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sexta-feira, 3 de junho de 2011

'Exemplificação Transcendental'


Exemplificação Transcendental
Albert Schweitzer
(Página recebida pelo Médium Gilberto Campista Guarino,
na reunião pública de 19-7-74, na FEB, no Rio de Janeiro, RJ)
Reformador(FEB), pág. 278 -  Dezembro 1975

            ...E, pelas dificuldades ocasionadas pelo burburinho do recenseamento ordenado por César augusto, por não haver lugar nas hospedarias, Maria retirou-se para a gruta, onde o Senhor veio ao mundo.
            Assim foi... assim narra o Evangelho da natividade. Envolto em panos, na humildade da manjedoura, rodeado pelos simples de toda natureza, deu-se na Terra um dos mais magnificentes acontecimentos do Universo. Como Espírito puro dentre os mais puros, o Senhor abraçou o mundo, na condição de exemplificador sublimado., mostrando a luz eterna sob a capa de profundo simbolismo, como dantes nunca teve notícias a humanidade, resguardando seu brilho com a nuvem da compaixão do homem.
            Como médico, curou os corpos onde estavam prisioneiras as almas em estado propício à convalescência moral e espiritual, aconselhando a outras que se retirassem para o sofrimento, sob a vergastada do próprio látego. Nas Bodas de Caná, apresentou à multidão reunida à sua volta o vinho improvisado para os olhos humanos, declarando entre as linhas da ação exterior a certeza de que a fé remove montanhas de qualquer forma e a qualquer pretexto. Trouxe à luz do Sol o filho da viúva de Naim, afirmando nas entrelinhas que todos os estados da natureza humana são passíveis das mais diversificadas modificações, obedecendo às nuanças que, pelo pensamento, o próprio ser vivente imprime aos centros do coração. Exemplificou, entre os doutores da Lei, deixando-os pasmados em face da sabedoria angelical que evidenciava. Com isso, assegurou à humanidade a fugaz expressão da idade biológica e a profunda preponderância da manifestação do Espírito. Demonstrou o quanto de instável possuem os padrões impingidos ao coração desde a forja do egoísmo degradador a que se submetem. Trouxe sempre vida: nunca pregou o pessimismo e constituiu-se na mais tangível  das realidades, conquanto fosse a estrela mais translúcida dentre as que brilham no céu da noite. Trouxe a espada, mas não foi apologista da guerra, ou da guerra santa, porque considerou que o argumento da guerra não transcende a própria origem pela simples aspersão da água benta, imposta pelos rituais humanos. Abriu luta, luta renhida, tendo como única arma a contundência sublime da palavra da verdade. Não houve pedra do mal que lhe suportasse o bater constante da água da vida, sobre a dureza de seus corpos agressivos. Na última ceia, configurou a aceitação da dor pelo agradecimento da satisfação frugal na refeição efetuada. Finalmente, subindo ao Calvário, quando as nuvens cinzentas cobriam o Sol da Terra física, mas não lograram empanar o brilho da estrela maior, carregou o patibulum, e não deixou as expressões angustosas da via crucis para reagir, aos gritos, contra o desmando estabelecido pela fereza obsessiva do homem. Foi pregado à cruz infamante, mas santificou o madeiro, transformando-o em símbolo de redenção, erguendo aos céus os olhos esplendorosos...  E da hora sexta à hora nona trevas sobre o mundo.
            Se Bhudda e Maomé foram emissários especiais para a expressão da verdade a porções de terra habitadas e atidas aos condicionamentos lingüísticos e costumeiros, só Jesus falou aos próprios anjos, e só ele foi o emissário de Deus para o mundo. Meditar no aroma impenetrável dessa flor incompreendida para a maior parte dos homens é compreender que foi ele uma paisagem superior que nos deu o exemplo da redenção. Emissário de Nosso Pai, expressou-lhe o pensamento, pois que é filho unigênito do Criador Incriado, condicionado apenas ao amor como lei natural do Universo puro em que vive.
            Antes de deixar ecoar a palavra da precipitação, que nos afasta do Pastor nosso, porque o acreditemos longe demais de nossa incrível veemência no erro, alimentemos intensamente a certeza de que, se o transcendentalismo dessa exemplificação foge aos condicionamentos do mundo, a verdade estabelecida nesse exemplo está em nós mesmos, porque o divino e o transcendental são as bases de uma expressão única: a incentivação de nossos sentimentos bons, que liga nosso plano de sombras às luzes fulgurantes do além-mal. Transcendentalizar o exemplo é unir duas expressões da verdade: o engano de nossa parte e a certeza do bem universal.

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