sexta-feira, 31 de agosto de 2012

Prece



 Prece
           
             Jesus, bom e amado Mestre!

            Tu, que nasceste numa manjedoura em Belém de Judá, para dares o exemplo grandioso de humildade aos homens.

            Tu, que durante a permanência luminosa de Teu espirito na face da Terra, enxugaste lágrimas, curaste paralíticos e morféticos;   

           Tu, que expulsaste os espíritos imundos dos lunáticos; que curaste o filho da viúva de Naim, a filha de Jairo e o servo do Centurião; 

           Tu, que só com o simples contato de Tuas vestes, fizeste exalar virtudes a ponto de curar aquela mulher de que nos fala a Bíblia; 

           Tu, que fizeste calar as tempestades e abrandar a fúria das ondas procelosas do mar bravio da Galileia; 

           Tu, que fizeste o prodígio da multiplicação dos pães e dos peixes, na proporção suficiente de saciar a multidão que Te ouvia e era composta de mais de cinco mil pessoas; 

           Tu, que Te transfiguraste no Monte Tabor e, diante de Pedro e João, trocaste ideias, na maior intimidade espiritual, com Moisés e Elias, mortos havia muito tempo; 

           Tu, que nas bodas de Canaã da Galileia, fizeste o prodígio de transubstanciação, transformando água em vinho; 

          Tu, que sempre Te revelaste o defensor de todos os oprimidos e o maior amigo e protetor das criancinhas; 

          Tu, que levantaste a Lázaro do sepulcro onde jazia havia já quatro dias; Tu, que perdoaste à mulher adultera; 

          Tu, que fugindo do bulício das cidades, compostas por populações perversas, foste ao jardim de Gethsemani para orar ao Pai; 

          Tu, que disseste que o Teu Reino não era deste mundo e que, depois de suportares todos os ultrajes e todas as perfídias humanas, que culminaram com a maior de todas as tragédias - a do Calvário -, deste o melhor exemplo de bondade, pedindo ao Pai perdão para os Teus algozes.

            Volve, Senhor, o Teu santo e misericordioso olhar por sobre a Humanidade hodierna que ainda se debate nos estertores da maior de todas as agonias, na crise mais ameaçadora e insuportável, no mais profundo labirinto de todas as desgraças!..

            Liberta, Mestre, as pobres criaturas da terra, das lágrimas que ainda as importunam, da paralisia e da morfeia do corpo e da alma, que ainda as torturam.

            Expulsa, Jesus, Tu que és a Cascata da Divina Luz Espiritual, os Espíritos imundos que até hoje ainda perturbam os homens, tornando-os nos endemoninhados, nos lunáticos ou obsedados atuais.

            Senhor, os homens, simbolizam, com os seus rosários de amarguras, os autênticos filhos das viúvas de Naim, as filhas de Jairo, os criados do Centurião, as mulheres dos fluxos de sangue, os homens da mão mirrada, os famintos do deserto, os sequiosos das bodas, os lázaros, os paralíticos e as adúlteras...

            Compadece-Te, Senhor, da miséria e das chagas dos homens e faz que ao Sol da Tua Caridade, eles se libertem dos seus males; que, à sombra do manto misericordioso da Tua proteção, eles se salvem das misérias, das desgraças e das trevas da vida terrena.

            Os desgraçados seres do nosso mundo carecem que os admoestes, que os censures e os ilumines, ao mesmo tempo, para se salvarem das tempestades, das procelas do mar da vida.

            Faze, pois, senhor, que os delegados de Tua imediata confiança, os espíritos de luz, influenciem as criaturas, para que a Terra se transforme num verdadeiro Tabor, onde serão edificados tantos tabernáculos, quantos necessários sejam para a integral regeneração humana, e que, a lei augusta que revelaste ao mundo, há vinte séculos - o Amor, - possa ser respeitada e praticada por todos os seres.  

            Faze, amantíssimo Jesus, que os homens transformem o seu coração em manjedouras de humildade, para que possas habitá-las, redivivo, a fim de que sejas o Pastor Soberano do rebanho humano, coeso, indivisível e fraternizado, para que a Terra seja, já agora, o Teu Reino Sagrado.

            Assim seja.

Amadeu Santos

in ‘O Retumbar da Trombeta’ Ed FEB  1942



Um Suicida


Um Suicida
Abel Gomes
Reformador (FEB) Novembro 1946


            Criança ainda na Terra e a sorte logo o pôs órfão; a estranhos teve que servir em troca da roupa e uma côdea de pão.

            Cresceu o corpo, ficou robusto; mas da alma ninguém lhe cuidou. Quando adulto, sentiu amor, mas o mundo o repelia. A jovem que ele amava, não o quis; preferiu um velho rico. O mancebo vivia triste, maldizendo da sorte ingrata.

            Sem crença na sobrevivência, com um tiro suicidou-se. Só muito tarde reconheceu que mais se agravou sua desdita.

            Dia e noite, em trevas, sentia a presença de seu cadáver em putrefação, roído pelos vermes, e o tempo passava sem socorro nem alívio.

            Não via os bons Espíritos que atentamente cuidavam dele e esperavam que em sua mente nascesse a luz do arrependimento redentor.

            Um dia sua consciência despertou, ele pediu perdão a Deus, e sua mãe veio, ao seu encontro em missão salvadora.

            Mais tarde voltará ele à Terra, onde as dores o visitarão, mas as reminiscências pela voz da consciência hão de ajuda-lo a suporta-las.




quinta-feira, 30 de agosto de 2012

II. Kardec e Roustaing



Kardec-Roustaing  II

Reformador (FEB)  Novembro 1946


            Em artigo anterior, demonstramos que já está cabalmente sancionada a obra do grande discípulo de Kardec, pela confirmação dos Espíritos que o Mestre prudentemente sugeriu fosse esperada. Com essa sanção, os dois Autores se completam na tarefa que lhes foi confiada para restauração do Cristianismo; mas é necessário salientar que, desde o primeiro momento, o trabalho monumental de Roustaing recebeu aprovação de Kardec em quase toda a sua estrutura, pois que o único ponto deixado de quarentena pelo Mestre foi a explicação dada quanto ao corpo de Jesus, aliás, sem qualificá-la de impossível. Em tudo mais, a Doutrina exposta pelos Espíritos a Roustaing é a mesma inserta nos livros de Allan Kardec e por este aceita como tal.

