por Pedro Richard
Reformador (FEB) 1º Abril 1914
Primeiro que tudo devo dizer de que
modo entendo esse sentimento puramente divino - a caridade, que o apóstolo
Paulo classificou como a primeira das virtudes, capaz só por si de levar o
espírito culpado à salvação, redimindo-o de toda a culpa, porque, diz o
convertido da entrada de Damasco: a caridade lava toda mancha.
Isto disse ele referindo- se ao
planeta Terra, onde os espíritos em prova estão manchados, em consequência do mal
emprego que fizeram de seu livre arbítrio.
Deus, que é o amor por excelência,
só criou para o amor; isto quer dizer que a sua criação só se destina a um fim:
o cumprimento e a execução das leis do amor.
Tudo que existe que vive e que
palpita, existe, vive e palpita para cumprir e executar as leis grandiosas e
santas dessa emanação divina - o amor.
A criatura, espírito, portadora desses
predicados, que conhecemos com as denominações de inteligência e vontade, por
conseguinte, com responsabilidade, é a pequena partícula que Ele destinou para
colaborar na sua grandiosa obra - o amor.
O
espírito, pois, existe para amar e ser amado.
Amar ao seu Criador com toda a
energia de seu ser, com todas as forças de que é dotado; amar as suas criaturas
como a si mesmo, desde a mais humilde à mais elevada; só assim é que só o espírito
dará provas e manifestará o amor a Deus, porque não se pode amar ao Criador sem
que se ame às suas criaturas. Não se pode dar provas de que se ama ao Criador senão
integralizando-se na sua obra, pois que é esse o fim para o qual Deus
concretizou a sua criatura. Eis a razão da lei ditada por Jesus: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao
próximo como a si mesmo”.
A caridade, pois, é a manifestação
do amor ao próximo, sob qualquer aspecto. Amar ao próximo é identificar-se com
ele, isto é tornar suas as necessidades dele e ser um agente caridoso do seu
progresso, fazendo-se dessarte um auxiliar de Deus na obra grandiosa do Bem, que
nada mais é do que a direção dos espíritos no rigoroso cumprimento do dever.
Em suma, a boa prática da caridade consiste no dever,
que cumpre a cada um, de repartir com seus irmãos tudo quanto lhe foi dado pela
misericórdia divina, quer se trate de haveres materiais, quer de benefícios
morais de toda a ordem. A criatura deve ter sempre em vista que nada possui por
si; tudo lhe é dado pelo seu Criador e Pai, que, na manifestação sublime de seu
amor, vai distribuindo a cada um proporcionalmente a seus méritos, isto é, à
medida que seu espírito vai se pondo em condições de poder comportar as graças
celestiais, que em síntese são Justiça
e Misericórdia.
São chegados os tempos preditos e
prometidos por Jesus; os tempos em que o nosso Criador e Pai mandaria à Terra o
Consolador para na Terra ficar. Para
isso Ele fez baixar o seu Espírito sobre toda a carne, dando às mulheres,
velhos e crianças, visões, sonhos, etc. Isto quer dizer que o Pai deu às suas
criaturas aqui encarnadas atualmente o dom grandioso da mediunidade, como sendo
a moeda majestosa capaz de resgatar numa só existência um conjunto de crimes e
faltas contraídos numa série de existências pretéritas, pois, na frase
evangélica, os campos estão branqueados e a colheita se aproxima.
Os nossos espíritos, trabalhados
pela dor, evoluídos pelos conhecimentos científicos adquiridos e asfixiados
pelo sentimento religioso materializado e seus derivados - isso que chamam de
escola materialista - não possuem, por isso mesmo, nenhuma crença
verdadeiramente religiosa e estável. E isto porque a escola materialista, pretendendo
destruir a concepção errônea de céu e inferno, ou o prêmio e castigo, ao invés de
trazer ao espírito um conforto duradouro e uma esperança eterna, dá-lhe um
outro inferno não menos temido e aterrorizador - o nada.
Para os grandes males grandes
remédios. Para destruir o vício encarnado na divindade de César, a divindade de
Jesus encarnada nas virtudes.
