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Fenômenos
de Materialização
por Manoel Quintão
Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
1942
O
Brasil ocupa vasta extensão de território, equivalente a pouco menos de metade
da América do Sul, e confina com todas as nações políticas que constituem o
continente, exceto o Chile.
Dizemos
nações políticas porque, na verdade, adotado o critério etnográfico, todas
essas nações ainda hoje se confundem em suas origens e desdobramentos.
Iberos
e Lusos, neolatinos ambos, os dominadores se mesclaram mais ou menos ao aborígene
aqui encontrado, e cujos ancestrais, por sua vez, não prescindem de uma
genealogia comum.
No
Brasil, entretanto, como em a Norte-América, outro fator se imiscuiu cedo
bastante para caldeamento da nova raça, com a diferença que lá, nos Estados
Unidos, o negro se insulou, extremado de cruzamento, enquanto aqui, estimulado
pela índole do colonizador, prolificou e preponderou mesmo, ao Norte, em
Estados como Bahia e Maranhão.
Com
a bravura e o espírito de liberdade do índio; com a resistência pacífica e a
amorosidade do negro; com o espírito de aventura e cavalheirismo do luso, como
que se acentuaram e apuraram os característicos do crioulo para receber e
assimilar o influxo da civilização europeia.
Quando
assinalamos estes valores étnicos em escorço desta natureza, é claro que não
pretendemos subordina-los a influências biológicas quaisquer, pois que o
sangue, para nós, é um fluido orgânico especificamente idêntico em todo o ser
humano.
Queremos,
sim, e devemos condiciona-los ao ascendente psicológico, ou seja ao contato dos
Espíritos em reencarnações iterativas, criando interesses e laços de afinidade
intelectual e moral, na formação de uma Pátria comum, com finalidades definidas
na evolução da humanidade.
Assim,
do africano a superstição, do índio a exaltação e o ardor votivo, e do luso o
misticismo poético se fundiram, para nos dar uma religiosidade pacífica,
temperada de suave racionalismo e extreme das violências e demasias que
ensanguentaram, quanto denegriram, a evolução religiosa do velho
continente.
É
um fato que, à parte ocorrências isoladas, acidentes mais políticos que
religiosos, as lutas sectaristas, a Inquisição, não tiveram eco aquém mar.
Dir-se-ia
que ao sol dos trópicos, em reflorir de seivas, ao contato de uma natureza
virgem, quão magnífica, os corações se destravavam, os Espíritos se abrolhavam,
as gentes se acomodavam à comunhão de um Novo Ideal também novo como o cenário
que se lhes rasgava aos olhos e maravilhoso dessas mesmas maravilhas.
Duas
citas ilustrativas bastam a sancionar o asserto: - Nassau, em Pernambuco,
luterano confesso, não consta tenha hostilizado o culto católico e, no Império,
por oficial o Catolicismo nenhuma religião, aliás permitida, embora com
restrições, sofreu violências.
Se
tais restrições, aliadas ao bafejo oficial, não facultavam a esses credos maior
desenvolvimento, não iam, contudo, ao ponto de lhes cercear o proselitismo e
estancar as fontes de uma propaganda discreta, que haveria de avolumar e
produzir frutos oportunos, como sucedeu com o Protestantismo e com a nossa própria
doutrina.
Proclamada
a Republica com surpresa e espanto da maioria da Nação (bestificada, na frase
de Aristides Lobo (1), estatuída
oficialmente a liberdade de cultos, a "Revelação Espirita", estudada
e praticada, até então, de modo por assim dizer "fragmentário e
dispersivo, quão platônico, entrou a corporificar-se, havendo por centro de
irradiação natural o Rio de Janeiro, a capital do país, o" seu maior e
mais importante núcleo de população e intelectualidade.
(1) Ainda há quem
insista no afirmar que Deodoro, ao marchar para a Praça d'Aclamação, não tinha
em mente derrubar a Monarquia, mas apenas destruir o ministério Ouro Preto,
como consequência da chamada questão militar. Esse seu desígnio fora, porém,
anulado in loco e de chofre. E por que não ver nesse incidente uma prova da
influência, dos Espíritos, quando ela está por toda a parte?
Os
médiuns curadores, mais que quaisquer outros, repontaram a flux em todas as
camadas sociais, á proporção que as obras espíritas se vulgarizavam por todo o
país, de Norte a Sul.
Qual
o primeiro caso de cura mediúnica? Ignoramo-lo .
