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terça-feira, 31 de outubro de 2017

Práticas Religiosas 1,2,3 e 4


Práticas Religiosas - 1
Theophilo Siqueira
Reformador (FEB) Novembro 1941

Em certos meios paulistanos, o Espiritismo, parece, vai romanizando-se e os que têm espírito crítico mais ou menos independente devem dar o sinal de alarma.

"Política dos espiritistas", dirão; mas, o Espiritismo não tem política, diremos. Deixem-se tais inovações aos credos materializados ou materialistas, como o romanismo, que quase nada mais tem de espiritualidade; é romanismo civil... A Santa Madre, agora, multiplica seus Congressos Eucarísticos e encarrega os jornais oficiosos de dar-lhes larga publicidade, com enormes clichés, onde se veem as autoridades civis sempre acompanhadas dos senhores bispos, padres, etc. Ela, a Igreja, já recebeu a sua parte, consoante diz o Evangelho, pois que vive unicamente desse exibicionismo, dessa exterioridade, desse formalismo ritualístico, que é o que lhe basta.

Mas, entre nós, espiritistas, precisa não ser assim, por isso que só devemos homenagens à Igreja viva, do Senhor Jesus, qual a estabeleceu Ele, e não a Igreja morta, material, que para subsistir necessita da mão forte do Estado, das muletas do mundo político-oficial.

A Igreja viva do Senhor Jesus, sempre e cada vez mais vivo e vivificante, não é a que se encontra nas dioceses, arquidioceses, paroquias, mas aquela que está dentro de cada ser, aquela cujo templo é o próprio indivíduo. E tanto assim é que Jesus disse: "onde duas ou mais, pessoas estiverem reunidas em meu nome, aí estarei". A nossa fé deverá viver sentida e não mostrada. Mostrar-se, ela o deve, porém, unicamente nos atos da vida quotidiana e sobretudo no exemplo.

Aqui em S. Paulo, ao que parece, generalizam-se as concentrações como as que já se realizaram no Estádio do Pacaembú. E dizemos concentrações, para não dizer Congressos...

Nos nosso salões ou centros já se encontram enormes quadros com a efigie de Jesus Cristo e não será difícil verem-se amanhã andores, acompanhados por caravanas, incenso, banda de música, etc.

A tendência do homem, neste mofino planeta, é para corporificar tudo em forma material, transformar os símbolos em realidades palpáveis, tangíveis e práticas, sempre esquecido de que se deve adorar a Deus em espírito e verdade, isto é, em consciência, em atos enquadrados naqueles cânones indicados pelo seu divino Enviado.

Realmente, é difícil combaterem-se as tendências, herdeiros que somos de vasto acervo de hábitos, usos e costumes. Em religião, então, a coisa ainda é mais séria. Uma ideia, quando desce ao coração, ou ao subconsciente e se torna instinto, só mesmo uma força maior, maior sensação pode arrancá-la dali, motivo pelo qual a dor; o sofrimento, o desamparo são elementos de primeira ordem - única linguagem empregada por Deus para se fazer entender pelos homens.

Mas, para, bem compreendermos essa linguagem de Deus, faz-se mister ainda uma certa evolução espiritual. Os que têm olhos de ver encontram na doutrina espírita a equação prática do problema, retendo-a, transubstanciando-a, fazendo-a carne de sua carne, vida de sua vida. Felizes os que não perdem as lições.

Dissemos, linhas atrás, que é muito difícil combater-se, em religião, a tendência que temos herdado e realmente assim é. O paganismo, o politeísmo, que eram praticados em Roma e na Grécia, antes do advento do Cristo, continua latente, a imperar na humanidade, graças ao "Cristianismo' das Igrejas, que não passa de prolongamento daqueles.

