A
Pluralidade
das
Existências
Mário
Rinaldini
Reformador
(FEB) Fevereiro 1961
A
pluralidade de existências equivale à possibilidade de nascer novamente neste
mundo ou em outros mundos onde as condições de vida o permitam.
Independentemente da crença que sobre este assunto predomina há milênios no
Oriente, já o célebre Camilo Flammarion, ao publicar a sua primeira obra, em
meados do século passado, a intitulou "Pluralidade
de vidas na pluralidade de mundos", postulado que veio a ser adotado
por Allan Kardec, o Codificador do Espiritismo. Mas o vocábulo vida,
como tantas vezes tem acontecido, pode ser interpretado simplesmente como
natureza, sem que faça específica alusão à existência, que define com maior
rigor a que assume o homem que participa da consciência dela.
Aplica-se,
então, a sucessão de existências exclusivamente ao ser humano, porque se
subentende nele uma alma e que esta é imortal (1). Por outro lado, sem mundos habitados não poderia efetuar-se essa
sucessão ou repetição de nascimentos. Estão em jogo, assim, os problemas
fundamentais que a Filosofia e a Religião têm intentado sempre resolver, e
vemos até que ponto mundos e existências são inseparáveis, até que ponto estão indissoluvelmente
unidos.
(1) O Autor
certamente não quis, a fim de não se estender em explicações, referir-se à
reencarnação de outros animais, igualmente possuidores de alma individual e
imortal. - (Nota de "Reformador")
Convém
esclarecer que, frequentemente, a palavra mundo
é empregada para designar o Universo, o cosmos, o orbe, o céu, etc., quando, a
rigor, devia circunscrever-se à Terra. Por outro lado, planeta indicaria com
toda precisão as condições de mundo habitado. Utilizaremos, então, preferentemente,
o vocábulo planeta habitado, sem excluir o de mundo, que pareceria mais
sugestivo. Outro tanto sucede com o nome de Alma e de Espírito. Para
o Espiritismo se denomina Alma ao
espírito que está unido ao corpo que representa o homem; é Espírito ao separar-se do corpo pela morte, recuperando a
liberdade. Não obstante, empregaremos indistintamente ambas essas denominações.
A Astronomia foi justamente designada
"Mãe da Ciência" e é oportuno chamar-lhe agora rainha dos domínios em
que as almas se forjam, pelas razões que a seguir apresentaremos.
Até
há precisamente meio século se acreditava que os vários centenares de milhões
de sóis descobertos constituíam todo o Universo; mas, a partir de uns trinta
anos a esta parte, graças à genial inventiva de esforçados investigadores e à
utilização de telescópios mais poderosos, foi possível dispor de instrumentos
que permitiram elevar essa soma, que parecia extraordinária, à impressionante cifra
de, pelo menos, cem bilhões de sóis, que, em seu conjunto, representam,
incluindo o nosso Sol, o que é denominado Via-Láctea, que constituiu
precisamente uma Galáxia. Essa estupenda e insuspeitada quantidade reduziu a
débeis balbucios as velhas concepções que nutriram tantas gerações desde o mais
remoto da História, sobre o que era o céu e os astros. Todo corpo celeste é um
astro, mas ocorre que, apesar do maravilhoso aperfeiçoamento de
seu instrumental, os astrônomos não podem registar, fora dos que compõem o
nosso sistema solar, outros corpos além das estrelas. Os planetas que possam
existir ainda estão fora de seu alcance visual. Nem se pode saber ainda se os tem
a estrela mais próxima. Não obstante, isso não quer dizer que algum dia, em
virtude de um genial dispositivo, não se possa desvendar a incógnita. Em que pese
a esse inconveniente, insolúvel por enquanto, outras razões militam para
induzir eminentes astrônomos, cujo número, aumenta continuamente, a declarar
que "não existe nenhuma razão de
valor que impeça admitir que cada sol ou grupo de sóis seja o centro de um
sistema planetário".
