Quantas
são as oportunidades...
Boanerges
/ (Indalício Mendes)
Reformador
(FEB) Maio 1976
Pouco antes do nascimento, inúmeros fatos
transcorreram, visando a sacudir o
homem do torpor que lhe insensibilizava o coração e toldava a visão da consciência.
homem do torpor que lhe insensibilizava o coração e toldava a visão da consciência.
Um dos mais notáveis foi, sem dúvida, o
halo de grandiloquência e fé que cercou o nascimento do precursor, aquele que
se declara a voz do que clama no deserto, como a dizer que é a voz do próprio
Messias que clama no deserto humano.
João era filho de Zacarias - sacerdote do
turno de Abias - e de Isabel, do tronco de Arão, oprobriada perante os homens,
padecendo a esterilidade. Ambos, clarificam os Evangelhos, eram avançados em
dias.
O Evangelho situa a problemática
transcendental num campo de luminosidades bem a gosto da linguagem inspirada em
que está escrito. Tendo entrado no santuário para queimar o incenso - pois que
corria a época em que os sacerdotes da classe oitava eram responsáveis pelo serviço no Templo -, numa das duas vezes em que o rito se
cumpria, diariamente, e oculto por um véu, Zacarias, enquanto a multidão rezava
no átrio, vê, à direita do altar do incenso, um anjo, o qual, pouco depois,
identificar-se-á como Gabriel. Prediz-lhe
o emissário do Senhor, que irá nascer aquele que traz o Espírito e o poder de
Elias, habilitando para o Senhor o povo preparado (mais adiante, entenderemos
que o preparo a que o Anjo Gabriel aludia era muito mais restrito do que amplo,
como, de resto, costuma ser o contingente daqueles que, realmente, envergam o
manto nupcial).
Como pedisse provas, perturbadíssimo como o
devemos imaginar, naquele momento, face àquela revelação, Zacarias emudece, e a
mudez não deixa de querer simbolizar a necessidade do recolhimento às fontes
íntimas, o jejum espiritual, a maturação das indagações do próprio psiquismo,
para que a criatura aceite e entenda, nos limites do possível, os mistérios de
Deus. Só muito tempo depois, enchendo-se do Espírito Santo (expressão que já
entendemos no seu devido sentido), lança aos céus um cântico imortalista dos
mais belos de que se tem notícia.
João, apelidado Batista, vinha desbravar em
parte o caminho, não porque o Senhor necessitasse de aplainadores do mundo, mas
porque a excessiva dureza de nossos corações não suportaria, íntegra, o peso da
Verdade. Fazia-se mister a ministração homeopática.
Se considerarmos o continuismo da
Revelação, não fora senão o Cristo quem falara pela boca dos Profetas do Antigo
Testamento, antecipando à própria manifestação tangível o quem tem ouvidos de
ouvir ouça. Era Ele mesmo quem já aplainava o caminho nas furnas de nosso ser. A seguir, mandou-nos Elias reencarnado, a quem não
reconhecemos, por não termos, tampouco, olhos de ver. E não foi só: veio,
afinal, Ele mesmo, semeando a transubstanciação da carne terrestre com a
substância da fé. Ponderável que tenha escolhido o seio do povo judeu, um dos
mais azoinados e indisciplinados dentre todos, naqueles tempos.
Esse programa de vida eterna, que
frequentemente malbaratamos (graças aos céus ele é eterno...), manifesta-se, em
praticamente tudo, de modo trino, conforme costumam aludir as crenças
orientais. Essa manifestação em trilogia não deixa de ter um altíssimo significado,
que não podemos desprezar, ainda que o não entendamos plenamente, não sendo,
por outro lado, aventável a hipótese de que se esteja preocupado com "assuntos esoteristas e orientalistas".
Assim, é interessante notar,
construtivamente, sem que se desvirtuem os fatos, e sem que se criem teorias
bizantinas, certas particularidades do Evangelho: a própria Revelação é
tríplice, assim como o homem se constituí de Espírito, Perispírito e Corpo
Carnal Grosseiro, em nossa fase atual. No esquema revelacionista, vejamos:
a. Jesus fala pelos
profetas;
b. Jesus envia o
precursor;
c. vem, Ele mesmo, até
nós.
