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sábado, 9 de dezembro de 2017

Médiuns estáticos e médiuns naturais


Médiuns estáticos e médiuns naturais
Luciano dos Anjos
Reformador (FEB) Abril 1962

Não é o primeiro companheiro de doutrina que nos adverte quanto ao comportamento do médium durante as sessões práticas. Tínhamos a advertência à conta de ponto de vista pessoal e, embora discordássemos, mantínhamos respeitoso silêncio. O comentário que faz critica deve ser sempre muito bem dosado e antes de tudo oportuno, a fim de não gerar decepção. Esta é a maior inimiga da Doutrina, principalmente com relação aos que começam e julgam estar procedendo admiravelmente bem. Abatem-se profundamente e sabem que um confrade presumivelmente tão equilibrado no seu proceder cometeu falta grave; ou, que seu raciocínio, que supunham perfeito, peca pelo desconhecimento de novos dados, antes não compulsados e que encerram verdade mais ampla. É preciso ter cautela para não conduzir o neófito à decepção. Importa inicialmente fortalecer em seu espírito a fé na Doutrina e só depois de senti-lo forte conduzí-lo a outros caminhos, ainda que diametralmente opostos aos que vinha seguindo, desde que seu equívoco seja de forma apenas e não de conteúdo, caso este em que, só então, nosso dever impõe outros modos de ação orientadora. Por isso ouvimos sempre com humildade as admoestações esporádicas de um ou outro companheiro. Agora, entretanto, aqui estamos dedilhando a máquina para tratar de público o assunto. É que as coisas caminham para uma espécie de generalização, cujos resultados não poderão ser os mais auspiciosos. Já são muitos que nos falam do mesmo problema, encarando-o erradamente. E companheiros experimentados, conhecedores do fenômeno espírita, práticos da mediunidade. Afinal, que estará acontecendo? Donde nascem esses dogmas tolos que não melhoram nem pioram o médium? Porque o mau hábito de se criar regrinhas para as sessões chamadas de desobsessão, quando elas devem transcorrer com simplicidade, acima de tudo com normalidade? O desvirtuamento, que agora se generaliza, obriga-nos ao comentário a que até então nos furtávamos.

O médium - dogmatizam - deve comportar-se durante os trabalhos da maneira mais estática possível. Deve colocar as duas mãos espalmadas sobre a mesa e não se mexer, não gesticular, não fazer mímica, não falar alto, não falar difícil, não tirar a cadeira do lugar, não se revirar, não movimentar as pernas. Uma série de proibições lidas e aprendidas ninguém sabe onde que só podem prejudicar o desenrolar da sessão. As recomendações sobre o comportamento do médium existem e também nós as proclamamos. Contudo, é mister que se não confundam aspectos de aprimoramento com aspectos de desprimor . Aurélio A. Valente, no seu muito bem feito livrinho “Sessões Práticas e Doutrinárias do Espiritismo”, recomenda que “para um médium prestar conscientemente e com ótimos resultados o seu concurso, é necessário tornar-se capaz de reprimir todos os gestos violentos e linguagem obscena ou ofensiva dos Espíritos”. Ora, daí à atitude estática vai uma distância quilométrica. É preciso ter em conta sempre que os Espíritos não são seres especiais, essencialmente diferentes dos humanos. Eles vivem a normalidade da vida. E se expressam dentro desta mesma faixa de norma, pelo menos até o plano em que podemos concebe-los à nossa imagem. Gesticulam ao falar, reagem fisionomicamente, alteiam ou abaixam o timbre da voz, movem-se enfim, eis que não são estáticos. Quando das comunicações através dos médiuns, nada há de estranho que transmitam a estes suas características. Aurélio A. Valente, na obra já citada, diz à página 141: “Os Espíritos, ao manifestarem-se, transmitem aos médiuns todos os característicos da sua elevação ou impureza de sentimentos. A asserção é verdadeira e muito lógica. E em sendo assim, nada mais normal e até recomendável que o médium seja um excelente receptor medianímico, permitindo a completa e real transmissão dos característicos da entidade comunicante. Tanto melhor para os trabalhos, para o presidente da sessão ou o doutrinador, para auxiliar o Espírito que sofre, para o progresso do Grupo ou Centro, enfim, para a fidelidade da mensagem mediúnica.

A esse respeito, aliás, tivemos a oportunidade de palestrar com o presidente do Grupo Ismael, que endossou nosso ponto de vista e até afiançou que naquelas reuniões as manifestações são procedidas dentro do critério que esposamos, sem quaisquer regrinhas para postura, colocação das mãos, imobilidade, ou o que seja no sentido de enquadrar o médium em padrões de extravagância e falsas interpretações dos ditados do Invisível.

Tais preceitos que vimos de criticar tiveram, talvez, sua origem na recomendação - esta, sim, justíssima e acertada - para que o médium não se deixe dominar pelos Espíritos, procurando conter todo os excesso de palavra, de gesticulação e movimento. Que se não deixem as entidades de pouca luz ofender quem quer que seja; não se permitam a transmissão do calão, o termo obsceno; não se deixem as expansões prejudiciais de gestos grosseiros, extremos, ou, simplesmente, a mobilização do sensitivo para fora da mesa de trabalho. Feitas estas abstrações, nada mais recomendável, ao contrário, que o Espírito se mostre tal como é. Nenhum prejuízo existe se lhe sabe bem acompanhar o que diz com ademanes moderados. Nada há de errado que se transfigure, sem exageros para revelar seu pensamento. No instante em que um Espírito se incorpora num médium e inicia sua conversação, devemos aceitar o quadro como se dois encarnados ali estives sem confabulando normalmente. Ora, ninguém conversa com ninguém feito estátua. Os excessos todos são proibidos, tanto para mais quanto para menos. A super excitabilidade é tão negativa quanto a paralisia. Precisamos todos acabar com as regras esdrúxulas e às vezes até exóticas que vão pouco a pouco, infelizmente, artificializando uma Doutrina que, afinal e em última análise, é de origem simples. natural, pura, sem convenções ornamentais que, de útil, nada trazem para os encarnados ou para os desencarnados.


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