Sabemos,
entretanto, que eles se realizaram por milhares e de tal quilate que aliciaram
adeptos na própria classe médica, adeptos do estofo de Marx, Dias da Cruz,
Bezerra de Menezes, Maia Barreto, Fernando de Alencar, Pinheiro Guedes, para só
falar dos desencarnados .
Mas,
por que essa feição singular, que não teve e não tem paralelo na história
espiritista de outro povo?
A
nosso ver; porque a índole, a alma coletiva da nossa gente, a sua formação, o
seu determinismo histórico, as circunstancias mesológicas, territoriais, econômicas
e morais assim o permitiram, providencial que não fortuitamente.
É
um prisma doutrinário superior, que nenhuma escola clássica poderia consultar e
que, mesmo para a generalidade do proselitismo, demanda amplitude de horizontes
visuais e muita coordenação de raciocínio, conhecimentos históricos e
filosóficos, senso comparativo e alta intuição teleológica.
A índole
brasileira, a própria história do país definem-na como a mais pacífica do
mundo.
Conquistas
de ordem moral e politica, tais como a Independência, a igualdade civil
(abolição da escravatura), a República, a separação da Igreja e do Estado, a
delimitação de fronteiras, tudo se há conseguido, pode dizer-se, sem efusão de
sangue.
Essa
indiferença, essa desambição, a miúde julgadas um mal, um sintoma de frouxidão
do caráter nacional, é antes, para nós outros, um signo benéfico, um timbre de
superioridade moral - antevisão específica, inconsciente embora, da evolução
espiritual, prenúncio de confiança, em suma, no potencial divino, em trânsito
acelerado para a fraternidade universal.
Se
o Cristo disse - que um fio de cabelo
não cairia sem que o Pai quisesse, não devemos daí iludir a lei de trabalho
e esforço, que nos compete individual e coletivamente realizar, para
enriquecimento do patrimônio de progresso planetário; mas, do esforço e do
trabalho inteligente e pacífico à violência, aos surtos da força, às explosões
do egoísmo, em detrimento da moral universal e da razão divina, vai todo um
abismo, que só pode ser coberto pela lei de Amor.
Indivíduos,
classes de indivíduos e nações, ainda não experimentaram até que ponto a
humildade deixa de ser covardia, porque uns e outras, tarados de orgulho -
fermento que leveda toda a massa - não se precatam da existência das correntes
espirituais que conduzem a humanidade.
Ora,
de um nateiro de Espíritos assim distribuídos e conjugados, o pendor latente e
pronunciado por mil feitos esparsos é o da beneficência mútua e, como a
desproporção da massa inculta e boa é enorme; como a dispersão dessa massa é
também um fato e mais: como essa população numerosa vive em rincões remotos,
isolada e pobre, dada a dificuldade de comunicações, era natural que os médicos
do espaço aí acorressem e, ao mesmo tempo que curassem corpos, suscitassem a
cura dos Espíritos.
Quem
perlustra o interior do nosso país e o conhece na singeleza simplesmente
encantadora dos seus hábitos e costumes, sabe que o Brasileiro ainda não
contaminado da gafeira do modernismo teórico e dissolvente, é um espiritista
inconsciente, seja um cristão inato.
Ele
pode, na verdade, ouvir a sua missa na igrejola rústica do povoado próximo, mas
sabe como ninguém de histórias de almas do outro mundo e as conta com a
convicção de verdadeiro crente.
E,
se nos centros civilizados o médium prescreve homeopatia, lá, por esses sertões
a dentro, é a flora opulenta o reservatório em que os Espíritos buscam remédio
para todas as enfermidades.
Poderá
ele, o ingênuo, o mísero instrumento da Providencia, não saber ler; poderá não
conhecer, de oitiva sequer, a Doutrina dos Espíritos, mas o que ele não ignora
é que há almas boas e almas ruins, pelo que também possui orações para atrair
umas e afugentar outras.
Com
mais um pouco, se um dia cai num centro espirita, magnífico de intuição, é de
vê-lo adepto integrado naquela "zona lúcida" de
que nos fala o ilustre Dr. Paul Gibier (1).
(1)
Analyse des choses.
Autóctone,
remanescente de velhas migrações orientais, ádvena da África ou forasteiro da
Europa, mais recente, que importa?
Ele
saturou o seu Espirito no "ambiente espiritual" desta terra de Santa
Cruz - é um filho
de Deus que busca o aprisco do Pastor, sob as
vistas de Ismael.
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