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sábado, 14 de abril de 2012

26 - 'Doutrina e Prática do Espiritismo'




26      * * *



            Se encararmos a questão no ponto de vista fisiológico, indubitavelmente decisiva se nos apresentará essa influência. Não é a única, porém, a concorrer para tal fim.

            Qual é, com efeito, a causa da morte nos seres organizados? A esta pergunta, identicamente formulada por AIlan Kardec no LIVRO DOS ESPIRITOS (1), a resposta, evidentemente encaminhada a definir o fenômeno em sua feição geral, sem cogitar de particularidades, foi: "o esgotamento dos órgãos", solução que, todavia, a outros, como Gabriel Delanne, terá parecido insuficiente, pois que, sem aludir embora ao mencionado texto, antes visando a opinião materialista sobre o caso, sugere ele esta objeção, que de
todo modo alcança o ensino dos espíritos:

            "Dizer que os órgãos se gastam é indicar simplesmente uma fase de evolução, é registrar um ,fato." E acrescenta (2): "Mas porque se gastam eles, quando se conservam perfeitamente durante a idade madura e aumentavam de vigor durante a juventude? A ciência materialista fica muda ante estes pontos de interrogação. Uma ex pIicação pode ser, entretanto, fornecida e vamos expô-la."

                (1) Cap. IV da 1ª parte. n. 68.
                (2) Vide A EVOLUÇÃO ANIMICA, págs. 19-20.

            Vejamos, pois, em que consiste.

            "Se admitimos - prossegue o nosso ilustre correligionário que há na célula fecundada uma determinada quantidade de força vital, tudo se torna compreensível.  A vida total de um indivíduo é o resultado de um certo trabalho a executar. As incessantes reconstituições da matéria gasta pelo funcionamento vital medem esse trabalho, e a força que é necessária pode ser considerada como uma função continua, que cresce, passa por um máximo, e volta a zero.
                "Se atirarmos uma pedra ao ar, a força que estava em nossos músculos se comunica à pedra; esta se eleva rapidamente, apesar da atração que a puxa para o centro da terra; chega o momento em que, sendo iguais essas duas forças e em sentido contrário, há equilíbrio; depois a atração predomina e a pedra torna a cair; quando regressa ao ponto de partida, toda a emergia que se lhe havia comunicado, desapareceu.
                "Pode conceber-se que alguma coisa de análoga passa no ser vivo. A reserva de energia potencial provinda dos pais, e que se encontra na célula original, se transforma em energia atual à medida que ele organiza a matéria: essa ação é ao começo muito intensa: a assimilação, o agrupamento das moléculas é mais rápido que a desassimilação - o ser cresce; depois o equilíbrio se estabelece entre as perdas e os ganhos - é a idade madura, o corpo fica estável; por fim, durante a velhice, esgotando-se a força vital, os tecidos não são suficientemente alimentados, sobrevêm a morte, o ser se desagrega e a matéria volta inteiramente ao mundo inorgânico."

            A comparação incontestavelmente é engenhosa, já tendo, por isso, captado a adesão de alguns estudiosos, que, para explicar "porque se morre", não têm hesitado em filiar exclusivamente esse fenômeno à elasticidade atribuída à força, ou energia vital oriunda dos progenitores. Por nossa parte, com tudo, sentindo ter que, ainda nisso, nos afastar da opinião ou, pelo menos, das conclusões, demasiado absolutas, do eminente pioneiro do Espiritismo científico na França, entendemos que a sedutora teoria por ele formulada padece o mesmo vício do articulado que faz objeto de sua impugnação, isto é: atribuindo a morte ao decrescimento e cessação da força vital, registra um fato, equivalente ao esgotamento dos órgãos, sem fornecer melhor explicação de tal fenômeno. O embaraço, a que supõe subtrair-se, permanece e com ele a mesma legitimidade de interpelação: qual a razão de se esgotar essa energia, uma vez que durante a vida, tal como se dá com todas as partes do organismo, vai sendo constantemente renovada?

            Porque não passa de uma simples conjetura a afirmação de que a soma de energia potencial haurida dos progenitores representa uma quantidade fixa e, por assim dizer, definitiva com os caracteres de impulso inicial, a que é assemelhada, e que, abandonada à sua própria velocidade, atinge o máximo limite, para retrogradar a zero e desaparecer- A verdade, reconhecida e proclamada mesmo por Allan Kardec - autoridade na matéria, por isso que era também médico e, como tal, conhecedor da fisiologia e suas leis - é que, se o fluido, ou energia vital, transmitido por via hereditária, efetivamente representa, segundo por nossa parte anteriormente o assinalamos, uma reserva inicial, indispensável à formação do ser, durante a vida e logo desde a infância não cessa de ser aquele fluido, constantemente renovado, à medida que vai sendo consumido nas operações igualmente vitais.

