quarta-feira, 29 de abril de 2020

A imanência cristã do Espiritismo



A imanência cristã do Espiritismo
por Indalício Mendes
Reformador (FEB) Junho 1966

            Evidentemente, o Espiritismo kardequiano é e sempre foi cristão, o que é fácil verificar, porquanto, já em “O Livro dos Espíritos”, aparecido em 1857, 1ª edição, lia-se, na: “'Introdução”': “A moral dos Espíritos superiores se resume, como a do Cristo, nesta máxima evangélica: Fazer aos outros o que quereríamos que os outros nos fizessem, isto é, fazer o bem e não o mal.” Ora, só o ato de mencionar o Cristo e a máxima evangélica seria suficiente para identificar a natureza lidimamente cristã do Espiritismo.

            Todavia, nele há comunicações subscritas por eminentes Espíritos que, na Terra, foram expoentes do Cristianismo, como se poderá ler no final de "Prolegômenos", no capítulo que trata “Das penas e gozos futuros”, terminando desta maneira essa obra magistral: “Por bem largo tempo os homens têm estraçalhado e anatematizado mutuamente em nome de um Deus de paz e misericórdia ofendendo-o com semelhante sacrilégio. O Espiritismo é o laço que um dia os unirá, porque lhes mostrará onde está a verdade, onde o erro. Durante muito tempo, porém, ainda haverá escribas e fariseus que o negarão, como negaram o Cristo. Quereis saber sob a Influência de que Espíritos estão as diversas seitas que entre si fizeram partilha do mundo? Julgai-o pelas suas obras e pelos seus princípios. Jamais os bons Espíritos foram os instigadores do mal; jamais aconselharam ou legitimaram os ódios dos partidos nem a sede das riquezas e das honras, nem a avidez dos bens da Terra. Os que são bons, humanitários e benevolentes para com todos, esses os seus prediletos e prediletos de Jesus, porque seguem a estrada que este lhes indicou para chegarem até ele.”

            Sabem quem deu tão preciosos conselhos? O Espírito daquele que, na Terra, foi chamado “Santo Agostinho”. Uma vez liberto dos liames da carne, conheceu a verdade integral na Espiritualidade e veio dar testemunho valioso da importância do Espiritismo.

            Mas as obras codificadas por Allan Kardec continuaram a afirmar a imanência cristã do Espiritismo. Em “O Livro dos Médiuns” o espírito verdadeiramente cristão está presente em suas páginas, inclusive também no capítulo das “Dissertações Espíritas”. Isto, desde a primeira edição dessa obra, em 1861. Corroborando a sua natureza eminentemente cristã, surgiu, em 1864, “O Evangelho segundo o Espiritismo”, todo ele dedicado à interpretação dos textos evangélicos, desprezando fantasias e alegorias inúteis, afastando o véu da letra e pondo a descoberto o espírito oculto nas palavras do Cristo.

            Nem precisaria mais nada para comprovar que o Espiritismo é cristão, muito mal cristão que certos credos que cada vez mais se afastam de Jesus, apesar de se inculcarem seus intérpretes, dizendo-se seus fiéis seguidores. Dizem, mas não sentem o que dizem. São cristãos dos lábios para fora e seus atos geralmente negam as palavras que proferem. Não estamos fazendo acusações, porque a História e os fatos mais corriqueiros da vida diária ai estão para confirmar nossas afirmativas.

            Sendo o Espiritismo realmente do Cristo, claro que tudo quanto promana de suas fontes puras é cristão. Prova-o outro livro – “O Céu e o Inferno”, também subscrito por Allan Kardec, aparecido pela primeira vez em 1865, no qual estuda a questão das penas e recompensas futuras, explica o que é céu e inferno, sem a encenação terrível que durante séculos, trouxe a Humanidade sob o látego do terror e a lançou nas garras da superstição e da intolerância. Esse livro tem como subtítulo “A justiça divina segundo o Espiritismo”. Nele se revela que a justiça de Deus não é esse amontoado de iniquidades e incoerências que religiões ditas tradicionais impingiram à Humanidade, dominando-a pelo medo, pela ignorância e pela força, em vez de a atrair e instruir pela explanação simples e clara das leis divinas e pelo amor que deve ser o ponto de partida e o fim de tudo quanto se relaciona com o homem e a vida humana.

            Todavia, não estava ainda finda a exemplificação dos Espíritos através de Allan Kardec, quanto à realidade cristã do Espiritismo. Por isso, em 1868, era dada à luz da publicidade a primeira edição de “A Gênese – os milagres a as predições segundo o Espiritismo”. O trigo dourado da verdade foi também debulhado cuidadosamente nesse livro, que derrubou definitivamente ideias absurdas e errôneas, predominantes no mundo religioso. O capítulo referente ao “Caráter da revelação espírita” está este magnífico trecho: “o que caracteriza a revelação espírita é o ser divina a sua origem e da iniciativa dos Espíritos, sendo a sua elaboração fruto do trabalho do homem.” É obra interessantíssima e de inavaliáveI utilidade, principalmente para quem deseja ampliar seus conhecimentos a a respeito da religião. O mesmo valor tem o livro “Obras Póstumas”, aparecido em 1890, assim como a “Revue Spirite” que Kardec fundou e onde desenvolvia comentários pertinentes ao Espiritismo, fixando pontos antes duvidosos de religiões e seitas pseudo-cristãs, mostrando a simplicidade e a grandeza doutrinária do Espiritismo, iríamos longe, muito longe, sem pormos de lado as obras e os artigos que Kardec subscreveu. Citaríamos ainda, se indispensável, a vastíssima fileira de obras espíritas, de Emmanuel, André Luiz, etc., etc., etc.

