sábado, 16 de março de 2013

21. 'Fenômenos de Materialização'


 Não é uma materialização!


21

Fenômenos de Materialização
por     Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942


2º Caso.

            Este ocorreu com um médium de nossa maior intimidade.

            À tarde de um domingo, repousando no lar, das fadigas de sua faina comercial, entra-lhe a porta, acompanhado de confrade amigo, um homem de qualificação social, o Major B., cujo filho gravemente enfermo, deveria operar-se no dia imediato, de um suposto abcesso no fígado.

            Ao expor o fim daquela visita, o confrade apenas queria, crente e como tal, poder proporcionar lenitivo ao coração paterno do amigo e recorrente. Assim se justificando, quereria, a mais, dar-lhe prova da realidade dos Espíritos, com a obtenção de um diagnóstico e prognóstico.

            E, para que a prova lhe fora mais convincente, não deixaria, claro, transparecer algo do que sabia e se premeditava - a operação cirúrgica.

            Depois de exordiar sobre a falibilidade dos médiuns e a relativíssima capacidade do recurso, como elemento de convicção - máxime nos casos de contradita à ciência oficial - apenas precedendo o seu gesto de uma prece a Jesus, o nosso médium tomou do lápis e prescreveu dois medicamentos homeopáticos, seguidos desta só promessa: Amanhã direi sobre a operação.

            Os visitantes entreolharam-se surpresos e o pai do enfermo, comovido, perguntou:

            - Como sabe o senhor tratar-se de uma operação?

            - Porque o senhor agora m’o diz, a confirmar o que aí escrevi, inspirado pelo Espírito assistente.

            - Que Espírito?

            - O que me assiste neste ministério de pura caridade, de que foi ele, como médico, . aqui na Terra, um verdadeiro apóstolo - o Dr. Bezerra de Menezes.

            Nesta altura, o inculcador do recurso interveio:

            - Aí tens, amigo B., uma prova da misericórdia divina: por que, pois, recalcitrar? Fala, dize tudo...

            E o pai aflito e comovido relatou, então, que tinha um filho de quatro anos, o pequeno Gentil, a ser operado no dia imediato, mas, que o cirurgião, aliás íntimo da família, de antemão prognosticara a fatalidade do tentame, dada a fraqueza do enfermo, que, aliás, se o não realizasse, sucumbiria pela infecção.

            Agora espicaçada, assim, a curiosidade do consulente, pretendia ele algo adiantar ao prognóstico oficial, forçando a opinião do Espírito. Mas o médium, irredutível, para logo lhe disse não transgredir preceitos tão categóricos, uma vez que, em casos tais, a fé sempre fora o melhor e maior elemento de êxito.

            - Mas, a sua opinião pessoal? - insistiu o aflito pai.

             - Eu não a tenho, meu caro senhor, não posso tê-la, nem mesmo devo tê-la, tão certo é presumir-me apenas um instrumento dos Espíritos.

            - Afinal, instante veementemente solicitado, sempre aventou: De duas, uma: ou seu filho morrerá de hoje para amanhã e, neste caso, prescindirá de operação, ou o médico do além espera com estes dois medicamentos modificar o estado patológico para decidir da operação.

            - Mas o senhor, que assim me fala com tanta segurança, é pai também... Poderia aceder em visitar o pequenino enfermo?

            Por mais que o médium lhe falasse da inocuidade de sua presença, uma vez que era um pobre leigo na arte de curar, não houve como se furtar a essa visita de mera cortesia e, digamo-lo também - de caridade, realizando-a à tarde.

            Desesperador o ambiente familiar, havia em cada pupila o traço de uma lágrima furtiva.

            Conduzido à alcova, na qual pairava o significativo silêncio que soe anteceder as grandes agonias, entre olhares de angústia e olhares de dúvida, verificou o médium, como leigo, a gravidade aparente do mal.       

            O doentinho ardia em febre alta de 40º, respiração estentórica, olhar vítreo, prostração absoluta. Tinha o ventre volumoso, duro, insensível; não se alimentava nem já defecava havia quatro dias, a despeito dos mais enérgicos drásticos ministrados.

            Em o tomando ao colo, massa inerte, o médium deu-lhe passes, ele mesmo - o médium sob a impressão do maior pessimismo.