Para destruir de uma vez para sempre
a dúvida concretizada nas escolas materialistas e nas religiões materializadas
a Revelação Espírita, que nos vem trazer pelo fato, pela razão e pela prova
experimental a certeza da imortalidade do espírito e sua consequente
responsabilidade, dando-nos, enfim, os Evangelhos, em espírito e verdade, que tudo
explicam e que vieram extirpar, de vez, a dúvida que nos tornava escravos dos
erros e das paixões.
Desta forma o Espiritismo nos abre a
porta larga e franca da caridade.
Desfeita a dúvida, surge a fé, e a
fé com obras, porquanto a fé sem obras é morta, na frase do apóstolo dos
gentios, Paulo.
Vamos nos deter por aqui;
prosseguiremos no próximo número se o Senhor nos permitir.
O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade
parte
2
por Pedro Richard Reformador (FEB) 16 Abril 1914
No meu escrito passado falei na fé sem obras. A
verdadeira obra da fé é a caridade.
Baixando à Terra a Revelação Espírita, baixou com ele
uma falange de espíritos prepostos e encarregados de sua propaganda.
Todos quantos tem tido a ventura de
receber a Revelação tomaram encargos mais ou menos importantes para com Jesus,
a fim desobrigarem de compromissos sérios de existências que se foram.
A cada colônia de espíritos ou,
melhor, a cada povo foi confiada uma missão para, de acordo com as suas necessidades
e tendências, ser desenvolvida e propagada a Revelação Divina.
Jesus, que é o sumo e divino diretor
dessa propaganda e que tudo prevê em beneficio da própria propaganda e para facilita-la,
dotou cada povo ou colônia de espíritos com os elementos precisos e indispensáveis
à perfeita execução de seu plano grandioso.
Assim é que nos povos da culta Europa, onde o cérebro
domina o coração, ali, o Divino Mestre, o Encarregado por Deus dessa gloriosa missão,
faz que apareçam os médiuns de efeitos físicos, transportes etc., porque lá a
luz vai se fazendo e continuará a ser feita pelo entendimento. É o cérebro que
domina, é a ciência que tudo devassa e que tudo pretende explicar.
Na terra de Sta. Cruz, neste pequeno
torrão onde o coração domina o cérebro, ao contrário, a partilha é consideradamente
maior. Para este recanto majestoso do planeta envia o Divino Missionário os médiuns
de efeitos morais; pois, meus amigos, o nosso encargo no Brasil é muito mais grandioso
e, por isso mesmo, de muito maior responsabilidade. A nossa missão nesta parte
da América é estudar e praticar os Evangelhos de N. S. J. Cristo; é sermos os
continuadores dos apóstolos e os disseminadores dos ensinos do Mestre pela prática da caridade. É para isto, para estes
efeitos da caridade que o Mestre Celestial dotou os filhos da terra de Sta.
Cruz de uma mediunidade quase desconhecida no resto do mundo, a receitista, que me ufano de dizer, há trinta
e tantos anos se propaga entre nós de uma forma assombrosa.
Um dos primeiros médiuns receitistas
nesta capital foi o taverneiro Abrante que era estabelecido na cidade nova.
Foi ele o escolhido por Jesus para despertar
a crença espírita no médium Nascimento, que, por sua vez e convenientemente
aparelhado, foi o efeito do Pai para levar a crença a centenas de médiuns receitistas.
De momento lembro-me de Maia de Lacerda
e Filgueiras, além de muitos mais, cujos nomes não me ocorrem agora mas que, médiuns
receitistas de fama, foram para muitos outros o veículo providencial da santa
doutrina.
E de tal maneira se tem propagado esta
classe de mediunidade, que, pode-se afirmar positivamente, não há uma rua
desta cidade onde não se encontre hodiernamente, pelo menos um médium receitista.
Tal é a abundância de médiuns receitistas nesta capital.
Essa providencial abundância de médiuns
receitistas trouxe para o nosso país, particularmente para esta cidade de São Sebastião,
o mais salutar resultado no ponto de vista moral, qual o de existir aqui um número
considerável de espíritas em todas a classes sociais. Talvez, mesmo, seja o Brasil
o país que goze da ventura sem par de possuir em seu seio amoroso o maior número
de espíritas, malgrado o seu pequeno número de habitantes em relação às nações
densamente populosas.
