Passes
mediúnicos
por Areobaldo
Lellis
Reformador
(FEB) Março 1946
Tenho lido, em
estatutos de muitas associações espíritas, figurando no rol de seus fins, ser um
deles a aplicação de passes magnéticos. Embora essa declaração não
impossibilite o registro, em Cartório, dos ditos estatutos, para que as associações
passem a ter personalidade jurídica, tal afirmativa não expressa a verdade,
consoante os ensinamentos doutrinários, por não corresponderem à natureza dos
fatos.
Encarado o
Espiritismo como ciência, religião ou filosofia, possui ele sempre um atributo específico:
o atributo espírita, isto é, encontra as suas legítimas raízes nos seres desencarnados.
Assim, quando se fala em passes, no Espiritismo, compreende-se que tais passes
só podem ser mediúnicos e, não, magnéticos, embora eles tenham esse caráter.
Vou explicar melhor. O homem só é homem quando vivo. Se está morto, ninguém dá mais
o chama de homem e, sim, de cadáver. Porque isto? pela razão simples de ter se
retirado dele a vida ou melhor, a fonte da vida, que é o Espírito. Por isto é
que a "Gênese", primeiro livro da Bíblia, nos ensina haver Deus
criado o homem à sua imagem e semelhança, porque o homem, a que ela se refere,
é o Espírito e não o corpo físico. Quer isto dizer que a matéria nada cria nem
produz, sendo tudo obra da centelha divina, repartida por todas as coisas e seres,
espalhada por todo o universo, a qual na espécie humana se denomina Espírito,
modo com que se convencionou chamar aquela centelha divina, quando alcança um
certo período de sua evolução aqui na Terra. Tal é o ensinamento científico da
doutrina.
Sendo o Espírito a
fonte da vida, todo poder magnético vem dele. Sabemos todos que o sapo pode ser
atraído por uma cobra, que o magnetiza à distância. O batráquio, sob a ação
magnética do réptil, vem saltando e dele se aproximando, até ser pela cobra
sacrificado. Porém, se pusermos um sapo vivo diante de uma cobra morta, mesmo
que ela esteja de olhos abertos e dirigidos para o sapo, esse não será atraído,
por faltar à cobra o seu poder magnético. E porque lhe falta esse poder? Porque
a centelha divina, que era a razão de ser de sua existência terrena, dela se
desprendeu, restando apenas o corpo físico sem vida, isto é, o cadáver. Essa
centelha é o espírito da cobra, mas, como se convencionou chamar-se espírito à
centelha que em nós vibra, nos termos acima referidos, chegamos, por ignorância
dos ensinamentos científicos, à errônea conclusão de que a cobra, por ser um
animal inferior, não possui espírito, nem tem alma.
Quando a cobra
atrai o sapo, ou o sapo atrai a lagartixa ou a lagartixa atrai um inseto qualquer,
o fenômeno de atração se dá em virtude de seu poder magnético, maior do que o
do animal sobre o qual ele irradia. Porém, não é do seu corpo físico que nasce
a força magnética mas da centelha divina, que lhe dá a vida. Nestes casos
verifica-se o magnetismo animal. Do mesmo modo, quando, a título de espetáculo,
um magnetizador qualquer, em um palco de teatro, hipnotiza uma pessoa, dá-se aí
o magnetismo animal ainda, porque o poder de hipnose é do próprio magnetizador,
tem origem no seu espírito. E se ele, para isto, ministra passes na pessoa,
então podemos afirmar, com toda propriedade, que esses passes são magnéticos.
Do exposto, vê-se
que a força magnética é atributo da centelha divina nos vários reinos da Natureza,
dessa mesma centelha, a que chamamos espírito no homem. Das condições de potencialidade
desse atributo depende a maior ou
menor força magnética de cada qual. A prova
prática e ao mesmo tempo científica, de que a centelha se derrama por todo o
Universo, temos na pedra ímã, para o
reino mineral, e na gurarema ou pau d'alho para o reino vegetal.
Sendo o poder
magnético atributo do espírito e não da matéria, é fácil compreender-se que, quando
o Espírito desencarna, leva consigo esse atributo ou propriedade. Preliminarmente,
deve ficar esclarecido não haver fenômeno mediúnico sem a presença de um médium. Médium é todo
ser vivo, por ser a mediunidade uma faculdade do Espírito, faculdade que nem se
perde, nem se tira, como erradamente se diz por ai.
Assim, nas
associações espíritas ou fora delas, quando um espírita ministra um passe, esse
é absolutamente mediúnico, embora, seja magnético. Seria, somente magnético, se
ele fosse dado por um magnetizador, destituído de fé religiosa, de modo a não
atrair, pelo seu próprio poder magnético, uma entidade incorpórea, no sentido
da prática de um benefício. Porém, não se verifica isto nos centros espíritas.
