sábado, 1 de agosto de 2020

Verdades indiscretas




Verdades indiscretas

Túlio Tupinambá (Indalício Mendes)
Reformador (FEB) Setembro 1953

            As sessões espíritas devem ter um objetivo elevado, como, por exemplo, o de retificar sentimentos e educar a alma num sentido superior de fraternidade e cooperação, Fazer sessões sem um fim verdadeiramente digno, será perder tempo e arriscar-se a dissabores. Até hoje, as melhores sessões a que assisti foram as que se subordinam à orientação evangélica aconselhada pela Federação Espirita Brasileira. As comunicações trazem sempre, ou na maioria dos casos, um cunho de austeridade capaz de tranquilizar o ambiente. Os que participam de tais reuniões experimentam bem-estar espiritual difícil de ser descrito. Tudo se aprimora, tudo alcança um refinamento extraordinário, pois parece que até os fluidos se tornam muito mais leves e benéficos do que em sessões onde não há o mesmo cuidado e a mesma orientação.

            Certa feita fui à um centro espírita, atendendo a instante convite dum amigo. Quando lá cheguei, todos se mostravam exuberantemente palradores. O “dono” do centro fazia pilhérias, tinha “piadas” que arrancavam gargalhadas. De repente, sem mais nem menos, ele se punha sério, gargarejava a prece de “Caritas”, com voz trêmula, como se tivesse o coração sangrando. Em seguida, citava Jesus com tamanho enternecimento teatral, que seria capaz de levantar das tumbas mortos milenares...

            Prosseguia a sessão e, logo após seu encerramento, outra vez com a prece de “Caritas”, espoucavam risos, gargalhadas, piadinhas, etc. Ora, francamente, meus amigos, seria melhor, em vez de realizar sessões desse Espiritismo curioso, que se fizessem reuniões recreativistas evitando referências a nomes que devem merecer acendrado respeito. 

            Mais tarde, levaram-me a outra sessão. O mesmo ambiente de “cordialidade social”. As entidades espirituais, agora, é que faziam graças, provocando risos com os seus trocadilhos. De edificante para a formação do espírito, rigorosamente nada. Não se estudava o Evangelho, não se analisava nenhuma passagem de “O Livro dos Espíritos” ou de “O Livro dos Médiuns”. Só futilidades, gracinhas, como se isso fosse na verdade Espiritismo, porque as consultas sobre negócios, questões de família, receitas para cachorrinhos (!) e outros disparates ocuparam cerca de duas horas de “projeção”!

            Tais fatos demonstram a necessidade de muito esforço e muito trabalho doutrinário, principalmente daqueles que se consideram capazes de dirigir trabalhos práticos e formam sua “entourage”, como se as sessões espíritas, pudessem ter qualquer semelhança com esses clubes americanos para “passar o tempo”... O mal é que qualquer pessoa se intitula capaz de fundar centros ou grupos, de dirigi-lo, passando a depositários de todas as atenções, como se tivesse o monopólio das manifestações espíritas em seu ambiente. Sua vontade prevalece sempre, seus desejos são leis.

            Muitos e muitos exemplos eu poderia aduzir a este comentário. Não adiantaria, porém. Se faço menção a tais fatos é com o objetivo único de chamar a atenção dos espiritas que preferem orientar-se pela Doutrina, no sentido de eles se tornarem, cada vez mais, colaboradores da grande obra de elucidação dos iniciantes, através dos ensinos contidos em “O Livro dos Espíritos” e “0 Livro doa Médiuns”, tendo como fundamento desse trabalho o Evangelho. Não devemos ser dogmáticos nem intolerantes, mas, para resistirmos à onda de dissolução dos princípios espíritas, é mister que proclamemos, pela palavra e pelo exemplo, as verdades contidas nas obras de Allan Kardec e confirmadas por J. B. Roustaing na monumental obra “Os Quatro Evangelhos”.

            A preparação doutrinária é indispensável à formação de uma legítima mentalidade espírita, sem que nos fechemos num círculo de ferro, mas que saibamos abrir os braços àqueles que buscam a Luz, ainda perdidos por atalhos. Nosso dever é de guiar, confraternizando; nunca, entretanto, de condenar, combatendo. Se desejamos vencer, temos de persistir no esclarecimento evangélico. Elucidar, explicar, explanar, orientar, guiar, trabalhando fraternamente, é o dever do espírita kardequiano. Todos somos dotados de livre arbítrio, mas não é por Isto que devamos deixar que alguém se atire num precipício, sem, antes, realizarmos todos os esforços para evitar que a loucura se consuma.

            As sessões espíritas de estudo são muito importantes. As de trabalhos práticos, também. Todavia, ninguém deveria jamais entregar-se a estas sem haver, primeiramente, adquirido o indispensável “passaporte” naquelas, alargando seus conhecimentos, firmando sua instrução evangélico-doutrinária. Para o futuro de cada um de nós, parece-me, modéstia à parte, ser esse o caminho mais aconselhável.

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