Aos deuses familiares dos gregos, que eram seus antepassados, seus heróis, deuses esses que, igualmente, foram adotados pelos romanos, ajuntaram-se outros que, em vez de serem heróis, ou ascendentes, eram os elementos físicos da natureza: o Sol, a Lua, o trovão, o vento, etc. O altar - doméstico agrupava a família; o marido, o pai era o sacerdote desse altar. Como várias famílias adoravam, às vezes, os mesmos deuses, criou-se um aglomerado que foi a cidade. Temos, pois, fundada a cidade, cujas famílias praticavam os seus ritos no mesmo altar, no recinto fechado duma edificação - pritaneu na Grécia, templo de Vesta em Roma - lugares esses que eram os mais respeitados e venerados da cidade, pois que neles ardia o fogo sagrado.

Na Grécia enfraqueceu-se logo esta veneração, com o haver a imaginação grega levantado templos suntuosos aos seus deuses, segundo diz De Coulanges, cujo tratado estamos seguindo.

Ainda e sempre, observa-se aqui como a forma, o culto, a observância aniquilam a ideia. Efetivamente, quando se observa o culto da forma, a substância vai passando a um plano secundário.

Já, por isso, o divino Mestre fez sentir à Samaritana que Deus é espírito e como tal é que os seus verdadeiros adoradores o devem adorar!




Práticas Religiosas - 2
Theophilo Siqueira
Reformador (FEB) Fevereiro 1942

A virtude, o caráter principal do Espiritismo está em elevar a inteligência humana à concepção do absoluto de Deus, e não o de estacionar em pequenos ritos, pequenas práticas em que nada há para refletir e aprender.

Comer-se uma refeição preparada sobre um altar consistia o principal culto do paganismo grego e romano. Essa a primeira forma que o homem deu ao ato religioso.

O "Cristianismo" de Roma e o de Lutero não se libertaram da velha influência pagã a que continuam jungidos, escravizados, no dogma imutável. O romanismo come, deglute o próprio Cristo. O protestantismo, se bem que um tanto mais simples, tem igualmente o seu repasto.

Na observância de práticas e ritos demoram as religiões que, por Isso mesmo, caem nesse automatismo que delas faz um meio de vida, criando-se assim os profissionais da fé. E as consequências aí estão: religião hoje, para toda gente, consiste em atos de culto exterior, em sacramentos, etc., que, uma vez cumpridos, põem a criatura em harmonia com Deus ... O substratum da doutrina do Cristo é pouca coisa; as práticas religiosas o mais importante ... Preenchidas umas tantas fórmulas e formas, está-se bem com Deus. Dele não se pode ter mais medo, porquanto, a sua exigência - o culto material - foi satisfeita.

Os espiritistas precisam estar vigilantes para não jogarem a doutrina na vala comum das outras religiões, cristalizando-a em formas litúrgicas, em cerimônias que só servem para abafar a manifestação intima e pessoal do nosso espírito. Daí o nosso grito de alarma contra os congressos, ou melhor, as concentrações públicas, as imagens do Cristo etc., que observamos na capital paulista. A observância da forma abafa, repita-se, o sentimento da substância.

O paganismo grego e romano tinha as regras estabelecidas, suas formas sacramentais para evocar a alma dos antepassados; uma palavra que faltasse na recitação de uma fórmula era o suficiente para o fracasso do que se pedia. Essas fórmulas haviam de ser repetidas ipsis litteris. Veja-se a influência que a forma exerce!

Quanto os bons espiritistas terão de lutar contra esse acervo de superstições acumuladas! O Espiritismo tem que preparar a humanidade para a implantação do reino do Senhor Jesus na terra, motivo pelo qual cada indivíduo tem que ser um sacerdote, sem, todavia, o sacerdócio das religiões que instituíram um esoterismo para si e um esoterismo para os outros.

Mas, todas as "religiões" nascem, vivem e morrem porque são plantas que Deus não plantou. Larguemos nós, os espiritistas, essas sementes que Deus não semeou. Tirem delas bom proveito as elites censoras do romanismo sibarita.



Práticas Religiosas - 3
Theophilo Siqueira
Reformador (FEB) Abril 1942

Ao ilustrado e incansável batalhador Dr. Romeu de Camargo.

Celebra-se este ano o primeiro centenário de William James, que, herdando o misticismo de Swedenborg, através de seu Pai, aderiu ao Espiritismo.

