o sistema alvitrado por Zamenhof haja algo de comum com o termo "humanismo" consagrado na língua. Parodiando a célebre frase, poderíamos dizer: "o Esperanto, em tal maneira é flexível, que, em se querendo, dir-se-á nele tudo": tudo, veja bem o leitor, e mais alguma coisa, para a qual as orgulhosas e ciumentas línguas nacionais não contam com termo próprio...

            O imortal mestre (que ele não nos leia, pois solicitava que não lhe dessem este título), ao que parece, não seguia nenhuma doutrina religiosa: tal verificação a um tempo nos causa espanto e não nos é motivo de surpresa a respeito de pessoa que tão alto conceito fazia da "mais alta Força", in compreensível para ele. Com efeito, não deixava o sábio e quantas vezes sábio! - passar o ensejo de se referir a essa Incógnita, sem que, por isto, se visse forçado a confessar algum credo religioso. A cada passo mencionava "essa grande Força moral", a "Força Misteriosa"; e, certa vez, chegou a se dirigir ao "potente mistério incorpóreo, força imensa que governa o mundo,.. grande fonte do amor e da verdade e fonte perene da vida ... a qual cada um imagina de modo diferente, mas que todos sentem de igual modo no coração", dizendo-Lhe: "a Ti, que crias, a Ti, que reinas, hoje oramos"! Nesta mesma súplica, em belíssima poesia, que é a "Prece sob o Estandarte Verde" e recitada em sessão solene do 1º Congresso Internacional do Esperanto, reunido em Boulogne-sur-Mer, Zamenhof roga: "Oh! quem sejas Tu, misteriosa força, ouve a voz da prece sincera, restitui a paz à infância da grande humanidade!", e adiante: "cristãos, hebreus ou maometanos, todos somos filhos de Deus"!

            Este o grande assombro a que acima aludimos; quer parecer-nos, entretanto, que nada é de admirar que Espírito dessa magnitude nutrisse tais pensamentos e emitisse tais conceitos, pois uns e outros eram a ele inerentes, a esse magnífico missionário que tão precisa e lealmente cumpriu a tarefa que trouxera. E dizemos, em acréscimo: se estivesse ele jungido a algum dogma, pelo menos difícil lhe seria pôr em prática o seu cabedal neste espinhoso terreno, onde se enredaria nos ditames rígidos e intolerantes de leis mais humanas que divinas.

            A finalidade que teve Zamenhof com a criação do Esperanto não foi senão a de aproximar os homens pelo intelecto para que se congregassem pelo espírito. Impossível num artigo estender-nos sobre a profundeza dessa concepção: esta, percebeu-a perfeitamente a nossa Federação, divulgando agora, no idioma neutro, a sábia doutrina dos Espíritos, uma e outros sem qualquer compromisso com este ou aquele povo. Não nos podemos, contudo, furtar às seguintes considerações.

            Por ocasião do Congresso de Raças, realizado em Julho de 1911, em Londres, Zamenhof analisa as várias causas que poderiam determinar "o ódio mútuo e a luta entre as gentes" (melhor e mais extenso termo do que simplesmente "raças"); examina detidamente cada uma dessas prováveis causas, inquirindo e respondendo com argumentos irretorquíveis, e termina:

            "Que é, então, a verdadeira causa do estado de separação e de ódio entre as gentes? De tudo quanto acima apresentei já se pode ver que, mal grado todas as teorias pseudocientíficas sobre peculiaridades raciais, climas, sangue, etc., as verdadeiras muralhas entre as gentes, a verdadeira causa de todo ódio entre as gentes, residem na diferença das línguas e das religiões. Principalmente a língua representa tão grande e quase exclusivo papel na diversidade das gentes, que em alguns idiomas os vocábulos "língua" e "gente" são sinônimos perfeitos. Se dois homens falam a mesma língua, sem humilhação para qualquer deles, com iguais direitos sobre ela, e graças a ela, não somente se compreendem um ao outro, mas possuem a mesma literatura (oral ou escrita), a mesma educação, os mesmos ideais, a mesma dignidade humana e os mesmos direitos; se, além disto, eles têm o mesmo "Deus", as mesmas festas, os mesmos costumes, tradições e modo de viver, sentem-se absolutamente irmãos, sentem que pertencem à mesma gente, Se dois homens não compreendem um ao outro, se, outrossim, possuem costumes e modos de viver de todo diversos, olham-se como estranhos, quais mudos e bárbaros, instintivamente se evitam e desconfiam um do outro, da mesma sorte que instintivamente desconfiamos de tudo quanto aos nossos olhos se oculta nas trevas."

            Zamenhof assim conclui essa mensagem ao referido congresso:

            "Nenhum paliativo de compromissos, nenhum sagaz tratado político trará a paz à Humanidade: Quanto mais, entretanto, o Esperantismo se fortalecer no mundo, quanto mais frequentemente os homens de diversas gentes se reunirem e se relacionarem sobre um fundamento neutro, tanto mais eles se habituarão à compreensão e amor recíprocos: tanto mais sentirão que todos têm iguais corações, iguais entendimentos, iguais ideais, iguais sofrimentos e dores, e que todo ódio entre as gentes nada mais é do que resquício dos tempos - da barbárie. Desse fundamento neutro... pouco a pouco surgirá essa futura humanidade, unida e puramente humana, com a qual sonharam os profetas de todas as gentes e de todos os tempos."

            Pese cada um estas palavras e conceitos sempre atuais; e, apreciando o alto grau de progresso que atingiu Espírito de tal quilate, sinta e colabore na obra que, deste modo, auxilia a confraternização dos homens, objetivo precípuo da Lei Divina.

sábado, 23 de novembro de 2013

16. 'Máximas extraídas dos ensinos dos Espíritos'



16. Máximas extraídas
dos Ensinos dos Espíritos.
           
             Ore cada um segundo suas convicções e do modo que julgue mais conveniente, porquanto a forma nada vale e o pensamento é tudo. A sinceridade e a pureza de intenção, eis o essencial. Um bom pensamento vale mais do que grande número de palavras, que se assemelham ao ruído de um moinho, mas onde o coração em nada toma parte.

