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sábado, 27 de novembro de 2021

Erros religiosos da Humanidade

 

Erros religiosos da Humanidade

por Ismael Gomes Braga

livro: “Libertação” (Editora Ismael-Araras-SP, 1955)

             “A mesma gota caída do céu será pérola se recebida por uma rosa, ou lama se absorvida pelo pó”, disse Léon Denis, com respeito às revelações que o Céu nos remete, e concluiu que o Espiritismo será o que dele façam os homens, porque os bons saberão empregá-lo para o bem, mas os maus o corromperiam como tantas revelações anteriores que se tornaram flagelos para a Humanidade, apesar de sua origem divina.

            A primeira desventura do homem é seu espírito de seita que tudo conspurca e incendeia, porque ele tem n’alma quase somente germens de inferioridade e em tal terreno não podem medrar as sementes do bom e do belo. Só uma ínfima minoria de bons colhe todos os benefícios das revelações divinas.

            Deus nos envia Mestres sublimes que nos ensinam o caminho da luz para a felicidade. Uns poucos aceitam a revelação e voam para o alto, mas a maioria projeta suas próprias sombras sobre o terreno e têm de progredir lentamente pela força invencível da dor que a ninguém deixa para sempre abandonado à margem da evolução.

            Moisés recebeu e transmitiu ao povo ensinos de eterna sabedoria. Não nos esqueçamos que por ele veio ao mundo o Decálogo e vieram outras pérolas preciosas, como comentários aos Dez Mandamentos. São frases que ficarão eternas nas Escrituras e foram mais tarde confirmadas por Jesus, como o são hoje pela Terceira Revelação, mas em poucos corações se tornaram força viva tais ensinamentos. Vamos copiar aqui apenas três frases recebidas por Moisés: “Como o natural entre vós será o estrangeiro que peregrina convosco, e amá-lo-ás como a ti mesmo.” (Levítico, XIX, 34). “Ama ao teu próximo como a ti mesmo” (Levítico, XIX, 18). “Nem só de pão vive o homem.” (Deteronômio, VIII, 3).

            Estas frases foram repetidas por Jesus e o são incessantemente pelos nossos guias, porque constituem ensinos de aplicação eterna e universal. Os homens creram que tais palavras vinham de Deus e as conservam nos lábios até hoje, mas só nos lábios. No coração elas não viveram ainda.

            Bastariam os ensinos recebidos pela mediunidade de Moisés para guiarem a humanidade à luz e à ventura. Reflitamos sobre o versículo 33 do cap. XIX do Levítico, acima transcrito, para percebermos que ele não poderia ser de origem humana. Naquele tempo em que se faziam as guerras de extermínio contra os estrangeiros e só se poupava o estrangeiro vencido na guerra para vende-lo como escravo, uma ordem de amar o estrangeiro como a si mesmo só poderia ter descido de alta esfera espiritual, porque excedia de muito tudo o que o homem de então poderia pensar e sentir.

            Esses ensinos foram escritos 1300 anos antes de nossa era, ou seja, há mais de 3200 anos  e o que foi feito deles pelos crentes que o receberam?

            Fecharam-se num seita fanática que cometeu os mais absurdos crimes de religião contra os seus profetas ulteriormente aparecidos, inclusive contra o Divino Mensageiro que levaram à cruz do martírio. Cultivaram tristemente o ódio e conquistaram para si mesmos o ódio universal.

            Tais e tantos foram os crimes cometidos em nome da Lei, que a dor se tornou o processo necessário de evolução daquele povo que era destinado a guiar os outros no progresso espiritual, como se depreende do fato de haver-se tornado universal a Revelação por ele recebida.

            Acusando de heresia e condenando o divino Mestre, o Mosaísmo se afastou do Cristianismo e ficou estacionado; mas o Cristianismo aceitou a Revelação mosaica, tornando-o o grande divulgador do Velho Testamento.