Aí tudo se faz sob os imperativos da fé e da convicção lógica de que, ao ter de
aplicar um passe, a pessoa que vai realizar pede antes pelo pensamento a
assistência dos bons protetores. Destarte, o seu passe é mediúnico, porque à
sua força magnética vem juntar-se a do Espírito desencarnado, seu protetor.
Assim como, nas horas das sessões doutrinárias ou mediúnicas,
muitos Espíritos são atraídos ou trazidos, conforme as suas condições morais,
para aquele ambiente, assim também os bons Guias e Protetores ali comparecem
para a obra misericordiosa, que lhes toca.
Da conjugação
dessas duas forças magnéticas, a do médium e a do Espírito desencarnado, resulta,
então, o passe mediúnico, por haver nele a interferência de dois fatores
distintos. Para que o passe, ministrado em semelhantes condições, fosse
magnético, era preciso fosse dado apenas pela pessoa, sem a colaboração da entidade
espiritual. Aí ele seria magnético, por haver concorrido apenas o que
cientificamente denominamos magnetismo animal.
A maneira de
aplicação dos passes mediúnicos varia muito, podendo obedecer às normas clássicas
estabelecidas pelos livros científicos que tratam do magnetismo animal como a
outros modos, que o próprio Espírito desencarnado cria para seu uso. Conheço um
médium cujo protetor, ao incorporar para ministrar passes, os faz por meio de
castanholas, vibrando os dedos com grande ruído. Outros se limitam à imposição
das mãos sobre a cabeça, outros ainda fazendo correr as mãos sem tocar no corpo
da pessoa, vibrando apenas lambadas pela ação do dedo polegar sobre o médio,
Essas lambadas ou chicotadas, feitas em torno de quem recebe os passes, podem
parecer sem importância, à primeira vista. Entretanto, possuem a sua utilidade,
tal a de desfazer o campo imantado, existente em torno da pessoa.
Os médiuns de mais
acentuada sensibilidade, costumam experimentar os efeitos desse campo de imantação
fluídica, constituído em redor das pessoas, que estão sob a ação de más irradiações.
Possuem os passes
uma dupla finalidade: a de afastar, pela força de repulsão, o Espírito irradiador
que opera junto de sua vítima, e a de retirar-lhe os fluidos pesados, que a
estão molestando. Em qualquer dos casos, o seu valor é incontestável, pela
natureza do pensamento que os determina.
Uma das características
mais impressionantes da importância dos passes mediúnicos se encontra na
presteza dos seus efeitos, ao contrário do que ocorre nos passes propriamente magnéticos.
Quem se der ao trabalho de ler as variadas obras sobre magnetismo animal, verá que
os mais afamados passistas desse gênero jamais conseguiram curas rápidas de
seus doentes, Porque? Pela circunstância de lhes faltar uma potencialidade mais forte, que lhes
seria dada por um Espírito bom que consigo viesse operar. Daí a presteza com
que se alcançam curas com os passes mediúnicos, nos casos em que eles se
imponham. Esta superioridade de força é que torna os passes mediúnicos uma das mais
poderosas armas como elemento terapêutico, no campo da medicina espírita. E
porque resultam da conjugação de duas forças magnéticas ou eletrodinâmicas, no
sentido justo da prática do bem, é que eles não devem figurar nos estatutos das
nossas instituições espíritas como simples passes magnéticos. Estes são
próprios dos Espíritos encarnados e, por isso mesmo, não possuem a potencialidade dos mediúnicos,
onde se dá a intervenção de uma outra força extra corpórea.
Só a falta de
conhecimentos da ciência espírita pode explicar esse erro e até certo ponto, essa
irreverência para com entidades que ajudando em tais circunstâncias os
trabalhos espíritas, se veem desclassificadas nos auxílios que nos prestam com
tamanha boa vontade. Nessa incompreensão assenta, por sua vez, a campanha
desenvolvida contra o Espiritismo e encontra a sua razão de ser para as
perseguições, de que são vítimas todos os aplicadores de passes mediúnicos,
pelo fundamento de não haver ainda a medicina acadêmica incluído, entre os seus
métodos terapêuticos, o uso dos passes magnéticos, embora admitindo, no campo
da neuriatria, essa coisa esdrúxula e absurda que é a auto sugestão, isto é, a
faculdade, de que seríamos possuidores, de nos curar de uma desordem nervosa,
convencendo-nos de que nada temos, sempre que nos dissermos portadores de uma
nevrose qualquer.
Dia virá, em que
tais coisas serão mais bem ajuizadas, máxime entre os espíritas, quando os
conhecimentos científicos alcançarem maior repercussão em suas associações, abrindo
clareiras no acervo dos nossos conhecimentos, Nesse dia, então, os passes mediúnicos
substituirão, em alguns estatutos, os magnéticos.
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