quarta-feira, 26 de setembro de 2012

61. "Doutrina e Prática do Espiritismo"



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            Vimos precedentemente que, ao despojar-se do envoltório físico, um prazo mais ou menos longo decorre para o espírito, antes que possa este, vencida a fase de perturbação que geralmente acompanha o fenômeno da morte, se integrar na plenitude da consciência  individual e, conseguintemente, das aquisições anteriores que lhe correspondem.  

            Franqueado esse passo, isto é, dissipada aquela espécie de letargia, que o mantivera inconsciente na fronteira dos dois mundos, é que começa verdadeiramente para o espírito a existência espiritual, em cujos elevados, dignificadores e transcendentes misteres vai novamente ser iniciado.

            Em que irão daí em diante consistir as suas ocupações? - Tal foi a pergunta que, muito atrás deixamos formulada, mas que a necessidade de outros desenvolvimentos, reclamados pela conexão dos assuntos que se foram logicamente sucedendo, nos induziu a deixar até agora sem resposta.
           
            Desembaraçado das pesadas roupagens da matéria e, portanto, da constrangedora limitação dos sentidos corporais, que lhe não permitiam mais que uma superficial e por isso mesmo ilusória apreciação do mundo exterior; transferido assim do plano dos efeitos, que é o nosso, ao das causas, em que não somente se preparam os sucessos que aqui se realizam, mas a vida ostenta os esplendores de sua gênese remota; restituído, numa palavra, a sua fonte originária, em que pode consistir a ocupação do espírito senão em se instruir?

            E essa instrução não se entende unicamente dos espíritos cuja mentalidade, volvida desde a Terra para a cogitação dos torturantes problemas da ciência e da filosofia, encontra no invisível, com um maravilhoso e ilimitado campo de pesquisas, as mais seguras possibilidades de certeza, senão que é igualmente acessível aos mais vulgares e modestos, aos que apenas decifram as primeiras singelas estrofes do poema sem fim da evolução. A uns o estudo das leis que regulam o variadíssimo e eterno ritmo da vida e, sobretudo , o conhecimento da Vontade que as mantém e de que a sua maior felicidade consistirá em se fazerem executores e instrumentos, como teremos ocasião de mais desenvolvidamente  examinar em capítulo adiante; a outros o subalterno encargo de servir as formas inferiores da atividade humana, em tudo o que tem de pessoal e transitório.

            E assim, distribuídos pelas diferentes esferas fluídicas dicas, ou etéreas, de que falávamos há pouco, umas às outras se interpenetrando, haverá para todas as categorias de espíritos ocupações apropriadas às suas aptidões, ao grau de moralidade e inteligência em que se encontrem. Podendo, sem ser vistos, misturar-se com os homens, imiscuir-se em seus atos e deliberações e com tanta facilidade se mover na atmosfera, como penetrar no seio da terra e na profundeza das águas, sem serem afetados por esses elementos, graças à permeabilidade do corpo etéreo que os reveste, compreende-se assim que múltipla atividade se acham em condições de desenvolver os espíritos, constituindo sempre, qualquer que seja a categoria a que pertençam, um campo de aprendizado e de progresso o meio em que operam.

            Nem sempre de progresso – retifiquemos. Porque, no que se refere à ação oculta sobre os homens, não é proveitosa ao adiantamento dos seres invisíveis que a exercem senão a que se inspira na grande lei do Amor e, conseguintemente, nos sentimentos de fraternidade e de solidariedade encaminhada ao bem.

            Acontece, entretanto, que, atraídos pelas paixões grosseiras que ainda em tão larga escala infelicitam a humanidade, comprazendo-se, portanto, em permanecer na atmosfera que imediatamente a envolve, saturada dos pesados eflúvios que de tais paixões constantemente emanam, a ação dos espíritos terra a terra antes se faz sentir no sentido de as reforçar, estimulando-as, com isso participando das responsabilidades dos que se constituem seus escravos, que no de as neutralizar e combater. Por fortuna, essa atividade malfazeja é contrabalançada pela dos bons espíritos, empenhados infatigavelmente em atrair os homens à consciência dos deveres e à pratica do bem, ou - para empregarmos a consagrada formula - ao caminho da regeneração.          