            Quanto a esse ponto único, Kardec foi prudentíssimo e sua reserva só pode aumentar nosso respeito por ele, pois que naquela época não estavam perfeitamente estudadas as materializações, tanto assim que o próprio Kardec ainda supunha “não passarem de uma aparência fluídica e que a nossa mão nenhuma resistência experimentaria ao tocar as aparições". Só muito mais tarde foi suficientemente estudado o fenômeno das materializações e ficamos sabendo que podem as aparições ter toda a consistência de matéria compacta, servir de original para moldes de parafina, ter peso verificado pelas balanças, órgãos em perfeito funcionamento, examinados por fisiologistas, confirmando, assim, plenamente, certas aparições registradas no Velho e no Novo Testamento. Isso só veio a ficar bem demonstrado com as materializações de Katie King pela mediunidade de Florence Cook e, mais tarde, por muitos outros médiuns em diversos países. Com a responsabilidade de Codificador, não aprovando nem reprovando a obra de RoustaingKardec  deixou ao tempo o encargo de a sancionar ou contraditar", e o tempo cumpriu o seu dever galhardamente, porque, oitenta anos mais tarde, a obra está plenamente sancionada. Ambos os livros transcrevem do Velho Testamento o Decálogo e demonstram sua concordância com os ensinos de Jesus e dos Espíritos, ou seja, a unidade eterna da Revelação Divina.

            Já vimos naquele artigo as profecias e a narração de dois Evangelistas quanto ao aparecimento misterioso de Jesus sobre a Terra. Agora vamos passar uma vista d' olhos pelas Escrituras para vermos se alguns fatos registados pelos Evangelistas poderiam ser explicados na vida de um Espírito encarnado em corpo de carne e osso como os nossos.

I) Jesus escapa das mãos dos seus perseguidores

            " ... E o levaram até o cume do monte sobre o qual estava edificada a cidade, para o precipitarem. Mas Jesus, passando por meio deles, seguiu seu caminho." (Lucas, 4: 29-30. )

II) Jesus anda sobre as águas

            "A quarta vigília da noite foi Jesus ter, com eles, andando sobre o mar. Os discípulos, vendo-o andar sobre o mar, perturbaram-se e exclamaram: É um fantasma! e de medo gritaram. Mas Jesus imediatamente lhes falou: "Tende ânimo, sou eu; não temais". (Mat., 14 :25-27). "Entrando ambos na barca, cessou o vento. Os que estavam na barca, adoraram-no, dizendo: Verdadeiramente és Filho de Deus." (Mat., 14:32-33).

III) Jesus continua com o mesmo corpo depois da morte

            “Estando as portas trancadas, veio Jesus, pôs-se em pé no meio deles e disse: Paz seja convosco. Em seguida disse a Tomé: chega aqui o teu dedo e olha as minhas mãos; chega também a tua mão e põe-na no meu lado; não sejas incrédulo, mas crente." (João, 20:.26-27).

            Diversas outras aparições, sempre com o mesmo corpo, se acham registadas nos Evangelhos, Veja-se Mateus, 28: 16-20; Marcos, 16 :15-20; Lucas 24 :36-43; João, 20 :11-23.

            Depois da morte aparente na cruz e do sepultamento, Jesus desapareceu do sepulcro, continuou, com o mesmo corpo, a aparecer e ensinar a Doutrina, Eis algumas de suas palavras nas aparições:

            "Jesus, aproximando-se, disse-lhes: "Foi-me dado todo o poder no céu e na Terra. Ide, pois, fazei discípulos de todas as nações, batizando-as em o nome do Pai e do Filho e do Espírito-Santo; instruindo-as a observar todas as coisas que vos tenho mandado. Eis que eu vou convosco todos os dias até ao fim do mundo." (Mateus, 28:18-20.)

            “Disse-lhes: Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda criatura. O que crer e for batizado, será salvo; mas o que não crer, será condenado. Estes sinais hão de acompanhar aqueles que creem: em meu nome expelirão demônios; falarão em línguas; pegarão em serpentes; e se beberem qualquer coisa mortífera, não lhes fará mal algum; porão as mãos sobre os enfermos, e os curarão." (Marcos, 16:15-18)

            Conservou o mesmo corpo e continuou agindo, falando e até comendo com os discípulos:

            "Tendes aqui alguma coisa que comer? Deram-lhe um pedaço de peixe assado; e tomando-o, comeu diante deles." (Lucas, 24: 41-43)

            Aqueles que dizem aceitar os Evangelhos e apresentam Maria como Espírito excelso, não podem hoje, depois da confirmação da obra de Roustaing, negar o ensinamento do corpo fluídico, porque isso seria negar a pureza daquele mesmo Espírito, visto que a sua gravidez, nesse caso, seria resultante de adultério.

            Somente os que não aceitam os Evangelhos serão coerentes com o seu ponto de vista; todavia, não se poderão classificar como Kardecistas, porque o Codificador aceitou integralmente os Evangelhos.

            Nos originais dos Evangelhos e em algumas traduções insuspeitas e religiosamente neutras, encontramos no versículo 28, Cap. 7, de Lucas e vers. 11, Cap. 11, de Mateus - que entre os nascidos de mulher nenhum houve maior que João Batista; logo, se admitíssemos que Jesus nasceu de mulher, seríamos levados ao absurdo de admitirmos que João Batista foi maior do que Jesus.