            O que se tem dito do martírio do povo judeu, sob o ódio universal, em todos esses milênios, não é só indizível é até inconcebível.

            Implantou-se a Segunda Revelação, acentuando mais a Lei de amor universal e exemplificando-a com os mais sublimes scrifícios.

            A parte má e errada da religião – o espírito de seita – colocou os israelitas fora da Humanidade, quando o fundamento mesmo do Judaísmo é universal e deveria ter feito dos judeus os líderes religiosos mais queridos do mundo.

            Dentre os numerosos erros religiosos dos judeus, um de graves consequências foi o suporem que a Revelação Divina ficara encerrada no Velho Testamento, e nada mais Deus teria que dizer aos homens. Com esse tenebroso engano, ficaram eles encarcerados religiosamente num passado remoto, fora do tempo e do mundo, sem admitir nenhum progrsso na Revelação, nem a possibilidade de haver preciosas revelações por intermédio de outros povos. Repeliram o maior de seus profetas, o que vinha coroar a obra e dar cumprimento à Lei, realizar as profecias.

            Nasceu o Cristianismo em plena capital judaica, mas a religião oficial o repeliu e só os simples de coração o aceitaram. Perseguiram o Espírito mais sublime que já desceu à Terra; crucificaram-no e perseguiram seus discípulos e continuadores.  O Cristianismo que teria dado o máximo prestígio ao povo de Israel, foi exilado e só pode medrar no estrangeiro.

            Foi um erro religioso de tremendas consequências para os judeus essa violenta repulsa ao Cristianismo nascente. Eles perderam a liderança religiosa que lhes havia sido posta nas mãos, e tornaram-se uma pequena seita odiosa e sempre odiada no mundo, quando ela só deveria inspirar amor, amar e ser amada.

            O Cristianismo confirmou a Lei em tudo que ele possuía de divino; mas depois de três séculos se constituiu em Igreja oficial do Império Romano, adquiriu poder temporal, tornou-se religião obrigatória par todos os súditos do governo romano.

             Como religião oficial o Cristianismo recebeu todos os defeitos do Paganismo, já muito enraizados no povo, e perdeu seu próprio espírito que era todo de perdão e amor.

            Passou de perseguido a perseguidor e entrou a cometer todos os erros – para não dizer crimes – de religião imposta pela força do Estado. Toda a crueldade bárbara ressurgiu sacrilegamente em nome do cordeiro de Deus. Nessa involução, descendo sempre, dando pasto às mais vis paixões humanas, com o passar dos séculos o “cristianismo” estava transformado na mais monstruosa instituição que já possuíu a Humanidade. Era a Inquisição, o ódio desenfreado, apoiando a escravidão, cavando prisões subterrâneas, levantando os cavaletes de tortura, a roda, acendendo fogueiras para queimar vivos os seus “hereges”, assim classificados em processos odiosos de interesses políticos e econômicos inconfessáveis.

            Séculos e séculos de crimes monstruosos em nome da religião de amor e perdão incondicional!

           Vieram as Cruzadas, guerras de pilhagem e extermínio que duraram séculos, sob pretexto de “libertar” a Terra Santa... E tudo em nome do Cordeiro de Deus!

            Surgiu entre os árabes o Islamismo, agressivo, exclusivista, cruel, e até hoje mantém guerra “santa” contra o cristianismo das igrejas.

            Em todos esses séculos e milênios de tremendos erros religiosos, o progresso humano continuou sendo feito através da dor que felizmente nunca nos abandonou em nossos desmandos.

            Chegou o século da revolução contra a tirania do imperialismo religioso. Foi feita a Reforma religiosa que custou rios de sangue e levou à fogueira Espíritos sublimes. Basta lembrar a Noitada de S. Bartolomeu e a execução de Jan Huss, para sentirmos o preço da Reforma, o terror da reação de Roma contra a Reforma; mas a Humanidade já havia progredido bastante para a vitória da Reforma sobre grandes massas humanas, se bem que Roma continuasse dominando em muitos países do Ocidente, como se acha ainda.

