Contra
ou a favor?
Sylvio Brito Soares
Reformador
(FEB) Maio 1976
A cerca de Alcindo Guanabara, grande
jornalista, há uma estória que se popularizou.
José Carlos Rodrigues, redator-chefe do
"Jornal do Commercio", costumava, às sextas-feiras santas, publicar
longo artigo sobre a vida do Cristo. Como, porém, estivesse esse redator em
viagem, o gerente do jornal chamou Alcindo e lhe pediu um artigo sobre Jesus
Cristo. Alcindo aceitou a incumbência. Depois, dizem, de haver dado alguns
passos, retornou e perguntou ao gerente:
- Você se esqueceu de dizer-me se o artigo
deve ser contra ou a favor.
Carlos de Laet, ao receber D. Silvério, na
Academia Brasileira de Letras, aludiu a essa anedota em seu discurso. Isto
irritou alguns acadêmicos e deu lugar, naturalmente, a uma questão entre Laet e
Félix Pacheco.
Lauro Müller, no entanto, asseverava que a
coisa se passara diversamente.
Recebendo
a encomenda do artigo, Alcindo Guanabara teria perguntado, aludindo às crenças
de José Carlos Rodrigues: - Cristo católico ou protestante?
Este episódio se explica, sem dúvida
alguma, em virtude de as religiões existentes se preocuparem mais com seus
cultos, com a manifestação externa de suas crenças, do que propriamente com o
espírito da Religião, tão bem definida por Jesus, em seu Evangelho. Eis por que
o Espírito Emmanuel disse, muito bem, que "os cultos religiosos, por sua
feição dogmática, são transitórios como todas as fórmulas de convencionalismo
humano".
Só a Religião pregada e praticada pelo
Divino Enviado não sofre qualquer modificação no tempo e no espaço, porque ela
é AMOR, e somente o amor tem a força incoercível de conduzir o homem à presença
de nosso Pai Celestial.
*
Mas, voltando à explicação de Lauro Müller,
no tocante à estória a que acima nos referimos, acreditamos sinceramente que
Alcindo Guanabara desejava saber apenas, a fim de conduzir seu artigo, se José
Carlos Rodrigues era católico ou protestante, tanto que Luiz Edmundo, em sua
obra "O Rio de Janeiro de meu tempo", referindo-se a esse grande
jornalista que foi Alcindo Guanabara, disse ser ele "sisudo e infenso a
relações banais”.
Arredio e grave, como uma cegonha, de ar
ensimesmado e triste. Como jornalista, não queria saber de assuntos que não
fossem sérios, quando escrevia: problemas sociais, questões de economia ou de
finanças, religião e política. Antes de terminar o século, já era um grande
nome no nosso jornalismo, como os de Bocaiúva, de Rui, de Ferreira de Menezes,
de Araújo, de Patrocínio.
"Tanto no início de sua carreira, como
no apogeu, foi sempre o mesmo. O mesmo na indumentária e na conduta espiritual,
com a mesma barba, as mesmas idéias, os mesmos óculos, a mesma sobrecasaca, a mesma
gravidade.
"De novo, a bem dizer, só nos revelou
certas tendências espíritas que, aliás, conservou até fechar os olhos.
"Em companhia de Luís Murat, Alberto
de Oliveira e outros próceres da literatura nacional, ia muito ao grêmio União
Caridade, à Rua Silva Jardim, 9, onde se reuniam os mais convencidos adeptos da
Doutrina Kardequiana.
"É a mesinha dos três pés, horas e
horas em confabulação com o astral...
"Não discutia, porém, o Espiritismo
que professava. E na prática estrita da moral da seita, marchava sereno e bom,
sem um deslize."
*
Era natural que o apreciado escritor Luiz
Edmundo, sem o indispensável conhecimento da Codificação Kardequiana,
considerasse o Espiritismo uma seita, quando, na verdade, ele é a Religião,
como muito bem acentuou Allan Kardec, que dispensa dogmatismos, sacramentos,
sacrifícios, sacerdócio. É a revivescência do verdadeiro Cristianismo do tempo
de Jesus.
"O que se faz preciso na vossa época,
disse o esclarecido Espírito Emmanuel, é estabelecer a diferença entre Religião
e religiões.
"A religião é o sentimento divino que
prende o homem ao Criador. As religiões são organizações dos homens, falíveis e
imperfeitas como eles próprios; dignas de todo o acatamento pelo sopro de
inspiração superior que as faz surgir, são como gotas de orvalho celeste,
misturadas com os elementos da terra em que caíram. Muitas delas, porém, estão
desviadas do bom caminho pelo interesse criminoso e pela ambição lamentável dos
seus expositores; mas a verdade um dia brilhará para todos, sem necessitar da
cooperação de nenhum homem."
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