            Podemos, ainda, ressaltar o papel desta Revista no ingente trabalho de propaganda, pregação evangélica e difusão doutrinária, e que tem como lema esta trilogia da Federação Espírita Brasileira; “Deus Cristo e Caridade”, sendo apresentada como órgão religioso "de Espiritismo Cristão".

            Demonstramos, parece-nos, a origem e a imanência cristã do Espiritismo, através das obras da codificação kardequiana. O assunto, pormenorizado, daria grosso volume, porque, então, poderíamos juntar exemplos sobre exemplos, citações inúmeras, salientar o trabalho de assistência espiritual e material realizado por espíritas e instituições espíritas, trabalho todo ele orientado segundo as diretrizes evangélicas. O mestre Allan Kardec se referiu com firmeza a “espírita cristão” e a “Espiritismo Cristão”, mas coube justamente ao seu insigne seguidor - J. B. Roustaing - apresentar, na monumental obra "Os Quatro Evangelhos", que está fazendo agora cem anos, a expressão “Cristão Espírita”.

            Não se trata, porém de criação humana, conforme se poderá verificar do trecho que vamos transcrever abaixo, com a comunicação subscrita por “Isabel”, na qual é evidente ter vindo de Jesus tal expressão, recentemente lançada no Brasil.

            No segundo tomo de “Os Quatro Evangelhos”, edição de 1954 da Federação Espírita Brasileira, às páginas 69 e 70, comentar sobre os Cap. VII, v. 21-29, de Mateus, e Cap. VI, v. 46-49, de Lucas – “Deus julga pelas obras”, lemos:

            Nem todos os que dizem: Senhor, Senhor, entrarão no reino de Deus. As palavras morrem no espaço sem chegar ao Senhor quando não têm por apoio os atos. Portanto, praticai sempre o que ensinais, o que admirais, o que louvais. Não bastará que admireis a lei de Jesus, que digais: ela é perfeita, se nada fizerdes por cumpri-la e por vos aperfeiçoardes. Não vos bastará dizer: somos cristãos, se obrardes contra a vontade do Cristo. Não vos bastará declarar: somos espíritas, se continuardes a ser o que éreis antes.  Não bastará declareis: somos médiuns e usamos das nossas diversas faculdades mediúnicas, se não praticardes os ensinamentos recebidos, se não puserdes cordial e intencionalmente essas faculdades ao serviço da casa de Deus, do melhoramento moral dos vossos irmãos, dando-lhes o exemplo dos esforços constantes e porfiados que empregais por vos melhorardes pessoalmente, se não vos utilizardes com humildade e desinteresse  dessas mesmas faculdades para o fim exclusivo de fazer propaganda séria, útil, eficaz, da lei de Jesus e da sublime doutrina dos Espíritos do Senhor que, despojando da letra o Espírito, vem explicar essa lei, fazê-la compreensível, amada, praticada, preparando o cumprimento das promessas do Mestre.

            Hoje, e sobretudo a vós, espíritas, a prática é necessária.

            Quem quer que haja enveredado por esse caminho fique certo de que não mais pode deter-se, de que não mais deve desviar-se, porquanto muito lhe tendo sido dado, muito lhe será pedido. Não terá desculpa. Não o protege mais o véu da ignorância, pois que a luz o rasgou. Tão pouco lhe servirá de escusa a sua fria indiferença. Dele se aproximou a caridade para aquecê-lo. Se o coração se lhe conserva enregelado é porque o quer.

            Ao espírita muito será reclamado. Que ele, portanto, se prepare para prestar contas exatas do que lhe foi confiado.

            No momento em que estas palavras acabavam de ser escritas, o médium, colocado espontaneamente sob nova influência medianímica, escreveu, com uma grafia diferente e magistral, o seguinte:

            Não basta se diga que certa moral é sublime; cumpre seja posta em prática. Não basta ser-se cristão e mesmo cristão-espírita, se se não pratica a moral por mim ensinada (1), Assim, pois, que os que querem entrar no reino de meu pai sejam seus filhos pelo coração e não pelos lábios, obedeçam com submissão, zelo e confiança às instruções que recebem e recebam hoje dos Espíritos enviados, de acordo com as minhas promessas, para ensinarem progressivamente aos homens todas as coisas, para conduzi-los à verdade e lembrar-lhes o que eu lhes disse.

            Que digam: Senhor, Senhor! mas que o digam do fundo de seus corações; que seus atos correspondam às suas palavras e o reino dos céus lhes pertencerá.

            Por aquele cuja mão protetora sustenta os humildes e os fracos e humilha os orgulhosos e poderosos. ISABEL.”

            Depois, também de modo espontâneo, o médium escreveu mediunicamente, e em caracteres idênticos aos com que fora traçado o ensinamento que acabava de ser recebido, esta última comunicação:
  
            Bendizei ao Senhor a graça que vos fez e pedi-lhe, de coração, o apoio daquele que se manifestou hoje por intermédio do seu enviado. Perseverai no caminho que trilhais, tende confiança e fé, mas fé séria, e o Senhor estenderá suas mãos por sobre vós, para afastar os obstáculos que vos pudessem deter.” João, Mateus e Lucas.

            Nada devemos dizer depois do que acabamos de reproduzir. Os que tiverem coração de sentir, sentirão no recesso da sua alma as repercussões singulares de tão belas, profundas e significativas comunicações vindas de MAIS ALTO.

            (1 ) Ver J. B. Roustaing – “Révelation de la Révelation” Les Quatre Evangiles – 1er vol. - 1866 - Page 386: "...il ne suffit pas de dire qu'une morale est sublime, il faut la mettre pratique; il ne suffit pas d'être Chrétien et même christo-spirite, si l’on ne pratique pas le morale enseigné par moi.”

Nenhum comentário:

Postar um comentário