A Palingenesia
Dr. Gustave Geley
Reformador (FEB) Maio 1971
“Ainda
que a Doutrina Espírita fosse apenas uma ilusão (o que não creio), é demasiado
original e demasiado bela para chamar a atenção dos pensadores e merecer séria
discussão.
A
moral palingenésica é demasiadamente conhecida, para que necessite aqui de
exposição pormenorizada.
Baseia-se
na célebre fórmula da justiça imanente, que é o resultado do movimento normal e
regular da vida terrestre.
Se,
no decurso da sua evolução, na série das suas vidas sucessivas, o
"ser" é o produto de suas próprias ações e reações, segue-se que a
sua inteligência, o seu caráter, as suas faculdades, os seus bons ou maus
instintos são obra sua e cujas consequências, terá de sofrer, infalivelmente.
Todos
os seus atos, trabalhos, esforços, angústias, alegrias e sofrimentos, erros e
culpas, têm repercussão fatal e reação inevitável, numa ou noutra de suas
existências.
Assim,
não há qualquer necessidade de julgamento divino, nem de sanções sobrenaturais.
A
sanção natural da palingenesia não é somente individual, mas também coletiva.
Estende-se aos povos, às raças, às famílias, etc., porque íntima solidariedade
liga, necessariamente, grupos de seres unidos, numa ou em muitas existências.
Em geral, a justiça imanente começa a manifestar-se no próprio lapso duma
existência terrestre, tomada isoladamente; mas, nesse caso, é muito raro que
ela seja verdadeiramente equitativa; encarada de forma tão restrita, parece
quase sempre falível e verdadeiramente desproporcionada.
Pelo
contrário, numa série suficientemente grande de encarnações, torna-se perfeita,
matematicamente perfeita, visto que as contingências felizes ou infelizes são
compensadas e apenas resta, como resultado indubitável, o produto do nosso
comportamento.
Como
se vê, a moral palingenésica assenta numa base admirável de clareza e
simplicidade.
Há
muito que se conhecia a importância do subconsciente nas manifestações
intelectuais mais elevadas. Conhecia-se também a existência da criptomnésia e
sabia-se que numerosas recordações, aparentemente olvidadas, não estavam
perdidas e podiam reaparecer bruscamente, sob influências diversas, tais como,
a emoção, o perigo, a doença, etc. Mas as últimas descobertas psíquicas provam
que a importância do subconsciente e da criptomnésia era infinitamente maior do
que se julgava. As investigações relativas ao mecanismo do gênio e o estado dos
casos de personalidades múltiplas no mesmo indivíduo, puseram em relevo a
espantosa complexidade do inconsciente.
Depois,
o estudo do hipnotismo e do sonambulismo, e, principalmente, dos fenômenos
mediúnicos, estabeleceu a sua função predominante na psicologia anormal e
supranormal.
Hoje,
está demonstrado que uma parte essencial do ser pensante, a qual se apresentava
cada vez mais vasta e complicada, escapa grandemente, na vida normal, à
consciência e à vontade, e permanece latente e oculta.
Desde
então, cai por si própria a principal objeção que se opunha, antigamente, à
palingenesia: a objeção do esquecimento.
Que a criptomnésia se estenda para lá da existência atual, é hoje coisa fácil
de compreender, pois não há nada mais lógico e racional do que este
subconsciente, tão misterioso e tão profundo, conter em si a recordação e as
aquisições das vidas passadas.
Nas
experiências de De Rochas há, pelo menos, uma demonstração precisa a deduzir: é
a unanimidade dos passivos, quanto à afirmação da palingenesia. Todos eles,
seja qual for a sua origem, a sua educação, o seu nível intelectual ou os seus
próprios princípios religiosos, declaram espontaneamente
que tiveram outras vidas. Em torno destes dados, engendram muitas vezes
romances vários, quase sempre de impossível verificação; mas a unanimidade e a
espontaneidade das suas afirmações relativas à pluralidade das suas existências
não é coisa de somenos importância. Quanto mais não seja, prova a realidade dum
instinto profundo, duma intuição que repousa, sem dúvida, em base séria. Além
das experiências de regressão da memória, têm-se publicado recentemente algumas
observações tendentes a provar a reencarnação. Os leitores das revistas
metapsíquicas conhecem-nas bem e algumas são verdadeiramente impressionantes,
embora, pelo seu escasso número, não consigam convencer.
É
compreensível, natural e humano, que os psicólogos oficiais não admitam, entusiasticamente,
a teoria palingenésica, tão revolucionária, apesar da sua luminosa
simplicidade, e que se mantenham em expectativa; mas o que não pode admitir-se
de forma alguma é que eles a desprezem sistematicamente e se recusem a discuti-la,
mesmo como hipótese de estudo, não obstante os trabalhos conscienciosos feitos
a tal respeito e o monte de provas estabelecidas. Dentro de pouco tempo, terão
de mudar de atitude, visto que, segundo uma frase célebre, a verdade está em
marcha e nada poderá detê-la.
A
história desta doutrina resume-se assim nas suas linhas gerais: dos documentos
que possuímos, infere-se que a ideia reencarnacionista foi geral nos primórdios
da evolução humana e é a doutrina natural na infância das humanidades. Mas
dentro em pouco a ideia se obscurece e perde e poucos indivíduos a conservam.
Só mais tarde reaparece e predomina nas humanidades supinamente evolucionadas.
Mais uma vez se verifica a teoria dos "extremos".
Este
ciclo evolutivo é muito fácil de compreender:
A
admissão da ideia reencarnacionista, mais ou menos exata ou mais ou menos
deformada por superstições diversas, na infância da humanidade (e até nos povos
selvagens da nossa época), é a consequência dum instinto que responde à
realidade,
de reminiscências ainda alheias a concepções
teológicas ou filosóficas.
Após
o início das investigações metapsíquicas, o número de partidários desta
doutrina cresceu continuamente (dispenso-me de citar nomes que toda a gente
conhece). Podemos dizer, com efeito, que estamos na aurora da terceira fase
evolutiva, ou seja a fase da filosofia científica.
Com
seu cortejo de consequências metapsíquicas, morais e sociais, a palingenesia
repousará, no futuro, em bases sólidas, para sempre inabaláveis.
Nenhum comentário:
Postar um comentário