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quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

Mas os tempos não mudaram

 


Mas os tempos não mudaram

Percival Antunes (Indalício Mendes)   

Reformador (FEB) Outubro 1963

             O mal de muita gente que lê o Evangelho é não separar o coberto do encoberto, isto é, não desvendar o que está oculto para compreender o verdadeiro sentido de certas passagens do Livro santo. Daí, então, muitas incongruências e não poucos absurdos na interpretação das palavras do Cristo.

            O Espiritismo, entretanto, que foi o primeiro a interpretar o Evangelho em espírito e verdade, lançou e solidificou as bases da interpretação correta, a qual vem, felizmente, espalhando bons frutos e encontrando seguidores, ainda que, muitas vezes, silenciem quanto ao aprendizado feito através das obras editadas pela Federação Espirita Brasileira.

            Nem sempre Jesus achou conveniente falar claro, numa época em que os preconceitos religiosos eram ferozes e a intolerância não cedia diante de qualquer argumente sensato. E a prova disto foi que, apesar de tudo, Jesus se viu insultado, perseguido, maltratado e, por fim, imolado por homens que colocavam, acima da Verdade integral que ele pregava, as suas “verdadezinhas” restritas, originadas de dogma estreitos que religiões paganizadas erravam para poderem dispor despoticamente da vontade do povo e, assim, na maioria dos casos, permitir que os apetites políticos dos dominadores aliados a chefes religiosos fossem fartamente satisfeitos.

            Como poderia Jesus, naqueles tempos, falar claro e ser claramente compreendido se os seus ensinamentos muitas vezes ultrapassavam o grau de compreensão e de Inteligência da época? Foi por isso que Ele recorreu a parábolas, a fim de que as suas lições pudessem ser aproveitadas por aqueles que eram exceção naquele ambiente e ficassem para a edificação dos homens do futuro.

            Em “Os Quatro Evangelhos”, de Roustaing, essa obra prodigiosa editada pela Federação Espírita Brasileira, e indispensável à cultura espírita dos estudiosos e também ao perfeito entendimento da Mensagem do Cristo, encontraremos este trecho elucidativo:

             Para ser compreendido e sobretudo atendido, para que sua missão fosse aceita e produzisse frutos, ele teve que velar a sua linguagem, apropriando-a, assim como seus atos, ao estado das inteligências da época, aos preconceitos e tradições que, mediante as profecias da lei antiga, lhe haviam preparado o advento. Teve que apropriá-los também às aspirações dos homens e ainda, como condição e meio transitórios de progresso, ao objetivo e às exigências das crenças que se desenvolveram durante e após o desempenho da sua missão terrena. Foram essas crenças que fizeram dele, sucessivamente, um homem como os demais, durante todo o tempo daquela missão; um profeta, quando entrou a desempenhá-Ia publicamente; depois, terminado o desempenho dela, um homem-Deus, atribuindo-lhe a divindade: homem, como os outros, porque revestido do corpo material do homem da Terra, porque nascido de mulher, e Deus, porque filho de Deus, fração, ainda que inseparável do Deus uno, do Deus criador incriado, imutável, eterno, infinito – igual,  portanto, a Deus. Assim é que fizeram o corpo de um homem, corpo finito, circunscrito, conter o infinito. Assim é que fizeram do Deus uno um homem sujeito à morte como os que habitam a Terra, que submeteram à vida e à morte, em um corpo material e perecível como os deles próprios, o Eterno, único eterno - Deus, que é, foi e será imortal, desde toda a eternidade, que só ele possui, desde toda a eternidade, a imortalidade.” (ob, cit. págs. 92/3 - IV vol. - Ed. 1954).

            Nessas poucas linhas transcritas, que mundo de ensinamentos! Ninguém poderá julgar-se bem enfronhado no estudo da Doutrina Espírita sem estudar esse complemento magnífico do pentateuco kardequiano. Em “Os Quatro Evangelhos”, afora a soberba explicação - soberba e racional - acerca do corpo fluídico de Jesus, há passagens exegéticas que extasiam o espírito, pois reafirmam as verdades do Evangelho.

            O Espiritismo fala claro, é explícito, simples, franco, positivo, mas ainda não é entendido e aceito por homens que se dizem sábios, que se intitulam cientistas, que inventam teorias e nomes extravagantes para explicar o que já se acha explicado nas obras espíritas e acabam não chegando a qualquer resultado satisfatório, porquanto, partindo de premissas falsas, terão que alcançar conclusões igualmente falsas...

            Para esses sábios, o Espiritismo está errado.

            Não existem Espíritos, não há mediunidade, nem sobrevivência da alma. E palmilham o terreno escorregadio de outros sábios e acabarão, também como eles, sem atinar com a realidade dos fatos psíquicos, porque, não aceitando a insofismável realidade espírita, emaranham-se em teorias absurdas e complicadas. Geralmente, acabam por silenciar, porquanto, a muitos, falta coragem para adotar a única atitude digna compatível com a personalidade dos verdadeiros sábios: confessar sua ignorância e seus preconceitos, declarando com humildade que o Espiritismo é que está certo.

            A verdade é que eles passam, deixam seguidores teimosos e estéreis, enquanto o Espiritismo prossegue em sua marcha vitoriosa esclarecendo a Humanidade e a ela apontando o verdadeiro caminho da compreensão. A Doutrina Espírita faz o homem compreender a razão da sua presença na Terra, a origem de suas dores, os meios de superá-Ias na luta incessante pela perfeição. Ao mesmo tempo, apurando-lhe a personalidade moral, prepara-o para a vida terrena e para a vida espiritual. Dessa forma, quer queiram, quer não, a Doutrina Espírita é legitimo e valioso curso de relações humanas.

            Jesus encontrou ignorância, orgulho, vaidade, arrogância, maldade e intolerância. O Espiritismo, que é o Paracleto referido pelo Mestre, tem tido os mesmos desafetos, os mesmos perseguidores, os mesmos detratores, mas levará avante a sua missão eminentemente cristã, verdadeiramente cristã. Os tempos não mudaram muito quanto às ideias. Apenas hoje já se tem liberdade de pensamento e não se leva ninguém à morte na fogueira por professar diferente crença religiosa.


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