Erros religiosos da Humanidade
por Ismael Gomes Braga
livro: “Libertação” (Editora Ismael-Araras-SP, 1955)
A primeira
desventura do homem é seu espírito de seita que tudo conspurca e incendeia, porque
ele tem n’alma quase somente germens de inferioridade e em tal terreno não
podem medrar as sementes do bom e do belo. Só uma ínfima minoria de bons colhe
todos os benefícios das revelações divinas.
Deus nos
envia Mestres sublimes que nos ensinam o caminho da luz para a felicidade. Uns
poucos aceitam a revelação e voam para o alto, mas a maioria projeta suas próprias
sombras sobre o terreno e têm de progredir lentamente pela força invencível da
dor que a ninguém deixa para sempre abandonado à margem da evolução.
Moisés
recebeu e transmitiu ao povo ensinos de eterna sabedoria. Não nos esqueçamos
que por ele veio ao mundo o Decálogo e vieram outras pérolas preciosas, como
comentários aos Dez Mandamentos. São frases que ficarão eternas nas Escrituras
e foram mais tarde confirmadas por Jesus, como o são hoje pela Terceira
Revelação, mas em poucos corações se tornaram força viva tais ensinamentos.
Vamos copiar aqui apenas três frases recebidas por Moisés: “Como o natural
entre vós será o estrangeiro que peregrina convosco, e amá-lo-ás como a ti
mesmo.” (Levítico, XIX, 34). “Ama ao teu próximo como a ti mesmo” (Levítico,
XIX, 18). “Nem só de pão vive o homem.” (Deteronômio, VIII, 3).
Estas frases
foram repetidas por Jesus e o são incessantemente pelos nossos guias, porque
constituem ensinos de aplicação eterna e universal. Os homens creram que tais
palavras vinham de Deus e as conservam nos lábios até hoje, mas só nos lábios.
No coração elas não viveram ainda.
Bastariam os
ensinos recebidos pela mediunidade de Moisés para guiarem a humanidade à luz e
à ventura. Reflitamos sobre o versículo 33 do cap. XIX do Levítico, acima transcrito,
para percebermos que ele não poderia ser de origem humana. Naquele tempo em que
se faziam as guerras de extermínio contra os estrangeiros e só se poupava o
estrangeiro vencido na guerra para vende-lo como escravo, uma ordem de amar o
estrangeiro como a si mesmo só poderia ter descido de alta esfera espiritual,
porque excedia de muito tudo o que o homem de então poderia pensar e sentir.
Esses ensinos
foram escritos 1300 anos antes de nossa era, ou seja, há mais de 3200 anos e o que foi feito deles pelos crentes que o
receberam?
Fecharam-se
num seita fanática que cometeu os mais absurdos crimes de religião contra os
seus profetas ulteriormente aparecidos, inclusive contra o Divino Mensageiro que
levaram à cruz do martírio. Cultivaram tristemente o ódio e conquistaram para
si mesmos o ódio universal.
Tais e
tantos foram os crimes cometidos em nome da Lei, que a dor se tornou o processo
necessário de evolução daquele povo que era destinado a guiar os outros no
progresso espiritual, como se depreende do fato de haver-se tornado universal a
Revelação por ele recebida.
Acusando de
heresia e condenando o divino Mestre, o Mosaísmo se afastou do Cristianismo e
ficou estacionado; mas o Cristianismo aceitou a Revelação mosaica, tornando-o o
grande divulgador do Velho Testamento.
O que se tem
dito do martírio do povo judeu, sob o ódio universal, em todos esses milênios,
não é só indizível é até inconcebível.
Implantou-se
a Segunda Revelação, acentuando mais a Lei de amor universal e exemplificando-a
com os mais sublimes scrifícios.
A parte má e
errada da religião – o espírito de seita – colocou os israelitas fora da
Humanidade, quando o fundamento mesmo do Judaísmo é universal e deveria ter
feito dos judeus os líderes religiosos mais queridos do mundo.
Dentre os
numerosos erros religiosos dos judeus, um de graves consequências foi o suporem
que a Revelação Divina ficara encerrada no Velho Testamento, e nada mais Deus teria
que dizer aos homens. Com esse tenebroso engano, ficaram eles encarcerados religiosamente
num passado remoto, fora do tempo e do mundo, sem admitir nenhum progrsso na
Revelação, nem a possibilidade de haver preciosas revelações por intermédio de outros
povos. Repeliram o maior de seus profetas, o que vinha coroar a obra e dar cumprimento
à Lei, realizar as profecias.
Nasceu o
Cristianismo em plena capital judaica, mas a religião oficial o repeliu e só os
simples de coração o aceitaram. Perseguiram o Espírito mais sublime que já
desceu à Terra; crucificaram-no e perseguiram seus discípulos e continuadores. O Cristianismo que teria dado o máximo
prestígio ao povo de Israel, foi exilado e só pode medrar no estrangeiro.
