Carlos
Imbassahy
e
Roustaing
Luciano dos Anjos
Reformador Maio 1972
Felizes os que
passam pelos lances da vida e, no termo de suas angústias, olham
para o passado, para o que ficou
atrás e não veem de que se envergonhar.
(Carlos Imbassahy - "Os
Menezes", pág. 136)
Muito se fala da coragem física das
pessoas, distinguida na disputa do corpo a corpo ou, mesmo, na palavra
grosseira que se profere, ou na ofensa chula que se dardeja. Não
sei bem das virtudes dessa coragem. Em todo caso, vá lá que valha à glória dos
brutamontes... Em contrapartida, não há
quem ignore o largo mérito da coragem intelectual e da coragem moral. Exemplos
delas não são corriqueiros. Mas sempre existiram e existirão. Carlos Imbassahy foi um deles.
Impossível negar-lhe a coragem moral e intelectual. Esta, ele a demonstrou,
sucessivamente, durante toda a sua permanência na Terra, nos embates árduos que
travava com os mais intelectualizados e também acirrados inimigos do
Espiritismo. Grandes teólogos, eminentes ateus racionalistas, bibliólatras de
nomeada tiveram pela frente, sempre, o verbo polêmico de Carlos Imbassahy, a
confinar-lhes os argumentos soezes às verdadeiras proporções do sofisma, da
mentira ou mesmo da ignorância crassa. Não importavam os títulos ou o grau de
cultura e conhecimento adversários. Imbassahy nunca deixou de apanhar a luva e,
ao final, o saldo sempre o favorecia. Aliás, marcou sua atuação de polemista
aliando à elegância estilística o tom saborosamente satírico e desconcertante,
tudo assentado, com carradas de rigor crítico, na excelência dos fatos e das
provas. "Nós - era seu curso - estaremos onde estiverem as provas daquilo
que afirmamos. Afirmar sem provar, garantir sem esteios, impor sem raciocínio não
poderá ser, jamais, o nosso critério" ("Religião", Carlos
Imbassahy, pág. 50). Ironizava
com finura, arrastando o antagonista ao ridículo regenerativo. Basta abrir
qualquer de seus livros para sentir a medida ferina da sua linguagem, embora
jamais achincalhasse o opositor. (Consola-me muito essa particularidade do
grande e admirável Carlos Imbassahy,
já que, não raro, há quem me apode de semelhante método... ) No caso,
justifico-me no empenho de justificar Imbassahy,
colocando-me à sombra de suas próprias palavras: "Há teclas que por mais que se lhes bata, parece que nunca ressoam. Principalmente quando lhes estão perto os
obstinadamente moucos" ("Espiritismo
e Loucura", Carlos Imbassahy,
págs. 94/95).
A tirada - convenhamos - serve
também para muito confrade...
Quanto à coragem moral, Imbassahy dela deu exemplos grandiloquentes.
Espírita consciente não ocultava suas convicções e, onde estivesse, as
proclamava alto e bom som. Mais que isso: apontava intimorato a podridão dos
que, nela chafurdados, arrogavam-se entretanto a autoridade de críticos de
Kardec. E fazia-o de cabeça alevantada, porque sua vida fora sempre limpa e
honrada.
Além disso, há que destacar também a
firmeza das suas posições, dos seus pontos de vista. Não era homem de pensar hoje uma coisa e amanhã outra. Não
era espirita de mudar a casaca ao sabo; das intempéries convencionais ou ao prazer
do agrado de grupos e de determinado público. Não buscava o aplauso; buscava,
sim, e corajosamente, a verdade despida do preconceito. E enquanto Sêneca
dissera que “a grande coragem nunca se
desmente", Imbassahy escrevera que "a insistência, de mãos dadas ao preconceito tem produzido inúmeros
males ao gênero humano" ("A
Mediunidade e a Lei", Carlos
Imbassahy, pág. 209).
Isto também serve para certos
confrades...
