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domingo, 29 de janeiro de 2012

Elementos da Filosofia Espírita



Elementos da
Filosofia Espírita
           
            A poucos passos da serenidade que nos proporciona a Doutrina Espírita, encontramo-nos com um mundo perplexo e atormentado pelas suas próprias criações transitórias, à semelhança de um grande barco agitado pelas vagas ameaçadoras de um mar revolto, com seus representantes anotando dolorosamente:

                        Nossa cultura é muito superficial hoje, e nossos conhecimentos são muito perigosos, já que a nossa riqueza em mecânica se contrasta com a nossa pobreza de propósitos. O equilíbrio de espírito que haurimos outrora na fé ardente, já lá se foi; depois que a ciência destruiu as bases sobrenaturais da moralidade, o mundo inteiro parece consumir-se num desordenada individualismo, refletor da caótica fragmentação de nosso caráter. Novamente somos defrontados pelo problema atormentador de Sócrates: como encontrar uma ética natural que substitua as sanções sobrenaturais já sem influência sobre a conduta do homem? Sem filosofia, sem esta visão de conjunto que unifica os propósitos e estabelece a hierarquia dos desejos, nós malbaratamos nossa herança social em      corrupção cínica de um lado e em loucuras revolucionárias de outro; abandonamos num momento           nosso idealismo pacífico para nos mergulhar nos suicídios em massa da guerra; vemos surgir cem mil políticos e nem um só estadista; movemo-nos sobre a Terra com velocidades nunca antes alcançadas, mas não sabemos para onde vamos, nem se no fim da viagem alcançaremos qualquer espécie de   felicidade.[1]

            O grito de perplexidade, diante dos quadros humanos de nosso mundo, não é articulado por quem ignore as luzes do Cristianismo. O seu Autor, num subjetivo respeito, anota no subtítulo de seu trabalho: “In my Father's house are many mansions[2]”, consagrando, na dinâmica do Cristianismo, a filosofia por plano do Universo, onde o homem se encontra com a Vida, buscando compreendê-Ia em sua unidade, origem e fins. Porém, embora essa sua sutil raiz cristã, não alcança equacionar o existencial pelo gênio da doutrina de Jesus e se mantém sem rumo definido.

            É o gemido profundo e sincero daqueles que se renderam, aturdidos, sob o peso de suas próprias obras e agora se indagam, por entre as brumas do panorama humano conturbado: o que fazer e como fazer para encontrar um roteiro seguro.

            Mas, o que para o filósofo é o horizonte da angústia, a incógnita que completou o vórtice reencenando, na ribalta da existência, a problemática da era socrática: a busca de uma ética que substitua as sanções sobrenaturais -- no Espiritismo é a fase do processo evolutivo que, pelo exercício de nosso livre-arbítrio, inscrevemos por contristador estágio de nossa maturação espiritual.

            Eis a ocorrência:

                        Na eclosão da Ciência, o homem foi bruscamente remetido para diante da realidade objetiva, induzido a desligar-se de fábulas e superstições, de fé dogmática e sistemas estanques de filosofia.    Essa repentina integração no existente promoveu o surgimento de duas atitudes mentais     diametralmente opostas:
                        - a daqueles que haviam rompido o cordão umbilical com sua natural tendência religiosa, gerando um monstro teratológico, fecundado pelo egoísmo-orgulho: o materialismo;
                        - a daqueles que não aviltaram a sua natureza íntima e que, pelo avanço da Ciência, se ajustaram para senhorear-se da fenomenologia mediúnica - que é de todos os tempos - já não mais no sentido mítico ou terra-a-terra de oráculos e pitonisas e sim na dimensão da racionalidade, surgindo com esses o espiritualismo científico: o Espiritismo-cristão.

            Esse comportamento filosófico, decorrente da inter-relação com a Espiritualidade, súmula das atividades evolutivas do espírito, teve a sua aurora com “O Livro dos Espíritos”, onde o seu coordenador esclarece: “Como especialidade contém a doutrina Espírita; como generalidade, liga-se à doutrina espiritualista, da qual apresenta uma das fases. Essa a razão por que traz sobre o titulo as palavras: Filosofia Espiritualista[3].”