Foi um erro
religioso de tremendas consequências para os judeus essa violenta repulsa ao
Cristianismo nascente. Eles perderam a liderança religiosa que lhes havia sido
posta nas mãos, e tornaram-se uma pequena seita odiosa e sempre odiada no mundo,
quando ela só deveria inspirar amor, amar e ser amada.
O Cristianismo
confirmou a Lei em tudo que ele possuía de divino; mas depois de três séculos
se constituiu em Igreja oficial do Império Romano, adquiriu poder temporal,
tornou-se religião obrigatória par todos os súditos do governo romano.
Passou de
perseguido a perseguidor e entrou a cometer todos os erros – para não dizer
crimes – de religião imposta pela força do Estado. Toda a crueldade bárbara ressurgiu
sacrilegamente em nome do cordeiro de Deus. Nessa involução, descendo sempre,
dando pasto às mais vis paixões humanas, com o passar dos séculos o “cristianismo”
estava transformado na mais monstruosa instituição que já possuíu a Humanidade.
Era a Inquisição, o ódio desenfreado, apoiando a escravidão, cavando prisões
subterrâneas, levantando os cavaletes de tortura, a roda, acendendo fogueiras
para queimar vivos os seus “hereges”, assim classificados em processos odiosos
de interesses políticos e econômicos inconfessáveis.
Séculos e
séculos de crimes monstruosos em nome da religião de amor e perdão
incondicional!
Vieram
as Cruzadas, guerras de pilhagem e extermínio que duraram séculos, sob pretexto
de “libertar” a Terra Santa... E tudo em nome do Cordeiro de Deus!
Surgiu entre
os árabes o Islamismo, agressivo, exclusivista, cruel, e até hoje mantém guerra
“santa” contra o cristianismo das igrejas.
Em todos
esses séculos e milênios de tremendos erros religiosos, o progresso humano
continuou sendo feito através da dor que felizmente nunca nos abandonou em nossos
desmandos.
Chegou o
século da revolução contra a tirania do imperialismo religioso. Foi feita a Reforma
religiosa que custou rios de sangue e levou à fogueira Espíritos sublimes.
Basta lembrar a Noitada de S. Bartolomeu e a execução de Jan Huss, para
sentirmos o preço da Reforma, o terror da reação de Roma contra a Reforma; mas
a Humanidade já havia progredido bastante para a vitória da Reforma sobre
grandes massas humanas, se bem que Roma continuasse dominando em muitos países
do Ocidente, como se acha ainda.
A Reforma e
o progresso social conquistado palmo a palmo, forçaram finalmente Roma a se
modificar e perder a força tirânica que exercia sobre o povo. Ainda em nosso
século houve tentativa forte de restauração daquela força. Pelo célebre Tratado
de Latrão, o fascismo restaurou o poder temporal da Igreja; mas foi de pouca
duração essa restauração, porque o próprio fascismo foi extinto mais cedo do
que a Igreja poderia supor.
Essas conquistas
sociais foram de caminhar lento. Três séculos depois de feita a Reforma, ainda
a Inquisição conservava seu inteiro poder sobre Portugal, Espanha e outros
países, e queimava impunemente os seus “hereges”, em processos tortuosos, nos
quais predominava muito o interesse político e econômico.
Com tantos
erros cometidos através dos milênios, a religião se comprometeu duramente na
consciência humana. Há numerosas pessoas que sentem um santo horror da palavra “religião”,
como os judeus e outros povos sentem pavor no nome “cristianismo”, porque para
esses povos “cristianismo” significa: prisões subterrâneas, torturas físicas e
morais, fogueiras inquisitoriais, confiscação de propriedade, escravidão, lama
da pior espécie.
Agora
ressurge a religião com a Terceira Revelação. Não desmente os seus princípios
revelados através dos milênios, confirma-os.
Diz-nos de
novo o mesmo que já foi dito por intermédio de Moisés, dos Profetas, de Jesus,
e, além de dizê-lo, traz-nos o depoimento dos “mortos”, todos eles afirmando que
aqueles princípios de amor universal indicam o único caminho seguro para a
subida ao céu.
A grande
diferença ente a Terceira Revelação e as duas que a precederam consiste em que
as duas primeiras afirmavam a eternidade
da vida, enquanto que a Terceira demonstra essa eternidade e com ela a
responsabilidade ilimitada: ninguém fica impune pelos crimes que comete; não há
meios de burlar a lei de Deus.
Pelos crimes
religiosos cometidos no passado, temos muita razão de supor que os homens não
criam na imortalidade e responsabilidade da alma; era um dogma inteiramente
morto o da imortalidade. De agora em diante, a repetição por toda a parte dos
fenômenos espíritas vai dando nitidez cada dia maior a essa verdade religiosa;
a imortalidade da alma torna-se palpável e indubitável.
