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quinta-feira, 30 de abril de 2015

Os segredos do túmulo

Os segredos do túmulo 

Frederico Francisco 
/ (Yvonne A. Pereira)


Reformador (FEB)  Maio 1972

            Temos recebido cartas de aprendizes da Doutrina Espírita tratando de um ponto doutrinário dos mais melindrosos, que alarma o leitor iniciante quando não bem esclarecido.

            É de notar, porém, que, com tantos livros excelentes, existentes na bibliografia espírita, como os livros assinados por um Allan Kardec, um Léon Denis, um Ernesto Bozzano, um Gabriel Delanne, um Conan Doyle, um Alexandre Aksakof e tantos outros de idêntico renome, há quem se embrenhe em dúvidas incomodativas sobre pontos que, comumente, acarretam erros de interpretação que o impedem de distinguir o verdadeiro do falso. Está-nos a parecer, pois, que determinados leitores desprezam o verdadeiro estudo doutrinário, preferindo aceitar o Espiritismo por ouvirem dele falar. Depreende-se, então, que as obras de base, dos variados autores citados, nunca foram consultadas, ou o foram superficialmente, o que é lamentável e quiçá prejudicial ao prestígio da própria Doutrina. O certo é que têm chegado às nossas mãos consultas em que leitores fazem as seguintes perguntas:

            “Um Espírito que foi abnegado quando encarnado, que praticou o bem e o amor ao próximo e viveu para a caridade, ao desencarnar poderá sofrer o fenômeno da retenção no cadáver, supondo-se sob a terra junto dele, sentindo-se devorar pelos vermes que roem o corpo a decompor-se? É isso possível? Para que se há de, então, ser bom e abnegado neste mundo, se a desencarnação se processa idêntica à dos grandes criminosos? Não valerá mais a pena gozar-se a vida do melhor modo possível, do que sacrificar--se, uma vez que nem a abnegação livrará dos tormentos, na vida invisível?”

            Lembraremos aos prezados missivistas justamente o que os códigos responsáveis pela Doutrina autêntica esclarecem a respeito e também o que o senso e as sessões sérias, legítimas, de Espiritismo prático mostram à observação. Jesus definiu o nosso destino em geral com a irreversível sentença: “A cada um será dado segundo as próprias obras”. Em mais de uma passagem evangélica, somos informados do que nos aguarda na existência de além-túmulo, em consonância com o nosso gênero de vida neste mundo, e Allan Kardec, o mestre escolhido pelo Alto para instrutor terreno da Nova Revelação, dá os seguintes esclarecimentos em “O Livro dos Espíritos”, além de outros pormenores dignos de serem relembrados (Cap. III, questões 149 a 165):

            “A observação demonstra que, no instante da morte, o desprendimento do perispírito não se completa subitamente; que, ao contrário, se opera gradualmente e com uma lentidão muito variável conforme os indivíduos. Em uns é bastante rápido, podendo dizer-se que o momento da morte é mais ou menos o da libertação. Em outros, naqueles sobretudo cuja vida foi toda material e sensual, o desprendimento é muito menos rápido, durando algumas vezes dias, semanas e até meses, o que não implica existir, no corpo, a menor vitalidade, nem a possibilidade de volver à vida, mas uma simples afinidade com o Espírito, afinidade que guarda sempre proporção com a preponderância que, durante a vida, o Espírito deu à matéria. É, com efeito, racional conceber-se que, quanto mais o Espírito se haja identificado com a matéria, tanto mais penoso lhe seja separar-se dela; ao passo que a atividade intelectual e moral, a elevação dos pensamentos operam um começo de desprendimento, mesmo durante a vida do corpo, de modo que, em chegando a morte, ele é quase instantâneo.”

            Tal o resultado dos estudos feitos em todos os indivíduos que se têm podido observar por ocasião da morte. Essas observações ainda provam que a afinidade, persistente entre a alma e o corpo, em certos indivíduos, é, às vezes, muito penosa, porquanto o Espírito pode experimentar o horror da decomposição. Este caso, porém, é excepcional e peculiar a certos gêneros de vida e a certos gêneros de morte. Verifica-se com alguns suicidas” (155).

            “Muito variável é o tempo que dura a perturbação que se segue à morte. Pode ser de algumas horas, como também de muitos meses e até de muitos anos. Aqueles que, desde quando ainda viviam na Terra, se identificaram com o estado futuro que os aguardava, são os em quem menos longa ela é, porque esses compreendem imediatamente a posição em que se encontram.”

            “A perturbação que se segue à morte nada tem de penosa para o homem de bem, que se conserva calmo, semelhante em tudo a quem acompanha as fases de um tranquilo despertar. Para aquele cuja consciência ainda não está pura, a perturbação é cheia de ansiedade e de angústias, que aumentam à proporção que ele da sua situação se compenetra” (165).

            Compreende-se, pois, que o indivíduo de vida normal (não precisa nem mesmo ser abnegado) tem o despertar mais ou menos tranquilo na vida espiritual; que somente os criminosos, os sensuais, que viveram da matéria e para a matéria, certos tipos de suicidas e vítimas de outras mortes violentas passam pelos penosos fenômenos acima citados. Salvo exceções que somente o conhecimento minucioso do processo pode explicá-las. Por sua vez, o genial analista Ernesto Bozzano, em suas preciosas monografias “A Crise da Morte” e “Fenômenos Psíquicos no Momento da Morte”, esclarece de modo insofismável o assunto, dando-nos a compreender que o despertar do indivíduo de caráter normal, em além-túmulo, é tranquilo, e até feliz e que, portanto, o “abnegado”, sendo superior ao normal, certamente melhor ainda terá o seu despertar, a menos que se trate de um refinado hipócrita que enganou o mundo e pretendeu enganar também a Deus.

            Além do mais, o que presenciamos nas sessões práticas de Espiritismo, quando bem organizadas, outra coisa não nos dá a compreender senão o seguinte: em princípio, só os maus, os devassos, os suicidas sofrem penosas situações após a morte. Os normais, os bons, os virtuosos despertam tranquilamente, felizes, “antegozando as delícias da vida espiritual”. Um Espírito que neste mundo viveu para o bem do próximo, que foi ao sacrifício da abnegação, muito provavelmente não experimentará os “horrores da decomposição” do próprio cadáver, pois já era, com certeza, desprendido das coisas terrenas antes da desencarnação, já vibrava em harmonia com a lei de Deus e, portanto, praticava o intercâmbio mental com os bons Espíritos. A não ser que, malgrado toda essa conquista, guarde ainda afinidades muito fortes com o corpo somático ou com deleites materiais que cercam a existência no planeta terreno, como acentuou Kardec. Não se pode esquecer jamais que, em Espiritismo, não há regras. Cada caso é um caso diferente.

            Será, pois, de utilidade para todos, constantes consultas às obras de base, maior observação nos ensinamentos superiores dos Espíritos, mais atenção ao que se passa nas sessões chamadas “de caridade”, pois tudo isso é necessário ao esclarecimento doutrinário. 


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