Por quê?
por Cristiano Agarido (Ismael Gomes Braga)
Reformador (FEB) Outubro 1946
“O
Espiritismo vem realizar, na época prevista, as promessas do Cristo. Entretanto,
não o pode fazer sem destruir os abusos. Como Jesus, ele topa com o orgulho, o egoísmo,
a ambição, a cupidez, o fanatismo cego, os quais, levados às suas últimas trincheiras,
tentam abafar lhe o caminho e lhe suscitam entraves e perseguições. Também ele,
portanto, tem que combater; mas, o tempo das lutas e das perseguições sanguinolentas
passou; são todas de ordem moral as que terá de sofrer e próximo lhes está o termo.
As primeiras duraram séculos; outras durarão apenas alguns anos, porque a luz,
em vez de partir de um único foco, irrompe de todos os pontos do globo e abrirá
mais de pronto os olhos aos cegos.” (Cap. XXIII, § 17.)
Ninguém poderia sensatamente pensar
de outro modo em 1864, mas vemos hoje que a vitória está longe e as lutas não
cessaram em alguns anos, nem em vários decênios, mas terão de continuar por
muito tempo. Quanto o mundo se modificou nesses oitenta anos, e na aparência
para pior, porque as perseguições sanguinolentas às ideias ressurgiram com o
Comunismo e o Fascismo e banharam do sangue o Velho Mundo! Repugnante perseguição
de raças trucidou milhões de seres humanos indefesos. De dois terços do
território europeu o Espiritismo foi banido pela violência, sem admitir
discussão alguma, e isso pelos dois grandes partidos em luta: Nazismo e
Comunismo, ambos furiosamente materialistas. Sabemos que o mundo piorou só na aparência
externa, porque a uma grande onda de mal sucede outra maior de bem e esta
conquista sempre o futuro. Porque falhou assim a lógica mais severa?
Bem simples e por isso mesmo muito
difícil de aceitar-se a explicação.
A universalidade da língua francesa
deu à França uma supremacia cultural indiscutível no século XIX e desencadeou
os ciúmes nacionais dos imperialismos diversos e cada povo tentou elevar seu
próprio idioma às culminâncias que havia atingido o francês. A língua única da
Diplomacia foi violentamente afastada e todos os povos tentaram introduzir seu
idioma, chegando-se rapidamente à plena Babel nas relações internacionais que
por mais de um século haviam gozado os benefícios da unidade linguística com o
francês como língua diplomática mundial. Chegou-se ao absurdo de redigir tratados
internacionais em tantas línguas quantos fossem os contratantes e todas elas
como originais.
Inglês, alemão, italiano, russo,
espanhol, todas as línguas da Europa, foram Impostas pelos diferentes povos
como possuindo direitos iguais ao francês e este caiu rapidamente das funções
de língua de cultura mundial para o lugar de simples língua nacional de
minorias.
O Espiritismo sofreu toda a
desarticulação da falta de uma língua comum. As mensagens descidas do Alto
ficaram limitadas a regiões linguísticas, a verdadeiras ilhas inabordáveis para
os outros povos. A Revelação contínua sendo mundial, porque os Espíritos falam
em todas as línguas do planeta, mas os homens estão privados da universalidade
das comunicações e limitados exclusivamente às suas fronteiras linguísticas. Em
vez de um Espiritismo mundial único, como ao tempo de Kardec, elaboram-se
centenas de pequenos movimentos espiritas desligados uns dos outros e
ignorantes até da existência de outros núcleos. Surgem grandes médiuns, maiores
do que existiam ao tempo de Kardec, mas sua obra provisoriamente permanece fechada em cada região linguística. Quem
conhece na França a obra de Rosemary ou de Francisco Cândido Xavier? Nem os
brasileiros conhecem as obras da grande médium inglesa, nem os ingleses
conhecem a dos nossos médiuns, e assim sucede a todos os povos. Falta a língua
comum que reúna todo esse imenso tesouro, que, realmente, quando ligado em um
todo, venceria o mundo em poucos anos, como previa Kardec sem poder imaginar a falência
da língua francesa, queda inteiramente imprevisível em 1864 mas totalmente
consumada em 1919, quando, pela primeira vez, numa conferência de diversas
Potências, o francês foi excluído, porque os estadistas declararam que não sabiam
francês.
A falta de uma língua mundial de
cultura que reúna tudo quanto recebem os médiuns espalhados pelo mundo, para
restituir tudo a todos como patrimônio comum de todos e de cada um, retardou de
modo impressionante o movimento espírita mundial; mas o que perdemos em um século
reconquistaremos em outro para toda a eternidade futura.
Já os espíritas iniciaram em escala mundial a obra do
futuro. O Congresso Espírita Panamericano adotou o Esperanto como uma de suas línguas
oficiais; na Inglaterra, fundou-se a Londona
Esperanto-Spiritista Societo; no Egito, está-se trabalhando com ardor pelo
Esperanto entre os espíritas; no Brasil, a Federação Espírita Brasileira iniciou
o duplo trabalho de divulgar o Esperanto entre os espíritas e o Espiritismo entre
os esperantistas, e neste sentido já publicou vinte e poucos livros.
Não sabemos quando, mas sabemos que
um dia a situação será muito melhor do que no tempo de Kardec; porque o
Espiritismo terá uma língua mundial de todos e nela reunirá essa imponente
biblioteca descida do Alto; são obras que se completam pela diversidade dos
aspectos tratados pelos Espíritos e, quando reunidas, terão a força necessária
para se imporem irresistivelmente a todos os pensadores do mundo.
Trabalhemos, pois, com a certeza de
que o grande ideal está em marcha e seu eclipse será muito passageiro.
Do blog: Até onde pudemos observar o Esperanto não ‘prosperou’ no Brasil. Para explicar este fato, rogamos os comentários de nossos leitores.
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