domingo, 10 de fevereiro de 2013

2. 'Fenômenos de Materialização'





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Fenômenos de Materialização
autor: Manoel Quintão
 Livraria Editora da Federação Espírita Brasileira
 1942

            Apenas, a premência de tempo não lhe ensejou trabalhos de longo fôlego. E embora as colunas do “Reformador" guardem lições suas, em prosa e verso, suficientes para constituir mais de um milhar de páginas de erudição doutrinária e modelar poesia, além de vasta e dispersa colaboração em jornais, Manoel Quintão sempre fugiu a escrever livros, sustentando que o melhor fruto é proporcionado pela síntese no ensinamento, pois mais arraigada e eficazmente se guarda na Alma - um preceito eloquente e verdadeiro, do que - na memória - extenso trecho de rebuscado estilo a imitar os clássicos.

            Mas, ainda assim, por algumas vezes, abriu exceções, e disso se seguem três exemplos. O primeiro trabalho é uma tese completa sobre o exercício da mediunidade, eloquentemente documentado com os mais convincentes traços da intervenção dos Espíritos, sem margem para explicações mais ou menos especiosas de telepatias ou criptostesias, nem elucidações pelas patranhas de uma  pseudociência onisciente.

            Fechado com um - Abecedário dos médiuns - que é um dos mais completos códigos para orientação desses instrumentos do além, o trabalho de Manoel Quintão encerra um ensinamento e advertência de excepcional importância e gravidade, cujo desconhecimento ou desprezo tem levado à desgraça - quando não à morte - pessoas e famílias.

            Vale sublinhar fortemente esse aspecto da lição que ali se condensa.

            É que, depois de recebida a dádiva caridosa, misericordiosa dos Espíritos, o contemplado não pode, não deve fugir ao testemunho de afirmar a Verdade, tornando-se infinitamente mais grave a falta - quando o agraciado esconde a ação dos Espíritos para não perder vantagens ou situações materiais de proventos e de clientela.            

            A lição que nos veio foi esta: Todo aquele que recebeu a visita da Verdade, e desta lhe ficou o socorro em hora de provação, tem de testificar - à face de Deus e dos homens - do que recebeu. Se o não fizer o seu duro coração, à semelhança do metal que necessita adaptar-se ao molde, terá de ser fundido no cadinho da Dor, ao fogo do sofrimento.

            Quando os Espíritos intervém em favor das criaturas humanas, assumem a responsabilidade dessas protegidas, e tem de propiciar a elas os elementos adequados, as oportunidades concomitantes, necessárias ao conhecimento e remodelação dos impenitentes, - por mais, dolorosos que se tornem esses meios de ascese à condição de Espíritos libertos dos erros terrestres. Sob os golpes do malho - aa bigorna inamoldável - é que o ferro se torna dócil e amoldável.

            Não importa que o aproveitador da benevolência dos Espíritos suponha estar quite pela dádiva que recebeu, e julgue poder ambicionar, conseguir, desfrutar posições e aferrolhar cabedais, costas voltadas às realidades da vida espiritual, surdo ao chamamento piedoso e fraterno dos desencarnados... Quanto mais tempo decorrer, maior lago de lágrimas estará formando para o futuro. Quanto mais dinheiro acumular nos estabelecimentos bancários, maiores agruras estará reservando para o porvir do seu próprio Espírito. Bem o disse o Cristo: do cárcere não sairá o devedor, sem que haja pago o último centil da sua dívida.

            Essa a dolorosa lição da autoridade policial fluminense de que trata um dos pontos do edificante trabalho.

            O outro é a valiosa narrativa de materializações realizadas em Belém do Pará, com a médium Ana Prado, a que assistiu e implicitamente controlou. É um documento de inapreciável mérito, porque constitui depoimento idôneo, de uma consciência honesta, de uma inteligência acurada e vigilante - contra a qual fraude alguma prevalece - em assunto doutrinário, testemunho bastante para inspirar confiança a quantos desejem - por ele e daí em diante - estudar a verdade desses fatos.