Outro
argumento de peso é a segurança que se possui de que o Sol não apresenta
nenhuma característica excepcional que o distinga do resto, nem em tamanho,
luminosidade, cor, nem elementos que o compõem e menos, ainda, por sua posição
dentro do conjunto, pois esta não pode ser mais
desvantajosa para as observações mais importantes que os abnegados
investigadores querem realizar dentro da Via-Láctea. Portanto. é preciso
rejeitar a existência de algo que justifique o privilégio de ser o nosso Sol o
único ou um dos poucos que regem a vida de um sistema planetário. Explica-se,
assim, a tendência atual de atribuir a cada sol ou
grupo de sóis a função de dirigir sistemas planetários parecidos ou diferentes
do nosso. (2)
(2) Veja-se a
concretização desta possibilidade no artigo "Descoberto novo satélite da
constelação do Cisne", inscrito na pág. 242 de "Reformador" de
1958. (Nota de "Reformador")
Tem
sido possível estabelecer, atualmente, que pelo menos a metade dos sóis formam
em grupos de dois, três e até de quatro deles, e também que os há em maior
número, uns poucos, os famosos cúmulos globulares e os irregulares, não
passando
de cem os primeiros, integrados por dezenas e
mesmo centenas de milhares de refulgentes estrelas. A outra metade é composta
de sóis simples como o nosso. Se calcularmos, por mera prudência, que os sóis
em grupos não possuem nenhum sistema planetário e que, em média, esses grupos
se compõem de três sóis cada um, concluiremos que três quartas partes dos cem mil milhões de sóis carecem de
sistema planetário e a quarta parte, ou sejam vinte e cinco mil milhões, os
têm. Mas, guiados por um excesso de prudência, se considerarmos que cada dezena
de sóis possui um sistema planetário com um planeta habitado como o nosso,
então haveria dois mil e quinhentos milhões de mundos habitados, apenas em uma das unidades estelares ou
Galáxia.
Parece-nos impossível tanta beleza, que nos enche de assombro.
Entretanto, talvez mais nos assombre o sabermos que, se deduzirmos os dois mil
e quinhentos milhões de sóis com um planeta habitado, da totalidade de cem mil
milhões de estrelas, ficarão noventa e sete mil e quinhentos milhões de sóis
sem aplicação e também sem explicação plausível o inconcebível desperdício da
precisa energia que emitem para dissipar-se em radiação isubstancial nas
profundezas do espaço.
Recusamos
admiti-lo; contudo, falar de milhares de milhões de residências planetárias
somente em um dos centenares de milhões de outros enxames estelares que
transpõem as profundidades do infinito, provoca uma admiração que promove as mais
fecundas inquietudes. Entretanto, isso confere uma sólida base à teoria da
pluralidade de existências. Cabe-nos agora fazer referência ao problema que
consolida mais fortemente os fundamentos da lei da pluralidade de existências,
isto é, ao protagonista que as encarna: a alma ou espírito.
Sua
realidade tem sido sustentada pelos maiores criadores de sistemas filosóficos e
foi sua chama divina e terrena que guiou os fundadores das grandes religiões.
Por conseguinte, o material acumulado por tão altos espíritos e seus sucessores
é abundante e de valor inestimável, mas o rumo da História tem querido,
especialmente no século passado, que se prescindisse e se negasse Deus e a
alma.
Tão
grave situação, cujas consequências estamos vivendo, requeria provas que
sintonizassem com o sombrio signo dessa época, que criava dilema de tão
angustiante magnitude. E elas chegaram, umas após outras, produzidas por mãos
invisíveis do mundo espiritual, alçadas como pendão de boa nova pelos
integrantes do movimento espírita ou espiritualista em quase todos os países do
Ocidente. Bastará citar o famoso caso do insigne físico William Crookes, que,
depois de cuidadosa e prolongada experimentação, ao abrigo de toda suspeita, pode
comprovar de maneira definitiva a realidade da presença, momentaneamente
corporificado, de um Espírito vindo do Além, Podemos mencionar igualmente as incomparáveis publicações
efetuadas pelo professor Ernesto Bozzano, que dispunha de um arquivo com mais
de cinquenta mil casos de fatos fenomênicos e experiências da mais variada
ordem, devidamente comprovados, que demonstram indefectivelmente a realidade da
sobrevivência da alma. A documentação no campo do Espiritismo é tão abundante
que já não resta a menor dúvida de que a prova decisiva foi alcançada, apesar
dos conservadores do sentimento religioso o haverem condenado e as autoridades
e instituições guardiãs da Ciência a repelirem, Essa prova decisiva se
apresentou por um meio inesperado, o da via mediúnica, mas o rumo dos
acontecimentos adquiriu tão acelerado ritmo que não duvidamos de que o
reconhecimento mundial não tardará muito a chegar e esse dia será de autêntica
alegria para todos, porque seus inegáveis benefícios a todos alcançarão.