            A Reforma e o progresso social conquistado palmo a palmo, forçaram finalmente Roma a se modificar e perder a força tirânica que exercia sobre o povo. Ainda em nosso século houve tentativa forte de restauração daquela força. Pelo célebre Tratado de Latrão, o fascismo restaurou o poder temporal da Igreja; mas foi de pouca duração essa restauração, porque o próprio fascismo foi extinto mais cedo do que a Igreja poderia supor.

            Essas conquistas sociais foram de caminhar lento. Três séculos depois de feita a Reforma, ainda a Inquisição conservava seu inteiro poder sobre Portugal, Espanha e outros países, e queimava impunemente os seus “hereges”, em processos tortuosos, nos quais predominava muito o interesse político e econômico.

            Com tantos erros cometidos através dos milênios, a religião se comprometeu duramente na consciência humana. Há numerosas pessoas que sentem um santo horror da palavra “religião”, como os judeus e outros povos sentem pavor no nome “cristianismo”, porque para esses povos “cristianismo” significa: prisões subterrâneas, torturas físicas e morais, fogueiras inquisitoriais, confiscação de propriedade, escravidão, lama da pior espécie.

            Agora ressurge a religião com a Terceira Revelação. Não desmente os seus princípios revelados através dos milênios, confirma-os.

            Diz-nos de novo o mesmo que já foi dito por intermédio de Moisés, dos Profetas, de Jesus, e, além de dizê-lo, traz-nos o depoimento dos “mortos”, todos eles afirmando que aqueles princípios de amor universal indicam o único caminho seguro para a subida ao céu.

            A grande diferença ente a Terceira Revelação e as duas que a precederam consiste em que as duas primeiras afirmavam  a eternidade da vida, enquanto que a Terceira demonstra essa eternidade e com ela a responsabilidade ilimitada: ninguém fica impune pelos crimes que comete; não há meios de burlar a lei de Deus.

            Pelos crimes religiosos cometidos no passado, temos muita razão de supor que os homens não criam na imortalidade e responsabilidade da alma; era um dogma inteiramente morto o da imortalidade. De agora em diante, a repetição por toda a parte dos fenômenos espíritas vai dando nitidez cada dia maior a essa verdade religiosa; a imortalidade da alma torna-se palpável e indubitável.

            Não aceitamos liteiramente a opinião de Léon Denis, citada no início deste artigo, porque a paciência dos nossos Maiores da Espiritualidade está hoje mais demonstrada do que no momento em que foram escritas aquelas palavras. Cremos que os homens não terão força de corromper o Espiritismo e rebaixá-lo como fizeram com as revelações anteriores, porque os Espíritos são incansáveis em seus esforços de nos ajudar, e porque a Humanidade já progrediu um pouco moralmente para não cair mais em erros tão grosseiros.

                                                                                   ***

            O Espiritismo terá que cumprir sua missão num mundo diferente daquele em que se desenvolveram as igrejas que cometeram grandes erros religiosos.

            Embora os princípios revelados do Judaísmo e do Cristianismo fossem universais, a Humanidade antiga vivia apartada em grupos sem comunicações constantes uns com os outros. A falta de transportes, de imprensa, de uma língua internacional popular insulava os grupos humanos que se desconheciam mutuamente. Nada havia de comum a toda a Humanidade. No presente e ainda mais no porvir, ao contrário, tudo será mais comum a toda a população do Planeta.

            Todas as distãncias já estão abolidas pelo rádio. O progresso do Esperanto já nos vai criando a mentalidade planetári, a consciência de solidariedade de todos os terrícolas. Quando se der o pleno desenvolvimento do Espiritismo, já as massas humanas possuirão uma língua internacional popular.