            E não é somente no domínio da moral - assinalemos de passagem - que se faz sentir sobre os humanos a ação dos seres invisíveis. Todos os que se aplicam aos trabalhos intelectuais - pensadores, literatos, filósofos, artistas - ou se encaminhem as suas faculdades à penetração dos segredos da natureza, como os inventores e os sábios, ou a exprimir a Verdade e o Belo em lapidares formas, contribuindo com suas obras para o patrimônio comum da civilização, todos os que; numa palavra, se constituem apóstolos ou, pelo menos, servidores do progresso humano em qualquer de suas variadíssimas modalidades, são sempre assistidos por espíritos que, simpatizando com suas aptidões, lhes transmitem, como uma sorte de estímulo e de premio ao seu labor, o que se chama inspiração" (1). 

            (1) Pretende o Dr. Gustave Geley (ver L'ÊTRE SUBCONSCIENT, págs , 107) que a Inspiração "nos homens de gênio ou de talento e pura e simplesmente o resultado da sugestão do Ser subconsciente."

            Sem desconhecermos, nem ainda menos contestarmos a parte que, nas produções do gênio, deva ser atribuída às aquisições anteriores do espírito, latentes nas profundezas da subconsciência, reivindicamos todavia para os espíritos prepostos à evolução da humanidade a intervenção que logicamente lhes deve caber no mecanismo da inspiração.

            Dá-se assim da parte dos seres desencarnados e em todas as manifestações da atividade humana uma sistemática e generalizada colaboração, de que o homem vulgar não faz a mais ligeira ideia e em que, todavia, reside a explicação da marcha ascensional, posto que jamais uniforme e não poucas vezes acidentada de perturbações e de recuos, pelo menos na aparência, que vem através os séculos realizando a humanidade e que se traduz como a emersão da nossa espécie dos ínfimos graus de embrutecida barbaria aos píncaros de uma civilização, que embora represente ainda um ideal distante, há de um dia ter na Terra a sua plenitude.

            É porque esse imenso rebanho, que nós somos, não se move ao acaso, senão que obedece a uma diretriz suprema em cujo rumo se encarregam de nos orientar desde as mais altas entidades espirituais, propostas à execução das divinas volições, até as que mais de perto nos assistem, inspiram e estimulem, que já foi possível acrescentar à ciência , como um novo ramo, a sociologia, e as suas leis puderam ser deduzidas com uma inflexibilidade aproximada ou semelhante, na ordem moral, à das que regem os fenômenos do universo físico.

            Há, pois, um plano traçado à existência e ao caminhar da humanidade, e esse plano se chama evolução. Mas a evolução não se limita nem se poderia limitar a ser uma espécie de imperativo convite a nossa espécie no sentido de um crescimento, moral pela aquisição e aumento de virtudes, e intelectual pela incessante dilatação da órbita  dos conhecimentos; abrange, e tem que forçosamente abranger, todas as formas e todas as manifestações da vida, o que importa dizer que não somente a totalidade dos seres, dos mais elevados aos mais ínfimos, que povoam o nosso mundo e constituem a sua denominada natureza viva, mas o próprio mundo, em sua estrutura física e nos elementos ditos inanimados que o integram, está sujeito a essa mesma lei.

            Tudo progride, se transforma e aperfeiçoa, a impulsos de uma vontade soberana, invisível em sua fonte, servida em todos os graus da hierarquia espiritual e planetária por inteligências a essa mesma lei.  

            De que veículo se servem tais inteligências para levar à execução o plano evolutivo? - De uma prodigiosa força, impalpável em sua essência, incalculável em suas consequências e efeitos, força que por desventura nossa não aprendemos ainda a utilizar convenientemente: o pensamento. 

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