            Vemos, pois, dos registos concordes dos quatro Evangelistas, que Jesus continuou, depois da sua suposta morte, possuindo o mesmo corpo que tinha antes e praticando os mesmos atos, sabemos que ninguém é obrigado a crer nos Evangelistas, mas igualmente ninguém que negue fé ao Evangelho tem direito de dizer-se cristão, como não seria espírita quem negasse o fato fundamental da Doutrina: as comunicações dos Espíritos.

            Kardec crê no Evangelho e toma-o por livro sagrado da segunda Revelação, como aceita o Decálogo revelado a Moisés, e transcreve pontos para fundamentar a Doutrina dos Espíritos. Portanto, o Espiritismo codificado por Allan Kardec é cristão, é a Revelação iniciada em Moisés, confirmada por Jesus e continuada hoje pelos Espíritos em numerosas obras. Dentre estas obras, uma existe, recebida por pessoas dignas de todo o apreço de Kardec, como foram os seus contemporâneos Mme. Emília Collignon e João Batista Roustaing, por ele citados como pessoas sérias, cultas, respeitáveis e bons espíritas. Nessa obra, completando a Revelação dada a Kardec, fica explicada a natureza excepcional do corpo de Jesus. Kardec, mui prudentemente aconselhou que se aguardasse a confirmação dessa explicação. São decorridos 80 anos e a confirmação está feita por muitos Espíritos superiores, inclusive o mesmo Kardec. Portanto, hoje a obra de Roustaing está consagrada como fundamental da Doutrina. Não há ainda unanimidade de opiniões, pois que também quanto ao Evangelho não há ainda unanimidade; há muita gente no mundo que não aceita o Cristianismo. Há pessoas que só aceitam o Velho Testamento, outras aceitam o Velho e o Novo Testamentos, outras aceitam os dois Testamentos e Kardec, por fim, alguns aceitam a Bíblia, Kardec e Roustaing. A nosso ver, estes últimos são os mais coerentes, porque as três Revelações formam um todo solidário, e quem nega parte, está inconscientemente demolindo sua própria casa, como sucede aos católicos e protestantes que negam os fenômenos espíritas, sem perceber que justamente sobre esses fenômenos, repetidos através da História, foram fundadas e conservadas até hoje suas Igrejas.

            Negar fé à obra de Roustaing é minar o edifício todo, desde Moisés até os nossos dias; é quebrar um dos elos mais fortes dessa divina cadeia de Revelações que vem de Gênese até aos dias atuais.

            Dissemos em nosso artigo anterior que os dois livros preparados simultaneamente pelos Espíritos superiores se destinam a públicos diferentes e vamos explicar melhor o nosso pensamento, "O Evangelho segundo o Espiritismo" destina-se ao público que busca no Espiritismo as regras evangélicas de conduta e com estas se satisfaz, sem exigir mais explicações, São os homens que já aceitaram o Evangelho como Revelação divina e têm a intuição de que tudo no Evangelho está certo e não reclamam maior compreensão. Além desse público crente, existe outro, mais exigente intelectualmente, que reclama explicações minuciosas de tudo quanto se acha no livro sagrado do Cristianismo. Para este último foi, ao mesmo tempo, ditada obra muito mais ampla -- "Os Quatro Evangelhos", de J. B. Roustaing.

            Comparando as datas das mensagens ditadas para o livro de Allan Kardec com o período em que foi recebido o de Roustaing, vemos que os Espíritos os prepararam simultaneamente: o de Kardec apareceu em público em Abril de 1864 e o de Roustaing foi recebido de Dezembro de 1861 a Maio de 1865.

            A obra de Kardec, no Brasil, está hoje com a 32ª edição em preparação e só agora está sendo preparada a 4ª edição de Roustaing, que, por ser muito maior, tem menor distribuição. Isso demonstra que não se dirigem ao mesmo público.

            A nossa Federação tem tido a fortuna de distribuir sempre os dois livros desde a sua fundação até hoje e sente-se ricamente recompensada de seus esforços ao vê-los ambos consagrados pela opinião de grandes Espíritos e das pessoas que mais profundamente estudam a Doutrina em nossa Pátria.

            Não só pela obra completa de Roustaing, como também em "Elucidações Evangélicas", de Sayão; "A Divina Epopeia", de Bittencourt Sampaio, e outros livros respeitáveis, a Doutrina revelada pela sublime mediunidade de Mme. Collignon vem sendo divulgada há dezenas de anos, paralelamente com os diversos livros de Allan Kardec, em todo o território nacional, e assim se vai consolidando esse todo grandioso, esse conjunto que forma as três Revelações. Todos os embates contra o Espiritismo - quer de adversários diretos, quer dos que se dizem espíritas e só atacam por partes a terceira Revelação - têm, por mercê de Deus, passado
sem abalar a obra dos nossos Maiores, que segue sua rota rumo ao futuro.

            Roustaing foi atraído para o trabalho exatamente como o foi Kardec: pela possibilidade das comunicações entre os dois planos da vida. Ambos foram avisados pelos Espíritos que se manifestaram através de médiuns, que se deveriam dedicar às suas missões; ambos fizeram alteração nos títulos de suas obras evangélicas por ordem do Alto; ambos receberam aviso de que vários messias (enviados) viriam trabalhar na obra de propagação do Espiritismo; ambos retocaram a primeira edição dessas obras, por sugestão dos Espíritos; ambos não conseguiram até hoje conquistar todo o meio estudioso, porque os tempos ainda não foram chegados para essa conquista, sendo certamente necessárias as discussões sobre a reencarnação e sobre o corpo fluídico; ambos só conseguiram ter as suas obras publicadas sem interrupção, e até mesmo distribuídas gratuitamente, na "Pátria do Evangelho"; ambos receberam ingratidões entre os seus próprios companheiros, que lhes chamavam - autoritários dogmáticos e místicos; ambos não conseguiram ver respondidas todas as perguntas que dirigiram aos Espíritos, porque o mundo não as poderia receber no momento; e, finalmente, ambos só se dedicaram ao trabalho, só se converteram, após duvidarem e somente em idade já avançada.