Conheci-o bem. Correspondíamo-nos
com frequência. Tenho todas as suas cartas em meus alfarrábios, algumas delas,
por sinal, passíveis de surpreender a muita gente... Numa delas, fala-me de Roustaing... Éramos excelentes
companheiros. Quando nos encontrávamos, o "papo" era longo e permeado
de recordações, conceituações pessoais, estudos e análises. De público, mais de
uma vez - perdoe-me o leitor a imodesta alegria de relembrá-lo aqui, ele fez
considerações a meu respeito que, sinceramente me desconjuntavam
o esqueleto. Eram magnânimas referências de fazerem desajeitar a alma e... a
posição na cadeira. Invertia, generosamente, nossos papéis e, de aluno que
sempre lhe fui, apresentava-me na condição de quem lhe pudesse ensinar alguma
coisa. .. Ora, quem me dera possuir a milésima fração do valor, da cultura, da
inteligência, da coragem de Carlos
Imbassahy! Os livros de sua autoria, que me enviava, vinham com
dedicatórias e acompanhados de cartas replenas de considerações amigas e
fraternas:
É muito grande o
prestígio
De possuir o
convívio
de arcanjos.
Que prazer a gente
tem
Quando a amizade
provém
dos Anjos!
Ao seu amigo dos
Anjos
A esse que entre os
arcanjos
A sua vida
entretece;
Um seu apagado fã,
Nalguns pontos alma
irmã,
Este livrinho
oferece.
Ao confrade Luciano
Que neste mundo
profano
Heresias não
consente,
Envio, aqui,
prazenteiro,
O meu livro
derradeiro
Que é este Poder da
Mente.
Ouvi-lhe as mais gostosas e finas
anedotas... Seu repertório era impagável. Dizia-me que,
toda vez que podia, vendo meu nome anunciado para proferir alguma conferência,
fazia tudo para estar presente. Foi realmente um dos bons amigos que tive. Sua
estima me honrava e me alegrava sobremaneira. Excelente espirita. Excepcional
Espírito.
Esse introito todo vale apenas para
me outorgar o direito de afiançar e provar: Imbassahy sempre aceitou Roustaing, sempre defendeu a
"Revelação da Revelação". Em meu livro "A Posição Zero" (a
publicar), há um capítulo em que Carlos Imbassahy aparece com seus pronunciamentos.
Eu não desejava antecipar nada desse capítulo, mas, a pedido de confrades, aqui
vai o que respiguei de Carlos Imbassahy
sobre a obra de Roustaing.
"Primo loco", a sua
confissão pública, pelo silêncio, ao ensejo de três conferências que eu pronunciei,
diante de numerosíssimo auditório. Afirmei, então, categoricamente, que ele,
Imbassahy, era a favor de Roustaing.
Encontrava-se à mesa, ao meu lado, e, no final das minhas palestras, nas três
vezes referidas, também lhe foi dada a palavra. E não desmentiu absolutamente
nada do que eu dissera! Quem cala... Ou, então, é preciso atribuir-lhe a
péssima qualidade de hipócrita, leviano, oportunista, para se aceitar a versão
de que ele não contestou porque não queria ser... indelicado. Ora, o problema
não é de normas sociais, mas de normas conscienciais. Em questões dessa
natureza, quando se sabe que a nossa opinião tem peso junto à opinião pública,
não se pode ser "bonzinho", se não se
quer ser velhaco.
Reportemo-nos aos fatos. A primeira
vez foi na sede da Federação Espírita do Estado do Rio de Janeiro, presente o
seu presidente. Imbassahy, à minha direita (guardo ainda a foto), ouviu-me
afirmar que ele aceitava integralmente Roustaing.
Não replicou. A segunda vez foi na cidade de Volta Redonda. Fiz a mesmíssima
afirmativa, tendo Imbassahy ao meu lado. Não retificou. A terceira foi na
cidade de Barra Mansa. Ao meu lado, ouviu-me dizer que era francamente a favor
de Roustaing e não contestou. Aliás,
aqui, registrou-se um lance que vale ser narrado. Quando acabei de fazer a
afirmativa, uma senhora da plateia (*) disse que eu estava equivocado. E, então,
enquanto eu reafirmava o afirmado, Imbassahy gesticulava para a espectadora,
pedindo que se calasse... E fez mais, tão logo terminei de falar e me sentei:
chegou-se ao meu ouvido direito e me balbuciou algo que peço licença para não
reproduzir aqui. Imbassahy, hoje na Espiritualidade, sabe bem o que me disse e
por que não o revelo agora. Garanto ao leitor que ele me entende a discrição...
