ANTOLOGIA UBALDIANA - 17
A GRANDE SÍNTESE
CAPÍTULO 73. FISIOLOGIA SUPRANORMAL
- HEREDITARIEDADE FISIOLÓGICA E HEREDITARIEDADE PSÍQUICA -
Somente estes conceitos de vida psíquica podem guiar a ciência até às portas de uma ultrafisiologia, ou fisiologia do supranormal, como a vedes despontar nos fenômenos mediúnicos. Aqui as relações entre matéria e espírito são imediatas: o psiquismo modela uma matéria protoplasmática mais evoluída e sutil: o ectoplasma. A nova construção, antecipação evolutiva, não possui, naturalmente, a resistência das formas que se estabilizaram por uma vida longa; seu desfazimento é rápido. As estradas novas e de exceção ainda são anormais e inseguras. Os produtos da fisiologia supranormal que emergem dos caminhos habituais da evolução, necessitam fixar-se, por tentativas e longas repetições, na forma estável. Tudo isso vos lembra o raio globular, retorno atávico de um passado superado. Ao invés, o ectoplasma é um pressentimento do futuro, corresponde àquele processo de desmaterialização da matéria, de que falamos. A matéria química do ectoplasma corresponde a uma avançada desmobilização dos sistemas atômicos em movimentos vorticosos, ao longo da escala de elementos, para pesos atômicos máximos. O fósforo (peso atômico 31), corpo sucedâneo, aceito apenas em doses moderadas no círculo da vida orgânica, é tomado aqui, no avançado movimento vorticoso, como corpo fundamental, ao lado do H (1), C (12), N (14), e O (16). A plástica da matéria orgânica, por obra do psiquismo central diretor, torna-se cada vez mais imediata e evidente. Tudo isso vos explica a estrutura falha de muitas materializações espíritas, que suprem a incompleta formação de partes, com massas uniformes de substância ectoplasmática, com aparência de panos ou véus. Tudo revela a tentativa, o esforço, a imperfeição do que é novo. Isso vos faz compreender como o desenvolvimento do organismo, até à forma adulta, seja apenas uma construção ideoplástica, realizada pelo psiquismo central, através dos velhos e seguros caminhos tradicionais percorridos pela evolução.
A rede de fatos e
concomitâncias restringe-se cada vez mais em torno deste inegável psiquismo. Só
ele vos dá a chave do fenômeno da hereditariedade 14. Fenômeno
inexplicável, se olhado apenas em seu aspecto orgânico, como o faz a ciência.
Para ser compreendido, tem que completar-se com o conceito de uma
hereditariedade psíquica. Como podem os órgãos, sujeitos a contínua
renovação, até um final e definitivo desfazimento, conservar indefinidamente
características estruturais e transmitir aptidões prenatais a outros
organismos? Os registros no instinto — mesmo os mais importantes — ocorrem
depois do período juvenil da reprodução, no indivíduo adulto, por vezes
justamente na velhice (a máxima maturidade psíquica). Como podem, numa
natureza tão previdente e econômica, justamente serem perdidas as melhores
ocasiões? Ou não será que a hereditariedade segue outros caminhos, os
psíquicos, pelos quais o material recolhido é confiado à sobrevivência do
princípio espiritual, em lugar dos caminhos orgânicos da reprodução? Não vimos
que esse era o nó que amarrava, numa explicação única, todos os fenômenos do
instinto, da consciência, da evolução psíquica? Quem, senão o espírito imortal,
pode manter o fio condutor que, através de um contínuo nascer e morrer de
formas, dirige o desenvolvimento da evolução? Que fio, senão esse, saberia
atingir as superiores construções da ética?
