sexta-feira, 6 de setembro de 2019

Aproveitamento de forças



Aproveitamento das forças
por Angel Aquarod
Reformador (FEB) Dezembro 1925

O estudo da economia é indispensável ao Espírito em evolução na Terra, a fim de que possa utilizar bem as forças e elementos de que disponha para sua atuação no planeta.

Falando, porém, aqui, de economia, não nos referimos à que se ensina nas instituições docentes da Terra. Aludimos à que o espírita precisa conhecer para o máximo aproveitamento das forças com que conte.

É de simples bom senso que, ao tentar-se a realização de um empreendimento, depois de concebido o projeto, depois de estudado por todas as faces e de pesadas as vantagens ou desvantagens que possa trazer o empreendimento, importa se reúnam os elementos indispensáveis à sua execução.  Sem que se faça isso, o fracasso é inevitável.

E não é senão por descurarem desse trabalho prévio que os espíritas militantes tão grande número de fracassos contam no desenvolvimento da obra a que se consagraram.  

O Espiritismo oferece pasto abundante às imaginações ardorosas, que facilmente se deixam seduzir pelos encantos da realização prática de empreendimentos de maior ou menor importância. São excelentes, não há negar, os seus propósitos e abençoadas as suas intenções. Isso, porém, não é suficiente para o êxito. Não basta que um projeto seja bom. Preciso é também que seja viável, que por bem empregado se possam dar os esforços que o empreendimento exija ou melhor, que fique plenamente demonstrado haver mais vantagem na execução da obra intentada do que no seu adiamento para outros tempos.

Não é raro esquecerem-se os espíritas de que a doutrina de que são adeptos ainda não adquiriu desenvolvimento bastante para que à sua sombra se empreendam certas obras, como raro não é que simultaneamente e sem que os respectivos projetos tenham passado por amadurecido estudo, vários núcleos se lancem à realização de empreendimentos idênticos ou semelhantes, descurados dos elementos indispensáveis ao êxito.

Em geral, apressam-se demais, levados por louvado zelo pelo engrandecimento da doutrina, traduzindo-se em obras visíveis de maior ou menor vulto. Logo, porém, surgem os inconvenientes da ideia propugnada e abandonando-se os intentos anunciados com entusiasmo. Com isso, está claro, nada lucra a doutrina.

Sem dúvida, o Espiritismo dará nascimento a obras de grande importância e vulto, com o cunho da elevação que lhe é própria, mas a seu tempo.

Quais, entretanto, as obras visíveis, de caráter social que já podem se realizar sob a égide do Espiritismo? Indubitavelmente as de beneficência e de instrução. Assim o têm entendido os adeptos mais entusiastas da Nova Revelação, tanto que desses gêneros são as instituições que projetam fundar.

Bom é que assim aconteça. Cumpre, todavia, que tais propósitos se não generalizem e que os poucos núcleos que se acham em condições de tornar realidade esse objetivo não ultrapassem os limites do possível e do razoável.

Não é, contudo, o que se observa. São em grande número os núcleos que se mostram inclinados a realizar os mesmos intentos, contando, não com recursos próprios, mas com os que terceiros lhe ofereçam. Ora, manifesto parece o inconveniente de semelhante método, cujo resultado é fatigarem-se com exigências contínuas a maiores esforços, os que podem dar alguma coisa, oferecendo-se lhes por prêmio se seus sacrifícios uma série de fracassos.

E, enquanto isso, deveres outros que a doutrina impõe a todos os seus adeptos e aos núcleos de crentes, deveres a cuja observância importa que uns e outros se consagrem escrupulosamente, ficaram esquecidos. Esses deveres são os de contribuírem, todos, por seus esforços e meios que lhe estejam ao alcance, para aumentar, em si e nos outros, a cultura doutrinária, assentando sobre bases indestrutíveis os elementos componentes do organismo espírita para que a toda parte sejam levados os ensinos dos Espíritos, de modo que ninguém fique ignorante do que ela proclama, do que dela podem que é a Nova Revelação, dos princípios esperar os indivíduos e as sociedades e dos benefícios que proporciona aos que a conhecem, sentem e praticam.

Distrair para outros efeitos as forças, de que disponham, é desperdiçá-las.

Para a propaganda doutrinária dispõem os núcleos espíritas das copiosas obras a que o Espiritismo tem dado origem, para oferece-las aos que queriam instruir-se das sessões de estudo: para a prática da beneficência dispõem das faculdades mediúnicas de alguns de seus membros, mediante as quais podem restituir a saúde aos que a perderam e dispõem das contribuições pecuniárias com que essa obra possam concorrer os que a compõem.

Para a instrução da infância e mocidade, dispõem do recurso do instituírem aulas especiais, onde se ensine a doutrina espírita, sob seus aspectos, filosóficos e moral religiosos. Essas aulas não reclamam grandes dispêndios para serem criadas e podem sempre funcionar em dias e horas que não obstem ao comparecimento dos que as ajam de frequentar, nas escolas oficiais ou particulares, onde vão beber os conhecimentos que nelas se ministram.