Será isto obra do acaso, ou tudo
isto é superiormente dirigido por Jesus, que dispõe de inúmeros espíritos
prepostos obedientes às suas ordens de amor e caridade? O acaso - todos nós
sabemos - é uma palavra que o espírito humano inventou para ocultar o que não
podemos explicar pela ignorância em que atualmente nos achamos mergulhados,
ignorância que, por orgulho não queremos confessar; no entanto, o nosso espírito
sente-se, por isso mesmo, amesquinhado e envergonhado. O acaso, pois, nada é. Não
pode, conseguintemente ser causa de fenômeno, fato ou manifestação de qualquer
ordem quer no domínio da ciência, quer nas concepções morais e religiosas.
Fica, logicamente, o fenômeno
dependendo de uma casa real e positiva, que é causa divina servida pelos espíritos
prepostos e obedientes ao mando amoroso de Jesus.
Esses médiuns receitistas o são por efeito
do acaso ou semelhante mediunidade lhe foi conferida quando tomaram corpos e
baixaram á Terra, a fim de resgatarem o seu passado culposo?
Já deixamos dito que o acaso não
existe; é simples fantasia criada pelo orgulho do espírito humano. Para nós espíritas,
pois, está positivamente provado que o acaso não existe. Tudo, portanto,
obedece a leis ainda que desconhecidas para nós. O surto de uma tal mediunidade
obedece, por consequência, ao plano divino. É que semelhantes médiuns tomaram,
quando ainda no espaço, o compromisso formal de ser para os seus irmãos os intermediários
da caridade de Jesus.
E de tal maneira se vai executando o
plano divino que, dia a dia, outros médiuns surgirão, talvez melhor aparelhados
para a realização da grandiosa missão evangélica: - as curas.
Mas, curar o que? O corpo?
Não;
curar o espírito, eis tudo. O corpo para nada vale. É preciso que a enfermidade
no paciente seja substituída pelo sentimento de gratidão e reconhecimento, e
destarte possa o enfermo aproximar-se do médium, que, na qualidade de intermediário
que é, deve fazer desaparecer a sua individualidade ínfima para que reconhecido
e grato, o curado se volte para Jesus, o sacrário da caridade e compreenda que
a cura foi obra exclusivamente do Bom Pai.
Assim é que procediam os apóstolos
de Jesus; assim é que devem proceder seus continuadores.
Nesse trabalho santo o médium
encaminhará os espíritos em demanda do amor de Deus e procurará afastar e, mesmo,
destruir o que de mais perigoso e daninho se vai aninhando no coração do
reconhecido, que é o culto à individualidade, culto consideravelmente mais
pernicioso que o das imagens no rito católico.
Esse
fermento que leveda toda a massa, na frase de Paulo, tem sido mais pernicioso
para a propaganda do Espiritismo do que o infeliz médium mercador o faz.
Esse sentimento subalterno é tão
daninho que não só afasta do seio de Jesus o neófito, senão também, e
principalmente, pontua inçando o médium de vaidade e orgulho, o esfacela
moralmente.
O culto à individualidade nada mais é
do que a confissão de um sentimento ridículo, oriundo da ignorância de quem o
pratica e a manifestação criminosa do orgulho e vaidade elevados ao mais alto expoente
por parte do cultuado, porque, presumindo-se loucamente o produtor dos benefícios
que do Pai vieram por seu intermédio, rebaixa e anula a Divindade - fonte de
todo o bem - pretendendo desse modo constituir-se um deus, ou, pelo menos, um
predestinado com virtude rara e excepcionais.
O médium que assim procede age
criminosamente porque faz do paciente um fanático e este envenena-lhe a alma
pretendendo endeusa-lo, ainda que, muitas vezes, de boa fé e na maioria dos casos,
como já disse, por ignorância.
É esse o veneno peçonhento que muito
foi combatido e verberado sempre pelos apóstolos Pedro e Paulo.