            Como vemos, Roustaing, como enviado especial para auxiliar o trabalho do Codificador, passou pelas mesmas fases e sofreu igualmente como o missionário-chefe - Allan Kardec.

            Ao completarem oitenta anos as obras de Kardec e Roustaing, sempre firmes e apoiadas pelos dois mundos o - visível e invisível -, apesar de todos os ataques e perseguições que pretenderam destruí-las em nome da Religião, da Filosofia,  da Ciência; ataques por vezes perigosíssimos por virem de dentro dos nossos próprios arraiais e astuciosamente preparados para desnortear os crentes, podemos dizer que os dois grandes Missionários venceram a dura prova do tempo, que destrói todas as construções sobre a areia e só deixa de pé as que foram edificadas sobre a rocha.

            A primeira fase da Missão da Federação foi levada a bom termo com a solidez já adquirida no Brasil pelas obras dos dois Missionários, e por isso rendemos graças a Deus e manifestamos nosso reconhecimento à firmeza de caráter dos nossos antecessores. A segunda fase, que ora apenas se esboça e reclamará longo tempo para cumprir-se, há de encontrar em nossos sucessores igual perseverança, idêntica firmeza, porque a Alta Direção é sempre a mesma dos Espíritos superiores guiados por Ismael. Quanto podemos prever dos acontecimentos que se desenvolvem em nossos dias, a segunda fase será divulgar em escala mundial a mesma Doutrina já firmada entre os espíritas do Brasil. Serão necessários muitos decênios ao desenvolvimento desta segunda fase, porque não compreende somente a publicação das obras em Esperanto; exige preliminarmente a divulgação do Esperanto e esta tarefa é muito morosa, está sujeita a muitos imprevistos que a podem atrasar. Cumpramos, porém, o nosso dever, sem nos preocuparmos com a época em que se realizarão as nossas esperanças.

Rio, 3-10-1946.




quarta-feira, 29 de agosto de 2012

I. Kardec - Roustaing




Kardec-Roustaing  I


            Diante de inúmeras mensagens que vêm sendo recebidas do Alto, psicograficamente, por vários médiuns, dentre os quais convém destacar três que já têm publicadas grandes obras consagradas pelos mais cultos espíritas, parece-nos oportuno fazer uma síntese que permita se evidencie estar sobejamente demonstrado ter sido Kardec um notável Missionário, auxiliado por outros companheiros, ressaltando-se dentre estes a personalidade de Roustaing, como encarregado de organizar o trabalho da fé, dando confirmação às duas Revelações anteriores.

            Os três médiuns a que nos referimos são Zilda Gama (1), América Delgado (2),
e Francisco Cândido Xavier (3). Deixamos de citar outros por não estarem ainda conhecidos por meio de obras de grande significação doutrinária. 

            A Primeira Revelação abrange todo o Velho Testamento e anuncia a vinda do Messias em muitas profecias, das quais basta citarmos: Gênese, cap. 49; 10 e 11:

            "Não se afastará de Judá o cetro, nem a vara do comando dentre seus pés, até que venha aquele de quem ela é, e a esse obedecerão os povos.  

            Isaías, 7, 14:

            "Portanto, o Senhor mesmo vos dará um sinal; eis que uma donzela conceberá e dará à luz um filho, e por-lhe-á nome de Emmanuel.”

            Esses dois eminentes vultos da Primeira Revelação foram nominalmente citados e confirmados por Jesus, como prepostos de Deus, grandes profetas. Cumpridos os tempos, veio o Messias. Vamos transcrever o relato de dois evangelistas sobre o seu aparecimento:

            Mateus, cap 1º, v. 18 a 23:

            “Ora, o nascimento de Jesus Cristo foi assim: Estando Maria, sua mãe, já desposada com José, antes que se ajuntassem, ela se achou grávida por virtude do Espírito Santo. José, seu marido, sendo reto e não a querendo infamar, resolveu deixá-la secretamente. Quando, porém, pensava nestas coisas, eis que um anjo do Senhor lhe apareceu em sonhos, dizendo: José, filho de David, não temas receber a Maria, tua mulher; pois o que nela foi gerado é por virtude do Espírito Santo. Ela dará à luz um filho, a quem chamarás Jesus; porque ele salvará o seu povo dos pecados deles. Ora, tudo isto aconteceu para que se cumprisse o que dissera o Senhor pelo profeta: Eis que a virgem conceberá e dará à luz um filho, e ele será chamado Emmanuel, que quer dizer - Deus conosco.”

            Lucas, cap 1º, v.. 26 a 38:

            "No sexto mês foi enviado da parte de Deus o anjo Gabriel a uma cidade da Galileia, chamada Nazaré, a uma virgem desposada com um homem que se chamava José, da casa de David; o nome da virgem era Maria, Aproximando-se dela disse: Salve! altamente favorecida, o Senhor é contigo. Ela, porém, ao ouvir estas palavras, perturbou-se muito e pôs-se a pensar que saudação seria esta. Disse-lhe o anjo: Não temas, Maria; pois achaste graça diante de Deus. Conceberás no teu ventre, e darás à luz um filho, a quem chamarás Jesus. Este será grande e será chamado Filho do Altíssimo; o Senhor Deus lhe dará o trono de seu pai David, e ele reinará eternamente sobre a casa de Jacob, e o seu reino não terá fim. Maria perguntou ao anjo: Como será isso, uma vez que não conheço varão? Respondeu-lhe o anjo: O Espírito  Santo virá sobre ti, e a virtude do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso o que há de nascer, será chamado santo, Filho de Deus. Isabel, tua parenta, também ela concebeu um filho na sua velhice, e já está no sexto mês aquela que era chamada estéril; porque nenhuma palavra, vinda de Deus, será impossível. Disse Maria: Eis aqui a serva do Senhor; faça-se em mim segundo a tua palavra, E o anjo retirou-se.”