            Vivendo Allan Kardec, codificador do Espiritismo, numa época de profundas renovações, em todos os campos dos conhecimentos e das atividades humanas, e sendo os ensinamentos que recolheu dos Espíritos a mais profunda e ampla renovação de conceitos, revivendo o Cristianismo do qual herdou o gênio, não se ocupou o mestre lionês em fundar uma escola sistemática, em que se criaria uma realidade temporal e que terminaria, como outras, por fugir do plano objetivo. Contrariamente ao condicionamento de criaturas a uma realidade, lançou as bases da compreensão dentro dos horizontes individuais, aceitando por inevitáveis os mais conflitantes comportamentos e as mais divergentes ideações, porque o homem sempre emerge mais enriquecido espiritualmente depois dos mergulhos nos oceanos de suas paixões.

            A filosofia Espírita, atingida pelo nosso crescimento intelectual e afetivo, não é, portanto, a construção de um sistema que encarcere o pensamento e que estabeleça uma realidade, impondo-se ao homem do exterior para o interior, limitando-lhe a área de experiências individuais com fé fundamentada no sobrenatural ou numa autoridade humana, já que o evento da Ciência dissolveu a ascendência dogmática e hierárquica.

            No processo do desenvolvimento integral, o homem primeiro treinou a sua razão, no contato direto com o meio tangível e mensurável pelos seus sentidos comuns. Despiu-se das gangas teológicas e das emoções primitivas, desordenadas, atingindo as fronteiras de sua maturidade. Já na divisa do imponderável, dominava regularmente as leis naturais mais próximas, ou seja, aquelas que falavam aos seus sentidos objetivos, tendo condições, então, para mensurar novas leis com o seu sentido objetivo, a mediunidade.

            Senhor de suas sensações, tendo frenado e ordenado a emotividade, desvinculando-se de escolas dogmáticas, por força de sua nova condição, estava apto à realidade psicofísica, seguindo a metodologia de suas experiências de Ciência, com a amplitude da racionalidade.

            O Espiritismo-cristão surgiu, assim, por coroamento de um laborioso processo evolutivo. Não, evidentemente, resultante da inventiva humana, mas como decorrência do novo estágio psíquico atingido em que o homem tem mais amplo descortino do Universo. Foi conquista, conjugada com a Espiritualidade Superior.

            A filosofia Espírita, à semelhança do próprio Sócrates, libertou-se dos cânones tradicionais e vem realizando, com substancional mutação de técnica e de forma, sem desmerecer mas sem utilizar o glossário técnico do filósofo profissional, o diálogo vital, na plataforma da razão. Não contribui para aumentar o acervo de páginas obscuras e nem de páginas rendilhadas por elegantes torneios de expressão, sem substância objetiva. Suas conclusões não são formas interrogativas de quem se aturdiu com o exame da Vida e nem são editais de falência de nossa Humanidade.

            É uma orientação assistemática do pensamento.

            O filósofo angustiado, perplexo, não entreviu, ainda, a nova ética espírita-cristã, substituindo as sanções sobrenaturais, assentada amplamente no raciocínio, em que se estabelece “a visão de conjunto que unifica os propósitos”. Seus liames, contudo, são bastante difusos e profundos, gerando as bases de uma nova civilização, entretendo-se com o homem para a reforma do atual estágio transitório de nossa civilização. Opera-se tal qual com a semente depositada no seio da terra e que arrosta as intempéries, fortalecendo-se para garantir o fruto nutritivo do amanhã.

Surge Emmanuel  

            O processo filosófico, inaugurado por Allan Kardec, numa doutrina fundamentalmente religiosa  - mas onde religião não tem o significado tradicional de dogma, de hierarquia sacerdotal, de ritos e paramentos exteriores; de culto organizado, nem de verdade única e integral ou mesmo de medida salvacionista -, após exatamente sessenta anos do aparecimento de “O Livro dos Espíritos”, viria aflorar, dinâmico, atual, com o Espírito de Emmanuel, através da mediunidade psicográfica de Francisco Cândido Xavier.

