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“À Luz
da Razão”
por Fran Muniz
Pap. Venus – Henrique Velho & C. – Rua Larga, 13 -
Rio
1924
O MATRIMONIO
O
casamento é ainda outro manancial inesgotável que, disfarçado pela benção nupcial,
vem, desde há muito, encanando ouro para as arcas do Catolicismo.
Antes,
porém, de comentarmos a nulidade do matrimônio religioso, ouçamos o que diz a
igreja a respeito:
“0
matrimônio santifica a união entre o homem e a mulher para darem filhos à
Igreja e a Cristo, pelo batismo e pela fé.”
Logo,
para começar, a doutrina falta à verdade, porque há milhares de filhos, cujos
pais foram santificados pelo matrimônio, e que não querem saber da igreja.
Outros
há, até, que nem ao Cristo se submetem; portanto a igreja falhou na sua
previsão.
“...e
sem este sacramento, continua a igreja, não passa tal união de torpe concubinato,
diz s. s. papa Leão XIII” (1)
(1) Goffiné -Manual
do Christão, pág. XXXVIII.
Quando
a sociedade estiver mais esclarecida, mais civilizada, obrigará o Catolicismo a
retirar da publicidade semelhante insulto atirado contra a honra dos casados
civilmente.
É
o cúmulo do desprezo pela dignidade de um povo!
“A
igreja improva com toda a energia os casamentos de católico e protestante:
quando porém, por graves motivos, os autoriza, impõe-lhes condições que atenuam
o perigo da salvação, tais são as seguintes: 1ª - os filhos que nascerem serão
todos educados na religião católica: 2ª- o consorte não será levado a terras
onde não possa praticar o seu
culto: 3º - o católico fará toda a diligência
para reduzir o consorte ao catolicismo.”. (1)
(1) Obra citada, pág.
XXXVIII.
Como
se vê, o catolicismo procura, por todos os meios, apertar o círculo de ferro
contra os que se deixam imbuir pelas suas manhas. Tais condições impostas
equivalem a tolher a liberdade de atos e pensamentos de cada um, implantando a
divisão de povos e raças e, por conseguinte, impelindo-os ao erro, ao ódio e ao
crime.
É
a mania tola e absurda de que todo o mundo há de ser católico, quer queira quer
não queira. Uma reminiscência, afinal, dos tempos do “crê ou morre”.
Esquece-se,
porém, a igreja, de que a humanidade, não podendo mais ser assada em suas
fogueiras, irá, pouco a pouco, fugindo de dogmas tão antiquados, o que lhe
valerá salvar a sua inteligência e o seu dinheiro.
Mas
falemos ainda desse “torpe concubinato”, em que vivem os casados fora da casa
de S. S. Leão XIII, no que vale muito a pena insistir.
Diz
a igreja que o casamento religioso é o único legal, por ser abençoado por Deus,
representado num ídolo de gesso ou coisa que valha, no altar, ante o qual se
realiza a união conjugal.
Primeiro
que tudo, devemos recordar que só alguns séculos após a era cristã, foi o
casamento considerado pela igreja como exclusivo privilégio seu e,
prevalecendo-se ela da aceitação natural daqueles tempos, fez dele uma cerimônia
aparatosa e ostensiva, como são todos os seus atos.
Cumpre,
todavia, perguntar à igreja: Antes dela tomar a si o casamento a seu modo,
todos os povos viviam em concubinato, como os que se casam pelas leis civis?
Por
outro lado, torna-se preciso saber, até que ponto a igreja reduz a posição de
um Pretor.
Pois
não é ele revestido de plenos poderes para executar a lei de uma Nação?
Pensamos
que sim, porque essa lei tem de ser cumprida por todos os seus habitantes, enquanto
que a da igreja só será pelos que a aceitarem.
Então
a igreja tem a audácia de denominar - torpe concubinato - um ato legal de um
governo?
Além
disso, com que autoridade fez ela também do casamento uma propriedade sua?
No
Evangelho não se encontra o mais leve vestígio dessa instituição, nem sequer
consta que Cristo tivesse casado alguém, a fim de que a igreja, ao menos,
pudesse expandir o seu vício de imitar o Mestre para gáudio e admiração dos
crentes.
Demais,
se Deus só abençoa os esponsais religiosos, porque há, então, tantas uniões
infelizes e até mesmo desgraçadas, entre as que se realizam sob os auspícios da
religião?
Conhecida
a onisciência de Deus, é claro que a sua benção não seria dada para depois
sofrer anulação.
Não
podendo, portanto, prevalecer esta hipótese, o que dirá a igreja para explicar
as desventuras de tantos matrimônios... abençoados?
Depois,
que entende a igreja por bênção de Deus? Supõe, porventura, que qualquer ser
humano pode merecer dele tão suprema graça pelo simples fado de ser católico?