            Allan Kardec
Pág. 51 e seguintes.
‘O Espiritismo na sua Expressão mais Simples’
1ª Ed FEB 2006

Tradução de Evandro Noleto Bezerra

sexta-feira, 22 de novembro de 2013

Diatribes à Casa de Ismael



Diatribes à Casa de Ismael
Luciano dos Anjos
Reformador (FEB) Maio 1963

            Embora decorridos já muitos anos, ainda lembramos quando nosso primeiro artigo assinado era publicado com singular destaque na grande imprensa do País, ao tempo em que ensaiávamos os primeiros e mais incertos passos no jornalismo profissional. Recebemos, com surpresa, três ou quatro cartas (nunca supuséramos serem os leitores tão atentos ao que escrevemos) das quais apenas uma nos transmitia congratulações pelo trabalho elaborado. As demais espumejavam de indignação contra os alvitres que esposávamos. Em nossas primícias jornalísticas, ainda epitetado como simples "foca", (neófito, em gíria de imprensa), ingênuo de sentimentos, não apenas ficamos lívido com a reação daqueles leitores mal-ensinados, mas sobretudo nos deixámos dominar por inusitada revolta íntima. Não podíamos aceitar que dois ou três analfabetos (as cartas atestavam essa qualidade) pudessem ter tido o ousio de nos contraditar. Afinal, não demonstravam conhecer uma nesga do assunto em tela, mas, em contrapartida, vituperavam a gramática e afrontavam a lógica do mais simples raciocínio. Como, pois, aturá-los, um minuto que fosse?! Resoluto, sentamos à máquina e começamos a redigir-lhes, para cada qual, resposta à altura do que mereciam. Já lá íamos pela segunda lauda datilografada quando o secretário da Redação por qualquer motivo nos veio ter à mesa e inteirou-se do que fazíamos. Sorriu, então. Pousou-nos a destra sobre o ombro, que longe estava ainda de denotar cansaço do peso dos anos, e comentou do alto da sua experiência e da sua tarimba:
           
            - Meu caro, se você for nesse andar, estará perdido, senão louco. Não haverá colunas que cheguem para publicar somente as respostas que você tiver de dar a seus leitores...

            Resfriamos. Paramos de dedilhar a máquina e fomos juntos até o bar em frente, onde mantivemos longa e saborosa conversa, durante a qual aprendemos lições inesquecíveis. A rotina do homem que escreve para jornal era um pouco diferente do que supúnhamos. O leitor é a figura mais heterogênea que existe. Os assuntos todos contêm aspectos abscônditos que mal imaginamos. A técnica redacional varia de propósito para propósito. Cada coisa tem o seu segredo; cada segredo a sua oportunidade. Aprendemos muita novidade importante, mas acima de tudo decoramos esse grande ensinamento, que o tempo e a experiência, dali por diante, transformaram em ponto basilar da nossa vida de profissional de imprensa: nem todos os leitores merecem resposta... É preciso revelar muita sensatez, muita segurança, muita precisão e muita significação para que a réplica de um leitor seja treplicada. Nem por isso, entretanto, esse comportamento do jornalista deve ser caracterizado como algum desprezo pelos seus leitores.

            Mas, somente a longa prática, a carreira vivida muitos anos é capaz de emprestar-nos a fleuma indispensável ante as cartas e os telefonemas que nos chegam do público, alguns tamanhamente insultuosos que os lá de fora não sabem como um "dromedário" (o jornalista tarimbeiro) consegue conter; a exaltação. De fato, vamos aos poucos cumulando tal frieza diante não apenas dessas cartas, mas também de todos os demais fatos diários (as notícias rolam a cada minuto, com toda a sua dramaticidade dentro das redações de jornal), que até nos confundem os sentimentos. E, não raro, acham estranho que não nos lancemos à rua, lado a lado com o povo, quando alguma crise vira manchete. Todavia, ao contrário do que julgam, a isso podemos chamar antes ponderação, do que frieza inconsequente ou indiferença doentia. Em linguagem doutrinária, talvez coubesse o termo humildade.

            Perdoem-nos os leitores de "Reformador" essa longa prolusão, através da qual, já agora escorçando, queremos apenas dizer-lhes que nossa consideração é por todos a mais profunda e respeitosa, mas não somos mais capazes de alterar nosso sorriso nem mesmo ante as cartas que vez por outra nos chegam à mão, repassadas de insultos, doestos e estultícias maiores. Somente a crítica elevada, a censura construtiva, o comentário sincero ou a dúvida honesta hão de merecer-nos maior atenção; nunca o histerismo impróprio dos que, certamente, gostariam antes de ter seus nomes transmudados em letra de forma, do que refutar alguma ideia contrária. Nossa constante, pois, tem sido o silêncio. Até mesmo por um dever de consciência religiosa, para não tisnar a Doutrina que pregamos.
             
            Agora, entretanto, o panorama é bem outro. Resolvemos afinal escrever este artigo tendo em vista o comportamento, não epistolar, mas pessoal, dum honrado e dedicado companheiro de ideais espíritas. E companheiro integrado na Doutrina, estudioso dela, cioso dos seus compromissos com ela. É em consideração ao seu trabalho já realizado, à sua honestidade de propósitos sempre revelada, que nos abalançamos a dirigir-lhe estas palavras, porque certos de que nossa resposta, por coincidência, senão por extensão, servirá a muitos outros intransigentes adversários da Federação Espírita Brasileira e da conduta desta venerável instituição, mercê da assistência dos mais elevados Espíritos de luz.

            Acusam-nos de seguir cegamente a Federação, a lembrar-nos de que também os padres seguem o Papa dentro do mesmo espírito de submissão e subserviência. Acusam-nos de fazer um tabu de tudo quanto a Federação diz. Acusam-nos de trabalhar apenas na seara da Federação.