            No primeiro encontro do médium com o Espírito de Emmanuel ficou inteiramente definido o seu roteiro de atividades, pelas suas palavras e pelo símbolo, dentro do qual se fez visível:

          “Via-lhe os traços fisionômicos de homem idoso, sentindo minha alma envolvida na suavidade de sua presença; mas o que mais me impressionava era que a generosa entidade se fazia visível para mim, dentro de reflexos luminosos que tinham a forma de uma cruz. Às minhas perguntas naturais, respondeu o bondoso guia: - “Descansa! Quando te sentires mais forte, pretendo colaborar igualmente na difusão da filosofia espiritualista. Tenho seguido sempre os teus passos e só hoje me vês, na tua existência de agora, mas os nossos espíritos se encontram unidos, pelos laços mais santos da vida e o sentimento afetivo que me impele para  o teu coração tem suas raízes na noite profunda dos séculos[4] ...

            Nesse primeiro reencontro, Emmanuel fez uma síntese, figurada, dos propósitos e do processo da filosofia espiritualista que propagaria pelo mediunato de Chico Xavier. Era o continuísmo existencial, em planos que se inter-relacionam continuamente, embora nem sempre assinalados conscientemente pelo homem. E a cruz, que irradiava de seus reflexos luminosos, instrumento de regeneração consagrado pelo Cristo, seria a geratriz, através da qual seriam examinadas as atividades evolutivas de nossa Humanidade.

            É por demais expressivo esse quadro!

            A visão global do homem, em si considerado e compondo o complexo de sua marcha ascendente, só poderia ser alcançada com o auxílio de sabedoria que transcenda ao mutável e que possa abarcar o conjunto do fenômeno evolutivo, sem visão deformada pelo poliedro do condicionamento vital.

            O Sol integral é dos que estão acima dos horizontes.

            O Espírito de Emmanuel, por força do plano em que se situa e em decorrência de seus estágios evolutivos, desfruta dessa visão integralizada, dentro do gênio da doutrina do Cristo. Veio, assim, de espírito limpo. Não trouxe o propósito de organizar uma escola filosófica ou religiosa, nem pretendeu inaugurar uma sistemática inusitada e estranha ou mesmo de abordar a problemática filosófica para disseminar princípios transitórios em essência ou relacionados a uma determinada época ou evento. Revelou-se fiel ao Mestre, sem trair por um só momento a dinâmica da reconstrução de mundo novo com o Senhor Jesus e, em consequência, sem se distanciar ou conflitar com a Doutrina codificada por Allan Kardec, ditada pelo Espírito de Verdade,

            Todas as obras de Emmanuel podem ser analisadas do prisma da mais pura filosofia, representando a Filosofia Espírita, numa posição de extraordinário avanço direcional e horizontal, enriquecendo os temas e aspectos propostos e implícitos na Codificação Doutrinária. Seria oportuno, de futuro, uma tomada global, para ensaiar compreendê-lo na sua genialidade-cristã . Contudo, ficaremos restritos, por ora, ao exame de apenas quatro de suas produções:

                                   - Emmanuel
                                   - A Caminho da Luz
                                   - O Consolador
                                   - Roteiro[5] 

            A obra “Emmanuel”

            A linha central do pensamento Espírita estava perfeitamente delineada, em seus princípios
fundamentais, no pentateuco kardequiano, dispensando o seu continuador, o Espírito de Emmanuel, de retornar à origem primeira para reeditá-Ia. Desse marco básico deveria irradiar--se, abarcando detalhes e questões que aflorariam no campo do conhecimento humano, à medida que se processa o sazonamento de nosso senso-moral.

            A obra “Emmanuel” traz a dinâmica vital da filosofia Espírita, sendo valioso e precioso subsídio para construir a mente na renovação do Cristianismo-redivivo. Seu escopo central se destaca na titulação das duas grandes partes em que se divide:

                                   I - Doutrinando a fé
                                   II - Doutrinando a ciência.