Consolidadas
as duas bases que fundamentam a pluralidade de existências, ampliaremos um
aspecto da primeira para estabelecer que, se a razão dos sóis são os sistemas
planetários, a destes é, pelo menos, como em nosso caso, a de um planeta habitado, e a razão dessa habitabilidade são
as almas em procura de reabilitação ou aperfeiçoamento e a razão de ser dessa
imensa epopeia é o cumprimento da ingênita aspiração até aos mais altos pontos,
o que demonstraria que o Universo está a serviço dos Espíritos.
Esta
sensata e deslumbrante interpretação, que fazemos de acordo com os ensinamentos
do Espiritismo, outorga sentido esclarece dor de como se exerce realmente a
justiça divina, conciliando a ideia de seu amor e bondade infinitos, e que, em
lugar de absurdos castigos depois de fugaz existência, proporciona todas as
oportunidades necessárias em sucessivas vidas que se realizarão em uns e outros
planetas habitados, dos incontáveis que integram cada unidade estelar, para que
no vaivém dos sucessos se reabilitem, reconheçam suas culpas e arrependidos,
retomem a senda do bem, do amor e da perfeição. Portanto, a repetição de
existências no mesmo mundo ou a pluralidade delas em outros planetas nabitados
requer a presença de humanidades. O conceito de humanidade é algo esquivo,
inacessível, porque viver é estar inexoravelmente sujeito ao precário, a continuar caminhando para as
fronteiras do Além. Mas, como se nasce para viver a vida, se não fosse real o
estupendo panorama que agora temos à vista: se a morte fosse o Nada, a existência
se converteria em irremediável desespero, carecente por completo de estimulante
finalidade. Seguindo o curso desta exposição, devemos reparar no que a humanidade continua sendo ao transpor
os limites do outro mundo, para se achar novamente existindo e revelando apego
à sorte da que ficou na Terra. São como duas esferas, uma no mesmo nível da
Terra, outra no mesmo nível do Céu. A primeira com um raio, de ação limitado, .a
segunda como um raio de ação ilimitado. Ambas se complementam e são solidárias em
espontânea reciprocidade de influências, intimamente unidas por tudo quanto
constitui poema, drama ou tragédia, de cuja história compartilham. Em virtude
de suceder o mesmo com as outras humanidades, as almas que estão na esfera do ilimitado, quando podem
faze-lo, estabelecem abundante intercâmbio de ideias, sentimentos, apreciações
que promovem estados de efusão, admiração, gratidão, para nós desconhecidos. Ao
tornar extensiva a todas as humanidades de nossa Galáxia essa atividade tipicamente
espiritual, é relativamente fácil representar-se essa espécie de festa das
almas envoltas em torrentes de pensamentos que estimulam os mais elevados propósitos,
e, talvez, em muitos casos, esse abarcamento pretenda alcançar outras e outras
galáxias; porém estamos ainda muito distantes dessa maravilhosa possibilidade,
porquanto, atentando para a nossa extraordinária pequenez, primeiro faz-se preciso
despojar-nos das misérias morais.
Outro
aspecto intimamente relacionado com o que acabamos de expor, que não podemos
deixar de mencionar, é o das migrações que se efetuam de uns a outros mundos.
Essas migrações de almas, numerosas ou reduzidas, chefiadas por Espíritos de alta
hierarquia, são reveladoras desse sopro de renovação que reina nos domínios das
humanidades, em suas duas fases de existência e que obedecem ao mesmo princípio
da pluralidade de vidas, isto é, as almas continuam em busca de uma felicidade autêntica,
de um sonho de beleza ou perfeição que amiúde se desvanece no meio das lutas e
da adversidade que devem enfrentar em cada experiência existencial. Nosso mundo
convulsionado tem sido definido pelos Espíritos como um mundo de prova e
expiação. Passa por uma etapa de grandes transformações e nas últimas décadas
vem experimentando um aumento de população inusitado. Em grande parte, esse
aumento provém das medidas de higiene e das conquistas da técnica; mas,
conforme a nossa teoria, cada habitante é tanto espírito como o organismo
biofísico de que dispõe para as suas manifestações e ele justifica a fluência de
migrações em maior ou menor quantidade. E o que nos importa consignar é que as
migrações são mais numerosas onde as condições oferecem melhores perspectivas
para a sua instrutiva experiência. Isto indicaria que estamos às vésperas de
surpreendentes realizações em todos os campos da atividade humana, o que, por
seu turno, seria garantia de que a guerra, a temida guerra que, pela
possibilidade de assumir horrendas proporções, ninguém deseja, será para sempre
desterrada.
