Stupete gentes (pasmai, ó gente!)
por Carlos Imbassahy
Livro: ‘Libertação’ (Editora ISMAEL -1955)
Venho tratar
das burletas do erudito teólogo nacional por comprazer com os insopitáveis
desejos do meio amigo Leite. Ele pensa que o nome de Flammarion não deve figurar
impunemente nas mistificações de certos rois.
De fato, o
grande astrônomo aparece entre os “que não admitem as explicações dadas
pelos espíritas.” E começaram então a bravejar as citações com essa piada
fulminante:
“E o Dr. Imbassahy a fazer
crer que Flammarion é partidário da doutrina espírita e a invocá-lo como
testemunha e autoridade em seu favor. É de se tirar o chapéu.”
Iremos ver
que é de se lhe tirar mais alguma coisa.
O famanaz (o que
tem muita fama pelo seu valor) descobridor dos antipsiquistas, lança-se
à obra de Flammarion, ‘Les Forces Naturelles Inconues’, e já do título
começa a extrair ilustrativas conclusões.
Das suas
citas, algumas não pude encontrar; outras são excertos devidamente amputados: -
“on peut poser en principe que les médiums de profission trichent tous”.
E passou o ancinho no resto, onde se diz: -
“Mais ils
ne trichent pas toujours et possèdent des facultès réelles, absolument certaines.”
Eles, porém, não enganam sempre e possuem faculdades reais, absolutamente certas.”
O astrônomo
refere-se aos profissionais e declara que esses mesmos possuem
faculdades reais, absolutamente certas.
Vão assuntando.
Foi-se
levando ainda a rodo a várias passagens onde se vê explicado ou atenuado o
ceticismo do Autor. Exemplos:
“Por vezes, as idéias
emitidas parecem provir de personalidade estranha e a hipótese dos Espíritos se
apresenta mais naturamente.” pág. 18
“A obra de espíritos
desencarnados, de alma dos mortos, é uma hipótese explicativa e não devemos rejeitá-la
sem exame, porque, por vezes, parece a mais lógica.” pág. 594
“Não me surpreenderei
que algumas interpretações se traduzam pela opinião “de que não admito a existência
dos Espíritos”. Não se poderá achar qualquer afirmação desse gênero nesta obra
ou em quaquer outra.” pág. 595
E para
concluir, ainda no mesmo livro:
L’hypothèse
spirite ne doit pas etre eliminée. Pág. 597
Como se
nota, nem aí se vê que o astrônomo “não admitisse as explicações dadas pelos
espíritas”.
O que ele
dizia na citada obra é que a intervenção dos mortos ainda não estava
demonstrada; que ele não tratara ainda com a alma dos mortos:
“O que eu digo é que
os fenômenos físicos aqui estudados não provam a sua colaboração.” Pág. 595
E afirmava:
“Sem admitir a
existência dos Espíritos como demonstrada, sentimos que tudo não é de ordem
simplesmente material, orgânica, cerebral. Há outra coisa. Pág. 597
Que dizer,
entretanto, da sinceridade do escritor que estaca nessa obra preliminar? Que dizer
do contraditor que cortina as obras posteriores em que ao eminente astrônomo se
depara, afinal e concludentemente, a prova da sobrevivência? Que fecha os olhos
quando a outra coisa aparece clara, irrefutável, ao notável Psiquista;
quando a intervenção dos mortos lhe surge definitivamente demonstrada?...
Ora,
mais tarde, Flammarion dedica-se ao estudo dos fenômenos de ordem subjetiva,
aos fatos da mediunidade intelectual. E escreve, então, ‘La Mort et son
Mystere’, em 3 volumes assim denominados: ‘Avant la Mort’, ‘Avant
de la Mort’ e ‘Apris La Mort’. Esse título já não comove o
teólogo. Vamos adiante e vejamos o que nos diz o Mestre:
“Os fatos expostos
nesta obra mostram que os nossos caros desaparecidos ficam algum tempo em nossa
vizinhança e se manifestam quando as circunstâncias o permitem.” III, 407.
E ainda:
“Verificamos que as
manifestações dos mortos são irrecusáveis.” Pág. 408
E mais:
“Os fantasmas dos
mortos existem. Mostram-se, manifestam-se. São vistos de face, de perfil,
obliquamente, refletidos nos espelhos, em plena correspondência com as leis da
perspectiva.” Pág. 415
Toda a obra
do astrônomo é a demonstração da cominicabilidade dos defuntos, o que o faz
concluir:
“Les défunts
manifestant leur survivance sous les aspects les plus variés”. Os defuntos manifestam
sua sobreivência, sob os mais variados aspectos.
O mundo psíquico
invisível e real parece-me doravante “icontestavelmente verificado”.
E,
finalmente, depois do seu longo estudo, estabelece cinco princípios, sendo o
último o seguinte:
“L’ame survit à l’organisme
physique et peut se manifester aprés la mort.” “A alma sobrevive ao organismo físico
e pode manifestar-se depois da morte.”
Se
folhearmos outra obra de Flammarion – Les Maisons Hantées – veremos que
não émenos firme a sua convicção na manifestação dos mortos. Basta que anotemos
o título do seu 1º capítulo: - Os mortos se manifestam.
Nesse livro
declarava ele que sua trilogia, consagrada ás manifestações post mortem,
provocou tempestades e recriminações.
Transcreve
um artigo que já havia mandado ao Jornal, em 1922. Aí perguntava: Há ou
não há manifestação de mortos? – E assegurava: - Eu digo que há.
Depois de
narrar, entre outros, um fato que prova a sobrevivência, termina:
“Os que negam esses
fatos são ignorantes, ilógicos ou acpciosos, de vez que, conhecendo-os, não
atino como possam eliminar o ato do defunto.”
‘As casas mal assombradas’ é mais um
repositório de fatos que demonstram iniludivelmente a sobrevivência e onde
Flammarion expende, com provas sobejas e razões indiscutíveis, a sua crença na
manifestação do morto.
E se
invocá-lo com testemunha e autoridade a meu favor é de se tirar o chapéu,
apresentá-lo como infenso à sobrevivência ou negador do que os espíritas
afirmam, já não é simplesmente de se tirar o chapéu, é de escacholar.
De tudo se
conclui que ‘Les Forces Naturelles’ muito ao contrário de firmar o
negativismo do Mestre, deixa-nos convicto de sua imparcialidade e insuspeição
quando, nas obras posteriores, se inclina, franca, decisivamente, para a
hipótese espírita.
Entre as
respostas abafantes do indefesso adversário dos espíritas acha-se a de que
estava a ironizar quando encaixou, em certo lance, o fantasma da Katie King com
os médiuns e experimentadores.
Um fantasma
transformado em médium é uma dessas facécias (pilhérias) que
deve ter provocado sonoras gargalhadas.
E se formos examinar com justiça toda a argumentação do dicaz (satírico) opugnador,
veremos que toda ela, a exemplo de Katie entre os médiuns, é capaz de provocar
por aí além uma tal hilaridade, que será um nunca mais acabar de rir.
Graças e
argumentações que farão dizer – stupete gentes!
Os mortos se manifestam...
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