            Submetendo fé e ciência à iluminação da doutrina espírita-cristã, realiza o seu Autor uma arrojada projeção do pensamento humano, revelando a objetividade da filosofia nova que não se deteria nas masmorras dos sistemas utópicos e nem se confinaria a enregelantes torres de marfim. É' o exame das cartas, com as quais a Humanidade faz o seu jogo de evolução, dentro dum realismo transcendental, sem o injetar de fel em nossa boca.

            Além da exposição em torno de “importantes questões que preocupam a Humanidade”, aborda dialeticamente quatro questões que têm gerado vasta literatura:

            1. Determinismo e livre-arbítrlo - onde elucida que o determinismo é o trajeto previsto para o viajor da evolução; contudo, o livre-arbítrio é uma lei irrevogável, pela qual pode o homem e as coletividades alterarem o seu destino.

            A proposição é a conciliação dos extremos - que são extremos tão somente para a nossa visão que, não fazendo uma tomada do todo, se confunde com os detalhes das partes. Explica a nossa responsabilidade nos atos, sem extrair-nos da marcha evolutiva a que nos submetemos.

            2. Tempo e espaço - não têm expressões objetivas, no plano das realidades eternas, são, contudo, figuras precisas ao homem como expressões de controle dos fenômenos de sua existência.

            Apresentando-nos tempo e espaço por condição transitória, permite-nos ilações sobre o eterno presente da vida humana, para almas de sublimada condição, abrindo o campo da fenomenologia de psicometria, de profecias célebres, de reexame existencial do pretérito.

            3. Espírito e matéria - podem ser considerados como estados diversos de uma essência imutável, para chegar-se a estabelecer a unidade substancial do Universo, fazendo-se preciso, porém, considerar a matéria como um estado negativo e o espírito como um estado positivo dessa substância.

            Que brilhante antecipação do energetismo!

            Se matéria fosse essência diversa do Espírito - sendo este a criação eterna do Pai - o tenderia um dia a desaparecer, como todas as formas-transitórias. Ocorrendo ser, todavia; estado diverso e não criação diversa, consubstancia a eternidade de sua essência e oferece os princípios da gradação da energia.

            4. O princípio da unidade - em que encarece que, mesmo nos planos elevados do Espírito, observa os princípios da unidade e variação, sem haver descoberto o seu ponto de interação. Todavia, como o princípio da unidade absorve todas as variações, crê que, sem perdermos a consciência individual no transcurso dos milênios, chegaremos a reunir-nos no grande princípio da unidade, que é a perfeição.

            Emmanuel não fecha, em definitivo ou dogmaticamente, as questões propostas, dando-nos uma visão relativa que podemos ter sobre as mesmas. Não deixa, contudo, de expender conceitos novos, numa linguagem direta e fundamentalmente inteligível, seguindo o mesmo estilo diáfano de Sócrates, rico de eloquente simplicidade nos problemas que nossa mente tornou complexos.

A obra “A Caminho da Luz”

            A razão examinou as religiões. Entrechocando-se com dogmas e hierarquias humanas, com princípios refratários ao progresso, com sistemas artificiosos que não suportaram a sua análise fria – verdadeiras furnas de morcegos que se vitalizam com as sombras da ignorância - o homem, obnubilado pelas suas ideações materialistas, concluiu que a religião é uma decorrência das civilizações.

            Foi tomada a causa por efeito.

            A religião, assim, teria de ser um elemento condicionado às civilizações, refletindo-lhes as
aspirações, os anseios, podendo, inclusive, excluir a ideia de Deus de seus princípios fundamentais, porque Deus seria uma consequência dos homens!

            Emmanuel, sem deter-se formalmente no exame desse teorema que precipita dolorosas
consequências psicofísicas, aviltando até sacerdotes e condutores de almas -- Emmanuel escreve, por Francisco Cândido Xavier: “A Caminho da Luz”, um livro magnífico que é “contribuição à tese religiosa elucidando a infância sagrada da fé e o ascendente espiritual no curso de todas as civilizações terrestres”.

            O ascendente espiritual é causa e não efeito.