E querem um exemplo do que acabo de
dizer? Leiam os Atos dos Apóstolos e
apreciem a passagem ali citada a respeito do entusiasmo de que o povo se
possuía, quando os dois apóstolos produziam os assombros que naquele tempo eram
denominados milagres, mas que
hodiernamente são naturais e plenamente explicados e compreendidos, à luz da ciência
positiva.
Rezam os Atos que, tendo o povo se assombrado
com os grandes milagres produzidos pelos apóstolos pretendeu arrebata-los para
deles fazer deuses.
Foi então quando os apóstolos,
rasgando as túnicas, - o que naquele tempo era o sinal positivamente
significativo de reprovação formal. - fizeram aquela turba compreender que
eles, os apóstolos, eram pecadores como toda gente e que em tudo quanto
acabavam de praticar tinham agido tão somente como mero instrumentos da vontade
do Pai.
Tenham sempre em mente esta
passagem, nela refletindo incessantemente os médiuns, para acertadamente seguirem
a trilha exemplificadora dos apóstolos, é o que ardentemente lhes imploro.
Façam desaparecer a sua
individualidade e ergam bem alto Jesus, o Salvador.
O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade
parte
3
por Pedro Richardº
Reformador
(FEB) 1º Maio 1914
No meu último escrito iniciei o traçado da linha de
conduta do médium no cumprimento da sua missão na Terra. Neste e noutros
pretendo continuar a expor as minhas idéias na mesma ordem doutrinária que
venho sustentando.
O médium, que verdadeiramente compreende
a sua missão, é aquele que exercita a mediunidade com inteiro desprendimento
pessoal, não esperando nem mesmo de Deus recompensa de sua ação, visto que,
tudo devendo ao seu Criador e Pai, assiste-lhe a restrita obrigação de tudo
praticar no intuito de desobrigar-se dos compromissos que contraiu em existências
passadas.
O médium, que conhece os Evangelhos, em espírito e
verdade, não pode se recusar à prática de tão precioso dom: não pode, nem deve,
sequer de leve, duvidar da assistência e auxílio dos bons espíritos na prática
do bem por amor do bem.
Neste particular não entra, nem pode
entrar em linha de conta o adiantamento do seu espírito, mas tão somente a firme
e decisiva resolução de cumprir o seu dever na estrada que vai trilhando.
Saulo fanatizado tinha as mãos tintas
do sangue daqueles cujo crime era amar a Jesus. E, no entanto, Paulo, o cristão
resoluto e abnegado, faz prodígios pela sua fé vigorosa e, recebendo todo o auxílio
do Alto, caminha desembaraçadamente para o seio de Jesus sem mesmo lhe servirem
de empecilho os desvarios de Saulo.
Que importa o que fomos ontem...; o
que nos convém saber é o que somos hoje.
A história dos cristãos está repleta
de exemplos semelhantes, como sejam o de Francisco de Assis, Santo Agostinho e
muitos outros.
Duvidar do auxílio divino é um crime.
Se Deus nos dotou com o dom precioso
da mediunidade é para produzirmos o bem em maior profusão do que os que não foram
contemplados com essa graça divina.
Bem aplicada é aqui a parábola do
talento enterrado.
O médium que não der expansões caridosas
a esse dom celestial é réu de lesa caridade, pelo que será severamente punido
pois deixa enterrado o talento, que
lhe foi doado pelo seu Senhor para fazer produzir em benefício de seus semelhantes.
Não quero, porém, dizer com isto que
todo o mundo que se sinta médium vá exercendo a mediunidade em uma conduta sensata
e criteriosa. Não absolutamente não. O critério é qualidade indispensável em
todas as ações humanas, sobretudo no exercício das funções inerentes às coisas
sérias e santas.
O que não sofre dúvida é que o médium,
que conhece a doutrina e pratica os Evangelhos na medida de suas forças tem o
dever de trabalhar e de exercitar a caridade - que é o amor ao próximo – a fim
de se de obrigar dos compromissos que tomou ao encarnar-se, pois não se é
médium por acaso, mas para dar cumprimento ao compromisso contraído pelo próprio
espirito.
