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quinta-feira, 17 de setembro de 2020

O Syllabus de Pio X

 

O Syllabus de Pio X

A Redação

Reformador (FEB) Novembro 1907

              O diário parisiense Le Matin, de 29 de julho deste ano, publicou a seguinte carta do padre Hyacinthe Loyson, reproduzida na Revue Scientifique et Morale du Spiritisme, fascículo de Setembro:

             Hei de escrever, provavelmente, algumas reflexões mais extensas sobre o Syllabus de Pio X.

             Preciso, porém, dizer, desde já, uma palavra referente a esse ato que vai passando desapercebido no meio da indiferença desdenhosa de uns e da aparente submissão de outros.

             Depois das encíclicas de Gregório XIV e de Pio IX, depois do Syllabus do segundo, o novo “catálogo” firma a oposição irredutível entre as duas mentalidades antagônicas, a do papado e a da sociedade contemporânea.

             Não podem, ainda que o quisessem, reconciliar-se.

             Roma não pode desdizer-se, porque se o fizesse, não seria mais Roma; perderia a  infalibilidade. Se a sociedade moderna se submetesse, voltaria ao pensamento medievo, ancilla theologiae, com esta diferença: a serva era então sincera; hoje, seria mentirosa e covarde.

             Muito padres e leigos católicos, que pensam como eu, mas não tinham até agora gido do mesmo modo, vão chegar afinal a esta conclusão prática: - harmonizar o procedimento com as convicções, rompendo abertamente com o papado, que nos considera heréticos e cismáticos, quando ele é que é o grande herético e cismático.

             Esse rompimento, que se impõe, atualmente, como um dever, encontro-o, já previsto, em livro notável, escrito, ha setenta anos, por um profeta moderno, porque também temo-los, embora não sejam ouvidos, como não foram os de Israel.

             Lamenais acreditava, com razão, na eternidade da religião e na eternidade do cristianismo, que é a forma superior daquela, mas, ao concluir os Affaires de Roma, acrescentava:

             “Se os homens, urgidos pela necessidade imperiosa de reatar, por assim dizer, as   suas relações com Deus, de preencher o imenso vazio deixado pela religião, voltarem ao cristianismo, este, fiquem certos, nunca será o que lhes apresentam com o nome de catolicismo.  

            “Já explicamos o porquê, mostrando, em futuro inevitável e muito próximo, o cristianismo compreendido e o evangelho interpretado de um modo pelos povos e de outro modo pelo pontificado: Roma, de um lado; do outro lado a raça humana.

             “É quanto basta...

             “Cometem desastroso erro os que pretendem dirigir o gênero humano por caminhos que o desviam dos seus destinos.

             “- Cumpre, porém, que aconteça o que tem de acontecer e que cada um vá onde tem de ir.”

             Lamenais tinha razão. É preciso que Roma vá até ao fim, até a catástrofe que lhe prepara a sua cega e orgulhosa infalibilidade. Cumpre também que o catolicismo liberal vá até ao fim com lealdade e lógica, afirmando o racionalismo cristão, ou, para usar de melhores termos, o espiritualismo evangélico, única esperança do futuro.

             “A letra mata, mas o espírito vivifica”, disse S. Paulo.

             Conservaremos todo o nosso amor, para as grandes verdades e o nosso respeito aos grandes espíritos, que ainda estão nessa Igreja, onde, outrora, vivemos; mas perseguiremos com ódio vigoroso os seus erros, o fanatismo e, principalmente, a hipocrisia que, em nome dela, querem impor.

             Diremos, como o salmista, falando, não aos homens, mas da mentira: Perfecto odio oderam illos et inimici facti sunt mihi. Eu os odiarei com o ódio perfeito e eles tornaram-se meus inimigos.


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