W. James é incontestavelmente o maior filósofo da América. Coordenador do pragmatismo, doutrina filosófica que, salvo melhor juízo, consiste em estabelecer o critério da verdade de uma proposição na medida da utilidade de suas consequências, merece as homenagens de todos os espiritistas.

W. James é adorado na América do Norte, onde o Espiritismo avança a passos largos - a terra dignificando seu filho, seguindo-lhe as pegadas. Este exordio, que fugiu ao assunto do estudo que temos feito, sobre a contrafação do Espiritismo, que se nota em certos meios, foi a título de desencargo de consciência e, também, para convidar os confrades a fazerem somente Espiritismo inteligente, baseado em ciência e não correrem ansiosos, como faz muita gente, atrás de adeptos, o que é mais política do que religião.

Entre as contrafações, uma se avoluma, a que leva os membros da família espírita a discutirem entre si a natureza do corpo do Senhor Jesus. Que mal há que esta entidade ou aquele individuo aceite o divino Mestre num corpo carnal ou fluídico? Fique cada um com o seu ponto de vista, com a sua concepção e não discutamos o modo íntimo de sentir do crente. O conceito de liberdade deve estar, principalmente no espiritista, muito acima de melindres pessoais. O essencial é que procuremos exemplificar a doutrina, objetivando-a em nossa conduta. Que importa que se aceite o Salvador sob a indumentária carnal, físico-material, ou etérea, fluídica? Não é o habito que faz o monge ...

Em vez de nos determos numa questão que, na hora presente, é de Iana caprina, demoremo-nos em meditar a substância da maravilhosa doutrina que Ele ensinou, estudando-a em sua plenitude, pois que, assim, faremos que ela exsurja na harmonia e beleza de sua estrutura.

O homem quanto mais cultiva a forma menos serve à substância. A forma é a substância em ato, ensinava Aristóteles, e todos sabemos que essa forma é passageira, morre, transforma-se, dissolve-se no turbilhão da vida universal. O culto da forma é a geratriz dos automatismos; é a ideia passando do dinamismo do cérebro para a estagnação do subconsciente.

Não nos demoremos no exame das vestes do Senhor Jesus. Deixemos isto para as sutilezas da Escolástica, que só tem servido para complicar e aristocratizar o conhecimento de Deus. O luminoso Espírito de Emmanuel nos conta, pela pena de Francisco Candido Xavier, que, "os romanos, ao contrário dos atenienses, não procuravam muitas indagações transcendentes em matéria religiosa ou filosófica, atendendo somente aos problemas do culto externo (o grifo é nosso), sem muitas argumentações com a lógica, e foi por isso que, com a evolução da cidade, o Panteon, seu templo mais aristocrático, chegou a possuir mais de trinta mil deuses". O romanismo atual, com o seu número astronômico de santos, tem razões com a sua tradição, que lhe é tão cara...

Conhecemos e admiramos ótimos caracteres kardecistas, como admiramos e conhecemos excelentes amigos roustainistas. Aliás, Kardec e Roustaing jamais tiveram a pretensão de dizer a última palavra sobre o Espiritismo. Sejamos coerentes
com a doutrina, em cujo conhecimento apenas aprendemos as primeiras letras.

Seja-nos permitido voltar às sublimes lições de Emmanuel, endereçando-as aos litigantes do corpo do Senhor Jesus. "A grandeza da doutrina não reside na circunstância do Evangelho ser de Marcos ou de Mateus, de Lucas ou de João; está na beleza imortal que se irradia de suas lições divinas atravessando as idades e seduzindo os corações". Não há vantagem nas longas discussões, quanto à autenticidade de uma carta de Inácio de Antióquia, ou de Paulo de Tarso, quando o raciocínio absoluto não possui elementos para a prova concludente e necessária. "A opinião geral rodopiará em torno do crítico mais eminente, segundo as convenções". Todavia, a autoridade literária não poderá apresentar a equação matemática do assunto.

