Legendas
por legendas
por M. Quintão
Reformador
(FEB) Janeiro 1938
Obra de laboração lenta, sutil,
profunda, não há contar-lhe tempo nem termos de equação, porque interdepende da
possibilidade de todos e de cada um na escala privativa da evolução espiritual.
Iludem-se, portanto, quantos supõem
desde logo mutável o roteiro tormentoso do mundo, no querer armar-lhe com
teorias meramente temáticas, compulsórias e arbitrárias, um estágio de paz, de
ordem, de tranquilidade universal, mesmo relativas.
Essa aspiração tão velha quanto o próprio
mundo; esse patrimônio inalienável de todas as gerações preteriras, não se
vinga de jus nem de fato (nem de direito nem
de fato) , senão através de ciclos e ciclos
de reencarnações iterativas: de jus,
porque, sendo o espírito humano simples mônada divina imperecível, consciente e
responsável, antes que mero autômato ocasional e contingente, traz consigo
intrínsecas as faculdades correlatas ao grau da própria evolução, a dentro também
de zonas limitadas de ação e reação, próprias e reflexas; e de fato,
porque, à evidência histórica, o que se verifica é a predominância de um
determinismo superior a todos os esforços e desígnios temporais.
Nem há como desmerecer que, deste
ponto de vista considerada, a tradição da nossa humanidade não passa de
monumental Babel de lutas indefinidas sobranceando (em posição mais
elevada)
campos estéreis de
linhas iníquas quanto inúteis.
Fora, então, a vida uma fatalidade sem objetivo e
porventura só tolerável no grau de incidência, fortuita e arbitrária, do que
pudesse ser, ou parecer, a felicidade de cada um. E, como sem maior afoiteza
poder-se-ia concluir que ninguém, jamais, houvesse vingado o plano integral da
própria felicidade, estulto (tolo) fora pretender auferi-la de outrem
ou a outrem querer deferi-la.
Nenhum governo, nenhum povo, nenhum
código legislativo poderá, portanto, alterar o ritmo da evolução universal, sem
que antes se escovilhem
(retirem
as impurezas), saneando-os
profunda e radicalmente, os valores que engendram, instruem e nobilitam a mesma
vida.
Tais valores são de teor divino em curso de eternidade
e imortalidade consciente, viva, e nunca de curso forçado e privativo de uma
realidade precária, sempre duvidosa e inconsistente.
Tais valores não valem, senão de um
modo direto e secundário ao provimento do corpo, mas, primariamente ao
provimento da alma, que é causa e não efeito do corpo.
É atender-se a que já se não pode
hoje taxar de absurda a concepção de almas sem corpo, porque provado está, à saciedade,
o apótema
(dito
ou palavra memorável)
de Paulo: há corpos
celestes e corpos terrestres.
Importa, de conseguinte, admitir que a aberração do
conceito de humanidade e felicidade deriva menos do chamado ateísmo - simples fórmula
verbal, incapaz de engenhar coisa alguma - do que de uma imperfeita noção das
finalidades realíssimas do ser, consciente e responsável, na previsão e
provisão de seus destinos.
As religiões, que ainda hoje tentam aforar (abonar) consciências
mediante dogmas inconcebíveis à luz do senso comum, têm, a nosso ver, a maior
carga de responsabilidades no báratro (abismo) de
iniquidades e angustias que flagelam as gerações contemporâneas.
Têm-na porque, senhoras de baraço (corda) e cutelo, armadas de privilégios e
regalias, elas, as religiões, não souberam, não quiseram ou não puderam
capacitar o homem da exata compreensão dos seus destinos neste cenáculo efêmero
da Terra.
E note-se que não arguimos esta nem aquela confissão
religiosa porque, católicos ou maometanos, judeus ou budistas, ou luteranos,
todos os povos se defrontam divisos (divididos), padecentes, incompreendidos, infelicitados em suma, nesta
hora apocalíptica do mundo.
Hora predita, sem dúvida, mas
demorada e difícil, dissemos de começo que a ela não se ajustam imediatas
modificações de alcance coletivo sensivelmente apreciáveis, porque dependentes
de uma reforma individual estimada morosa e difícil, pelo que se observa no âmago
mesmo do nosso proselitismo onde viçam exuberantes os remanescentes do velho.
Hora difícil porque, inda os compenetrados da
irrevocabilidade de uma Justiça Divina perfeita, investem o tumulto
despercebidos de que nos domínios da razão só prevalece para triunfar uma força
construtiva - a do Amor na pauta evangélica, em espírito e verdade, qual o vêm
preceituando as vozes do céu, os arautos da “Nova-Hegira” (a fuga de Maomé de
Meca para Medina, em 622 da era cristã) planetária,
que são os verdadeiros construtores do “Novo Mundo” prometido pelo Cristo de
Deus.
Porque, só esse amor, que vai do aniquilamento do mais
comezinho defeito moral à abnegação da própria vida, pode engendrar a Fé que remove montanhas.
O Divino Mestre não venceu exércitos, venceu corações.
Os cristãos dignos da esmola de luz que lhes é referida para esta fase crítica
do rebanho impenitente, precisamos ter mais de vista o bordão do apóstolo que
edifica por atos, do que a pena do propagandista que se derrama em palavras.
A propaganda, quem na faz são os
nossos Guias, são os desencarnados a manifestarem-se por toda parte e a
despeito de todas as ridículas negaças (negativas) e repulsas; mas, sendo a doutrina por eles ratificada a
do Cristianismo Apostólico - doutrina de fatos por excelência - é claro que só
a nós outros, encarnados, compete concretizá-la em atos. E até que o possamos
fazer a benefício individual, em função da família e do ambiente social mais
próximo, em que laboramos, é inútil berrar e encenar programas e legendas
inoperantes à forma do mundo, de vez que o mundo é e será sempre a expressão
totalitária das provas de cada um.
Adorar a Deus selecionando credos; exaltar
Pátrias traindo, vencendo e massacrando povos; amar a Família injuriando,
desprezando e conspurcando a família alheia não é divisa que lisonjeie e iluda
o cristão espiritista, que só estima legendas integradas na lei das leis, fora
da qual não há salvação, isto é: - Amar a
Deus sobre todas a coisas e ao próximo como a si mesmo.
Tudo mais é palha seca destinada ao
fogo das provas remissoras e das expiações dolorosas, aquele emblemático choro
e ranger de dentes, que aí se nos vai a cada passo nesta hora apocalíptica do
antolhando (desejando) com o desencanto e temor dos que
sabem que muitos serão chamados e poucos escolhidos.
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