quarta-feira, 8 de setembro de 2021

A Prece e a Lei

 

A Prece e a Lei

por Indalício Mendes

Reformador (FEB) Março 1966

     “Há pessoas que contestam a eficácia da prece, fundadas em que, conhecendo Deus as nossas necessidades, é supérfluo que lhas exponhamos. Acrescentam que, encadeando-se todo o Universo por meio de leis eternas, não podem os nossos votos alterar os decretos de Deus. Sem dúvida alguma, existem leis naturais e imutáveis, que Deus não pode derrogar conforme o capricho de cada um; mas daí a crer-se que todas as circunstâncias da vida são submetidas à fatalidade, vai distância grande. Se assim fora, o homem não seria mais do que um instrumento passivo, sem livre arbítrio e sem iniciativa, hipótese em que só lhe restaria curvar a cabeça, sob o peso de todos os acontecimentos, sem buscar evita-los, sem procurar desviar-lhes os golpes. Se Deus lhe concedeu raciocínio e inteligência, foi para que deles se servisse, assim como lhe deu a vontade para querer, a atividade para ser posta em ação. O homem, pela liberdade que tem de agir em outro sentido, é quem faz que seus atos lhe tragam, e para outrem, consequências derivadas do que ele praticou ou deixou de praticar.” (“A Prece” – Eficácia da prece – Allan Kardec).

 Meditemos bem nessas palavras do Codificador. O capítulo se estende por mais umas páginas preciosas, mas parece-nos suficientes as que aqui reproduzimos, para o fim que temos em vista.

            Tudo quanto se relaciona com a vida espiritual e a vida humana está intimamente ligado à Lei de Causa e Efeito; Portanto, a prece não pode escapar à influência cármica, comprovando o asserto de que é o Espírito, encarnado ou desencarnado que traça mesmo o seu destino, que elabora suas alegrias e suas dores, através do que pensa e faz. Deus é a maior expressão da Lei, porque Ele é a própria Lei. Se as nossas preces forem amparadas por um quadro cármico razoável, mais facilmente se revestirão da força suficiente para promover o reconhecimento das nossas pretensões, consoante a justiça impessoal do Carma.

            Às vezes ficamos surpreendidos com o poder da prece proferida por certas pessoas bastantes espiritualizadas. Outra vezes, decepcionamo-nos com o malogro das nossas preces, que parecem destituídas de eco, porque não encontram ressonância no Alto e se perdem na esterilidade dos nossos esforços. Porquê? É que a nossa situação cármica não dá passagem às nossas pretensões. Como será possível satisfazer da mesma maneira duas pessoas com painéis cármicos diametralmente opostos? Um indivíduo cheio de débitos morais e espirituais não pode ter o mesmo crédito de outro indivíduo que busca invariavelmente melhorar a sua condição em face da lei.

            Já ouvimos queixas assim: “Nada obtenho com as preces que faço”, “De nada adianta fazer preces, porque raramente consigo alguma coisa”, “Tenho uma prece bonita e infalível. Quando me vejo em apuros, peço o que quero e obtenho.”

            Convém não levar muito a sério aqueles que consideram a prece como uma gazua para arrombar as portas da Espiritualidade. O que dá eficiência à prece é o mérito moral. Quanto maior o merecimento, maior alcance terá a prece proferida com sinceridade. A primeira condição de quem ora deve ser a humildade, porque o merecimento não dá a ninguém autoridade para despir-se dessa importante condição. A prece deve ser sincera, deve traduzir a pureza do nosso sentimento. O merecimento, o sentimento e a fortalecem a oração, assegurando-lhe o êxito, sempre que não contrariar disposições fatais Lei de Causa e Efeito.

            A prece não precisa seguir um modelo especial. Há preces lindas e inócuas. Agradam a quem as ouve, mas não produzem resultados, se não animá-las o sentimento puro de quem as profere. É Kardec quem esclarece: “Os Espíritos tem dito sempre: “A forma da prece nada significa, o pensamento é tudo. Cada um que ore, de conformidade com as suas convicções e da maneira que mais lhe toque o íntimo. Um bom pensamento vale mais do que um grande número de palavras, com as quais nada tenha de comum o coração.” (ob. cit., pág. 67)  

            Conta-se que um homem, vendo-se em estrema aflição e não sabendo orar, caiu de joelhos, quase desesperado, e exclamou repentinamente: “Deus! Deus! Deus!” E caiu em pranto. Aquilo que ele almejava viesse a suceder, verificou-se para o refrigério de sua alma. Então, disseram: “Milagre!” Nada. Não houve milagre algum. O homem, embora não soubesse expressar-se em palavras, traduziu em seu pensamento o que desejava. Isto foi o suficiente, porque as mensagens do pensamento são mais rápidas e profundas do que as mensagens verbais. Estas têm a vantagem de exercer sobre nós uma influência psicológica imediata e benéfica. Parece que nos deixemos sugestionar por nossas próprias palavras, quando nos entregamos de coração à prece.

            Kardec diz também que “são boas as preces de todos os cultos, desde que sejam proferidas com o coração e não com os lábios somente. Não impõe nenhuma e a nenhuma condena”.

            O essencial é compreendermos que nossa vida é regulada pela lei cármica. Somos produto dos nossos pensamentos e atos. Se devemos ter queixas de nossas dores e insucessos, queixamo-nos, na maior parte dos casos, de nós mesmos.

            Tenhamos, pois, cuidado com o que dizemos, pensamos e fazemos. O nosso futuro é feito do nosso passado e do nosso presente. Somos escravos de nós mesmos. A Lei de Causa e Efeito é o juiz inexorável do nosso comportamento, levando com alto espírito de justiça o que tivermos a lançar no Crédito e no Débito da contabilidade espiritual.


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