Forte
banalidade! A igreja está muito distanciada do progresso e precisa avançar nele
para ficar sabendo que a benção de Deus é uma felicidade eterna que só a
merecem aqueles que estão já elevados aos mais altos páramos da perfeição,
visto que nunca mais poderão errar.
É
muita tolice acreditar que Deus possa abençoar criaturas que logo ao deixarem o
altar, vão praticar, às vezes, atos indignos e até infames...
O
casamento nada mais é do que um contrato estabelecido pelas sociedades e
indispensável à moralização da humanidade, visto que, sem essa medida, a lei de
procriação seria cumprida com depravação: a honra desapareceria da face da Terra
e a mulher seria um simples objeto para as satisfações impúdicas dos depravados, quando, perante Deus, ele tem o mesmo valor que o homem.
Seria
o que acontece com os que, fingindo
castidade, se tornam celibatários para clandestinamente cumprirem essa lei
da natureza em prevenção da qual, a Escritura nos diz:- “O Senhor disse a Moisés:
Não é bom que o homem seja só.”
Esse
contrato, para a união de dois seres, porém, não se realize como se supõe, pelo
fato de ambos se amarem reciprocamente: mas porque são, em geral, atraídos um
para o outro, por uma força oculta que se chama magnetismo.
Vejamos
se isso pode ser admissível, sem a pecha de absurdo, tão usada pelos
ignorantes.
O
magnetismo é a lei principal da
natureza, porque tudo no universo é magnetismo.
É
ele que delimita a lei de atração entre os planetas; que mantém os Inumeráveis
mundos na amplidão infinita. A rotação e translação da terra; a força centrífuga
e centrípeta, são consequências do magnetismo, variando os nomes, apenas, para
distinguir as espécies. É o magnetismo
que faz crescer o arbusto e florescer o prado; que dá perfume ao lírio, variedade
às cores é instinto aos animais; que regularize as fontes e dirige as águas.
É
por ele que obtemos a matéria para o nosso corpo e nos atraímos uns aos outros;
é ele, em suma, a vida e o agente universal.
Pela
atração magnética, por tanto, é que as criaturas se procuram e se unem. A prova
disso, é ver-se, por exemplo, indivíduos deixarem milhões de patrícios seus
para virem casar com estrangeiros, de Nações, às vezes, bem distantes.
Isto
nos faz refletir que há uma força, uma razão precedentemente traçada para essa
união.
Assim,
exprime-se uma verdade, quando se diz que – “casamento e mortalha no Céu se
talha (corta).”
Há,
todavia, casamentos que nulificam essa atração e rescindem a convenção contraída
anteriormente, porque todos temos o livre arbítrio de fazer, ou deixar de fazer
o que nos aprouver.
É
então quando se dá o matrimônio pela vaidade de se conservar o nome de família;
quando se faz dele um comércio, visando o interesse mais do que o amor, etc., e
que, geralmente, são sempre desastrosos.
Fora
disso, o casamento pode ser a união de dois espíritos que se amam desde
anteriores encarnações e reencarnam, embora em lugares diferentes, para mais
tarde, unindo-se sob a força da lei natural, constituir família e, desse modo,
estreitar os laços da fraternidade que será um dia universal.
Esse
é um casamento feliz, mesmo sem a benção do padre.
Outras
vezes, acontece que espíritos inimigos, reconhecendo no espaço que sem o amor
não pode haver o progresso de que eles necessitam para se elevar a mundos
melhores, pedem a reencarnação para se unirem pelo casamento, a fim de que o ódio
seja substituído pelo amor, que é aumentado
consideravelmente, com o nascimento dos filhos,
Se
eles conseguem vencer a luta, tornando-se dóceis e amorosos entre si, teremos
ainda um casamento feliz, mesmo não sendo religioso; se, ao contrário, esquecendo
eles o compromisso assumido na vida espiritual, se deixam tomar de assalto pelo
antigo ódio interrompido e se atiram novamente à luta, então temos aí um
casamento infeliz, ainda que haja sido até abençoado pelo papa.
O
casamento, pois, nada mais é do que isso, variando, apenas, de condições.
Muitos, ainda, se submetem ao matrimônio do
Catolicismo, devido à retumbância e ostentação dos aparatos, que não raras
vezes acabam em misérias e desventuras para os consortes.
Benção existe, de fato, no casamento,
mas, ao contrário do que se supõe, ele parte dos nubentes para o padre, no célebre envelope fechado.
É
muito natural, pois, que a igreja procure envidar todos os esforços para manter
o seu manancial aurífero, com essa tabela
de benção de Deus.
A
observação, porém, de fatos diários, em que os cônjuges abençoados se separam escandalosamente, e, não raro, tragicamente,
vem infirmar a validade de tal sacramento,
aliás, dos mais caros que a igreja impinge aos seus fiéis.
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