Esse conceito de
hereditariedade psíquica conduz à conclusão inevitável, já agora preparada por
muitos fatos para poder ser negada, da sobrevivência de um princípio psíquico
depois da morte, isso tanto no homem como nos seres inferiores, que não foram
deserdados pela justiça divina — embora irmãos menores e de forma diferente —
dos direitos da sobrevivência. Se o psiquismo já foi demonstrado como parte
integrante dos fenômenos biológicos — como princípio ao qual são confiados os
últimos produtos da vida e a continuidade do transformismo evolutivo, como
unidade diretora de todas as suas formas sucessivas — é óbvio admitir que ele,
tal como sobrevive à morte orgânica, deva preexistir ao nascimento. Esse
equilíbrio de momentos contrários é necessário na harmonia de todos os
fenômenos; na indestrutibilidade da substância, já demonstrada em todos os
campos, tudo é continuação e retorno cíclico. O universo não pode ser arrítmico
em nenhum ponto, nem em nenhum momento. Resulta, pois, absurdo o conceito de
uma Divindade submetida à dependência de dois seres, cuja união deva aguardar,
para ser obrigada, quando eles o queiram, ao trabalho da criação de uma alma.
Não se pode conceder à criatura tal poder de decisão. No tempo ilimitado,
que acúmulo de unidades espirituais através da vida! Onde se completaria o
ciclo e se restabeleceria o equilíbrio?
A própria
hereditariedade oferece-vos fenômenos doutro modo inexplicáveis. Sem este
conceito, tudo se torna incompreensível e ilógico; com ele, tudo fica claro,
justo, natural. Por vezes, os filhos superam os pais; os gênios nascem quase
sempre de ancestrais medíocres. Como poderia o mais ser gerado pelo menos. Os
caracteres distintivos da personalidade exorbitam de cada hereditariedade, à
qual vedes que estão confiadas mais as afinidades orgânicas que as psíquicas.
Vimos a gênese do psiquismo, a formação do instinto, da consciência, problemas
insolúveis de outra forma. Por que essas profundas desigualdades, inatas e
indestrutíveis no indivíduo, qualidades próprias indelevelmente estampadas em
sua face psíquica interior? Elas não vos revelam todo um caminho percorrido? Um
passado vivido que não pode anular-se, nem fazer calar, ressurge e grita: tal
qual fui, tal sou. De tudo isso depende um destino de alegria ou dor, que demonstra
um direito ou uma condenação. Uma criação nova, a partir do nada, teria que
formar, por justiça divina, almas e destinos iguais. Não permitais que
tantas condenações dolorosas — permitidas com justiça por Deus, porque queridas
pelo ser livre e responsável — recaiam sobre a Divindade, como acusação de
injustiça ou de inconsciência. Quantos absurdos éticos diante de uma alma, à
qual, ao invés, deveria ensinar-se a subir moralmente!
Não exceptuais o
homem da lei cíclica, que rege todos os fenômenos. Um rio não pode criar-se
para a fonte. Se esta não haurisse sempre do mar, por meio da evaporação e das
chuvas, não haveria bastante água para alimentar seu eterno fluxo. Não crieis
desproporções entre um átimo, vossa vida, e uma eternidade de consequências. Sabeis
acaso o que é uma eternidade? É absurda, inconcebível, uma tão descomunal
desproporção entre causa e efeito. Só o que não nasce é que não pode morrer;
só o que não teve princípio pode sobreviver na eternidade. Se admitirdes um
ponto de partida, tereis que aceitar um equivalente ponto de chegada; se a
alma nasce com o corpo, tem que morrer com o corpo. Esta lógica nos leva ao
mais desesperador materialismo.
Não acrediteis,
como tantas vezes o fazeis em vossas ilusões, que prêmio ou castigo, alegria ou
dor, na eternidade da divina justiça, possam ser usurpados, como é de costume
em vosso mundo. Tudo obedece a uma lei fatal de causalidade, uma lei íntima,
invisível e inviolável, contra a qual nada pode a astúcia nem a prepotência. É
lei matemática, exato cálculo de forças. Não há possibilidade de violação, em
tão férrea entrosagem de fenômenos. Ninguém escapa às consequências de suas
ações: o bem e o mal que se praticam, é para si mesmo que são praticados. Antes
da hereditariedade orgânica, existe a hereditariedade psíquica. Esta comanda
aquela e resume todas as vossas obras e determina vosso destino. Deus é justo,
sempre. Não podeis culpar ninguém. Em qualquer caso é absurdo amaldiçoar. Em
cada átimo é feito o balanço exato do dar e do haver, como culpas e méritos,
como castigos e alegrias; a dor é sempre uma bênção de Deus porque, se não
resgata nem purifica, se não paga o débito, sempre constrói, porque acumula
crédito. É a lei da vida, oculta, inatingível, sempre presente e sábia.
