Sejamos
lógicos
por M. Quintão
Reformador
(FEB) Novembro 1921
A doutrina espiritista não se amolda a hermenêuticas duvidosas, para culminar em cânones rígidos e inflexíveis, perfeitos e acabados.
Ela não é estática, é dinâmica por excelência e, como tal, essencialmente progressiva no tempo e no espaço, como bem o afirmou o provecto compilador - Allan Kardec.
Dizê-la doutrina de Kardec, de
Roustaing, ou de quem quer que seja, é absurdo só explicável pela inópia (imperfeição) humana, enfeudada (submetida) ao rotinismo (rotina) de escolas e sistemas que ela, a
doutrina, vem precisamente proscrever.
O “Livro dos Espíritos” (veja-se
bem: dos Espíritos), que é, por assim dizer, a chave da Nova Revelação, está
cheio de anotações e comentários pessoais do seu coletor, de molde a comprovar
que os seus colaboradores do Além nem tudo lhe disseram, senão só o que lhes
foi perguntado e, do que disseram, nem sempre o fizeram a título definitivo e
absoluto, senão conformado a circunstâncias de tempo, meio e fins.
A quem se afigurara exótica esta restrição,
valeria recordar o Divino Mestre com João:
(Cap. XVI, v. 12)
Seriam todos a tudo saber e nada mais perquirir, por
conhecer e progredir. Ora, não é isto que se enquadra no bom senso teórico e
menos ainda se deduz da realidade dos fatos, que, gradativos e variáveis no tempo
e no espaço, superam, dominam e excedem a todas as teorias.
Se algo podemos admitir definitivo e
imutável na eternidade, e isso não apenas em foro de consciência propriamente
humana, porque no consenso dos Espíritos desencarnados, em geral, é o
fundamento posto para Aquele que se disse - Caminho, Verdade e Vida.
Estar, em verdade, com Jesus, não é
ouvir Espíritos e seguir ou aceitar de mão beijada ou pro domo nostra (em
proveito próprio)
o que eles dizem de
Jesus ou por Jesus; mas, confrontar se o ensino corresponde à essência da Lei,
extreme de prismas e facetas exclusivistas e não raro tendenciosamente personalíssimas.
Marchar no caminho, com Jesus, não é fazer pregão
espetacular da qualidade de uma fé que se poderia, quiçá, qualificar de megalomânica.
Andar em vida, com Jesus, não é
fantasiar fetiches e fantoches canonistas, no seio do proselitismo, a falsear a
doutrina que deixa, então, de auspiciar-se providencial e essencialmente
reformadora para tornar-se convencional e sectária, do pior dos sectarismos,
que é o pessoal, dos mestres em Israel.
Quem afirma que Kardec disse tudo e nada mais resta a
dizer, invalida implicitamente a necessidade de comunicar com os Espíritos e
vai na esteira do Catolicismo dogmático, que se arroga o privilégio de possuir
a Verdade integral, definitiva e imutável.
Quem assim pensa não considera que
ele, Kardec, foi o primeiro a dizer que sua tarefa não estava completa e
voltaria por terminá-la.
Menos ainda considera que, depois de Kardec, pioneiros
outros do mundo espiritual vieram dilatar os horizontes da vida terrena.
Porque a mentalidade das gerações,
que se alternam em ritmo progressivo, também requer instruções adequadas a
perspectivas e problemas novos, ou simplesmente renovados em circunstâncias
outras mesológicas.
(Da
Wikipedia: A Mesologia é uma ciência dedicada ao estudo das relações recíprocas
entre o ambiente e os seres que nele vivem.)
Por outro lado, nem Kardec nem ser algum, intra et
extra mundo, poderia abranger, para sistematizar e definir, a evolução
universal.
Nem o Cristo - paradigma de verdade maior
a nós concebível - poderia fazê-lo, porque se igualaria ao Pai, que sempre
afirmou maior do que ele, como porque também não o compreenderíamos jamais
integralmente. E até que o pudéssemos compreender, qual o não fizemos em vinte
séculos de experiências trágicas e dolorosas, haveria que adotar o seu critério,
para exemplificar com amor o que presumimos com fé.
Porque a fé sem o amor degenera em
fanatismo, e o fanatismo espírita é mais grave e inconcebível que o próprio
ceticismo.
Sejamos, pois, lógicos com o Cristo
para entender Kardec, sem abdicar da razão e livre arbítrio, que é o maior e
melhor galardão da criatura de Deus.
E não na Terra, tão somente, porque no universo de
Deus, em forais
(foros?) de eternidade.
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