            Desminta-se, antes que tudo, aquela primeira afirmativa, para depois explicarmos porque seguimos a FEB e finalmente negar que colaboremos apenas na seara da Casa Máter, embora evidentemente lhe dediquemos maior atenção, dada a nossa posição de membro do seu Conselho Superior. Seria preciso um desconhecimento integral da Doutrina que professamos, para enceguecer-nos por alguma coisa. Não somos espírita por acaso, por tradição ou por comodismo. Alguns dos que nos acusam - perdoem-nos a imodéstia - talvez não tenham estudado tanto a Terceira Revelação quanto o fizemos, por amor à Verdade, Só lhe aceitamos os postulados depois de examinar com nímio cuidado tudo o que se continha nas pregações das demais religiões do mundo. Não nos escasseou ânimo sequer para o estudo das principais doutrinas do passado, nas quais fomos buscar, em cada qual, a sua parcela de autenticidade e de sentido vero. Fomos conhecer as ideias de Trismegisto, no Egito, e de Akhnaton, seu reformador. Lemos sobre o Código de Hammurabi, origem da religião assírío-babilônica e no qual já se fala de Deus assistido pelos "santos". Saboreamos os "Cânticos órficos", de Orfeu, e os "Versos Dourados" de Pitágoras, bases da religião grega, inicialmente tão séria, mas infelizmente deturpada pelo povo, que acabou divinizando as estátuas de seus santos e seus deuses. Estudamos as "Leis de Numa Pompílio", onde pudemos sentir todas as coordenadas da religião dós romanos. Não deixamos escapar o "Vedas:', o "Upanichade", o "Maabarata", o "Ramaiana", o "Darmas" e o "Purunas", do hinduísmo pré-histórico. Estudamos o Judaísmo, especialmente através do "Tora" ou "Pentateuco". O "Avesta" nos ensinou a filosofia de Zoroastro ou Zaratustra, com a célebre figura do diabo e o princípio do Mal. O "Damapada" nos mostrou as luzes do budismo, de Sidarta Gautama ou Saquia Muni. De Lao-Tse, o "Tao-Tse-King" revelou-nos a doutrina da não-resistência contida no taoísmo. O "Shi-King", o "Shu-,King", o "Yi-King", o "Li-Ki" e o "Ch'un Ch'iu", do confucionismo, nos falaram duma doutrina de profunda sabedoria. O sintoísmo trouxe-nos ao conhecimento a crença dos japoneses nos seus antepassados e a concepção do seu deus masculino-feminino. De Maomé tivemos oportunidade de conhecer o "Alcorão", e de Nanak, reformador do hinduísmo, conhecemos com satisfação o "Granth", donde se esparge o ensino maravilhoso da eficácia da oração e da meditação, embora, estranhamente, pregasse também a violência. A doutrina de Bah explicada por Bahá'u'Ilah, empolgou-nos sobremodo, principalmente quando prega a unidade e tolerância de todas as religiões do mundo. Mas estudamos também a religião dos mórmons (Igreja de Jesus-Cristo dos Santos dos últimos Dias), revelada pelo Espírito de Moroni, filho de Mórmon, a José Smith, em Ontário, nos Estados Unidos. As obras básicas do gandismo, o "Neethi-Darma" e as "Cartas ao Ashram", esclareceram-nos sobre a poderosa reforma cristã introduzida no hinduísmo por Moandas Gandhi, o mahatma, em pleno século XX. Fomos conhecer ainda todos os detalhes históricos do chamado cristianismo ortodoxo, que ainda hoje domina quase inteiramente o Oriente Médio, não nos esquecendo de estudar com acuidade e mais vagar o catolicismo de São Jerônimo, Santo Agostinho, São Tomás de Aquino e do Concílio de Trento. Aprendemos a história da Reforma, de Lutero e Calvino, a Umbanda afro-brasileira, o Cristianismo puro de Jesus Cristo e por fim o puro Espiritismo de Allan Kardec.

            Pesando e sopesando todos os conceitos e ensinamentos contidos em todos esses valiosos estudos a que procedemos, acabamos por compreender que só o Espiritismo era bastante para esclarecer completamente todos os problemas que nos atribulam o espírito sequioso de conhecimento. Só o Espiritismo responde com exação e carradas de bom senso às perguntas do homem sobre as mais complexas e abstrusas questões filosóficas.

            Por tudo isso, quando um leitor como aquele de Niterói, irritadiço, nos acusa de provável "egresso do catolicismo", sem dúvida comete equívoco alvar. Aliás, invectivadores desse jaez são às vezes os que menos conhecem a doutrina católica e julgam mesmo que ela se reduz à crença em Adão e Eva, no Céu e Inferno, em Satanás, na missa ou no Juízo Final. "Vis-à-vis" com um seminarista inteligente haveriam por certo de se surpreender com muita coisa que ignoram. O Espiritismo é sobejamente profícuo em teses e proposições altamente racionais de forma a desnudar todas as incongruências e aberrações lógicas do Catolicismo; mas este não é confutável tão só com o juízo pueril daqueles que, em vez de se lançarem a essa empreitada dialética, deveriam antes estudar um pouco mais a sua própria religião. No grupamento de que fazemos parte - o "Grupo Espírita Léon Denis" - tivemos ensejo de enfrentar, todos nós, em épocas distintas, três Espíritos terríveis: um professor de sociologia, católico, desencarnado no início deste século; um bispo, arguto e erudito; e um antigo inquisidor português. A defesa que essas entidades fizeram da doutrina católica - especialmente o professor - foi impressionantemente séria. Exceto o último, com o qual perdemos o contato, os dois primeiros graças a Deus chegaram a ser tocados pela Verdade que lhes procuramos oferecer em troca de suas ideias dogmáticas e sobremodo formais. O Catolicismo, na sua essência, é prenhe de impropriedades e postulados chocantes, mas é mister estudá-lo bastante para combatê-lo com proveito. Não basta proclamar-se espírita e acusar os outros de "egresso do catolicismo" para que esta doutrina seja contraditada ou aquela comprovada.

            Outro leitor, cheio de animadversão, vem-nos ensinar que, ao contrário da nossa opinião expendida em determinado artigo, Allan Kardec conhecia muito bem as materializações. E copia trechos enormes de "A Gênese" para atestar o que diz. Ora, que poderíamos responder a esse moço, senão que ele pensa que sabe, mas não sabe nada? As experiências de materializações começaram apenas em 1870, com Wíllíam Crookes, e Kardec desencarnou em 1869. Disséramos precisamente isso, que o Codificador recebera ensinamentos sobre o assunto e os inserira na sua obra, sem entretanto ter tido a oportunidade de testar experimentalmente essas lições teóricas, aprendidas dos Espíritos.

            Outro mais, cuida de nos recomendar a leitura de alguns escritos contrários ao corpo fluídico de Jesus, prometendo-nos mesmo enviar alguns trechos para nosso aprendizado. Que lhe poderíamos, também, responder? Que já havíamos lido todos aqueles disparates, dilatados pela má fé e o ódio gratuito? Um desses escritos, embora publicado a bem da verdade, se celebrizou pela confusão que o autor fez entre João Batista e João Evangelista. A certa altura, a fim de negar-lhe o caráter de revelação, critica a mudança do título da obra de Roustaing, ignorando que Allan Kardec também mudou o título do seu "Evangelho segundo o Espiritismo". À página 95 diz que Maria era um Espírito puríssimo, mas admite irreverentemente que ela tenha ficado grávida de outro homem que não José. Considera a teoria do corpo fluídico um dogma e dogmáticos os seus defensores, sem se lembrar de que os nossos irmãos anglo-saxônios também consideram um dogma a teoria da reencarnação de Allan Kardec, aliás, por este mesmo assim considerada. Em suma, um chorrilho de incongruências que só comprometem o autor e nos suscita a lembrança daquela sentença de André Luiz contida em "Vozes do Grande Além": "A lâmina de nossa reprovação volta-se, invariàvelmente, contra nós, expondo-nos as próprias deficiências" (pág. 109, 1ª ed.).