            As religiões antigas tinham, cada uma delas, sua língua internacional: o Judaísmo tinha o hebraico, a Igreja Católica tinha o latim, o Islamismo possuía o árabe, mas tais línguas só eram internacionais para pequeníssimas elites de alto nível cultural; o povo mesmo não possuía meios de compreender as Escrituras, sempre fechadas em línguas sagradas até a Reforma, quando a Bíblia passou a ser traduzida e divulgada entre os crentes.

            No porvir, as massas humanas mesmas possuirão uma língua realmente internacional e gozarão os benefícios da Revelação Progressiva e universal que se dará no planeta todo e chegará imediatamente ao conhecimento de todos.

            Seria pessimismo supormos que o Espiritismo venha a cair nos mesmos erros do passado. Isso não será possível; o progrsso não o permitirá.

            Temos encontrado nos meios espíritas, ultimamente, famílias de israelitas que teriam pavor de entrar em uma igreja católica; mas, através do Espiritismo foram conquistadas para o Evangelho. Uma das missões do Espiritismo, ao que nos parece, será recuperarmos para o Cristo o coração dos judeus, esse coração tão assustado pelo medo milenário das perseguições que supunham “cristãs” e que se diziam “cristãs”. Já com dois mil anos de atraso, mas na eternidade nunca é demasiado tarde.

 ***

             Os crimes religiosos do passado eram cometidos impunemente, porque a legislação humana não havia ainda classificado aqueles atos como crimes passíveis de punição pelos tribunais mesmo humanos. Hoje chama-se genocídio essa espécie de crimes cometidos contra um grupo religioso, uma nação, um partido. No caso da matança de judeus pelos nazistas, a ação foi classificada de genocídio e reuniu-se um tribunal internacional que julgou e condenou os responsáveis.

            A defesa dos acusados alegou que tais atos não eram crime, porque praticados de acordo com a legislação vigente na Alemanha que era uma nação soberana e podia decretar as leis que lhe aprouvesse. Mas os julgadores decidiram que acima das soberanias nacionais existem direitos humanos universais, cuja violação é crime, e assim foram condenados e executados os responsáveis. Houve um progresso na evolução do direito internacional e o sentimento de humanidade foi colocado acima das soberanias nacionais que cobriram tantos crimes no passado.

            Pode argumentar-se que esse reconhecimento dos direitos da criatura humana à liberdade, à vida, à crença, é de difícil execução, e como prova disso pode alegrar-se que o lançamento de bombas atômicas contra cidades japonesas, exterminando populações civis indefesas, seria um crime de genocídio, mas os responsáveis não foram julgados, porque não houve força legal suficiente para julgá-los. Se os Estados Unidos houvessem sido vencidos na guerra, certamente um tribunal japonês teria classificado o fato como genocídio, julgado e condenado os responsáveis, e meia dúzia de ianques teriam sido enforcados. Ninguém foi acusado, porque faltou força necessária ao julgamento em tribunal. Mas a consciência universal não absolveu os responsáveis: o mundo todo sente ódio contra os responsáveis, e os mais veementes protestos suriram dentro dos Estados Unidos. Houve outra espécie de condenção que apavora os responsáveis, e esta nos agrada mais do que a de Nurenberg, porque entrega o criminoso ao tribunal de sua própria consciência que é o mais forte de todos os tribunais.

            O povo dos Estados Unidos julgou os responsáveis pelas bombas atômicas sobre cidades indefesas do Japão e este julgamento é muito forte.

            Os erros religiosos da Humanidade são capítulo triste da História, mas não poderão reproduzir-se no porvir, nesse grande porvir que assistirá ao triunfo mundial da Terceira Revelação, ou seja do triângulo luminoso a que se têm referido os nossos guias:

                                                                             E

                                                                       E          E         

             Evangelho, Espiritismo, Esperanto: amor, luz, compreensão universal.

 


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