Pesquisar este blog

sexta-feira, 17 de maio de 2019

A criança e a escola


A Criança e a Escola
por Guerra Junqueiro
Reformador (FEB) Janeiro 1920

            Eu sinto uma tristeza imensa quando vejo as grades de uma cadeia ou as portas de uma escola má.

            Dois cárceres.  Um é corolário do outro: a ignorância produz o crime, a má escola produz a cadeia.

            Os povos têm um coração: é a escola. Escola boa, boa saúde.

            Matusalém estuda o alfabeto. Se não fosse triste, seria ridículo.

            Trabalhemos. Alongar a escola é diminuir o cárcere. Quereis garantir o direito, a paz,  a civilização? Prendei o espírito na jaula da Verdade.

            Quereis suprimir o cárcere? Metei dentro a escola.

            À noite iluminam-se as ruas por causa dos ladrões.

            Quereis segurança? Acendei os espíritos e apagai os candeeiros.

            Menos enxovias (cárceres) mais argumentos!

            É para as almas delicadas um quadro doloroso ver as crianças durante seis horas na  escola, sentadas, imbecis.

            A criança, cujo organismo físico e moral requer imperiosamente a agitação cujo sangue é áspero, vivaz, inquieto, petulante; a criança que é toda feita de alegria viva, de movimento rápido, de vibrações aladas, não pode estar um dia inteiro estupidamente constrangida numa posição bestial e monástica.

            Pobres flores! Dobram-lhe as espinhas sobre um livro árido, seco, abstrato, amolecem-nas com o repouso forçado, e quando sonolentas e cansadas, levantam a vista do livro, que não entendem, para espreitarem pela janela uma nesga do céu, encontram diante de seu olhar humedecido o terno, o olhar dogmático de um professor pedante.

            Vamos! Deixai que corram as crianças!

            Saturai-as de luz. Equilibrai-lhes o sistema nervoso. Dai-lhes força, movimento, harmonia e liberdade.

            Uma criança é uma avezinha.  

            Quereis modelar a escola?

            Não copieis o claustro, imitai o ninho.

            É por isso que as crianças quando saem da aula tem uma alegria vibrante, radiosa, alucinada; gritam, soltam, trepam as árvores, roubam os ninhos, apedrejam os cães, correm, desaparecem, voam como pássaro que fugiu da gaiola.

            Voam, sim, a alegria tem asas. É a natureza que protesta.

            A natureza! Palavra santa.

            É o berço do mundo. Fora dela não há ciência nem religião.

            Quando o homem a desprezou fez-se a noite da história- a idade média.

            A luz tornou-se penumbra, o pensamento sonho.

            Foi o eclipse da alma, entre ela e Deus levantou-se o terror, fechou-se o espírito e abriu-se o claustro!

Nenhum comentário:

Postar um comentário