As
apreciações que fizemos a respeito da reciprocidade de pensamentos entre umas e
outras humanidades, em sua fase ao nível do Céu, se aplicam igualmente às
migrações, embora com outra impressão, destinadas a penetrar em cheio na espessura
da convivência terrena, pois as inovações que promovem concorrem de outro modo
para o progresso geral. De qualquer maneira, porém, demonstram que a
solidariedade e a colaboração constituem as ações que dirigem as relações entre
as almas, em uma ou em outra das fases de sua existência, no estupendo concerto
da vida universal.
A
astrofísica sustenta que cada estrela, ao irradiar luz, perde quantidades
colossais de sua massa por minuto, e essa energia radiante é aproveitada numa
parte mínima (uma parte em duzentas mil no caso do Sol) pelos planetas que
porventura tenham. O resto se dissipa no espaço. Por conseguinte, a energia
radiante do fabuloso número de sóis que nos rodeiam junta-se no espaço,
convertendo-o no reservatório da massa das estrelas transformadas em luz. Dispõe-se
hoje em dia de instrumentos que já registram alguma coisa do que se passa com essa
abundantíssima energia, o que tem reforçado a opinião de que, ao fundir-se,
repelir-se ou juntar-se, dá origem a combinações que depressa terminam na formação de sistemas estelares destinados a
substituir os que se vão extinguindo. Se nos referimos a esse aspecto é porque
se deve excluir a crença de que o espaço é algo vazio, apavorante, e de que só
chega até nós o inanimado. Esta imagem é imputável à maneira pela qual à
percebe o nosso sistema sensório.
Também
nesse terreno o Espiritismo dá valiosa contribuição. Desde as primeiras,
comunicações era assinalado que o espaço é o Grande Laboratório Universal. Por
acréscimo, é a residência das almas, das mais atrasadas às mais luminosas. Sem
cessar, essas regiões invisíveis são percorridos por
inumeráveis legiões de Espíritos dedicados ao bem e à caridade, que velam pelos
que sofrem ou que se encontram em erro, e, com elas e sobre elas, por extensas
comunidades de almas refertas de amor sublime, resplandecentes de saber e
beleza, que controlam a marcha dos sistemas de sóis com suas humanidades, as
quais se desenvolvem em seus respectivos sistemas de planetas habitados. A nova cosmovisão reduz a míseras tentativas todas as
concepções que do Universo vinham sendo ensinadas desde as primeiras idades.
Afeta de fato todas as esferas do saber, seja religioso, científico e filosófico,
lançando insuspeitada claridade sobre os problemas fundamentais do destino
humano.
A
pluralidade de existências, que estudamos em rápido esboço, levou-nos a
destacar o seu verdadeiro alcance, podendo agora chegar-se à conclusão -de que
sendo o Espírito a verdadeira existência, .a sucessão de vidas é o espontâneo
desenvolvimento de sua atividade essencial, que é vida de vida, e, por seu
intermédio, verifica-se que essa pluralidade é possível porque há também lares
planetários onde ela pode efetuar-se. Por esse caminho, pudemos chegar à
convicção fundada de que o Universo, o extenso e maravilhoso Universo, em toda
a gama de sua riqueza dinâmica, energética e biológica, existe para servir de
pedestal, de oficina, de crisol, de aula ou de cenário aos Espíritos
inexperientes ou prevaricadores, que terão de ocupá-los para realizar sua
grandeza imperecível.
Não
desejamos incorrer na imperdoável omissão de silenciar acerca do autor de tanto
prodígio. A diversidade de nomes com que ele tem sido designado não tem
conseguido defini-lo. Podemos sentir Deus, mas só o sentiremos verdadeiramente
quando houvermos alcançado a justa proporção do grau de pureza e o nível de
compreensão necessária a esse fim.
Todas
as imensidades que, no mundo estelar a Astronomia revelou, e o profundo sentido
humano, coerente e luminoso, com que o Espiritismo atende a essa totalidade
alvoroçada de almas e humanidades, assinalam indefectivelmente a majestade do
Supremo Concessor de todo o Bem.
Sóis
e Universo, almas e humanidades exaltam o poder de Deus, e Ele é em todo o
magnífico esplendor de sua infinita grandeza, e nós somos, na mais
insignificante parte de nossa pequenez, não obstante "estarmos feitos em
espírito à sua semelhança" .
(Transcrito
de "La Idea", número de Junho- Julho de 1958.)
Nenhum comentário:
Postar um comentário