História
antiga
Rui Alencar Nogueira
Transmitiu-nos
um Espírito iluminado, mercê de Deus, esta grande e incontestável verdade:
"As religiões (erro imperdoável)
todas em luta entre si, exclusivistas, quanto à posse da Verdade, e isso em
nome do próprio Deus, aplicadas não em procurar, como deviam, a ponte que as
ligue, mas em cavar o abismo que as separe; cada uma presa da ânsia de invadir
sozinha o mundo todo, em vez de coordenar-se com as demais, colocando-se no
nível que lhe corresponda pela profundidade da revelação recebida, mais não têm
feito que recobrir de humanismo a originária Centelha Divina." (Do
Livro "A Grande Síntese",
edição da FEB).
Recordo-me,
diante disto, que há cerca de 10 anos servia eu numa guarnição do Norte do país
e estava no meu posto, num sábado, quando o sargento da guarda veio à minha
presença para comunicar a chegada de um sacerdote católico que pretendia
confessar, ali mesmo, todas as praças de serviço naquele dia.
Por
minha vez, devo declarar que, então, ainda não chegara até o meu espírito a luz
da Terceira Revelação e eu ainda desconhecia a
tolerância e a mansidão para com os pobres irmãos em Deus e vivia, portanto,
nas trevas e sob o conceito materialista dos fatos.
Ainda
perplexo, fui ao encontro do padre que se propunha realizar um dos atos do seu culto religioso dentro de um Quartel,
contrariando as leis e os regulamentos militares em vigor, do Estado desde os
tempos memoráveis da proclamação da República e este laicismo foi uma das
grandes conquistas da democracia no nosso país.
"- Tenho ordens do seu comandante para
confessar os homens, disse-me ele. Sou o capelão militar. Não vê que uso na
manga da batina as estrelas de Capitão?"
"- Desconheço essa função militar,
reverendo. O desejo é, em verdade, muito antigo, mas os fatos ainda não estão consumados. Traga
esta ordem escrita, porque ela é absurda e não pode ser cumprida assim ... de boca!"
-
"- Ora, tenente, mas que exigência tola!
O senhor é muito moço! Ainda não compreende a vida. Eu poderei ser, um dia, seu
superior. E, olhe, o senhor terá que me fazer continência!"
"- Tudo é possível, não nego, porque o
mundo caminha para frente... mas dá os seus passos para trás, e nós podemos voltar às
ladainhas nas casernas, como no tempo do Império. Mas, vamos esperar. Por
enquanto, a Lei é outra bem diferente."
Meia
hora depois, o comandante - homem católico e que fora um dos organizadores da
chamada "páscoa dos militares", dela participando como comungante,
chamou-me ao telefone.
"-
Tenente, o padre F... veio à minha residência queixar-se. O senhor exigiu uma
ordem escrita para que ele pudesse realizar confissões aí no Quartel, embora
seja amanhã o dia da nossa páscoa?"
"- Perfeitamente, coronel - respondi-lhe.
O regulamento neste particular é bem claro e não permite. O senhor concedeu a ordem
escrita?"
"
- Não, meu filho, redarguiu paternalmente. Você cumpriu o seu dever. Muito bem!
As nossas igrejas, realmente, estão bastante próximas
e os que desejarem poderão ir a qualquer delas, com toda convicção, mas sem a
obrigatoriedade. Esta, sim, é a verdadeira religião - um dos verdadeiros
caminhos que nos levam a Deus. Obrigar o soldado a ser católico, meu filho, não
é possível nem é doutrina de Cristo!"
"-
Mas, comandante ... "
"- Não diga nada, tenente, porque a
Verdade está ao alcance de todos e Deus nunca foi nem será privilégio de ninguém ... "
"- Obrigado, coronel, pela excelente
lição."
"-
Boa tarde, rapaz! Continue cumprindo assim os regulamentos da nossa
instituição. É uma forma de ser cristão... "
Foi este um grande e belo exemplo de compreensão, de tolerância e de amor ao
próximo, digno de ser imitado.
E
agora posso dizer: "Meu velho comandante e amigo! Que na Pátria dos
Espíritos, onde vos encontrais, possam os missionários divinos
esclarecer-vos e iluminar-vos cada vez mais para que possais derramar fluidos
benéficos e dar intuições acertadas aos que labutam nas fileiras desse mesmo
Exército que tanto amaste e tanto servistes com dedicação e tão perfeita
compreensão."
Reformador
(FEB) Novembro 1948
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