            Assim, com efeito, se exprime o incomparável missionário, apreciando o funcionamento orgânico associado à cooperação do indicado fluido nos fenômenos como na conservação da vida:

            "O conjunto dos órgãos - diz ele (1) - constitui uma espécie de mecanismo, que é impelido pela, atividade íntima ao principio vital  neles existente.
                O princípio  vital é a força motriz dos corpos organizados. Ao mesmo tempo que o agente vital dá o impulso aos órgãos, a ação nos órgãos conserva e desenvolve a atividade do agente vital, pouco mais ou menos como o atrito desenvolve o calor."

            (1) Allan Kardec, O LIVRO DOS ESPÍRITOS, págs.  25 e 26, nota aos nº 67 e 70.

            E, em nota adiante, assim completa esses conceitos: "Os órgãos são, por assim dizer, impregnados de 'fluido vital, fluido que imprime a todas as partes do organismo uma atividade que, em certas lesões, opera a coesão e restabelece funções momentaneamente suspensas. Quando, porém, os elementos essenciais ao jogo dos órgãos estão destruídos ou muito profundamente alterados, o fluido vital é impotente para lhes transmitir o movimento da vida, e o ser morre.
                "Os órgãos reagem necessariamente, mais ou menos, entre si; é da harmonia do conjunto que resulta a sua ação reciproca. Quando uma causa qualquer destrói essa harmonia, as suas funções se detêm, como o movimento de um maquinismo cujas peças essenciais estejam desarranjadas."

            Compara em seguida o corpo a um aparelho elétrico, em que a atividade do fluido produz o fenômeno da vida, enquanto a cessação daquela atividade ocasiona a morte, e observa:

            "A quantidade de fluido vital não é absolutamente a mesma em todos os seres orgânicos; varia conforme as espécies e não é constante, quer no mesmo indivíduo, quer nos indivíduos de uma mesma espécie. Alguns são, por assim dizer, saturados dele, ao passo que outros apenas têm o necessário; dai resulta que alguns têm uma vida mais ativa, mais tenaz e, de algum modo, superabundante.
                "O fluido vital se esgota; pode tornar-se insuficiente para a conservação da vida, se não for renovado (1) pela absorção e assimilação das substâncias que o encerram."

                (1) O grifo é nosso.

            Estas considerações de Allan Kardec, perfeitamente acordes com o princípio estabelecido no ensino dos espíritos, no sentido de que a vitalidade não é um atributo permanente do agente vital, mas só se desenvolve com o corpo, sendo necessária a união das duas coisas para produzir a vida (2), nos colocam em face do paralelismo que é preciso ter em consideração quando se trata de compreender esse fenômeno; de um lado o conjunto dos órgãos, com a sua capacidade intrínseca de funcionamento e resistência, constituindo uma espécie de mecanismo, e do outro o fluido ou princípio vital que os estimula e aciona, uns e outro subordinados à mesma necessidade de renovação, como o todo - não é demais acrescentarmos – está ligado, mediante o perispírito, à influência do espírito, princípio diretor e centralizador da personalidade, segundo a formula expressiva do doutor Geley.

            (2) O LIVRO DO ESPÍRITOS, cap. IV da 1ª parte, n. 67.

            Assim sendo, a duração da vida, particularmente da vida humana, que é o que nos preocupa no momento, não pode unicamente depender da potencialidade do princípio vital contido na célula originaria, como não basta alegar a degradação motriz desse princípio, para explicar o fenômeno da morte. Ao demais, se ele periodicamente se renova (1), subsiste a interrogação que formulamos: por que motivo se degrada?

            (1) Por escassos que sejam os dados positivos sobre assunto, como esse, tão pouco investigado, o que é licito admitir é que a renovação do princípio ou fluido vital se opera, não só mediante a assimilação das substâncias nutritivas que o encerram, mas principalmente - como noutro lugar ficou assinalado - pela absorção desse elemento sutil nas elevadas regiões atmosféricas, através o conduto perispiritual, graças ao fenômeno de exteriorização durante o sono, considerado por isso o mais reparador dos alimentos.


            Não é preciso contudo grande esforço para atinar com a solução: - simples -e evidentemente porque, obedecendo a um determinismo providencial, a renovação não é proporcionada à intensidade do dispêndio. E assim se dá, tanto com o fluido vital, como em relação aos outros componentes do organismo, para que se cumpra a grande lei - lei de transformação para consequente e perpétua evolução - a que todas as coisas estão submetidas.

            A morte, por conseguinte, - considerado no ponto de vista fisiológico o problema da duração da vida humana - é o resultado do simultâneo esgotamento dos órgãos e do fluido vital, já seja porque, profundamente alterados ou destruídos os elementos essenciais ao funcionamento dos primeiros, o fluido vital é impotente para lhes transmitir o movimento, já seja porque, a seu turno esgotado, esse fluido se tornou insuficiente para o entretenimento da vitalidade.




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