            Os aparecimentos e desaparecimentos de Jesus, antes e depois do drama do Calvário, demonstraram a natureza excepcional de seu corpo, mas ficara reservado ao futuro, à Terceira Revelação, o confirmar e explicar essa concepção supranormal .

            Quando surgiu a obra "Os Quatro Evangelhos", de Roustaing, Kardec lhe noticiou o aparecimento em sua revista, às páginas 190, 1, 2, do mês de Junho de 1866, apresentando-a como obra considerável, com o mérito de não estar em contradição com a Doutrina ensinada em "O Livro dos Espíritos", em "O Livro dos Médiuns" e em "O Evangelho segundo o Espiritismo" (únicas obras até então transmitidas ao Codificador), ressaltando que ela continha ensinamentos incontestavelmente bons e verdadeiros e que merecia consultada com proveito pelos espíritas conscienciosos.

            Como se tratava de assuntos novos, completamente inéditos, quase diríamos revolucionários para os meios religiosos da época, Kardec, receoso de que os Espíritos não a aprovassem, receio esse não confirmado, pois que na imensa coleção de Revue Spiriteentre numerosíssimas comunicações publicadas, nem uma só encontramos contra a obra de Roustaing, Kardec, dizíamos, por precaução e pesando sua responsabilidade, declarou que ele não havia escrito uma obra semelhante, porque não a julgava oportuna, e que, apesar de a teoria do corpo fluídico de Jesus nada apresentar de impossível, ele não a aprovava nem reprovava, até que os Espíritos se manifestassem, visto que a obra fora recebida por intermédio de um único médium.

            Vemos que a opinião de Kardec foi pessoal, mas, em vista do seu grande, inigualável valor, surgiram espíritas mais realistas do que o rei, os quais julgaram, erradamente, a prudente reserva de Kardec como condenação definitiva da obra e não levaram em conta que, hoje, já está a mesma com a única sanção que para ela exigia o Mestre: a confirmação dos Espíritos. No Brasil houve quem julgasse um crime a tradução da obra e pusesse em dúvida a honra e a dignidade da médium Mme. Emília Collignon e de Roustaing... para não irmos mais longe.

            Para que nossos confrades possam conhecer a opinião de Kardec sobre essas duas respeitáveis personagens, vamos transcrever a palavra do Mestre mesmo. Em Revue Spirite de 1861, págs. 167 a 172.

            "Os princípios que aí são altamente expressos (na carta que lhe escrevera Roustaing) por um homem cuja posição o coloca entre os mais esclarecidos, darão que pensar aos que, supondo possuírem o privilégio da razão, classificam todos os adeptos do Espiritismo como imbecis.

            "Vê-se que Roustaing, apesar de recentemente iniciado, se tornou mestre em matéria de apreciação; é que ele tem séria e profundamente estudado, o que lhe permitiu apreender rapidamente todas as consequências da importante questão do Espiritismo, e que, ao contrário de muitos, ele não ficou na superfície.

            "Infelizmente, nem todos têm, como ele (Roustaing), a coragem de dar a sua opinião, e é isso que alimenta os adversários."

            Quanto à Mme. Emília Collignon, de Bordéus, médium absolutamente mecânica, dama da alta sociedade, e que, pessoalmente, não concordava com a teoria do corpo fluídico, enquanto os Espíritos a lançavam pelo seu lápis, transcrevemos a palavra de Kardec da página 288 da Revue Spirite de 1865, em noticiário por ele assinado:

            "Temos o prazer e o dever de chamar a atenção de nossos leitores para essa brochura (Palestras Familiares sobre o Espiritismo, por Mme. Collignon) que inscreveremos com prazer entre os livros recomendáveis."

            A autoridade indiscutível de Kardec reconhecia, pois, na médium e no compilador de "Os Quatro Evangelhos", criaturas superiores, capazes, e hoje, diante da aprovação geral por parte dos Espíritos, nós, espíritas conscienciosos que seguimos o conselho do Codificador, lendo e consultando a obra de Roustaing, temos o dever de aproximar as obras dos dois Missionários e não nos orientarmos por processos dissolventes, como procedem confrades de outros países, onde até hoje combatem a Codificação Kardeciana, por não aceitarem o a que chamam de dogma da reencarnação.

            Toda a razão tinha Kardec em deixar a teoria do corpo fluídico para ser julgada pelos que lhe sucedessem, depois que os Espíritos se manifestassem, como ele mesmo veio a manifestar-se pela médium Zilda Gama e outros. Toda notícia do Além deve ser julgada com as mesmas precauções e a responsabilidade do Mestre era enorme; mas ele mesmo teve a fortuna de inserir em sua revista, em 1868, págs. 45 a 55, numerosas comunicações de Espíritos que se apresentaram com nomes respeitáveis, assegurando todas elas que um novo Messias. que restabeleceria o Evangelho de Jesus-Cristo, já estava encarnado, apesar de os comunicantes não estarem autorizados a revelar o lugar em que ele havia nascido (pág. 45).

            Em nota a essa mensagem recebida em 1861 e publicada em 1868, escreveu o Mestre:

            "Esta revelação é uma das primeiras que nos foram transmitidas, mas outras lhe sucederam. Há muito tem vindo espontaneamente grande número de comunicações sobre o mesmo assunto em diferentes centros espíritas da França e do estrangeiro. "

            E termina assim a nota:

            "Isto é um exemplo dos mais notáveis da simultaneidade e da concordância dos ensinos dos Espíritos, quando é chegado o tempo de uma questão ser apresentada."