            Outro livro, recomendado pelo nosso caro leitor é aquele que, nas suas conclusões finais, sugere uma sessão durante a qual se evocariam os Espíritos de Allan Kardec e J. B. Roustaing para dirimir a dúvida sobre o corpo de Jesus! Se tivéssemos oportunidade, pediríamos a esse escrevinhadeiro que aproveitasse para indagar também sobre a cura do câncer ou até mesmo o bilhete que vai dar amanhã na loteria... Ismael Gomes Braga, nosso brilhante confrade, diria mais tarde, sobre esse trabalho, que ao autor "faltou a serenidade construtiva"...

            De São Paulo, outro missivista nos vem dizer que o livro "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho" foi adulterado da segunda edição em diante, na parte que diz respeito ao consenso de Humberto de Campos ao papel de Roustaing como organizador do trabalho de fé do Espiritismo. A primeira edição do referido livro está à disposição do leitor na biblioteca da Federação (possivelmente em muitas outras, inclusive de São Paulo), para que pessoalmente verifique a calúnia assacada.

            E assim, uma série de cartas de todos os coloridos, de todos os diapasões. Quanto à Federação Espírita Brasileira, seguimos seu programa - e com absoluta fidelidade - porque nada temos racionalmente que lhe criticar. Essa história de chamar-lhe Papado já está sobremodo desgastada. Os que assim procedem mostram completa ignorância dos seus métodos e do mecanismo interno que lhe imprime a marcha ascensional. Sua diretoria é eleita anualmente por um conselho de trinta e sete membros que, quando bem queira, pode alijá-la, se assim o desejar. Todos os anos é lido pelo presidente um relatório das atividades. Este, pode ser interpelado sempre, sobre qualquer assunto. Os livros editados pela entidade só o são depois de examinados por uma comissão especial. A Federação não obriga ninguém a coisa alguma. Ela se preocupa tão somente com a divulgação da Doutrina Espírita. Não faz política, não faz conchavos, não faz exibições, não faz histerismos. Os que a atacam, fazem-no simplesmente porque ela não lhes encampa os pontos de vista pessoais. Quem são afinal os intransigentes? A Federação, que segue rigorosamente um programa estatutário aprovado em assembleia geral, ou os que de fora gostariam que ela lhes apoiasse o programa individual de cada um? Diariamente chegam à FEB dezenas de cartas com sugestões, críticas, novas ideias, etc. Se a sua diretoria fosse atender a todos esses missivistas - dentre os quais, não esqueçamos nunca, proliferam os obsidiados -, sua missão seria um fracasso. Por isso a Casa de Ismael não tem de seguir ninguém particularmente, senão o seu próprio programa de trabalho. E este é traçado pelo Alto, não pelos seus dirigentes, pelos seus conselheiros ou pelos seus associados. Muito menos pelos seus adversários. A esse propósito, leiamos o que nos diz Humberto de Campos em "Crônicas de Além-Túmulo", à pág. 119, 6ª ed.: "A obra da Federação Espírita Brasileira é a expressão do pensamento imaterial dos seus diretores do plano invisível, indene de qualquer influenciação da personalidade dos homens." "O roteiro de sua marcha é conhecido e analisado no mundo das verdades do Espírito e a sua orientação nasce da fonte das realidades superiores e eternas, não obstante todas as incompreensões e todos os debates."

            É sempre oportuno esclarecer um aspecto sobremaneira mal interpretado pelos eternos detratores da Instituição. Fingem não compreender como possa o Alto nortear os trabalhos da FEB sem que se negue o ensinamento espírita de que cabe aos homens sua parcela de trabalho aqui na Terra. Ora, o que promana do Alto é apenas o programa, tanto quanto aconteceu com a própria codificação da Doutrina Espírita. Os homens encarregados de cumpri-lo, estes serão sempre livres para vencer ou fracassar na sua missão. Mas não podem se surpreender, caso fracassem, se "inexplicavelmente" forem afastados da seara para a qual não se mostraram à altura. Isto porque, os homens podem falhar, mas o programa - que é do Alto - não pode falhar nunca. Se Kardec falhasse, outro se encarregaria da Codificação. Se os dirigentes da FEB falharem, outros os substituirão. Não ocorrendo isso, é porque tudo vai muito bem, com o beneplácito do Alto. E não precisa ser muito inteligente para descobrir, pelo trabalho já realizado, que tudo vai de fato muito ao gosto do Cristo.

            Aos que alegam ser pequena a ajuda material que a FEB oferece, apesar de sempre crescente, devemos lembrar que os tempos são outros e os critérios de serviço devem também ser renovados.

            Atualmente, por ser muito mais importante e fundamental do que qualquer outra tarefa, a FEB vem-se dedicando com mais empenho àquele compromisso que, de todos, há de ser sempre o mais altanado. O livro espírita, a sua impressão, a sua divulgação e a sua distribuição pelo Brasil inteiro, e mesmo pelo mundo afora, levando a todos os rincões os ensinamentos do Evangelho e da Terceira Revelação, vale mais, muito mais do que qualquer esmola dada a um necessitado da carne. Releiamos, a propósito, o que Irmão X nos ditava através de "Reformador" de Abril de 1957, pág. 74: "Celebrando, pois, o primeiro centenário de "O Livro dos Espíritos", reverenciamos a memória de Allan Kardec, saudando igualmente a Federação Espírita Brasileira que, em três quartos de século do Espiritismo Codificado, vem construindo no silêncio e no trabalho de sua obra impessoal, sob a égide dos Mensageiros da Vida Superior, o santuário moral do Livro Espírita, dentro da dignidade doutrinária, clareando consciências e inspirando corações para o serviço do Cristo, como roteiro de caridade, fonte de esperança e celeiro de luz."