Outro
esquema que poderia ser armado:
a. Revelação moisaica:
b. Revelação
messiânica;
c. Consolador
prometido.
O próprio João, filho de Zacarias e de
Isabel, cujo batismo deveria ser efetuado durante o inverno, uma vez que no vau
do Baixo Jordão, a mais ou menos 350 metros abaixo do nível do mar, a
temperatura é insuportável durante o verão - o próprio João, dizíamos,
completou um ciclo de trabalho em três importantes etapas:
a) Moisés, o
legislador, o libertador:
b) Elias, o
mantenedor:
c) João, o precursor,
Nessa sucessão de deslumbramentos que
inebriam a Palestina e o mundo, convém ressaltar que três foram os cânticos em
louvor a Deus, que o Evangelho apresenta:
a) o cântico de Maria, logo a seguir às
exaltações de Isabel;
b) o cântico de Zacarias, enchendo de
espanto a todos;
c) o cântico de Simeão, declarando-se
pronto para a morte, após ter visto o menino.
A estrutura, em seus fundamentos, parece
continuar a mesma: o ministério público de Jesus dura três anos. Três são as
fases do seu julgamento:
a) frente a Pilatos;
b) frente a Herodes;
c) novamente frente a Pilatos,
No cimo do Monte da Caveira, três são as
cruzes que atestam a bestialidade humana. O próprio martírio do Justo
desenrolou-se, mais agudamente, da hora sexta à hora nona, ou seja, das 12h às
15h, durando, portanto, três horas.
Passaram-se três dias até que Jesus
ressuscitasse, firmando-se como Senhor do Túmulo Vazio, na feliz expressão de
Humberto de Campos:um túmulo vazio que nos plenificou de esperanças os dias!
Por três vezes o Senhor apareceu aos
discípulos após a ressurreição:
a) em João, XX - vv.
19 a 23 (ausente Tomé);
b) em João, XX - vv.
26 a 29 (presente Tomé);
c) em João, XXI - vv.
1 a 18.
Relembremos que o testemunho do Batista,
quanto àquele que batizaria no Espírito Santo, foi, igualmente, tríplice
manifestação:
a. "Este é o de quem eu disse: O que
vem depois de mim tem, contudo, a primazia, porquanto já existia antes de
mim" (João, I-v. 15);
b. "Respondeu-lhes João: Eu batizo com
água; mas no meio de vós está quem vós não conheceis, o qual vem após mim, de
qual não sou digno de desatar-lhe as correias das sandálias" (João, 1- vv.
26 e 27);
c. "É este a favor de quem eu disse:
Após mim vem um varão que tem a primazia, porque já existia antes de mim"
(João, I-v. 30).
É, todavia, no final da trajetória visível
do Mestre entre nós que estas belezas se conjugam, com a finalidade de
mostrar-nos toda a vastidão do Amor de Jesus por nós. Referimo-nos à negação de
Pedro e, posteriormente à ressurreição, à confirmação, também tripla, de seu
profundo Amor pelo Nazareno. Vejamos a negação:
a. "Então a criada, encarregada da
porta, perguntou a Pedro: Não és tu também um dos discípulos deste homem? Não
sou, respondeu ele" (João, XVIII - v. 17);
b. "Lá estava Simão Pedro,
aquentando-se. Perguntaram-lhe, pois: És tu, porventura, um dos discípulos
dele? Ele negou e disse: Não sou" (João, XVIII - v. 25);
c. "Um dos servos do Sumo-Sacerdote, parente
daquele a quem Pedro tinha decepado a orelha, perguntou: Não te vi eu no jardim
com ele?..
De novo Pedro o negou, e no mesmo instante
cantou o galo" (João, XVIII - vv. 26 e 27).