(*) Trata-se da Sra. M., sobre quem
não quero deixar de dizer uma única palavra: criatura de coração estremíssimo,
aureolada de maravilhosa simpatia espiritual e que vale como exemplo de
dedicação e amor ao Espiritismo. Disso dando testemunho público, quando
terminei minha conferência desci do local em que me encontrava e,
oferecendo-lhe uma flor, beijei-lhe a mão amiga.
Pois bem; todo o público presente a
estas três conferências foi testemunha do que narro. E, se não basta, informo
que, desta última, há uma gravação completa em mãos do presidente da Aliança
Municipal Espírita da região, incluindo o momento em que faço a citação em
tela. Não é fato, pois, que possa ser negado facilmente, tantas lhe foram as
testemunhas. Aparecesse alguém com tal coragem, escudar-me-ia nas palavras do
próprio Imbassahy: "Nestas condições,
negar o fato seria empresa arriscada, senão empresa ridícula para aqueles que
não estão inteiramente cegos" ("O Espiritismo à Luz dos Fatos", Carlos Imbassahy, pág. 12).
Passemos agora a algumas provas ainda
mais comprobatórias e objetivas. Vejamos como Carlos Imbassahy tratou, ele próprio, do assunto, sendo oportuno
recordar, mais uma vez, que o inesquecível confrade não era nenhum proteu.
"Reformador" de 19 de
fevereiro de 1933, ano LII, nº 3, a págs, 55/59, publicou ampla matéria sob o
título "Jesus e o Espiritismo". É que um padre, professor de
Dogmática no Seminário Maior de Taubaté, em São Paulo, realizara uma
conferência, com esse título, no Santuário de N. S. Auxiliadora, em Santa Rosa,
Niterói, comemorativa do 19º Centenário da Redenção. E esclarece o
"Reformador":
"Escusado será dizer que a anunciada conferência não foi mais do que um
ataque em regra ao Espiritismo."
Mas, tendo estado presente à
conferência, o nosso Carlos Imbassahy
dirigiu ao conferencista uma carta (transcrita a págs. 56/57 do
"Reformador" citado), em que cumprimenta o orador e o convida para
debater o assunto na sede da então Federação Espirita Fluminense, na Rua Gomes
Machado, 140, às 20 horas de quarta-feira, dia 27 de dezembro de 1933.
Prossegue, então, o "Reformador":
"Marcada a conferência de C. Imbassahy, na sede da Federação Espírita do
Estado do Rio, para as 20 horas da noite, já a essa hora estava inteiramente
repleto o salão daquela Sociedade, bem como todas as suas dependências.
"O orador começou fazendo notar que o tema da conferência do reverendo
versava sobre JESUS E O ESPIRITISMO, e que se, de Jesus, o padre Moraes, a quem
respondia, dissera pouco, do Espiritismo dissera mal, em todo sentido do termo.
"Lembrou que a Igreja sempre emprestara a Jesus os mais hediondos e
detestáveis papéis e, porque o Espiritismo vinha colocá-lo na sua verdadeira
situação de meigo rabino. do doce e suave pregador da Palestina, choviam sobre
a doutrina os anátemas da intolerância, da ignorância e do mau senso. Mostrou
como poderia fazer que os homens descressem de Jesus a doutrina absurda do
Inferno, a ilógica de sua divindade e a incompreensível da Santíssima Trindade;
que estamos numa época em que os ensinos religiosos precisam falar à razão e
que, portanto, os dogmas da Igreja só tendem a afastar os homens de Deus;
mostrou como, segundo explicações e interpretações trazidas pelos Espíritos,
conforme se encontram nas obras de Kardec e Roustaing, entre outros, ficam
inteiramente esclarecidos os pontos evangélicos, até então obscurecidos pela
letra que mata."