"É que, portas a dentro do coração, só a essência deve prevalecer para as almas e, em se tratando das conquistas sublimadas da fé, a intuição tem de marchar à frente da razão, preludiando generosos e definitivos conhecimentos" (1).
(1) A caminho da luz, pag. 100
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Práticas Religiosas - 4
por Theophilo Siqueira
Reformador (FEB) Maio 1942

Remanescentes do catolicismo romano, que quase todos somos, ainda não foi possível libertar-nos por completo, da velha tara, dos “restos de batina...” 

Com as contrafações e desvios, que se notam no Espiritismo prático, futuramente estarão as entidades jurídicas da doutrina dando as mãos ao Estado, uma vez que este o queira e perceba que deverá cortejar, por política, as maiorias. Foi assim com aquele Imperador pagão, Constantino, que habilmente oficializou a religião nascente, época em que começa a verdadeira fundação da Igreja romana, começando igualmente a sua agonia lenta, a esclerose que havia de minar lhe o organismo, por isso que, aos simples postulados do meigo Nazareno, antepunha a prestigiosa instituição os imperativos de vantagens aparentes.

Com o Espiritismo, uma vez que siga as mesmas trilhas da Igreja, dar-se-á a mesma coisa, não nos iludamos. Essa ânsia de proselitismo, de fazer adeptos, o que é mais política do que religião, não é um sintoma de efeito negativo?

Pouco adianta trazerem-se à doutrina pessoas que não estejam aptas a recebe-la e compreender lhe a estrutura. Aceitá-la teoricamente e na prática continuar o converso a batizar filhos, frequentar e usar sacramentos da Igreja, como temos visto, de pouco ou nada vale.

lncoerência, ignorância, pusilanimidade ou que outro nome tenha, o resultado é o mesmo: gente que desserve a doutrina e que nos atos morais também praticará essa duplicidade ou dubiedade de ação.

Seguir o Espiritismo é tomar a cruz e acompanhar o divino Mestre.

Abstenha-se portanto o espiritista desse agarramento às formas e fórmulas, que são apenas o reflexo exterior do que vai pelo interior. Paulo, o grande apóstolo, diz que a boca fala do que o coração está cheio e a palavra é símbolo, é forma do pensamento. 

O Espiritismo tem que se firmar primeiramente no indivíduo, na intimidade doméstica, antes de sair para a rua. É necessário não dar asas ao sentimento com prejuízo da razão, o que leva muitas vezes a nossa doutrina para fora dos seus legítimos aspectos, conduzindo-a à morbidez, ao fanatismo, coisas que mais a prejudicam.

Concitemos, num apelo fraternal, os nossos confrades a exemplificarem mais o Espiritismo do que proclama-lo ou propaga-lo lá fora, onde deveremos dizer, acima de tudo e serenamente, que somos espiritistas. Isto sim; negarmos o nosso Deus, jamais.

Todas, as religiões nasceram, viveram e morreram, exceto as parcelas de verdades divinas que nelas existiam e se transmitiram à posteridade. 0 que é humano cai necessariamente e tanto assim é, que o Senhor Jesus, falando sobre o Templo de Jerusalém, de cuja suntuosidade os discípulos se admiravam, disse que dele não ficaria pedra sobre pedra, profecia que se aplica a todas as épocas, conforme se verifica, pois que o divino Salvador só se preocupava com as verdades morais.

Religião não é templo, não é sacramento, não é rito, não é hierarquia político-social, não é profissionalismo na fé, por que é ato puro, é consciência, é procedimento; enfim, religião é amor e prática do bem. E o apóstolo Paulo afirmou que Deus não mora em templo feito pela mão do homem.

É a estas coisas simples, destituídas de sutilezas teológicas, que os espiritistas devem atender, tão somente. O mais é “igrejificar” a doutrina. Sejamos coerentes.  

Assim, ritos tradicionais, cerimonias diversas devemos deixá-las às religiões formalísticas, primitivas, como a dos Bantus, por exemplo, férteis nesses costumes, conforme conta José Huby, História das Religiões, 1º volume, pág. 79.

O Espiritismo é simples, puro e não tem pompas, podendo repetir com o apóstolo Paulo: “Há um só Senhor, uma só fé, um só batismo”. O batismo do fogo, a fé em harmonia com a razão e a ciência, sob a suserania do Senhor Jesus.

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