            Todos sabemos que os Espíritos, quando querem enganar, podem igualmente fazê-lo através de numerosos médiuns, e isso ter-se-ia verificado, se admitíssemos que Kardec fora ludibriado com tais comunicações, publicadas em sua revista, por não se haver confirmado o aparecimento de qualquer Messias; mas, se concluirmos que Kardec não foi ludibriado, como cremos e afirmamos, aquelas mensagens iniciadas em 1861, época em que o Evangelho de Jesus Cristo começou a ser medi unicamente explicado, em espírito, pelos próprios Evangelistas e outros Espíritos, para dois livros diferentes - "O Evangelho segundo o Espiritismo", de Kardec, no qual aparecem mensagens dos anos de 1859 a 1863, e a primeira edição apareceu em 1864, e "Os Quatro Evangelhos", de Roustaing, recebido de 1861 a 1865 e publicado em 1866 - somos de parecer que as referidas mensagens indicavam exatamente
esse acontecimento: preparação dos dois livros destinados a promover a compreensão e revigoramento do Evangelho. Elas se confirmavam: uma dizia que nasceu um novo Messias, outras afirmavam que eram vários Messias, e outros localizavam que já estava encarnado, em França.

            A coincidência das datas e o estudo em conjunto dessas comunicações que tanto interessaram ao Mestre, levam-nos à conclusão de que os Espíritos comunicantes não tinham permissão de revelar tudo, mas apenas de indicar vislumbres.

            Pelo conjunto das comunicações, podemos hoje concluir que a notícia real a transmitir seria esta: - Vários enviados (messias) desceram à Terra, procuraram dois iniciados encarnados, em França, e lhes retransmitiram o Evangelho de Jesus Cristo, restabelecendo-o, explicando-o, para duas obras que se completam, porém, cada uma destinada a um público, conforme prometido para a época da vinda do Consolador. De tudo isso concluímos, com os Espíritos, que Kardec, o grande Missionário, ao descer à Terra, veio acompanhado de vários missionários auxiliares: Roustaing, para o trabalho da fé: Léon Denis, para o desdobramento filosófico; Délanne, para a estrada científica, e Flammarion, que nos desenharia as maravilhas das paisagens celestes.

            As três Revelações - Velho Testamento, Novo Testamento, Espiritismo, - formam um todo inseparável, um conjunto único em sua essência e não se pode atacar uma parte sem abalar todo o edifício. Quando um judeu nega o Cristianismo, um católico nega o Espiritismo, ou um espírita nega uma das duas Revelações anteriores, não percebe que está minando sua própria fortaleza: a eternidade e universalidade das manifestações espirituais. Se não fosse confirmada a natureza excepcional do corpo de Jesus pelo Espiritismo, as duas Revelações anteriores teriam que cair e o Espiritismo não subsistiria, porque tais aparições formam a base das três Revelações. Felizmente; está sobejamente confirmada a natureza excepcional do corpo de Jesus, em numerosas comunicações, e com isso consolidada a obra de Kardec, e confirmados o Cristianismo e o Judaísmo.

            Continuemos tranquilamente nossa tarefa.

            Hoje, ao recordarmos o 142.° aniversário natalício do grande Missionário (1946) e quando o livro de Roustaing completa 80 anos, sentimos imensa ventura em proclamar nossa forte convicção de que os dois Enviados cumpriram fielmente suas missões, sem que exista ponto algum que os afaste. Praza a Deus possamos também nós, os trabalhadores deste Século vinte, cumprir nossas pequeninas tarefas.

            Que Deus nos abençoe a todos, dando-nos a graça de compreender os Seus Missionários, unindo-os definitivamente entre os homens, que, em sua estreita visão, tanta vez se servem das coisas mais sublimes como bandeira de separação e lutas. Graças a Deus, nada mais existe para que as obras dos dois Mestres não nos guiem a todos rumo ao futuro. Todas as incompreensões devem cessar.

Rio, 3 de Outubro de 1946.

(1)  V. "Diário dos Invisíveis", págs. 241/63.
(2)  V. "Funerais da Santa Sé", págs. 95/9.
(3) "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", pág. 128.

‘Reformador’ Outubro 1946




O Desmoronamento da Igreja


O Desmoronamento
da Igreja


            Ao folhearmos os Evangelhos, vemos o Mestre proferir sentenças condenatórias, objetivando o nosso esclarecimento, para que não caiamos no erro de nos iludir com as aparências.

            Aproveitava Ele as ocasiões que se lhe apresentavam, como seja aquela em que seus discípulos chamaram-lhe a atenção para a grandiosidade da estrutura do templo do qual acabavam de sair; Sem mais rodeios, assim falou: "Em verdade vos digo que não ficará aqui pedra sobre pedra que não seja derribada." Jesus não queria com isso recriminar a estética dos templos de oração, mas sim o orgulho da casta sacerdotal que se julgava superior às demais. A mesma sentença condenatória ressoa hoje aos nossos ouvidos, se contemplarmos as grandes catedrais construídas pela Igreja e o orgulho de seus ministros em querer impor a sua crença, teimando assim em oficializá-la, para melhor manietar a consciência dos que lhe não são submissos.

            A Igreja deixou de ser cristã para ser política e perdeu por essa razão toda a sua moral. Já não somos nós os espíritas que o dizemos, são os seus adeptos que não cessam de o afirmar em suas reuniões íntimas.

            Há dias ouvimos ler uma carta na "Rádio Cruzeiro do Sul", pelo locutor Jota Domingues, de uma senhora católica que declarava de público o seu desligamento da irmandade à qual pertencia, alegando que, quando ia à missa, o padre, em lugar de se dedicar ao ato religioso, só se ocupava de política. E dizia mais: ter assistido a uma missa campal, onde havia tanques, canhões e metralhadoras, em contraste com os ensinos do meigo Rabi da Galileia, cujos soldados só devem estar armados de fé e amor.

            A Igreja receia perder o seu prestígio e, para que tal não se dê, os seus ministros se servem do púlpito para atacar os partidos políticos ou os credos religiosos que porventura possam por a verdade acima da mentira convencional.