            A assistência material é nobre, não há que duvidar, mas, sozinha, não desperta ninguém para os labores da própria redenção. O livro, este sim, atinge diretamente o Espírito, modificando-o, iluminando-o, aprimorando-o. Camilo Castelo Branco afirmou com muita sabedoria e muita gratidão: "Nos livros aprendi a fugir ao mal sem o experimentar." E Eça de Queirós completou: "Só um livro é capaz de fazer a eternidade dum povo." No mais - convém repetir com assiduidade - o Espiritismo não veio senão para redimir o homem, transformá-lo, remoçá-lo e salvá-lo para Deus. Essa tarefa só é factível através do aprendizado, da aculturação, cuja base é o livro, sempre o livro. Os que criticam a FEB fazem questão de ignorar esse essencial mister a que a quase secular instituição se tem dedicado com todo o denodo. Ao mesmo tempo, deslembram, esses impenitentes, que não foram capazes até hoje de escrever meia dúzia de linhas sequer em benefício da propagação da Doutrina. E se, em raríssimas oportunidades o fazem, não esquecem nunca de cobrar, direta ou indiretamente, os direitos autorais... Só aprenderam a criticar destrutivamente; nunca construíram nada. Vale, para eles, a assertiva do tribuno popular francês Camilo Desmoulins: "Não há gente mais disposta a criticar os que fazem alguma coisa, do que os que não fazem nada."

            Contudo, de todas as assacadilhas contra a FEB, a mais virulenta é sempre relativa à sua posição de propagadora da obra de J. B. Roustaing. E nós também vamos pegando algumas sobras por nos colocarmos nessa mesma linha, em razão do que até "irmã vicentina" já nos chamaram, nas colunas de certo periódico. Tivemos ocasião de escrever modesto artigo catalogando todos os espíritas de renome, encarnados e desencarnados, que advogavam a tese do corpo fluídico de Jesus. Foi o bastante para que caíssemos na desgraça de alguns confrades menos ponderados. Mas, que querem eles, afinal? Que lhes sigamos os passos e nos afastemos do pensamento de Ewerton Quadros, Bezerra de Menezes, Guillon Ribeiro, Manuel Quintão, Bittencourt Sampaio, Leopoldo Cirne, Manuel Spindola, Antônio Lima, Ismael Gomes Braga, Newton Boechat, Indalício Mendes, Antônio Luiz Saião, Humberto de Campos, Emmanuel e tantos outros? Ou, então, que fiquemos com aquela história do Cristo Cósmico, Período Lunar, Período Solar, Espírito Planetário, etc? Ou gostariam ainda que aceitássemos o Cristo-Deus? Aproveitamos o instante para lembrar àquele leitor que deitou sobre nós tantos conhecimentos a respeito do corpo de Jesus, acusando-nos de falsear o verdadeiro sentido do item 277 de "O Consolador", que poderíamos ser ainda mais objetivos na nossa argumentação, se em vez daquela citação transcrevêssemos a resposta de nº 243, onde se pode ler: "Todas as entidades espirituais encarnadas no orbe terrestre são Espíritos que se resgatam ou aprendem nas experiências humanas, após as quedas do passado, com exceção de Jesus-Cristo, fundamento de toda a verdade neste mundo, cuja evolução se verificou em linha reta para Deus e em cujas mãos angélicas repousa o governo espiritual do Planeta, desde os seus primórdios.”

            Parece-nos que aqui não há dúvida. Emmanuel foi categórico na afirmativa de que Jesus nunca encarnou. Sobre a célebre mensagem recebida no início do presente século, no Grupo "Vinha do Senhor", nesta cidade, e inculcada como sendo de J. B. Roustaing, penitenciando-se, este, de haver aceito a teoria do corpo fluídico de Jesus, recomendamos nosso leitor a procurar saber que fim levou aquela agremiação, seus dirigentes, seus frequentadores e o médium que recebeu a mensagem, Aqui, infelizmente, já não temos mais espaço para contar com minúcias a história.

            Restaria perguntar, a esses detratores todos, por onde anda sua vontade de aprender, a qual não lhes ensejou até hoje a leitura de determinadas obras do Além através de médiuns de grande envergadura moral, como por exemplo Chico Xavier. Compulsemos, de passagem, o livro "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", transmitido por Humberto de Campos, nas suas páginas 199/200 da 2ª edição: "A realidade é que, considerada às vezes como excessivamente conservadora, pela inquietação do século, a respeitável e antiga Instituição é, até hoje, a depositária e diretora de todas as atividades evangélicas da Pátria do Cruzeiro." "As forças das sombras alimentam, muitas vezes, o personalismo e a vaidade dos homens, mesmo daqueles que se encontram reunidos nas tarefas mais sagradas; mas a direção suprema do trabalho do Evangelho se processa no Alto e a Federação Espírita Brasileira, dentro da sua organização baseada nos ensinamentos do Mestre, está sempre segura do seu labor junto das almas e dos corações, cultivando os mais belos frutos de espiritualidade na seara de Jesus, consciente da sua responsabilidade e da sua elevada missão.

            Na verdade, podemos sentir, sem esforço, que o Alto não se afasta de orientar a FEB, inspirando os seus dirigentes na sua conduta terrena. Os fatos aí estão para demonstrá-lo e só um cego não os vê. Enquanto as demais organizações nascidas e alimentadas do ódio à FEB vão desaparecendo paulatinamente, a Casa de Ismael permanece intangível, altaneira, vencendo os anos e as vicissitudes todas. Os periódicos que lhe dão combate têm sua trajetória interrompida, sendo de se notar a recente extinção duma característica publicação que, de todas, quiçá primasse pelo mais longo afastamento da doutrina espírita-cristã, tal o seu habitual linguajar irreverente e pretensioso. Entre seus articulistas um se destacava, comicamente, pela sua constante posição "do contra". Era contra a FEB, contra Roustaing, contra Emmanuel, contra André Luiz, contra Chico Xavier, contra Waldo Vieira, contra Humberto de Campos, contra nós, contra tudo, contra todos. Quem sabe até contra ele mesmo ... ? Quanto aos livros de oposição à FEB, dormem nas prateleiras de livrarias, ou rolam pelos sebos e nunca mais são reimpressos. As tribunas escasseiam para aqueles que não têm sabido fazer dela um verdadeiro recurso de pregação do amor e da verdade, mas que seriam os primeiros a abrandar a língua se a FEB lhes destinasse uma coluna no "Reformador" ou cinco minutos no seu salão de conferências. Não desejam mais do que exibir-se e, faltos de autocrítica, pregar suas teorias preconcebidas. Em "Obras Póstumas", pág . 319, 11ª ed., Allan Kardec quis por certo aludir a esses, quando escreveu: "Não faltarão intrigantes, pseudo-espíritas, que queiram elevar-se por orgulho, ambição ou cupidez; outros, que estadeiem pretensas revelações com o auxílio das quais procurem salientar-se e fascinar as imaginações por demais crédulas."

