Espiritismo –
Parte 3
por José Amigó y Pellicer
Reformador
(FEB) Abril 1954
(Traduzido do livro
‘Nicodemo’, edição de 1879, do mesmo
autor)
Cremos haver demonstrado que os princípios
fundamentais da Doutrina Espírita vêm ao público baseados em ideias sancionadas
pela observação, pela autoridade humana, pelo testemunho religioso e pela crítica
cientifica, constituindo um corpo de filosofia digno de profundo estudo.
Acrescentaremos agora que o Espiritismo, além de filosofia, é também religião,
e poderíamos dizer ainda: a única religião natural e racional. Só ela explica
satisfatoriamente sem violentar o bom senso nem chocar o sentimento, os
destinos da criatura e suas relações com o supremo Autor do universo.
Não se creia, porém, quando afirmamos
que o Espiritismo é religião, que entendemos como tal o culto externo, esse
conjunto de cerimônias e fórmulas aparentes com que as religiões chamadas
positivas procuram sustentar a fé, excitando a imaginação de seus adeptos.
Ao nosso modo de ver as cerimônias
exteriores do culto, organizadas ou regulamentadas pelas respectivas igrejas,
não são, não podem ser indispensáveis para o progresso espiritual, nem por consequência
formar parte integrante da verdadeira religião.
Claramente São Paulo o dá a entender
em sua segunda epístola aos Romanos, quando diz que não é judeu aquele que o é
manifestamente, nem circuncisão a que se faz na carne, e que só é judeu e
circunciso o que o é no interior; doutrina clara, justa, racional, que explica
com toda a perfeição a necessidade do sentimento religioso e a superfluidade
das fórmulas.
É preciso não esquecer que a religião é de
origem divina e os cultos, instituições humanas; eterna e imutável a primeira,
mutáveis e perecíveis os últimos. Podem as exterioridades satisfazer aos homens
em suas relações sociais, porque sua vista não pode sondar o coração alheio;
mas a Deus, que penetra no íntimo de nosso ser, só pode satisfazer a adoração
espiritual.
Entendemos por religião o culto íntimo
da alma, o sentimento de adoração que sobe da criatura ao Criador, a
observância das leis que presidem ao nascimento espiritual, à inefável economia
moral do Universo. Nessa religião o templo é o espaço sem limites, o altar o
coração da criatura, o sacerdote o homem, e a igreja é formada por todas as
famílias humanas derramadas na imensidade dos céus. E neste sentido o
Espiritismo é religião; porque ensina que Deus é o centro de todas as
perfeições e felicidades, pelo cumprimento do dever. Crê em Deus, na liberdade
humana, na supremacia do Espírito e na responsabilidade individual efetiva
pelos sentimentos e obras voluntárias. Para o Espiritismo, religião e moral são
a mesma coisa, porque só o cumprimento do dever pode aproximar-nos de Deus e da
felicidade, e a moral é a ciência do dever.
Qual será o homem verdadeiramente
religioso? - Aquele que pratica a justiça, levanta no fundo de sua alma um
altar ao Pai do universo e, tendo em conta a comunidade de origem das criaturas
racionais, considera todos os homens como irmãos e o justifica em suas obras.
Daí se deduz que o Espiritismo é a
religião cristã em sua pureza original, sem fórmulas exteriores e sem
mercantilismo, tendo por único código a moral do Evangelho.
Jesus Cristo não fez indispensável
culto algum para a salvação das almas, mas fê-la depender do amor ao Criador e
à criatura.
Porque, pois, fazem tão crua guerra
ao Espiritismo sob o ponto de vista. religioso e procuram sublevar contra ele a
consciência dos povos? Não costumam apresentá-lo como um conjunto de máximas
absurdas e imorais de práticas diabólicas? Não fulminam contra seus adeptos os mais
terríveis anátemas? Certamente isso sucede, e as coisas ainda iriam mais longe,
se a Igreja não tivesse, segundo a expressão de um escritor católico apostólico
romano, as mãos encadeadas (1).
(1) ‘A Fé Católica e o Espiritismo’
pelo Dr. Niceto Alonso Perujo
Porque foi Jesus caluniado,
escarnecido e crucificado?
Porque os sacerdotes sublevaram as
turbas contra ele? Porque o ódio sacerdotal chegou até o extremo de preferir a
morte do filho de Maria à morte de Barrabás? A religião naqueles tempos não era
mais que comércio e hipocrisia; e Jesus veio desmascarar os hipócritas e
expelir do templo os vendilhões. A religião era a oração na sinagoga e na praça
pública, e Jesus veio condenar essas exterioridades, recomendando a oração que
se eleva a Deus, no segredo do mais recôndito lar. A religião era o templo de
pedra, e Jesus veio substituí-lo pelo templo do sentimento.
Em resumo, a religião falava aos
sentidos pela pompa das cerimônias, e Jesus as punha de parte, só ligando
Importância à bondade e às obras do espírito.
Vejamos agora o que faz o Espiritismo,
e talvez não nos seja difícil conjecturar os motivos da guerra encarniçada que
lhe declararem os descendentes daqueles fariseus que crucificaram o Cristo.
Em primeiro lugar ele proclama a ilegitimidade
do sacerdócio que não se funde na prática das virtudes e na prédica da verdade;
isso só é suficiente para que se aprestem para a luta as hostes ultramontanas.
Ele recusa aos homens o direito de
condenar, fazendo depender a redenção da bondade das obras: não acredita na
eficácia da oração paga, nem que o dinheiro possa influir de modo algum na
sorte das almas.
A única infalibilidade que ele
conhece é a de Deus, e só a Deus presta homenagem de adoração, repelindo,
portanto, o culto dos semi-deuses, tão em uso em todas as religiões positivas,
sem excetuar a Católica romana. Considera dentro do Cristianismo e herdeiros
das promessas de Jesus todos os que adoram a Deus e praticam a caridade, seja
qual for a sua filiação religiosa ou mesmo que não pertençam a alguma igreja
conhecida, E, por último, combate sem trégua nem descanso a seita ultramontana,
a maior e mais nociva praga da época, que fez do Cristianismo o transunto de
suas misérias, do culto um esplêndido mercado e do sacerdócio um emprego
lucrativo e um elemento de resistência contrário ao progresso e a emancipação
dos povos.
O Espiritismo é a prédica do
Evangelho de Jesus; por isso os escribas e fariseus do século concitam contra
ele as turbas e clamam aos ouvidos de César: Crucifigatur... crucifigatur!
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