            Pela proposição, as civilizações se originam do influxo espiritual, do crescimento psicofísico da Humanidade, cabendo aos homens renovarem-se nos princípios religiosos, renunciando de si, sem o louco tentame de estabelecer condições para que a fé sobreviva.

            A obra se inicia na gênese planetária “quando o orbe terrestre se desprendia da nebulosa solar, a fim de que se lançassem no tempo e no espaço as balizas de nosso sistema cosmogônico e os pródromos da vida na matéria em ignição, do planeta” e termina dissertando sobre o “Evangelho e o Futuro”, quando “luzes consoladoras” envolverão todo o orbe regenerado no batismo do sofrimento. O homem espiritual estará unido ao homem físico para a sua marcha gloriosa ao ilimitado, e o Espiritismo terá retirado dos seus escombros materiais a alma divina das religiões, que os homens perverteram, ligando-as no braço acolhedor do Cristianismo-restaurado”.

            Por conclusão, afiança: “Em nosso modesto estudo da história, um único objetivo orientou as nossas atividades -- o da demonstração da influência sagrada do Cristo na organização de todos os surtos da civilização do planeta, a partir de sua escultura geológica. “

            Essa interpretação filosófica da História, dentro da área Espírita-cristã, restabelece ao Cristo, para nossa visão, o seu ascendente multissecular sobre a nossa Humanidade. É-nos facultado compreender que Ele não se encontra entre os homens apenas há dois mil anos e nem acompanha de longe os lances de nossa evolução, após ter contribuído com seus exemplos. É' o eterno-presente, o sempre-hoje em nossa vida.

            Esmaece, também, o conceito do fortuito em História.

            Nossa evolução é dirigida no seu todo e, em linhas gerais, responde a um determinismo místico. No curso da caminhada, contudo, seguimos com nossas próprias pernas, escrevendo, dia a dia, as páginas de nossa história, no exercício do livre-arbítrio. Nos momentos cruciais, no entanto, somos beneficiados pela companhia de grandes Instrutores da Espiritualidade Maior, liderando-nos e retificando-nos a senda de nosso progresso.

            Embora as dores, estamos a caminho da Luz.

A obra “O Consolador”

            O Espírito de Emmanuel, no livro “O Consolador”, reformula e conceitua os departamentos da filosofia Espírita, desmembrando-lhe o campo da História, que transfere para o capítulo de Ciências Combinadas; o campo da Política, que agrega à Sociologia e o campo da Religião que, muito apropriadamente, afirma ser o ápice sublime de todo esforço humano e divino.

            É uma atitude extraordinária!

            Após esse desmembramento admirável, procede a uma classificação das cinco áreas da filosofia espiritualista com uma acuidade que só poderemos classificar de genial:

                                   I - Vida                        aprendizado
                                                                      experiência
                                                                      transição
                                  
                                   II - Sentimento            arte
                                                                       afeição
                                                                       dever

                                   III - Cultura                 razão
                                                                      intelectualismo
                                                                      personalidade

                                   IV - Iluminação           necessidade
                                                                       trabalho
                                                                       realização

                                   V – Evolução               dor
                                                                       provação
                                                                       virtude.

            Observemos, ainda, que, após tal disposição dos departamentos da filosofia Espírita, Emmanuel realiza uma triangulação que poderíamos dizer pragmática ou objetiva, induzindo-nos a aceitar a filosofia por orientação de vida e não por mero exercício ou ginástica mental. Assim, no primeiro departamento, nas bases, ele coloca: aprendizado e experiência, tendo por ápice a transição, que é a passagem do Espírito de um estágio inferior para outro imediatamente superior. No segundo departamento, ele ajusta como alicerces: arte e afeição, culminando em dever. No terceiro, encontramo-nos com a cultura e seus problemas, tendo razão e intelectualismo por fundamento da personalidade. Após, necessidade e trabalho promovem a realização. E, finalmente, dor e provação culminam com a virtude.

            Esse processo, ele só em si, é mensagem inteiramente nova.