            A debandada nos meios católicos começou a tomar grande incremento no dia em que se realizou a sabatina entre o padre Saboia e o Sr. Crispim. De que o sacerdote não se saiu bem, não há nenhuma dúvida; nem se saiu melhor nas conferências que realizou com o fim de esclarecer o seu fracasso. Não porque lhe faltasse inteligência, mas porque está preso a dogmas, dos quais não pode desembaraçar-se sem romper com os seus superiores clericais.

            Soube o padre Saboia definir a democracia teoricamente, pois, dentro da Igreja Católica ela não existe; os seus fiéis tem que obedecer cegamente as ordens emanadas dos santos pontífices, que são os ditadores perante os quais se devem curvar todos os católicos. Os que ousaram discordar de suas santidades, não tiveram apelação; entre as centenas de milhares de vítimas que experimentaram a suavidade da democracia jesuíta, basta citar Joana d'Arc que, por receber mensagens do Céu, foi condenada à fogueira; João Huss e Giordano Bruno sofreram a mesma pena, apesar de serem frades, por terem divisado novos horizontes através do nosso sistema planetário; Galileu esteve entre a vida e a morte, por ter dito que a Terra girava em torno do Sol, contrariando assim os ensinos da Igreja. Ainda é bem recente a excomunhão do bispo de Maura, por ter prefaciado O Poder Soviético e por ter dito, além disso, umas verdades que em nada honravam a democracia católica.

            Quanto mais a Igreja se mete em política, mais se aproxima do seu fim. A desunião que se verifica entre os nossos irmãos católicos, por causa da política, serve muito bem de lição para os espíritas que querem a todo transe servir a Deus e aos políticos, fazendo do Espiritismo escada para galgar postos superiores na Terra.

            Nestas eleições, os espíritas tiveram oportunidade de observar que, para bem da causa espírita, não devem arregimentar os seus irmãos em crença, para com eles formar um partido político. Os que teimam em fazê-lo, bem demonstram ter mais inclinação para políticos do que para espíritas, errando dessa forma a sua vocação ao ingressarem no Espiritismo. É de lamentar que, entre essas criaturas, se encontrem confrades ocupantes de cargos de responsabilidade em entidades espíritas.

            Os católicos acusam a Igreja, com ou sem razão, de ter favorecido -um candidato em prejuízo de outro. Não nos sucederia o mesmo se em iguais condições tivéssemos que nos definir por um ou outro candidato? Cremos que sim, contribuindo isso para aumentar a desunião já existente entre nós.

            Pensem bem os nossos irmãos e vejam que seria um dos maiores absurdos, justificável apenas na vaidade dos que acreditam desprezarem os espíritas o seu livre arbítrio e bom senso, para votar de olhos fechados, só porque o presidente de uma sociedade espírita lhes indicou um candidato.

            Se até agora não fomos capazes de confraternizarmo-nos em nome do Cristo, quanto mais difícil não será, em se tratando de política?

            Basta sabermos haver espíritas desde os mais conservadores até os mais liberais, o que nos levaria a termos diversos partidos. E a prova temos ao observar que muitos deixaram de votar nos candidatos espíritas, para votar em outros candidatos que, embora não pertencendo ao seu credo, satisfaziam mais de perto às suas aspirações. A nosso ver é assim que se deve proceder; a doutrina espírita não é doutrina de fanáticos.

            Quem tiver a missão de ser político deve filiar-se ao partido que melhor satisfaça aos anseios de sua alma de idealista. É nesse meio que, com sua influência, poderá atuar como o fermento do Evangelho, moralizar e combater as injustiças dos homens.   

            Formar partidos com elementos espíritas para entrar em atritos com outros partidos, é desconhecer a missão do espírita idealista, que consiste em irmanar e confraternizar os homens e manter o Espiritismo na sua mais alta pureza, sem jamais o mesclar nas competições políticas.

            Só agora é que podemos perceber porque uma parte dos militantes espíritas não se confraternizava com os demais. Longe estávamos de, em nossa ingenuidade, conceber a ideia de que tudo decorria de serem eles espíritas políticos!!!

            O Cristianismo conservou-se puro nos seus primeiros séculos, até que a Igreja o deturpou. O Espiritismo, que é o Cristianismo redivivo, codificado por Allan Kardec, começa a ser ameaçado pelo "morbus" da política, que levou a Igreja Católica à falência de sua missão cristã. Urge, portanto, realizar a mais perfeita união de todos os seus adeptos, para enfrentar a tempestade que se aproxima. Que não nos aconteça o mesmo que acaba de suceder aos nossos irmãos católicos ao serem chamados para colaborar na transformação moral e espiritual da Humanidade; o Senhor os encontra desunidos e contaminados pela política. Não nos esqueçamos de que o Espiritismo é uma doutrina que nos é ministrada, gradativamente, por Espíritos superiores. A sua defesa só pode ser exercida pela força moral e espiritual de seus adeptos e não pelo número de votos nas urnas.


Luiz Gomes da Silva
in 'Reformador' (FEB) 
Janeiro 1946



15. "Amor à Verdade"



15
“Amor à Verdade”
por Alpheu Gomes O. Campos
Marques Araújo & C. – R. S. Pedro, 216
1927


Divina moeda


            Dia do benefício, véspera da ingratidão - lá diz o proverbio. Nada mais verdadeiro, e explicável, pela precisão de resgatar nosso passado.

            É comum toparem-se pessoas lamentando benefícios feitos a outrem e de que lhes resultou contrariedade, ou ingratidão. Essas pessoas desconhecem os ensinos de Jesus, a inflexibilidade das leis.

            Aquele que dá socorro moral ou material a seu próximo, exerce a caridade e faz, assim, jus ao resgate de uma velha falta. Há, portanto, mérito perante Deus, que, infinitamente justo, recompensa ouro e fio os seus obreiros.