Ora, muito bem. A priori não seria difícil demonstrar que toda a matéria, embora
sem assinatura, pode perfeitamente ter sido redigida pelo próprio Imbassahy. O
estilo é o homem, já dizia Buffon... Mas, mesmo que o não fosse, uma coisa é
certa: Imbassahy disse realmente o que a matéria diz que ele disse. Por que a
convicção? Simplesmente porque, nessa ocasião, o Secretário do
"Reformador" não era outro senão... Carlos Imbassahy. Obviamente, nessa qualidade, ele não deixaria
passar o texto mentiroso (se alguém tivesse a coragem de escrevê-lo, sabendo
que o orador não falara em Roustaing
na conferência e que era ele o próprio Secretário da revista !); e, mesmo que
passasse sem que a visse (hipótese absurda), logo ele a retificaria. Assim agem
os homens de caráter. Mas não aconteceu desta forma. Além do mais, tratava-se duma
conferência pública. Todos haviam ouvido o que o orador dissera. Como poderia a
matéria descrever algo que não existiu? Logo, não há dúvida menor que seja: Imbassahy argumentou, de fato, com o
apoio de Roustaing, a quem ele
sempre aceitou. A não ser que fosse uma espécie de maria-vai-com-as-outras e,
mesmo sendo o Secretário da revista, não tivesse tido hombridade de consertar a
redação maranhosa. Mas não foi esse o Imbassahy que eu conheci. Não foi esse o
Imbassahy que deu tantos motivos de emulação aos espíritas. Não foi o Imbassahy
da impressionante coragem moral que todos nós aprendemos a respeitar. Não foi
esse o Imbassahy que todos tínhamos acima das paixões grosseiras e que dissera
um dia: "Para que o indivíduo se
coloque acima das paixões é necessário que saia fora da craveira comum da
humanidade" ("Os Menezes", pág, 136).
Contudo, meus elementos de prova não
se resumem nessa notícia, embora a paixão de opositores pervicazes possa até
mesmo ter nela outras verdades que não contém. Ao homem de bom senso, porém,
ela bastará, porque "o que aí fica
já basta para que verifiquemos como a verdade transparece através das lentes de
apaixonados opositores" ("A
Margem do Espiritismo", Carlos
Imbassahy, pág. 243). Vamos, pois, a outras fontes ainda mais concretas.
Leiamos a obra "Espiritismo e
Loucura", publicada pela Livraria Allan Kardec Editora, em 1949. A
páginas 77/79, diz Carlos Imbassahy:
"Poderíamos
prolongar as citações. Basta, porém, apresentar uma lista de psiquistas,
conforme a de Laponi, ainda no século passado:
"Para quem quer nomes tiramos
de uma lista apresentada por G. Athuis e de outras fontes os seguintes:
"( ... ); Roustaing, advogado;
( ... )"
Que fez Imbassahy? Acolheu em seu livro a relação de Laponi, emprestando, portanto, o seu endosso ao nome de Roustaing, que é citado entre outros
respeitáveis estudiosos do Espiritismo. Claro que, a ter produzido obra de
mistificação - como alguns maus leitores de Imbassahy já chegaram a dizer que ele assim considerou a produzida
por Roustaing -, não teria o autor
de "Espiritismo e Loucura" transcrito a relação do sábio José Laponi, dando-lhe apoio e cobertura.
Seria atitude da mais cabal irresponsabilidade (como quem escreve sem saber o
que está escrevendo), além de ilógica e até irracional. Mas "nada se diria mais difícil de entender, que
o lançar a razão nos rincões do irracional" ("Freud e as
Manifestações da Alma", Carlos Imbassahy, pág, 45) ...
Prossigamos, compulsando outras
fontes. Vejamos, agora, a obra "Religiões
Comparadas", editada em outubro de 1929 pela Cruzada Espiritualista. A
págs. 185, afirma Carlos Imbassahy:
"Jesus
é o Filho. Veio à Terra trazer a palavra divina. Foi o verbo que se fez carne.
(Entre nós se admite que o seu corpo fosse de natureza mais delicada que a do
comum das criaturas). Espírito puro entre os mais puros, pregou, exemplificou,
chorou e morreu condenado pelos homens."
Quereriam, acaso, maior clareza? Há
que se exigir ainda mais? Nesse caso, respondo com o próprio Imbassahy que,
dirigindo-se a adversário absurdamente intolerante, depois de muitas provas e
contraprovas, e de apresentar sucessiva série de fatos irretorquíveis,
desabafou: "Para os estudiosos serão
eles suficientes; para os cépticos serão inúteis, e o seriam ainda que os
levássemos ao infinito" ("Corpo
e Espírito", Carlos Imbassahy,
pág. 120).