            Sim. Seguimos a FEB, porque seu programa é o que nos agrada, pautado que está rigorosamente na própria Doutrina Espírita. Nenhum reparo temos a fazer ao seu trabalho e à sua conduta. Os ideais que ali vigem são os que abraçamos, os serviços que ela empreita são os que nos satisfazem. Nunca nos impuseram coisa alguma e muito antes de lhe pertencermos ao Conselho Superior, já dela éramos beneficiário, não apenas materialmente (ali recebemos inestimável assistência espiritual, através de passes magnéticos) mas, acima de tudo, doutrinária e evolutivamente, com as lições que aprendemos emanadas das obras que há mais de meio século vem divulgando. Lemos muito sobre Espiritismo. E de tudo o que lemos, ficou-nos a autoridade, mínima que seja, para escolher sem cegueira nem paixão: estamos com a FEB. Aos que quiserem conhecer melhor os argumentos esfarrapados dos que a combatem, recomendamos os capítulos IX, X, XI e XII do livro "Elos Doutrinários", do nosso erudito confrade Ismael Gomes Braga. Vale a pena ler.

            Nossos leitores que continuem a escrever-nos, pois suas críticas hão de agradar-nos sempre. Pedimos apenas que o façam em termos evangélicos, sem facciosismos, sem ódios, sem o desejo de aluir coisa alguma. Quanto ao companheiro que nos obrigou a esse longo artigo, nosso convite sincero para que venha conhecer melhor a obra da Federação Espírita Brasileira, principalmente seu trabalho de divulgação do livro espírita, em muitos dos quais, estamos certos, foi beber os conhecimentos que hoje o fazem um espírita honesto e senhor de cabedal respeitável. O Papado, que ele andou adivinhando na direção da FEB, não existe na realidade. Por outro lado, esta não pode nem deve descuidar-se um minuto sequer, para que a Instituição não acabe caindo em mãos menos dignas. Essa cautela, de resto, quem a aconselha é o próprio Allan Kardec, quando diz em "Obras Póstumas": "É também de prever que, sob falsas aparências, indivíduos haja que tentem apoderar-se do leme, com a ideia preconcebida de fazerem soçobrar o navio, desviando-o da sua rota. O navio não soçobrará, mas poderia sofrer prejudiciais atrasos que se devem evitar" (pág. 219, 11ª ed.).


            Deixem-nos por fim, o companheiro e todos os leitores nossos, lembrar-lhes que bastaria a conquista do selo comemorativo do centenário de "O Livro dos Espíritos", conseguido duramente pela FEB, para credenciá-la - em especial a sua atual diretoria - junto ao coração dos espíritas de todo o mundo. E, ao seguir pela avenida Passos, que nosso companheiro se detenha um instante em frente à Casa de Ismael, se nela não quiser entrar, para sentir pessoalmente, ao passar por ela, que de fato os homens passam e a FEB fica, eterna e imortal.

XXIII. 'Apreciando a Paulo'



XXIII 
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958


“Porque nós não somos como muitos,
falsificadores da palavra de Deus,
 antes falamos de Cristo com sinceridade,
como de Deus na presença de Deus.”
(Paulo - II Epístola aos Coríntios, 2:17)

            Saulo de Tarso, que se transformou em Paulo, o apóstolo das nações ou o apóstolo dos gentios ou das gentes, depois que Jesus lhe tocou o coração na estrada de Damasco, sempre foi fiel ao Divino Mestre. Jamais falsificou a palavra do Cristo, mas divulgou-a com sinceridade, em viagens memoráveis que fez a dois continentes, atestando por inúmeras obras a grandeza redentora de sua fé.

            Foi sem dúvida um Espírito encarregado de missão sublime, “vaso escolhido” do Cristo para pregar seu Evangelho na Europa como na Ásia Menor, em cujo sudoeste nasceu, naquela velha Tarshish ou Tarso, capital da província romana da Cilícia, cidade edificada sobre as ribanceiras do rio Adno, que desce das vizinhas montanhas do Tauro e que “todos os poetas tinham cantado”.

            Tarshish ou Tarso possuía naquela época, conforme Daniel Rops, 300.000 almas. Era um grande centro universitário, “ultrapassando Atenas e Alexandria pelo seu amor às ciências”, consoante o testemunho de Estrabão.

            Segundo os historiadores, existiam apenas aquelas três universidades na Terra, no tempo de Jesus: a de Tarso, a de Atenas e a de Alexandria, cuja biblioteca foi depois incendiada; mas a primeira superava as duas outras, em cultura e em pesquisas filosóficas.

            Tarso foi cidade tão importante que, segundo Sholem Asch, obtivera as regalias de cidadania romana para seus naturais, desde que nascessem livres. O decreto em apreço fora de Pompeu, o Grande, mais tarde confirmado por Júlio César, “e de então em diante nunca mais fora posto em dúvida”. Daí porque Paulo era também cidadão romano, o que lhe valeu de alguma coisa, quando começou a sofrer suplícios e perseguições por amor ao Nazareno.

            Tarshish, sob o aspecto mundano, tornara-se célebre, porque fora naquele grande porto do Mediterrâneo - Mare Nostrum - que as galeras de Cleópatra esperaram Marco Antônio...  Cícero, o grande tribuno romano, quando ali residira como governador da província da Cilícia, deixara o sulco de sua eficiência administrativa, construindo obras de vulto, que embelezaram a cidade.

            Mas que resta agora da grandeza de Tarso, daquela que tinha sido o traço de união entre a Europa e a Ásia? Transformou-se em Tersus, um vilarejo turco, cujo município possui apenas umas vinte mil almas.

            “Hoje, o visitante, que uma grande saudade faça ali voltar, tem dificuldade de se convencer desse esplendor passado. Desde a pobre marinha de Mersina até a cidade, no mesmo lugar em que outrora os jardins e os vergéis ostentavam, como num xadrez sulcado de regos fecundantes, o múltiplo esplendor das suas colheitas, não há mais do que pântanos sinistros e estepes miseráveis.”

            Assim passa a glória do mundo, como os romanos diziam... prova de que as cidades, como as criaturas humanas, estão sujeitas ao mesmo ciclo evolutivo e transitório: nascem, crescem, envelhecem e morrem também; como Léon Denis inteligentemente acentuou: Só o Espírito é eterno!

