domingo, 15 de setembro de 2013

XII. 'Apreciando a Paulo'



XII
‘Apreciando a Paulo’
      comentários em torno
    das Epístolas de S. Paulo
   por Ernani Cabral

Tipografia Kardec - 1958

“Porque, se eu orar em língua estranha,
o meu espírito ora bem,
mas o meu entendimento fica sem fruto.
Que farei pois? Orarei com o espírito,
mas também orarei com o entendimento;
cantarei com o espírito, mas também cantarei com o
entendimento. Doutra maneira,
se tu bendisseres com o espírito,
como dirá o que ocupa o lugar de indouto o Amém,
sobre a tua ação de graças,
visto que não sabe o que dizes?
Porque realmente tu dás bem as graças,
mas o outro não é edificado.
Dou graças ao meu Deus,
porque falo mais línguas do que vós todos.
 Todavia, eu antes quero falar na igreja cinco palavras na minha
própria inteligência, para que possa também instruir os outros,
do que dez mil palavras em língua desconhecida.
1ª Epístola aos Coríntios, 14:14 a 19


            Esta é a lição de Paulo de Tarso, o iluminado apóstolo dos gentios, a propósito do uso de línguas estranhas, como o latim, nas práticas religiosas.

            Como alguém poderá dizer amém, conscientemente, na hora da missa, visto que não sabe o que o padre está dizendo? Apenas poderá supor que tudo está certo, mas sem uma convicção real, já que não entende o que o sacerdote lê.

            Não há nestes comentários o desejo de diminuir a Igreja católica romana, mas somente o interesse, a bem da verdade evangélica, de comparar essa tradição errônea ao ensino esclarecedor e autorizado do apóstolo, nos versículos acima transcritos.

            O padre “poderá dar boas graças”, mas os assistentes “não são edificados”, pois nada compreendem do que é dito, e limitam-se a repetir amém, sem a devida compreensão ou mesmo sem consciência da aprovação que manifestam!

            A Igreja de Roma se diz infalível. Entretanto, eis aí uma prática que é condenável, a que também se choca com a palavra de Paulo, o vulgarizador do Cristianismo, que ela devia respeitar, mesmo porque se diz “apostólica”.

            “Eu antes quero falar na Igreja cinco palavras na minha própria inteligência, para que possa também instruir os outros, do que dez mil palavras em língua desconhecida.”

            Esta é a palavra autorizada do apóstolo Paulo, encerrada na Bíblia, que o papa e a igreja de Roma, com seus bispos e padres, até hoje desobedecem ou deixam de seguir. Justificam-se, a propósito da unificação do culto e em nome da tradição; mas isto é contrário à perfeita edificação dos crentes, ou daqueles que assistem às missas, celebradas incompreensivelmente em latim.

            A missa consiste em leituras do Evangelho e em preces feitas em língua estranha, de difícil entendimento, já morta e desconhecida até por muitos doutores.

            Trata-se, portanto, a darmos valor à palavra de Paulo, de uma prática condenável, que não instrui os outros e nem edifica.

            Não é nosso interesse, repetimos, menosprezar a Igreja de Roma, que tantos cristãos tem dado à Humanidade e que, até hoje, tem um corpo de auxiliares excelente, como essas freiras abnegadas que servem nos leprosários e nos diversos hospitais, dando-nos o exemplo de quanto é edificante e generoso o poder da fé.

            Mas devemos preocupar-nos também com o problema da verdade, a que o próprio Jesus deu tanto valor. E “o vaso escolhido” para vulgarização de seu Evangelho (Atos, 9:15), o imortal apóstolo dos gentios, a esse respeito legou-nos tal ensinamento, que a Igreja “apostólica” de Roma, que também é cristã, devia acatar e cumprir, inclusive aquele outro, do próprio Cristo, “dai de graça o que de graça recebestes” (Mateus, 10:8), que ainda é mais, importante, recomendando que nada cobrássemos das coisas de Deus. A venda ou a mercantilização de “sacramentos”, inclusive da missa, com preço taxado, é abominável, constituindo, isto sim, perfeita heresia, simonia, ou ainda um flagrante desrespeito aos ensinamentos de Jesus, que é a verdadeira pedra de sua igreja, conforme a palavra de Paulo (I Cor., 10:4) e do próprio Pedro (I Pedro, 2:4).