O cantar do galo é uma espécie de baliza
aterrorizadora para todos nós. A todos os momentos estamos negando a Jesus, e a
todos os momentos os galos cantam melancolicamente, nos prados de nossa
consciência... todas estas coisas se passaram perante Anás e Caifás, e sob os
aplausos do mundo,
Mesmo assim, nada é insanável: o erro
tríplice de Pedro, que - logo após André, seguiu a Jesus, sucedendo-se Filipe e
Natanael -, não ficaria sem igual oportunidade de reerguimento, perante o mesmo
Senhor, e perante os homens. Após a ressurreição, da
terceira vez em que o Nazareno aparece aos discípulos (aparição a 7 discípulos), Pedro é interrogado por três vezes:
terceira vez em que o Nazareno aparece aos discípulos (aparição a 7 discípulos), Pedro é interrogado por três vezes:
a. "Depois de terem comido, perguntou
Jesus a Simão Pedro: Simão, filho de João, amas-me mais do que estes outros?
Ele respondeu: Sim, Senhor, tu sabes que te amo, Ele lhe disse: Apascenta os
meus cordeiros" (João, XXI - v. 15);
b. "Tornou a perguntar-lhe pela
segunda vez: Simão, filho de João, tu me amas? Ele lhe respondeu: Sim, 'Senhor,
tu sabes que te amo, Disse-lhe Jesus: Pastoreia as minhas ovelhas" (João,
XXI-v. 16);
c. "Pela terceira vez Jesus lhe
perguntou: Simão, filho de João, tu me amas? Pedro entristeceu-se por ele lhe
ter dito, pela terceira vez: Tu me amas? E respondeu-lhe: Senhor, tu sabes
todas as coisas; tu sabes que eu te amo. Jesus lhe disse: Apascenta as minhas
ovelhas" (João, XXI - v. 17).
É o Evangelho o mais perfeito dos códigos
que conhecemos. Considerando as trilogias apontadas, que são as coisas a mais
que existem, a desafiar a nossa vã filosofia; considerando, principalmente, a
tríplice negação e o tríplice testemunho de Simão Pedro, nada nos resta senão
trabalhar infinitamente, perdoar irrestritamente, e não invejar nunca! Quem
conhece os martírios que, por vezes, uma fisionomia sorridente esconde? O
desespero que um rosto sério oculta? O próprio questionário formulado pelo
Senhor, em presença de todos, pareceu dizer da infinita pena que Jesus nutria
por todos nós, simbolizados, naquele momento, por quem haveria de ser o esteio
do Cristianismo. O Cristo possibilita-nos iguais ensejos de soerguimento,
quantas sejam as quedas que soframos.
Primeiramente, diz a Pedro que
apascente os cordeiros: estes bem podem simbolizar uma primeira fase dos
homens. São as criaturas indiferentes à Boa Nova.
Os cordeiros são a passividade, mas não a pacificação. Logo a seguir, aconselha ao Apóstolo que pastoreie as suas ovelhas. Cordeiros despertados, pacificados, transformam-se em ovelhas: estas são a parte do rebanho que está, de fato, preparada (na preparação do povo, não estavam incluídos os "doutos e os prudentes"). Em terceiro lugar, fala em apascenta as minhas ovelhas. O Cristo sabia perfeitamente que as ovelhas tresmalhar-se-iam; seria preciso, após a turbulência, apascentar as partes do rebanho despertas. Ou seja:
a) apascentar cordeiros
(despertá-los);
b) pastorear ovelhas
(conduzir os que estão preparados);
c) apascentar ovelhas
(trazer de volta ao aprisco as que, preparadas, se tresmalharam).
Diante de tudo isso, Senhor, quanto não nos
reserva a misericórdia de Deus?!. ...Se não sabemos tudo, isso se dá, com
certeza, porque não convém que o
saibamos; e porque nem tudo daquilo que sabem os que nos estão acima pode ser-nos revelado. Não foi o próprio Paulo de Tarso quem declarou trazer um espinho na carne, embora jamais tenha dito que espinho era esse?...
saibamos; e porque nem tudo daquilo que sabem os que nos estão acima pode ser-nos revelado. Não foi o próprio Paulo de Tarso quem declarou trazer um espinho na carne, embora jamais tenha dito que espinho era esse?...
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