            Consiste muita vez o prêmio, ou salário, na permissão para que uma vítima se aproxime, a qual, fazendo-nos sofrer, em verdade nos ajuda. Cireneu inconsciente, ajuda-nos a saldar uma parcelinha mais do nosso grande débito, tão grande, que o Pai, desejando nosso caminhar constante e poupar-nos ao desalento, nos tira dele a memória, nos alivia do seu peso, durante nossas peregrinações terrenas.

            Que nos cumpre, pois? Sermos resignados, cheios de benevolências carinho para com todos os que, sucessivamente, nos vierem fustigar. Lamentações só nos fazem perder tempo; deitar fora ensejos de afastar inimigos, melhor, convertê-las em amigos; retardar não só o alívio próprio como a entrada de nossos irmãos na senda luminosa da felicidade. Eles merecem as nossas preces mais ardentes e, terminada a prova, a nossa mais viva gratidão.

                        Que as boas obras nos granjeiam mérito, é incontestável; que este nos aproxima de Deus, não há duvidar: portanto, amemos os mesmos inimigos e, pelo amor, chamemo-los à luz da verdade, certos de que eles, como agentes da dor, são o que fomos - forças de que serviu e se serve a Providência para guiar-nos à brandura e à paz.

            Aqui pomos um ditado que, sobre outras coisas, versa exatamente as provas consequentes aos nossos bons atos. Pode-se, em muitas passagens, universalizar o que há nele individual.

            “A luz e o amor à verdade sejam contigo.

            “As provas e expiações tem feito de ti um dócil compreendedor da carinhosa afeição dos teus protetores de há séculos.

            “Bastante sofreste para alcançar a verdadeira felicidade; porém muito e muito fizeste sofrer a todos os teus amigos e defensores.

            “Quando, na erraticidade, eras chamado à luz da razão, repelias com impetuosidade todos os conselhos e resistias a todas as dores. Foi preciso modificar teu gênero de encarnações, para a pouco e pouco te submeteres à doutrinação.

            “Depois de tua última encarnação, tornaste, em grande sofrimento, para o espaço, onde Silveria, teu Guia, mostrando-se a teus olhos e proporcionando-te sossego, acabou de te fazer aceitar os conselhos e ensinos.

            “Não eras ainda para vir como médico, porque não tínhamos confiança nas tuas boas resoluções; teu anjo tutelar, porém, maior do que eu, quis e preparou os acontecimentos, a fim de que, abraçando uma nobre profissão, fosses alvo das tuas vítimas e não pudesses ter estímulo pelo orgulho. A tua encarnação prendia-se a sucessos em que poderias, aceitando as inspirações, servir de elemento para a obra de Criador, e resgate do passado.

            “Vacilante, ensaiaste os primeiros passos na doutrina, e isso valeu-te um primeiro ataque, a obsessão por audiência. Serias completamente dominado se não guardasses nossa palavra.

            “Com a guerra europeia, que estava nos desígnios de Deus, principiaste a compreender teus deveres. Precisando provado na abnegação, teve lugar a prova comercial, que ainda hoje é aproveitada para limpeza sempre de faltas.

            “Conduzido como foste, adquiriste mérito, sendo razão deixar-te elevar, segundo é destino geral, apagando culpas que talvez ficariam para outra jornada.

            “Pelo amor, vencemos em ti os obstáculos; pelo amor, fizemos-te um cultivador dos ensinos de Jesus, expiando ao compasso da força adquirida, provado naquilo mesmo que mais desejas. 

            “Tal é a lei.

            “Nesta existência irás escrever um livro. Será ele ditado por alguns amigos do espaço, que esperam, de colaboração, relatar sucedimentos passados através de várias encarnações, bem assim demonstrar quanto pode um espírito fazer numa só existência,sendo reto, humilde e caridoso.

            “Cuido, meu amado filho, que esse livro trará muita luz ao teu entendimento, por isso que melhor conhecerás as tuas vidas. Terás, para recebê-lo, o auxílio necessário.

            “As lições que derramar, se o publicares, servirão de roteiro a muitos, que melhor uso passarão a fazer das faculdades, compreendendo que quanto maior é o homem na terra, tanto mais risco corre de ser o menor na hierarquia espiritual.

            “As grandezas da terra amesquinham as almas, tenham mesmo certa evolução, se não lhes sobra nobreza bastante para nos permitir levá-las pelo caminho do amor e da justiça.    

            “Entre as tuas qualidades nesta vida, nota-se o amor à verdade. É a causa de nossa assistência, a causa da regeneração dos infelizes do espaço, obreiros, muito breve, do esclarecimento dos seus pares da Terra.

            “Certo, tens ainda defeitos que não percebes, pois são pequenos para hoje. De vulto amanhã parecerão, constituindo motivo de novos trabalhos, novas labutações, em teu particular proveito e no da humanidade.

            “O que ora se julga natural e próprio do meio, logo, em novo jornadear depurador, será objeto de provas e sublimes lutas.

            “Tudo evolve; e o que não é impureza a olhos desarmados, repugna à vista auxiliada pelos prodigiosos expedientes da ciência moderna.

            “Venho, uma vez mais, repetir o que diversas vezes deixei em teu caderno de comunicações, com o nome de Amor á Verdade. Se precisar difundir qualquer assunto, poderás declarar sermos teus amigos e que, antes de alcançares certos conhecimentos da doutrina, todos colaborávamos sob aquele criptônimo, mas agora cada qual se dá a conhecer pelo verdadeiro nome, visto como sabes que mesmo os chamados Santos pelos homens colaboram na regeneração da humanidade, e podem, o que fazem frequentemente, mostrar-se aos videntes e comunicar-se pelos médiuns que lhes forneçam elementos.

            “Prossegue em tua tarefa e terás a recompensa; a ti e aos teus companheiros eu felicito, rogando ao Pai para que a todos proteja."