Caem vossas
barreiras e as defesas que ergueis em favor da injustiça. A justiça é a lei
profunda que vos acompanha e sempre vos encontra na eternidade. Quantos dramas
nestas palavras! Acima do parentesco de corpos, há um parentesco mais profundo
com o vosso passado e com vossas obras que ressurgem em redor de vós,
assediam-vos, erguem-vos ou vos abatem. Sois exatamente como vos construís;
possuís, aparentemente concedidas pela natureza, as armas que vós mesmos
fabricastes para vós e com elas enfrentais a vida, com ela a venceis.
Movimentastes as causas que agora agem dentro e fora de vós. O presente é filho
do passado; o futuro é filho do presente. Não culpeis ninguém. A gênese de uma
vida não pode ser o efeito de um egoísmo a dois, que agem em dano de um
terceiro, impossibilitado de dar opinião. Como podeis acreditar que uma vida de
alegria ou dor, tal qual dependeria a fixação de um estado definitivo por toda
a eternidade, fosse deixada à mercê de um fato acidental, realizado sem
consciência de suas consequências? Um fato tão substancial como é a vida e a
dor de um homem, num organismo universal em que tudo é tão exato e justamente
querido e previsto, como pode ser abandonado assim, fora da lei, no momento
decisivo de sua gênese, que tem efeitos colossais? Não vedes o absurdo desse
conceito? Como podeis crer que na imensa ordem soberana possa haver lugar para
a loucura e a maldição, para a inconsciência e para a usurpação? E que se
possam semear, assim ao acaso, por irresponsáveis, as causas da dor?
Não sentistes
vossa personalidade, que grita “eu”, acima de qualquer vínculo e afinidade? A
hereditariedade é acima de tudo psíquica, essa é de vós mesmos, individual,
preparada por vós e assim desejada. A hereditariedade fisiológica é uma
hereditariedade secundária, dependente daquela, de consequências limitadas
porque inerentes a um organismo que, para vós, é apenas o veículo da viagem
terrena que amanhã abandonareis. O parentesco familiar é parentesco orgânico,
de formas, de tipos; nesse vaso desceu vosso espírito, não por acaso, mas por
lei de afinidade. A fusão é completa numa unidade que, mesmo conservando os
caracteres da raça e da família, transcende-os, muitas vezes,
inconfundivelmente como personalidade psíquica. Vêm daí as semelhanças e ao
mesmo tempo, tantas diferenças. Os genitores vos dão o germe da vida física;
protegem-lhe o desenvolvimento, paralelamente ao da vida psíquica, descida do
céu, e confiada a eles. Respeitai e amai seu grande trabalho. Nas horas frágeis
da juventude, vossa alma eterna está em suas mãos; e tremei se sois vós os
genitores, ao refletir que sois escolhidos como colaboradores no trabalho
divino da construção de almas.
Se a vida
psíquica não é filha direta dos pais, tem parentesco com eles pelas vias da
afinidade, que a chama e atrai para determinado ambiente. Nada é confiado ao
acaso. Muitas vezes a alma escolhe o lugar e o tempo, prevendo as provas que
tem que vencer, mas quando ainda não atingiu essa consciência e ainda não sabe
ser livre, então seu peso específico — que resulta do grau de sua destilação
espiritual — as atrações e repulsões pelas coisas da terra e a natureza do tipo
que constituiu, guiam-na automaticamente, para um espontâneo equilíbrio
de forças em seu elemento, único no qual pode viver e trabalhar, do mesmo modo
que tudo se equilibra no universo, do átomo às estrelas.
Nada é confiado ao acaso. Muitas vezes a alma escolhe o lugar e o tempo prevendo as provas q terá para vencer...
ResponderExcluir