            Contudo, sabemos que religião é grau de entendimento. Cada um segue a que melhor lhe apraz, e somos os primeiros a reconhecer que vários caminhos conduzem a Deus, pois o principal é a regeneração, a prática do bem, o amor.

            Conforme os padres reconhecem, a confissão de nada vale, se não houver o arrependimento das culpas. Logo, o que vale é o arrependimento e não a confissão, e aquele pode ser manifestado mesmo em segredo, ao Pai Celestial. É Ele quem pode perdoar nossos pecados, com a medida com que perdoarmos (Mateus, 6 :12) e de acordo com a sinceridade de nossos propósitos de regeneração.

            O lema do Espiritismo, como frisou o grande Allan Kardec, o codificador de nossa doutrina ou da Doutrina dos Espíritos, é TRABALHO, SOLIDARIEDADE E TOLERANCIA.

            Devemos ter compreensão e tolerância para com as outras crenças, que também são boas e que também são de Deus (em certos aspectos), embora tenhamos o dever de apontar-lhes os erros, não com o propósito de anatematizá-las (pois não temos esse direito de excomungar nosso irmão), mas com o intuito de servir à causa da verdade, que é a do Senhor.

            Se o apóstolo Paulo condenou as orações em línguas estrangeiras, dizendo que elas não edificam e nem instruem; se a passagem dessa primeira epístola aos coríntios aí está, desafiando contradições, é nosso dever apontar o erro multissecular em que laboram nossos prezados irmãos da Igreja católica romana, pedindo a Nosso Senhor Jesus-Cristo que ilumine seus entendimentos e que os faça compreender e sentir a verdade.

            O Espiritismo não foi criado para combater as outras crenças, pois todas são respeitáveis; apenas os erros são apontados para que o homem, livre e conscientemente, deles se afaste, se quiser.

            As diversas igrejas da Terra arquitetaram centenas de interpretações dos textos bíblicos e se têm digladiado, até com intolerância, julgando, condenando e excomungando, tudo isto em torno do Evangelho, mas contrariando as lições do Divino Mestre, que ensinou – “amai-vos uns aos outros”.

            Então, nos tempos prescritos, buscando dirimir essas dúvidas e contendas, em volta “da letra que mata”, os Mensageiros do Senhor vieram comunicar-se com os homens de boa vontade, dando o sentido exato do Evangelho e realizando sua interpretação “em espírito e verdade”.

            É a obra do Espírito Santo ou do Consolador, que é o Espiritismo, prometido com clareza, no Evangelho de João (João, 16 :12 a 14.)

            O desejo do Espírito Santo, conforme sua comunicação persistente aos homens de boa vontade, é de unir os cristãos em torno do verdadeiro sentido das palavras de Jesus e dos ensinamentos de seus apóstolos (que jamais podem ser interpretados contra a palavra do Divino Mestre), contribuindo para que desapareçam os dogmas e os enxertos humanos, feitos pelas igrejas da Terra, na árvore singela do Cristianismo, cujas lições precisam repetidas e examinadas na língua do próprio povo, a fim de que penetrem, naturalmente, em todos os corações!


            Assim, a palavra de Paulo de Tarso aí fica, para ser lida, examinada e seguida, porque ele falava, não só com a sabedoria dos homens, mas com a autoridade de um apóstolo do Senhor, escolhido pelo próprio Cristo, para vulgarizar sua doutrina de luz, que igreja alguma tem o direito de ensombrar.

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