            Todavia, se Tarshish ou Tarso feneceu, como flor que se despetala, as palavras de seu filho querido estão cada vez mais vivas, rescendendo sempre o perfume sutil e inebriante dos céus, porque participam da essência divina, cujo Espírito é dinâmico, infinito e perfeito.

            Assim, a doutrina que Paulo pregou, viverá conosco eternamente.

            O nome do apóstolo, Schaoul ou Saul, em hebreu, que significa o desejado, e cuja forma helênica é Saulo, ele depois o mudou para o substantivo latino Paulo, que quer dizer pequeno.

            Poderoso doutor da lei entre os israelitas, zelador de seu respeito e cumprimento por atribuição do Sinédrio, preferiu transformar-se no humilde fabricante de tendas, ou em simples tecelão das “cilicianas”, fazendas ásperas saídas de seu tear, ofício que aprendera quando menino, usando os pelos das cabras do Tauro para transformá-las em um tecido “impermeável e praticamente incorruptível”, que vendia “para viver com o suor de seu rosto”.

            Desta maneira não era pesado a ninguém, e disto se vangloriava com justa ufania:

            “Porque bem vos lembrais, irmãos, do nosso trabalho e fadiga; pois, trabalhando noite e dia, para não sermos pesados a nenhum de vós, vos pregamos o Evangelho de Deus.” (1 Tess., 2:9)

            Ele seguia estritamente, em matéria religiosa, a lição do Nazareno: “De graça recebestes, de graça dai.” (Mat., 10:8) Nada cobrava pelo curso evangélico que ministrava, tirando “da letra que mata o espírito que vivifica.” Não punha e nem aceitava preço nas coisas de Deus. Mas vivia de seu trabalho manual, árduo e humilde, porém honesto.

            Criado em ambiente cosmopolita, onde as culturas grega e romana, vale dizer, pagã ou politeísta, faziam quartel, e onde predominava o culto a Baal, cheio de imponência mas repleto de degradação, Saulo de Tarso cedo compreendeu que era mister defender o monoteísmo de seus ancestrais, pois Israel mantinha-se detentor da verdadeira cultura religiosa, entre aqueles povos que eram joguetes dos deuses, encarnando suas paixões.

            Achava que somente Pentateuco, Provérbios, Salmos e Profetas, podiam dar uma diretriz segura à Humanidade, através da lei (Tora) que o Mishna e o Talmud, onde se achavam reunidos os doutos e esclarecidos comentários dos rabinos, tão bem sabiam condensar e definir.

            A cultura clássica da Universidade de Tarso não o podia satisfazer, nem ao puritanismo de sua família, que era de fariseus, A filosofia que ali se ensinava parecia chocante aos judeus ortodoxos ou de boa têmpera, e, além disto, como reconhece James Stalker, “Paulo sempre manifestara escarninho desprezo pela argúcia dos retóricos e pelas balofas disputas dos sofistas, o que constitui mesmo uma feição assaz marcante em alguns de seus escritos”.

            Destarte, foi mandado ainda moço para Jerusalém, a capital da Palestina, sede do Templo de Javé ou Jeová, cidade reconhecida como sagrada pelos israelitas, a fim de tornar-se rabi, isto é, “ministro de Deus, professor e advogado, ao mesmo tempo”.

            Saulo fez seu curso com Gamaliel, mestre notável, “que de seus contemporâneos recebera o título de Beleza da Lei, e entre os judeus é ainda comemorado como o Grande Rabi”, neto do não menos ilustre Hillel, outro grande rabino fariseu, que ao seu tempo disputava com Shammai a profundeza dos conhecimentos e o sentido exato da lei.

            Quando Gamaliel faleceu, foi-lhe feito um elogio, que a Mishna recolheu como verdadeiro:

            “Desde que Gamaliel desapareceu, já não existe a honra da Lei; a pureza e a devoção morreram com ele.”

            O livro bíblico Atos dos Apóstolos, 5:38 e 39, registra a sua edificante manifestação de tolerância para com os primeiros cristãos, palavras de que nossos irmãos católicos e protestantes deviam ainda se servir para conosco, cristãos-espíritas:
  
            “Dai de mão a estes homens, e deixai-os, porque, se este conselho ou esta obra é de homens, se desfará,
            Mas, se é de Deus, não podereis desfazê-la; para que não aconteça serdes também achados combatendo contra Deus.”

            Todos sabemos como Saulo de Tarso se tornou cristão, numa “conversão instantânea”, sendo que a luz da Verdade até o cegou!

            Jesus, na estrada de Damasco, pessoalmente convocou-o para o seu serviço, não sendo exagero dizer-se que S. Paulo é para o Cristianismo o mesmo que Allan Kardec é para o Espiritismo: o seu codificador. Aquele foi fundado por Jesus; este pelo Espírito Santo, mas tiveram em Paulo e Kardec, respectivamente, suas maiores expressões humanas, que jamais poderão ser excedidas.

            Como disse o ilustre escritor protestante James Stalker, referindo-se a S. Paulo, “ele é pensador nato, espírito de majestosa amplitude e força, operoso e infatigável; não foi somente o maior da Igreja, como também o mais consumado trabalhador que ela possuiu”.

            Sua lealdade ao Cristo de Deus é absoluta. Jamais falseou a palavra do Messias, porém multiplicou-a como ótimo semeador, com dedicação e sinceridade, sem medir sacrifícios.

            E as catorze epístolas que nos legou, condensando e desenvolvendo a doutrina do Divino Mestre, a quem sempre foi fiel, constituem, depois dos Evangelhos, o maior monumento do Cristianismo, a mais legítima expressão do Verbo de Deus, o que não é de estranhar, de vez que Paulo mesmo afirmava em Gálatas, 2:20: “vivo, não mais eu, mas Cristo vive em mim; e a vida que agora vivo na carne, vivo-a na fé do Filho de Deus.”

            Por isto, tudo o que legou à Cristandade (que é a Igreja do Senhor, composta de todos os que o seguem, pouco importando o credo) tem um sabor sempre agradável, oportuno e universal.

            Por consequência, a vida de Paulo de Tarso merece rememorada, como o foi tão bem na obra de Emmanuel - «Paulo e Estêvão», e seus escritos aí estão, secundando e atualizando sempre a palavra do Cristo e gozando do mesmo cunho de consolação e de verdade!