            A sua atitude, adivinhava-o, produzia a curiosidade irônica, embora respeitosa, de familiares e fâmulos (criados, empregados), todos a compita interessados no caso, mas descrentes do "milagre".

            Pois "sô dotô" não dissera que só mesmo um "milagre"?

            Havia, porém, no meio hostil e refratário, um elemento precioso, de cuja salutar eficiência não é lícito duvidar - um coração de mãe.

            Foi para esse coração que o chefe da família ali reunida em conselho, exposta a consulta, apelou, dizendo:

            - De ti, minha mulher, mãe que és, depende agora a nossa resolução.

            E ela - Se o nosso filho ha de sucumbir retalhado, sangrado, martirizado, mutuado, que sucumba íntegro, em meus braços, ao calor dos meus beijos. Vamos dar-lhe as "aguinhas" e amanhã será o que Deus quiser.
           
            Este - o que Deus quiser - vale bem uma outra tese.

            Ao retirar-se daquela câmara fúnebre, o médium levava consigo uma alma de chumbo e monologava: É um caso perdido, não há Bezerra que o salve; amanhã está enterrado.

            Qual não foi porém, a sua surpresa quando, antecipado de ordens, depois de uma súplica ardente, recebeu esta comunicação:

            " - Nada é perdido. O doente não tem tumor no fígado e muito menos no bordo interno do fígado (1). O que ele tem e uma infecção intestinal generalizada.  Vamos medicá-lo com a "graça de Deus" e, não um,  mas muitos tumores lhe rebentarão em benefício da cura. A operação, qualquer operação, será fatal.

            (1) Este pormenor não era conhecido do médium.

            Na manhã seguinte, alviçareira, esta comunicação foi recebida com mais confiança pela família, tendo-se verificado melhoras no enfermo durante a noite. A febre declinara, o enfermo pedira alimento.

            Posta de lado a ideia de operação, com ironia e despeito do médico assistente, entrou o paciente em franco regime homeopático, auxiliado de passes magnéticos e, após a formação e supuração de um, dois, três, quatro volumosos abcessos no abdome, restabeleceu-se completamente. É hoje um dos rebentos mais sadios daquela família. Ela, a família, converteu-se em peso à doutrina e, porque o fato haja ocorrido há mais de quinze anos, essa conversão se desdobrou por muitos lares, onde se aceita e pratica hoje o Espiritismo.

            Nesta altura, a título de ensinamento, convém relatar um episodio interessante, de molde a demonstrar que o comércio com os invisíveis não pode ser praticado arbitrariamente, ou seja sem tal ou qual critério, que se não improvisa, antes se adquire com esforço, abnegação e sacrifício.

            É o que justifica o preceito do Deuteronômio, tão do agrado dos nossos adversários, ortodoxos fechados.

            O caso é que, diante da cura do pequeno Gentil, toda a família B. passou a fazer observações e a obter provas as mais insólitas e convincentes.

            A princípio, eram segredos e revelações de família desvendados com minúcia e precisão edificantes; parentes há muito desencarnados, a darem testemunhos inequívocos da sobrevivência; depois, sermões religiosos e defesas jurídicas, ou teses filosóficas produzidas de improviso, altiloquentes e ilustradas de citações latinas, de textos eruditos, por moças de instrução vulgar, sem cultura literária nem conhecimentos científicos.

            Mas, a breve trecho, essas manifestações derivaram para o campo da mais nua pornografia e das violências inauditas, tentando os pobres e despercebidos médiuns ao público escândalo, ou procurando impeli-los mesmo ao suicídio.

            Foi quando, pelo mesmo médium que ali levara a primeira semente da Fé, foi recebida a seguinte mensagem:

            "Amigo, a esmola foi grande demais para aquele meio. A verdade, como a luz, não graduada, em demasia, cega. Diga àquela gente que lhes proíbo ler e mesmo falar de Espiritismo, até que o possam compreender e sentir, como convém.

            Separem-se os médiuns, distraiam-se os médiuns, dissolva-se a colmeia.”

            Assim se fez, dispersou-se a colmeia. e a normalidade voltou ao seio dessa família, que é hoje, repetimos, toda ela adepta do Espiritismo.

            Relatemos agora outro caso bizarro, a desafiar suspeitas quanto à eficácia de qualquer ação medicamentosa, em dadas circunstancias, ao menos com o valor absoluto que comumente se lhe atribui.

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