            Toda a problemática da filosofia está em “O Consolador”, nos seus mais absorventes prismas, com a visão de unidade que conduz o homem ao encontro e à compreensão de si mesmo. É o autoexame do “conhece-te a ti mesmo”, a fim de burilar-nos, de aparar nossas arestas espirituais, aproximando-nos da interação do homem-físico com o homem-espiritual.

A obra “Roteiro”

            A visão global da vida gera a esperança.

            A certeza de que nos encontramos a meio caminho de um porvir dadivoso nos provisionará de imensurável consolação e coragem, transmudando nossas lágrimas de sinônimo de angústia em pérolas de fé raciocinada.

            A filosofia Espírita é renovação.

            Não poderemos satisfazer-nos com o brilho externo de seus conceitos inovadores, qual se estivéssemos frente a maravilhosa vitrine de sublimadas criações. Espiritismo não é doutrina salvacionista, isto é, de ingresso garantido a um paraíso desejável. O Cristianismo-redivivo é bússola que nos pede o esforço da mutação interior de valores, sem o dualismo de personalidades que aceitam-mas-não-fazem, acre-ditam-mas-não-se-transformam, pregam-mas-não-realizam .

            “Roteiro” é um roteiro autêntico, a partir de seu prefácio que é um diálogo, cuja resposta nos pertence:

             “Em verdade, meu amigo, terás encontrado no Espiritismo a tua renovação mental. O fenômeno terá modificado as tuas convicções. As conclusões filosóficas alteraram, decerto, a tua visão do mundo. Admites, agora, a imortalidade do ser. Sentes a excelsitude de teu próprio destino. Mas se essa transformação da inteligência não te reergue o coração com o aperfeiçoamento íntimo, se os princípios que abraças não te fazem melhor, à frente dos nossos irmãos da Humanidade, para que te serve o conhecimento? Se uma força superior te não educa as emoções, se a cultura te não dirige para a elevação do caráter e do sentimento, que fazes do tesouro intelectual que a vida te confia?”

            Repetiremos que Emmanuel, representando o continuismo da filosofia Espírita, é pragmático, ou seja, identifica o verdadeiro com o útil; revela a verdade, objetivando a reforma íntima. Não resolve e nem agita problemas: apresenta soluções, orientando o pensamento humano. Por isso, suas indagações são feitas sem ressalva, dialogando com nossa consciência:

            - Para que te serve o conhecimento?

            - Que fazes do tesouro intelectual que a vida te confia?

            A seguir, escreve quarenta preciosíssimas ponderações, no contexto de “Roteiro”, colocando-nos ante as grandezas infinitas do Universo, sem que nos ameace com desfechos derrotistas e amargosos. Sua grandiloquente afirmativa é de que o Universo não vale, para o Pai Celestial, o mesmo que uma simples alma, repleta de paixões e de defeitos e, por isso, a  criatura se reerguerá da posição a que se confiou, no movimento de sua ascensão espiritual.

                                                                       *

            Emmanuel não é grande demais para o nosso tempo.

            Temos de convir que o relógio divino nunca está sequer num segundo adiantado e nem um
segundo atrasado. O seu tempo é sempre tempo justo e, em decorrência, era tempo de Emmanuel, na filosofia Espírita.

            Com Emmanuel, a filosofia Espírita atingiu um cume, permitindo-nos ver mais além, entredivisar detalhes, mensurar esse complexo que se chama vida, projetando-se para o futuro como uma das mais sublimes revelações do Plano Maior.


Roque Jacintho

inReformador” (FEB) Junho 1970


[1] Will Durant, Filosofia de Vida, tradução de Monteiro Lobato, 7ª Edição, Cia Editora Nacional, páginas VIII e IX, de “Convite”.
[2] "Na casa de meu Pai há muitas moradas" -- Jesus.
[3] Allan Kardec, "O Livro dos Espíritos", in "Introdução ao Estudo da Doutrina Espirita", edição da FEB.
[4] Francisco Cândido Xavier, no livro "Emmanuel", do Espírito de Emmanuel, 6ª edição da FEB " página 11.
[5] Obras do Espírito de Emmanuel, psícografadas pelo médium Francisco Cândido Xavier, edições da FEB.


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