Mas, se há quem queira, vamos
adiante. Examinemos, agora, rapidamente, o livro de Ismael Gomes Braga "Elos
Doutrinários", no qual o notável esperantista expõe e demonstra, à
farta, a tese do corpo fluídico de Jesus. A certa altura, quando se reporta à
resposta do Espírito São Luiz dada a
Kardec, sobre os agêneres (na qual é
taxativamente esclarecido que há exemplos de agêneres na Bíblia), Ismael Gomes Braga apõe, em nota de
rodapé, a seguinte informação (página 43 da 2.a edição, 1949):
"São
muito numerosos esses fatos na Bíblia. Antes e depois da crucificação, Jesus
aparecia com o mesmo corpo e até tomava alimentos como qualquer homem.
"Informa-nos o nosso
eruditíssimo confrade Dr. Carlos Imbassahy que o nascimento de Krishna e de
outros personagens semilendários da Índia antiga ter-se-ia revestido dos mesmos
mistérios que envolveram o aparecimento de Jesus. Teriam sido agêneres
igualmente tais personagens. Não possuímos suficientes dados para formar
opinião própria e nos limitamos a registrar aqui essa comunicação daquele culto
amigo.
"Quanto a Jesus, possuímos
esses dados e não temos dúvida."
Note-se, portanto, o empenho de Carlos Imbassahy no sentido de também
oferecer elementos de prova ao confrade para fortalecimento da tese do corpo
fluídico de Jesus. Que outra conclusão se poderia extrair, senão essa, da
preocupação de Imbassahy ao fazer questão de dar o seu testemunho sobre o
assunto, depois de ler um livro que não trata doutra coisa senão da revelação
de Roustaing? Saliente-se, ainda, o
encaixe da frase: "Teriam sido agêneres igualmente tais
personagens" - que é, sem dúvida, parte da própria informação de
Imbassahy. Não se diga que aventuro hipótese, pois, editada com a mesma nota,
em 1961, a 2ª edição, nem por isso Imbassahy
se pronunciou contrário a ela. Depois, é dele próprio o conceito de que "quando os casos são narrados pelos próprios
pacientes ou que deles foram testemunhas e se são seguidos de centenas de casos
idênticos, não há por que pôr em
dúvida tão grande acervo de provas" ("A Psicanálise Perante a Parapsicologia", Carlos Imbassahy, pág. 176).
Todavia, nem isso ainda é o tudo.
Abramos, finalmente, o livro "À
Margem do Espiritismo", 2ª edição de 1950. A págs. 38, afirma Carlos Imbassahy com toda a sua
autoridade de mestre:
"É
preciso ler a OBRA COMPLEMENTAR DE ROUSTAING para podermos apreciar devidamente
o episódio da gênese."
O grifo é meu. E grifei-o a fim de
chamar a atenção do leitor para o fato de o autor considerar a obra de Roustaing complementar. E Imbassahy não
era autor de dizer as coisas à conta de precipitação porque era sua a
recomendação de que "o verdadeiro
homem de Ciência só deveria pronunciar-se depois de acurado estudo e o filósofo
verá que é estultice supor tudo conhecido" ("O Poder Fantástico da Mente", Carlos Imbassahy, pág. 191).
Continuemos a perpassar "À
Margem do Espiritismo". Leiamos, agora, a página 72:
"Lição
cheia de sabedoria é a que deparamos na obra de Roustaing: "Perante o
Senhor os homens não são nem católicos, nem cristãos, nem judeus, nem muçulmanos,
nem pagãos, nem heréticos, nem ortodoxos. Eles se dividem, apenas, em submissos
à lei e rebelados contra ela." Esta
é a Doutrina Espírita."
Imbassahy considera a lição lida em Roustaing "cheia de
sabedoria" e ainda afirma que "esta é a Doutrina Espírita".
Não é impossível que, apesar de tudo,
ainda apareça quem ache que Imbassahy negava Roustaing. Sempre é possível o
impossível. em questões de preconceito e Intolerância. Imbassahy já destes
falava, no seu tom deliciosamente debicador. "Conta-se - e ele mesmo é
quem conta - a anedota de um sujeito que, às perguntas que lhe faziam.
respondia invariavelmente - não.
Depois. o interrogador ficou mudo, mas o outro continuou
a repetir o não"
("Fantasmas. Fantasias e Fantoches", Carlos Imbassahy, pág. 104).