Não
aceitamos liteiramente a opinião de Léon Denis, citada no início deste artigo,
porque a paciência dos nossos Maiores da Espiritualidade está hoje mais
demonstrada do que no momento em que foram escritas aquelas palavras. Cremos
que os homens não terão força de corromper o Espiritismo e rebaixá-lo como
fizeram com as revelações anteriores, porque os Espíritos são incansáveis em
seus esforços de nos ajudar, e porque a Humanidade já progrediu um pouco
moralmente para não cair mais em erros tão grosseiros.
***
O
Espiritismo terá que cumprir sua missão num mundo diferente daquele em que se
desenvolveram as igrejas que cometeram grandes erros religiosos.
Embora os princípios
revelados do Judaísmo e do Cristianismo fossem universais, a Humanidade antiga
vivia apartada em grupos sem comunicações constantes uns com os outros. A falta
de transportes, de imprensa, de uma língua internacional popular insulava os
grupos humanos que se desconheciam mutuamente. Nada havia de comum a toda a Humanidade.
No presente e ainda mais no porvir, ao contrário, tudo será mais comum a toda a
população do Planeta.
Todas as
distãncias já estão abolidas pelo rádio. O progresso do Esperanto já nos vai
criando a mentalidade planetári, a consciência de solidariedade de todos os
terrícolas. Quando se der o pleno desenvolvimento do Espiritismo, já as massas
humanas possuirão uma língua internacional popular.
As
religiões antigas tinham, cada uma delas, sua língua internacional: o Judaísmo
tinha o hebraico, a Igreja Católica tinha o latim, o Islamismo possuía o árabe,
mas tais línguas só eram internacionais para pequeníssimas elites de alto nível
cultural; o povo mesmo não possuía meios de compreender as Escrituras, sempre
fechadas em línguas sagradas até a Reforma, quando a Bíblia passou a ser
traduzida e divulgada entre os crentes.
No porvir, as
massas humanas mesmas possuirão uma língua realmente internacional e gozarão os
benefícios da Revelação Progressiva e universal que se dará no planeta todo e
chegará imediatamente ao conhecimento de todos.
Seria
pessimismo supormos que o Espiritismo venha a cair nos mesmos erros do passado.
Isso não será possível; o progrsso não o permitirá.
Temos
encontrado nos meios espíritas, ultimamente, famílias de israelitas que teriam
pavor de entrar em uma igreja católica; mas, através do Espiritismo foram
conquistadas para o Evangelho. Uma das missões do Espiritismo, ao que nos
parece, será recuperarmos para o Cristo o coração dos judeus, esse coração tão assustado
pelo medo milenário das perseguições que supunham “cristãs” e que se diziam “cristãs”.
Já com dois mil anos de atraso, mas na eternidade nunca é demasiado tarde.
A defesa dos
acusados alegou que tais atos não eram crime, porque praticados de acordo com a legislação vigente na Alemanha que era uma nação soberana e podia decretar as
leis que lhe aprouvesse. Mas os julgadores decidiram que acima das soberanias
nacionais existem direitos humanos universais, cuja violação é crime, e assim
foram condenados e executados os responsáveis. Houve um progresso na evolução
do direito internacional e o sentimento de humanidade foi colocado acima das
soberanias nacionais que cobriram tantos crimes no passado.
Pode
argumentar-se que esse reconhecimento dos direitos da criatura humana à liberdade,
à vida, à crença, é de difícil execução, e como prova disso pode alegrar-se que o
lançamento de bombas atômicas contra cidades japonesas, exterminando populações
civis indefesas, seria um crime de genocídio, mas os responsáveis não foram
julgados, porque não houve força legal suficiente para julgá-los. Se os Estados
Unidos houvessem sido vencidos na guerra, certamente um tribunal japonês teria
classificado o fato como genocídio, julgado e condenado os responsáveis, e meia
dúzia de ianques teriam sido enforcados. Ninguém foi acusado, porque faltou força
necessária ao julgamento em tribunal. Mas a consciência universal não absolveu
os responsáveis: o mundo todo sente ódio contra os responsáveis, e os mais
veementes protestos suriram dentro dos Estados Unidos. Houve outra espécie de
condenção que apavora os responsáveis, e esta nos agrada mais do que a de
Nurenberg, porque entrega o criminoso ao tribunal de sua própria consciência que
é o mais forte de todos os tribunais.
O povo
dos Estados Unidos julgou os responsáveis pelas bombas atômicas sobre cidades
indefesas do Japão e este julgamento é muito forte.
Os erros
religiosos da Humanidade são capítulo triste da História, mas não poderão
reproduzir-se no porvir, nesse grande porvir que assistirá ao triunfo mundial
da Terceira Revelação, ou seja do triângulo luminoso a que se têm referido os
nossos guias:
E E
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