            Discípulo fiel, Paulo foi um apóstolo que honrou o Mestre e que, tendo seguido a lei de Moisés e as lições de seus rabinos, soube depois amar e exemplificar a doutrina que o Cordeiro de Deus pregou para salvação da Humanidade, de trabalho, de perdão e de humildade, comprovando que o Senhor Jesus efetivamente é “o caminho, a verdade e a vida”.



quinta-feira, 21 de novembro de 2013

13. 'Máximas extraídas do ensino dos Espíritos'



13. Máximas extraídas
dos Ensinos dos Espíritos.
           

            A prece é recomendada por todos os bons Espíritos. Todos os Espíritos imperfeitos a pedem como meio de alívio para seus sofrimentos.          

            Allan Kardec
Pág. 51 e seguintes.
‘O Espiritismo na sua Expressão mais Simples’
1ª Ed FEB 2006
Tradução de Evandro Noleto Bezerra

Do Cristianismo - O pensamento de Hermínio Miranda






           "... Não sei qual o ponto de vista do leitor, mas, para mim, prefiro fazer uma distinção bem nítida, sem a qual não é possível compreender racionalmente a questão: primeiro, a substância doutrinária do Cristianismo; segundo, a história do Cristianismo, desde suas origens até os dias de hoje, e, finalmente, a teologia dogmática que se teceu à sua volta.     

            No meu entender, a substância do Cristianismo está no ensinamento primitivo, original, incontaminado, do Cristo, antes de qualquer interpolação ou deformação. Essa doutrina, evidentemente trazida de muito alto, é um código de moral religiosa que não conhece tempo, nem fronteiras, porque goza dos privilégios da universalidade cósmica. Ainda que a maculem e a distorçam, ela renascerá, mais além, purificada e imortal.

            Quanto à historiografia, sabemos o que seja: seu objeto é a preservação ordenada de fatos ocorridos, verificados ou seguramente inferíveis. Nela não há, portanto, espaço para a invencionice; no instante em que descamba para a fantasia, vira romance. Aqueles que bordaram ficções em torno da história do Cristianismo, prestaram um desserviço de lamentáveis e trágicas consequências à Humanidade.

            Já a teologia dogmática, que se emaranhou em torno do Cristianismo primitivo, acabou por, sufocar, com suas bizantinices, a pregação singela do Cristo. Os conceitos fundamentais ensinados pelo Mestre não precisavam e jamais precisarão das escoras artificiais do dogmatismo teológico. Para se praticar a doutrina do amor ao próximo e de obediência consciente às leis divinas, não é necessário dissecar a Suma Teológica, nem consumir a existência e repassar toneladas de alfarrábios que se escreveram sobre coisas tão simples e evidentes. Claro que não podemos, em nossa limitação biológica e espiritual, compreender toda a ideia da infinita grandeza e perfeição de Deus. Para que, então, prender o corpo físico à sombra empoeirada das bibliotecas, quando lá fora há tanto que fazer em favor do próximo? Teria Francisco de Assis desempenhado sua missão se, em lugar de sair pelo mundo exemplificando sua doutrina de amor, ficasse a estudar dogmas antigos e inventar novos?

            É evidente que poucos podem ombrear-se com o homem de Assis, como também é verdade que o estudo e a interpretação correta dos ensinos do passado é condição necessária ao progresso futuro; o que não se pode é permitir que o acessório, o secundário que se contém no estudo teórico da doutrina, sufoque, aniquile o que tem ela de essencial. A doutrina pode perfeitamente sobreviver e produzir até melhores frutos sem a teologia dogmática, enquanto que esta sem aquela é mera especulação filosófica, ainda que erudita. Não é, porém, a erudição que leva os espíritos para Deus - é a prática de uns poucos preceitos morais ao alcance do mais simplório dos analfabetos. Se, conforme o simbolismo evangélico, é difícil ao rico chegar ao Céu, não é impossível ao erudito subir para Deus, desde que sua erudição - serva e não senhora - seja subordinada à moral doutrinária."...

Trecho do artigo 'Lendo e Comentando' de Hermínio Miranda
publicado em Maio 1963 pela revista 'Reformador' (FEB). 

'Não sejas um deles'



Não sejas um deles
Bezerra de Menezes
por W Vieira
Reformador (FEB) Maio 1963

            Um dos aspectos marcantes na vida do companheiro de fé, ainda encarnado, é a formação do ambiente espírita.

            O seguidor do Espiritismo não pode existir isolado; à face disso, o meio doutrinário para ele se revela importantíssimo, por indispensável.

            Nesse meio há de necessariamente granjear a euforia cristã e a oportunidade de servir, com o devido apoio espiritual na defesa de si próprio.

            Há elevado número de irmãos relegados à margem das tarefas do bem, por ainda não haverem conquistado ambiente fraterno onde desabotoar o coração; paralisa-os a timidez, detêm-nos variadas inibições e a ausência de comunicabilidade lhes frena, lamentavelmente, o impulso criativo. Não sejas um deles.

            De maneira invariável, é óbvio que partilhamos verdadeira eficiência em serviço  tão só no grupo humano em que nos integremos, segundo os princípios da afinidade; urge, no entanto, fazer concessões de nossa parte. Nada nos fará deparar com cenáculos de anjos na Terra, mas seremos indubitavelmente atraídos para os ninhos de todos aqueles cujos pensamentos sintonizam com os nossos.

            Do mesmo modo que os Espíritos evoluem e se aprimoram em falanges entrelaçadas pela semelhança de gostos, tendências, ideais e princípios, o homem, pela, própria condição da existência terrestre, vê-se obrigado a pertencer a certo clã social, e o espírita, por sua vez, é impelido para determinado círculo doutrinário.

            Entretanto, não nos é lícito imitar a tartaruga na carapaça...

            Somos convidados a sair de nós próprios, a compreender, a edificar, a extravasarmo-nos nas boas obras... Por essa razão guardemos o júbilo espontâneo de expandir-nos na fraternidade para a descoberta incessante de novas luzes; cultivemos amizades por tesouros da alma; concretizemos as próprias convicções na vida prática.

            Quem se isola furta-se de cooperar no rendimento da vida; além disso, faz-se órfão de alegria, na posição de tutelado constante do sofrimento.

            Observa, pois, se já constituíste o teu ambiente doutrinário.

            Analisa a ti mesmo, repara se desfrutas euforia natural nesse ambiente, se te reconfortas dentro dele e esforça-te para desenvolver com eficiência a parte de serviço que te compete na equipe de ação redentora a que pertences.

            Habitua-te, desde agora, a trabalhar em conjunto na condição de peça útil e essencial no mecanismo do bem, porque somente assim alcançarás, um dia, o ingresso venturoso à Vida Espiritual, como Obreiro do Bem, ante os sóis do Infinito.