Casos e coisas
por Manoel Quintão
Reformador (FEB) Janeiro 1940
Não se
precatam (acautelam-se), esses amáveis confrades, de
que o jogo é velho e feito sempre com as mesmas cartas. O que muda é a parceria,
quando muda.
Em se
tratando do Parnaso de Além Túmulo, vale então dizer que essa crítica
veio tarde e a más horas, pois esse livro, maravilhoso e único nos anais da
bibliografia espírita, apareceu há oito anos, está na terceira edição quase
esgotada e, por conseguinte, consagrado no conceito público.
O público, é
bem de ver, não se conta aqui pelas tasquinhas (pedacinhos) da
peraltice literária, esfatiada ao gosto de mentalidades seminaristas e mais ou
menos cavadoras de notoriedade, em achegas de revistas mais ou menos esportivas.
Não é, tampouco, o que ajuiza de conta alheia. Esse público nós o damos sem ágio
aos mercadores de roupas feitas, para que se vista à vontade e acompanhe o
terço e a missa que melhor lhe saiba. Não temos a pretensão de aposentar Panurgo
(designação irônica dos que só procedem por espírito de
imitação.) Nosso público é de outra marca, não se improvisa, não se
requesta. A convicção não se lhe faz ab extrinseco ( apresentar
a fé impondo-se à alma unicamente do exterior e por via autoritária),
mediante garabulhos (asperezas) de convicção, mas, ex intimis, (do
mais íntimo...) em penhor de madureza espiritual, que os “Saint-Beuvesinhos”
(Saint Beuve: crítico literário francês) de
arribada (ato ou efeito de arribar, de chegar à margem)
jamais poderiam conceber na sua psicologia materialista, salvo o paradoxo.
Então, que querem os confrades missivistas? É deixa-los com a sua psicose e
aguardar que o Tempo, o grande mestre da vida, se encarregar de lourejar (amarelecer) as
searas, como quem sabe que não crê quem quer, mas, quem pode.
Não teve,
outrossim, o convívio e o estímulo de rodas intelectuais e literárias, não foi
tipógrafo, qual Machado de Assis, nunca fixou de plano qualquer problema
filosófico, social, moral, científico ou religioso... Isso ele mesmo o diz,
melhor que nós, no proêmio do Parnaso e é o que a crítica honesta
competiria considerar antes de criticar.
Pois bem:
esse moço, que não escreve quando quer nem como quer, e nunca para ganhar
dinheiro – pois que nada aufere da sua recolta (ato ou efeito de colher, recolher) mediúnica e os próprios
elogios o constrangem e intimidam – esse moço nos vem dando de improviso,
vertiginosamente, sem intermitência de quaisquer elucubrações embrionárias, ou
de plano preconcebido, obras de relêvo literário, não somentte, mas de fundo
filosófico e científico, só frutecentes ( que dê frutos) em
cerebrações (atividade mental) privilegiadas
e adubadas de copiosa e intensa cultura.
E na prosa
como no verso afloram estilos, modismos, dialéticas, hermenêuticas pessoais
inconfundíveis e mais – inconcebíveis, porque tudo isso ele ignora. É a
História trabalhada em veios ricos de poderosa síntese, é o Romance entretecido
em bastidores de fina tela psicológica, a preceito técnico, é a Filosofia condensada,
pasteurizada à luz de todas as conquistas do pensamento humano.
Em toda essa
obra multifária (variada) e cambiante (modulada),
desbordam teorias, fatos, doutrinas e conclusões, que o médium não ruminou, não
poderia ter imaginado, induzido ou deduzido jamais. Alega-se que há falahs
nessa obra? Perrfeitamente; mas, antes de tudo, é preciso focalizar no seu
conjnto e atender às circunstâncias em que se nos ela oferece. Que nos dizem os
críticos, por exemplo, desse alfabeto de cegos, coisa que o médium nunca viu, por
ele grafado a ponta de alfinete? Que dizem da escrita invertida e, ao demais,
em inglês, idioma desconhecido do médium? E das mensagens de caráter íntimo,
concernentes a episódios remotos, totalmente ignorados do médium e esquecidos
do consulente?
Conosco mesmo,
ainda há pouco, em sofrermos um acidente que nos levou ao leito por 30 dias, o
médium vibrou a 650 km distante e deu o alarme com uma mensagem espontânea de Emmanuel
(seu Guia-Espiritual), absolutamente sintonizada com o nosso estado de alma, reproduzindo
ipsis verbis (literalmente) pensamentos nossos em face
do acontecimento, quando, por si, nada sabia nem poderia presumir!
São provas
documentais, nítidas, incontáveis, que se não infirmam com paroleiras (imposturas)
mais ou menos áticas (despojadas) e bizantinas (especulativas).
Noutro país, elas seriam dignas de estudo conspícuo, qual o fizeram na
Inglaterra a Sociedade Dialética de Londres e, na Frnaça, o Instituto
Metapsíquico.
Entre nós,
com a nossa mentalidade moitante (brincalhona)-desportivo-carnavalesca,
vai tudo à conta dos Pimentéis (?) e do ... “pastiche” (obra
literária ou artística em que se imita abertamente o estilo de outros
escritores, pintores, músicos etc.)
Mas,
como o “pastiche” pressupõe habilidade invulgar, cultura intelectual, tempo e,
sobretudo, interesse, claro ou oculto, e nada disso ressalta da obra honesta do
médium Xavier, já houve um preopinante que se saiu com esta: ou fenômeno
genial inexplicável, ou pastiche inconsciente... Ouviram bem? – inconsciente!
E aí tens, leitor confrade, uma charada sem conceito pata o teu conceito, que
seria de lhe “dar com um gato morto até miar”, se o velho bichano não andasse
por aí escondido com a cauda de fora. E que cauda, santo Deus!
Portanto,
convenhamos: é deixá-los examinar, até que lhes possamos repetir
evangelicamente o quoerite et invenietis... (procure
e você encontrará...)
Mas até
lá...
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