            Mas, ao lado de tão empolgante descrição, há uma página de incalculável beleza e vibração de sentimento: é aquela em que o Autor descreve o seu apelo ao Espiritismo, quando a, Medicina o desenganou de viver, dando-lhe - irrecorrivelmente - um bem curto prazo de resistência física. É um documento e é uma prova a que nenhuma consciência íntegra poderá deixar de render homenagem.

            O terceiro e final é uma palestra domingueira, lida na sede da Federação Espirita, e vale por uma lição erudita, pois dificilmente se conseguirá melhor condensar em tão poucos períodos um tão largo cabedal de conhecimentos históricos sobre a verdade da ação das forças universais na imortalidade da vida e do Espírito, paralelamente a preciosos exemplos das hesitações e erros da Ciência oficial - a negar, hoje,   as verdades de amanhã.

            Mas, no conjunto, extremados os assuntos precípuos de cada um desses trabalhos, ainda ficará pairando um elemento de invulgar riqueza; um filão onde o ouro fulge espontaneamente aos olhos de quem sabe ver... É a beleza do estilo, que mal esconde o literato sob o gabão do doutrinador.

            Pode qualquer um isso constatar: o Autor tem o raro dom de fundir, na sua maneira de escrever, os três principais elementos do estilo perfeito: sentimento, erudição, beleza. E também falando, a frase lhe flui natural, polida, doutrinária, simples no seu encanto de espontaneidade.

            Mas, talvez se interrogue, por que um tão bem aquinhoado ser não tem o nome no pórtico de alguns livros?

            Por modéstia natural, pelo conhecimento que a experiência da observação lhe deu. Ele diz que o maior tropeço do Espirito, na delicada senda dos trabalhos doutrinários, é a vaidade, principalmente aquela que assenta nos lauréis do mundo, cujas raízes se escondem nos aplausos nem sempre sinceros e não raro exagerados.

            Evita as sagrações literárias, os êxitos de vitrine, as consagrações de fachada...

            Espectador de muitos dramas íntimos, assistente de alguns fracassos mediúnicos, que ruíram aos estrondos do zabumba de um exibicionismo incompatível com o anonimato indispensável ao labor espirita; ele sempre se furtou a todas as oportunidades de risco de se confundir com os espetaculosos "apóstolos" e "trabalhadores da seara" que só transitam em público batendo aplausos a si próprios.

            Tem, no entanto, contribuído formidavelmente para muita realização espiritual, para enorme conforto e consolo de inúmeras almas aflitas, para elucidação de muitos hesitantes e incipientes adeptos; mas, sempre anônimo, naquele paradigma evangélico da esmola por uma das mãos, sem que a outra de tal se aperceba, lição que também serve para a esmola que é dada aos Espíritos necessitados.

            Quer a coluna editorial do "Reformador", sempre douta  e fiel na pureza doutrinária, quer a suculenta e inapreciável seção de CORRESPONDÊNCIA, guardam copiosíssima série de ensinamentos transmitidos pela sua pena e suficientes para sagrar a reputação do mais notável dos escritores do Espiritismo.

            Promovendo a publicação em volume autônomo destas três produções, tenho esperança de vencer a relutância do Autor em rever e consentir que se republique um outro seu trabalho de elevado quilate - O CRlSTO DE DEUS. E, se ajudado, quiçá algo mais do muito que o tempo sepultou no esquecimento natural, pela ação do repouso da memória, depois que se lê um trecho de Revista...

            Pedindo ao leitor perdão por haver penetrado nas páginas deste volume, devo afirmar que o meu intuito principal foi explicar a demora em aparecer um livro com o nome de Manoel Quintão por autor, e também dizer da modéstia, sincera e difícil de exprimir, com que aferrolha o nome, no improcedente temor de ser confundido nessa notoriedade que, barulhenta e gastronomicamente, é disputada por muita gente nas revistas e jornais.

Almerindo Castro


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