segunda-feira, 29 de junho de 2020

A proibição de Moisés

A Proibição de Moisés
por Amaral Ornellas
Reformador (FEB) Julho 1919

            Sob a autoridade do grande legislador do povo hebreu, os inimigos do espiritismo florescente condenam-a na prática e os seus mais santos misteres, relembrando palavras que se acham consignadas nas composições bíblicas.
            Ilustremos com essas próprias palavras o nosso despretensioso artigo.
            Diz o cap. XVIII do “Deuteronômio” versículos 10 e 11: 

     “Nem se ache entre vós quem consulte adivinhos ou observe sonhos e agouros, nem quem seja feiticeiro ou encantador, nem quem indague dos mortos a verdade.”

            Condenava Moisés a consulta aos adivinhos, a interpretação dos sonhos, os sortilégios e encantamentos e as perguntas feitas aos mortos para indagação da verdade.
            O espiritismo, não a baixa magia negra que muitas vezes se oculta sob as suas asas benéficas, outra coisa não faz do que repetir aos inexperientes os mesmos conselhos do legislador hebreu.
            Combate o espiritismo toda sorte de superstições e jamais aconselhou que, pela curiosidade, fossem os seus adeptos movidos a interrogar aqueles que impropriamente denominamos mortos.
            Os espíritas nada perguntam. Os seus irmãos de além-túmulo vêm sob o protetorado de Jesus e dizem, clara ou veladamente, o que lhes é permitido.
            Moisés, porém, não proibia nem podia proibir as comunicações com o invisível, pois o seu espirito brilhante não se achava ainda corrompido pelo maquiavélico conceito jesuítico que só muito mais tarde veio a humanidade conhecer: “Faze o que eu digo e não o que eu faço.”
            Moisés confabulava com os espíritos do Senhor e não fazia mistério desse comércio intelectual que mantinha com o Além. Não podia, portanto, condenar o que ele próprio praticava.
            Ele não disse: ninguém converse com aqueles que já se foram, e sim: ninguém indague dos mortos a verdade.
            A proibição de Moisés é repetida por todos os espíritas: Não procureis saber dos desencarnados aquilo que devereis adquirir pelo vosso próprio esforço. Não perturbeis o silêncio dos vossos amigos do Espaço com indagações frívolas e perguntas pueris.
            Mais estremado da doutrina de Moisés do que os pregadores de hoje, deveriam mostrar-se Saul e outras personagens bíblicas.
            Elias, no entanto, como médiuns que eram, mantinham com o Espaço relações muito estreitas. Colhendo dessas relações salutares princípios de moral, governavam os povos sob a inspiração que lhes vinha da pátria. Elas bem compreendiam o alcance das palavras de Moisés.
            Os antagonistas da nova Revelação não procuram refletir sobre os motivos que determinaram aquelas palavras e, decalcando a Bíblia nos versículos transcritos, combatem as manifestações espíritas sem o apoio do bom senso.
            Acham eles que os fenômenos mediúnicos se dão por artimanhas do Demônio, símbolo algumas vezes empregado pelo Cristo e que a ignorância elevou à categoria de um deus maligno.  
            O missionário que conduzia o povo de Israel, acreditava na comunicação com os mortos; não as atribuía a Satanás, afirma com bastante clareza o texto citado, que vem demonstrar à evidência que a casta sacerdotal hoje se encontra em pleno desacordo com Moisés.
            Se pensasse como ele não veria nas sessões espiritistas manobra do inferno.
            Não professando as suas ideias, por que é, então, o seu nome lembrado como uma grande autoridade no assunto? Para estabelecer a confusão que baralha e ensombra o mundo das ideias que se vão espiritualizando.
            Mas os sectários da doutrina do Amor que vem evangelizando os povos, terão o cuidado de dizer bem alto para que todos escutem; Nós ainda respeitamos, com fervor religioso, esse útil conselho dado à humanidade pelo profeta do Sinai. Mas, quando o desrespeitássemos, não poderia ser o espiritismo derrocado, porque Moisés legislou para a sua época e nunca para os tempos modernos. Muitas das suas ordenações já não se cumprem, pois o progresso, na sua marcha de luz, vem demolindo a obra perecível do homem para desvendar-lhe os segredos da harmonia divina.
            Depois de Moisés novos instrutores surgiram e após eles o Profeta dos profetas: - Jesus.
            Cumprindo as leis morais exemplificadas pelo Augusto Filho de Maria, teremos dado insofismável cumprimento a todos os preceitos perdidos na noite tenebrosa dos tempos.
            Os espíritas ainda prestam franco apoio à proibição de Moisés, quanto às perguntas feitas nos mortos, E assim é. Seguem-no quando os seus decretos ainda condizem com as máximas de Amor preconizadas pelo Cristo; desprezam-no quando ele, arvorado em condutor de um povo de cerviz dura, ditava leis ainda mais duras do que a sua cerviz.
            Mas os que combatem o espiritismo em nome da Igreja de Roma, não seguem Jesus nem Moisés. Não seguem Jesus por que da tolerância fizeram o dogma; do amor, um artifício; da caridade, um balcão.
            Estando cm pleno desacordo com Moisés, como patenteamos acima, também desrespeitam as suas leis, como provaremos transcrevendo apenas dois versículos do “Deuteronômio”, na impossibilidade de encher estas colunas com inúmeros outros.

            Cap. VII, versículo 26:
            “Nem em tua casa meterás coisa alguma que seja de ídolo, para não vires a ser anátema como ele o é também.”

            Moisés mandava escrever essas palavras no limiar e nas portas de todas as casas, para que elas se gravassem em todos os corações.
            Eles não as inscrevem no íntimo da alma, pois mercadejam com breves, amuletos e escapulários e levantam estátuas para serem idolatradas.
            Infringem, assim, uma das leis que os espíritas respeitam integralmente.  
            Ouçamos agora o versículo 8 do capítulo XIV:  

            “O porco também será para vós imundo: não comereis da carne desse animal.

            Os espíritas que refletem sobre as causas dessa prescrição inteligente, que tem bem vivos na memória os ensinamentos de Jesus quando ele dizia que não era o alimento que tornava o homem impuro, não ligam o mínimo apreço à essa censura que já produziu os seus frutos, porque eles só acompanham os preceitos bíblicos no que concerne com o adiantamento moral da humanidade de agora.
            Os seus contraditores, porém, que tão zelosos se mostram pelos dispositivos contidos no Velho Testamento, não dispensam nos lautos banquetes com que humilham os famintos, o tradicional leitãozinho de fomo, encolhido e amortalhado com rodelinhas de limão verde.
            Nova e indesculpável infração para aqueles que se arraigam à letra, menosprezando os símbolos. 
            E nada mais precisamos acrescentar para que fique demonstrada esta verdade que nos entristece: De Moisés e do seu código eles só se recordam para apavorar os incautos; de Jesus, desgraçadamente, eles não se lembram nunca.
            Os espíritas amam a Jesus, sem negar a Moisés o papel proeminente que lhe coube no cenário do mundo.
            Veneram o rutilo espírito que conduzia através do deserto o povo de Israel, mas o seu grande Mestre é Jesus, o Eleito dos eleitos, o médium de Deus.

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