Desse modo de praticar a beneficência ou a caridade podem lançar mão, com relativa facilidade, todos os núcleos espíritas visto que ao alcance de todos estão os meios indispensáveis para isso, acrescendo que o desempenho dessa  tarefa não impede o cumprimento dos outros deveres que a doutrina prescreve a seus adeptos e às agremiações por eles formadas.

Embora ainda não sejam tantas quantos se desejam, já por toda parte há escolas que facilitam às crianças e aos jovens instruírem-se nas matérias que formam o curso elementar de ensino, pondo-as em condições de mais tarde ampliarem seus conhecimentos, de acordo com as suas vocações. As escolas espíritas, portanto, deverão ter por fim apenas ministrar a essas mesmas crianças e jovens a instrução moral cristã, na conformidade da doutrina dos Espíritos, o conhecimento do ideal que lhes inspirou a fundação. As de outro gênero só deverão cuidar de fundá-las os núcleos espíritas que o possam fazer, tão somente para atender à necessidade da instrução nos bairros e nas povoações que não as possuam e onde, conseguintemente, as crianças não podem sair das trevas da ignorância completa.

Fora destes casos especiais, afigura-se nos não haver motivo para que todos os núcleos espíritas se preocupem com a fundação de escolas para instrução primária e secundária. Basta se preocupem com oferecer às crianças o pão do Espírito e isto todos o podem fazer abundantemente.

No tocante a instituições de beneficência, certo não se contam ainda tantas quantas são precisas e nem todas as que existem correspondem ao ideal cristão, a que se acha vinculada a verdadeira caridade. Muitas instituições desse gênero, porém, já existem que, melhoradas, aperfeiçoadas, satisfariam, em escala bastante considerável, à necessidade da assistência aos indigentes e sofredores. Incontestavelmente, mais fácil seria para os espíritas a tarefa de amparar e melhorar as instituições já fundadas com esse caráter, ou que venham a fundar-se, do que criar outras, responsabilizando por elas, ante o mundo, o Espiritismo. 


Sabe-se que não é com os filantropos abastados, com os que empregam grandes capitais na fundação e manutenção de instituições de beneficência, que as fileiras espíritas se engrossam. Ao contrário, em geral são pobres de bens materiais os adeptos da Nova Revelação. Assim sendo, claro é que todos os empreendimentos, da natureza das instituições de que tratamos, por eles tentados se ressentirão sempre da falta de recursos para sua manifestação. Para sua manutenção, quando cheguem a efetivar-se do que resulta estarem de princípio condenados a fracassos comprometedores do prestígio da doutrina.

De tais fracassos não há duvidar, desde que somente de boa vontade disponham os núcleos que se abalancem, assim no campo do ensino, como no da
beneficência, a semelhantes empresas que, ainda quando sejam suficientes os recursos financeiros, exigem trabalhadores em grande número, devotados
e capazes, além de extrema atenção e cuidado com enorme dispêndio de energias.

Ao fracasso se juntará uma perda imensa de forças que, bem empregadas, na medida do possível, a favor do ideal, teriam produzido efeitos importantíssimos.

A observação dos fatos já ocorridos mostra que toda vez que entidades
Espíritas hão tentado a realização de empreendimentos da ordem dos que tratamos, tudo quanto a doutrina mais reclama de seus adeptos foi posto de lado, pela necessidade de fazer convergir todas as atenções e todos os esforços para a obra tentada.

Em sobrevindo o fracasso, que é o com que as mais das vezes deve contar, enormemente sofrerá o núcleo, se não chegar mesmo a dissolver-se, por efeito dos desgostos e decepções decorrentes do malogro. Se este não se der, quase sempre mesquinha será a instituição resultante dos ingentes esforços empregados, instituição que, por conseguinte, em nada contribuirá para o prestígio de uma causa da importância do Espiritismo, redundando mesmo a sua manutenção em prejuízo da ideia que este consubstancia, porquanto ele ficará desatendido nos seus mais importantes aspectos.

            Quer parecer que ainda não chegou o tempo dos espíritas consagrarem seus esforços à fundação de instituições de ensino, que devem continuar principalmente a cargos dos poderes públicos, nem de instituições de beneficência nos moldes das que já existem com caráter oficial ou sob o patronato de confissões religiosas. A situação em que se encontra o Espiritismo não permite que seus adeptos empreguem as forças de que disponham em empresas de tal natureza.

Por enquanto, o que há de mais aconselhável, para o melhor aproveitamento dessas forças, é que os núcleos espíritas, em geral, se limitem, ao cultivo da doutrina, à sua difusão, ao fortalecimento dos mesmos núcleos para lhe assegurar a inextinguibilidade.  

Dentro desses limites, cabe perfeitamente o que dissemos acima relativamente à assistência moral e à instrução espírita das crianças e dos jovens.

Faz-se mister o aproveitamento de todas as forças existentes no campo do
Espiritismo, para que o ideal espírita cada vez mais esplendente se mostre e em condições de exercer a influência social que lhe compete.

           Haja em tudo o bom senso necessário e os espíritas evitarão o mínimo desperdício das forças de que necessitam e os fracassos, que acarretam, pelo menos, lamentável e prejudicialíssimo estacionamento na marcha da ideia.


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