Folheemos algumas páginas mais
adiante do "À Margem do Espiritismo" e encontraremos, na de nº 77, o
seguinte:
"Isso,
porém, não significa que nos não deixassem entrever a doutrina que ia ser
exposta pelas entidades que trouxeram a Roustaing a revelação da
revelação."
"Omitida que fosse a lição de
Kardec em relação a tão importante matéria, estaria no entanto já preenchida a
lacuna coma obra, EM MUITOS PONTOS COMPLEMENTAR do Senhor Roustaing.
“Razão assiste àqueles que creem
dever os espíritas estudar essa obra, pelos esclarecimentos que nos vem ela
trazer em vários casos.
“Se julga o ilustrado pastor qua a
Doutrina Espírita é falha neste capítulo, tire da sua estante o 1º volume de J.
B. Roustaing, tradução de G. Ribeiro, e aí verá a lacuna , inteiramente preenchida.”
(seguem-se
citações de Roustaing às págs. 77,
78 e 79).
Tornei a grifar a afirmativa de
Imbassahy "em muitos pontos
complementar", para ressaltar bem o juízo que ele fazia da obra.
Entretanto, é possível (sempre é possível!), ainda assim, que neguem esse seu
juízo. Permitir-me-ei, data venia, fazer minhas as seguintes palavras do mesmo
Imbassahy: "Será fácil dizer que tudo aqui é falso. Felizmente, nem todos
são cegos" ("Ciência
Metapsíquica", Carlos Imbassahy,
pág. 191).
Finalmente, a págs. 204 do "A Margem do Espiritismo", o autor
coloca a pá de cal: "Quanto ao texto das Escrituras, seriam
suficientes as obras de Allan Kardec para demonstrar que os Espíritos vêm
ajudar-nos a reconstituí-lo; e, se elas não bastam, temos ainda a de Roustaing, além de outros."
Aí está, caro leitor, o grande
arremate. Haverá argumento capaz de pôr por terra tanta convicção, provada e
comprovada à desmedida? Talvez ainda subsista quem a tanto se abalance, mas a priori havemos de sentir-lhe quanto
se lhe apouca o tom da voz, porque "diante disto, o que se verifica é que,
se as vozes dos nossos adversários aumentam assustadoramente de tonalidade, em
compensação, diminuem lamentavelmente no que toca à argumentação" ("A Missão de Allan Kardec", Carlos Imbassahy, página 123).
Talvez surja à cena, também, quem
profligue (não seria esta a primeira vez que a FEB se
vê, assim, levianamente acusada) que os trechos foram interpelados à revelia do
autor. Bem, nesse caso, é achincalhar a memória de Carlos Imbassahy. Trechos tão longos, tão incisivos e tão opostos
ao pensamento do autor são-lhe interpolados à obra e ele nunca vem a público
denunciar a tratantice? Trechos que ele viu e leu muito bem quando reviu e
releu o livro, acrescentando-lhe inclusive um apêndice enorme, à guisa de
"Tréplica", para a última e mais recente edição. Trechos que não
representariam sua posição mas que ele, por ser "bonzinho", deixou
ficar confundindo seus leitores, enganando-os, desprezando-os impudentemente,
vilipendiando-os desavergonhadamente, ridicularizando-os enfim. Ou será que Roustaing serve como argumento mas não
como verdade?
Não, nada disso aconteceu, porque o
próprio Imbassahy sabe muito bem o que escreveu e disso não se arrependeu. Na
"Tréplica", ao aditá-la, ele mesmo afirmaria, como sempre, do alto da
sua autoridade e honestidade morais:
"Mas, quem leu este nosso livro sabe que
não se pôs aqui nada a ridículo. Obra séria. para gente séria e em resposta a
pessoas sérias" ("A Margem do
Espiritismo", pág. 218). Como
se vê, somente na base do sofisma se desmentirá este artigo. E se o sofisma é
que valerá
a quem nem mesmo há de ter lido as obras de Imbassahy, então não tenho por que prolongar
mais os esclarecimentos. Devo apenas registrar que será muito cômodo, agora que
Imbassahy não está mais encarnado, afirmar-se que ele era contra Roustaing, Por
que não antes? Sim, antes, a breve tempo, tal como eu o fiz três vezes, com o
"de cujus" de corpo presente, face a face, "tête-à-tête",
diante de imensas plateias! E sem jamais ser contestado. Lamentar-se-ão todas
as considerações tardias que se façam sobre o assunto, posto que, no fundo,
servirão apenas para ressaltar as dificuldades que uma revelação enfrenta
diante dos sofismas, das distorções, das negativas retardatárias, principalmente
dos preconceitos. Imbassahy, rustenista sincero, há de amargurar-se, ainda
agora, tanto quanto já se amargurara antes, ouvindo, lendo ou sentindo as
injustiças assacadas contra o extraordinário missionário cuja obra, em seu
dizer, complementou a de Kardec. Mas
Imbassahy sabia e sabe que o martírio é o preço da coragem. Roustaing padece até hoje a dor dos
grandes enviados. Entretanto, dia virá em que a "Revelação da
Revelação" fecundará por sobre a Terra. Certamente, foi também pensando
nele que Imbassahy escreveu:
"Os mártires, estes é que
deixaram, com seu martírio, a semente que deveria fecundar mais tarde.
Cabe-lhes extraordinária glória, porque, em vez do caminho pontilhado de
flores, que trilham os felizes, com o aplauso das multidões, preferiram esta
senda de espinhos seguida por tantos quantos se imolaram pelo amor da
humanidade" ("Hipóteses em
Parapsicologia", Carlos
Imbassahy, pág. 271).
Finalmente, lamento muito que alguém
ainda desconheça todas essas citas que aqui transcrevi do inesquecível Carlos Imbassahy. Lamento,
principalmente, porque jamais poderei admitir que alguém não tenha lido as suas
portentosas obras, ímpares na bibliografia espírita. Não me refiro a artiguetes
ou notinhas de imprensa, mas à obra que legou à cultura filosófica, em
alentadíssimas brochuras, cujas edições se multiplicam a cada ano
e onde, afinal, está o seu pensamento, a sua linha doutrinária.
Repiso: é incrível que haja, ainda
hoje, quem não tenha lido os livros de Carlos
Imbassahy; incrível, mas incrivelmente
verdadeiro. Como as bruxas: "hay" ...
Inobstante, o tempo, o grande amigo
tempo passará, desdobrando-se sobre as encarnações de todos nós. Ele
descortinará a Verdade aos olhares atônitos dos que viveram da ilusão. E a
revelação dada a Roustaing será
talvez razão de lágrima e compunção de muita gente despreparada para os
resplendores da luz que inunda a alma do Homem novo de amanhã. Por agora, que
fazer? Dou a palavra final deste artigo ao notável Carlos Imbassahy, cuia
coragem intelectual e moral serviram de "lead" a este trabalho,
escrito com a preocupação única de honrar-lhe a memória:
"O que temos a fazer é esperar. Esperar, suportando os mais duros
reveses, com o poder da vontade, da paciência, da resignação e da fé. O pano do
cenário cairá e terminará o drama da vida, para que esse pano se erga em outro
ato, onde os esplendores aguardam aqueles que souberam viver de acordo com as
prescrições do bem e do amor da Humanidade" ("O que é a Morte", Carlos
Imbassahy, pág. 274).
O próprio Imbassahy 'filho' nega tamanho despropósito.Em entrevista concedida ao jornal “Abertura”, de Santos, pág. 4, edição de agosto de 1993, o Imbassahy 'pai', acima retratado como roustainguista, afirma, categórico: A LÓGICA NÃO ME PERMITE ACEITAR ROUSTAING.
ResponderExcluirAlém disso, em seu texto "Radiografia da Deturpação do Espiritismo", o pensador Carlos Imbassahy, um dos que se esforçavam a combater as deturpações catolicizantes da Doutrina Espírita, nos alertou sobre os perigos dos chamados "kardecistas autênticos", uma farsa surgida tanto na crise do roustanguismo explícito quanto na crise do poder centralizador da Federação "Espírita" Brasileira.
Recebemos seus comentários com satisfação. O Blog permanecerá sempre aberto a comentários divergentes de suas fundamentações desde que sejam postos com respeito e consideração aos seus leitores como foi o caso. Sigamos caminhando em paz. Que nossas divergências nos unam no amor a Deus e ao próximo como a nós mesmos.
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