Fugir à prática da mediunidade não
se preparando convenientemente para exerce-la é falir e não raro, caminhar em
demanda da obsessão.
Sem dúvida, quem assim procede não pode deixar de ser vítima
de obsessão, porque, não cultivando a mediunidade que, por misericórdia lhe foi
dada, e não exercendo, portanto, a caridade, como lhe compete, vem a ser
vitimado pelos espíritos inferiores, que não respeitam a bondade de outrem e, aproveitando-se
do desequilíbrio orgânico provocado por um excesso qualquer, atuam sobre o organismo
do infeliz médium, exercendo a sua influência deletéria particularmente no baço
do paciente, por isso que é o baço a sede do aparelho nervoso, conforme me têm
dito os espíritos.
Dessarte, o médium provoca
voluntariamente nele a atuação dos espíritos inferiores, que têm ingresso pela
porta ampla da sua própria desídia. Desde então começa a punição do médium que
abandonou o cumprimento do dever moral.
Os trabalhos de caridade impõem-se,
pois, como medida de sanidade moral para os que sofrem na Terra como no espaço.
Não existe médium receitista que não
tenha sentido a necessidade imprescindível dos trabalhos práticos de caridade
como meio eficaz de cura moral e física.
Relevem que narre, a propósito, o último
caso que comigo se passou há pouco tempo.
Em minha clínica de médium receitista apareceu-me um
enfermo que desde muito me conhecia. É parente de uma senhora que por muitos
anos foi nossa auxiliar nos serviços domésticos de nossa casa.
O rapaz queixava-se de perturbações
nervosas, que não o deixavam dormir nem exercer as funções de seu ofício de
bombeiro, pois era vítima de constantes e violentos movimentos bruscos e
independentes de sua vontade. Além disso, tinha manifestações auditivas que
impiedosamente o perturbavam.
O pobre operário medicou-se durante
longos meses, sem nenhum resultado satisfatório.
Frequentava assiduamente as sessões
da Federação e foi durante algum tempo ouvinte da escola de médiuns.
Foi senão quando desapareceu-me e não mais o vi.
Passado tempo deparei com o nosso
homem na rua da Uruguaiana e veio pressuroso ao meu encontro; estava fardado de
guarda-fiscal, alegre, bem disposto e prazenteiro (espirituoso).
Apressei-me então, a perguntar-lhe:
Como vais, rapaz. Já ficaste bom?
Já estou bom, graças a Deus, diz-me
ele.
Mas de que modo? Interroguei-lhe.
Aconselhado por um nosso irmão desenvolvi
a mediunidade e tudo passou como por encanto, respondeu-me.
Presentemente estou trabalhando no
grupo A. Acha que estou procedendo bem?
Filho, disse-lhe, mais alto e
eloquente que os argumentos que eu te poderia aduzir fala o fato. Mas, devo dizer-te,
com a liberdade de irmão, que não estou de acordo com a orientação do grupo A.
Penso que, se ali continuares, poderás te prejudicar.
Para onde devo ir então, Sr. Richard?
Para a Federação? Mas, na Federação, não há semelhante ordem de trabalhos.
É verdade, meu amigo, repliquei-lhe
compungido. - O que lá temos é incompleto. Já se tem feito alguma coisa; mas
ainda há muito por fazer. Pede a Jesus que nos ajude.
Continuei o meu caminho orando e
mais uma vez rogando a Jesus que fizesse da Federação uma casa verdadeiramente
de caridade, onde o foragido de toda a sorte possa encontrar abrigo.
Agora pergunto: Em face de fatos dessa
ordem devemos aconselhar os médiuns que não trabalhem? Não, não temos este
direito. O que devemos fazer é aconselha-los a que se preparem o mais
urgentemente possível para o exercício de semelhante mister, não esperando que
se façam puros, porquanto para isso precisariam de uma série de existências, e
a verdade é que a mediunidade lhes foi dada para ser exercida na atual existência
planetária.
O que se faz preciso é que cada vez
mais procurem melhorar a suas condições espirituais particularmente as morais,
e para isso façam da mediunidade um santo sacerdócio, sem recompensa outra que
não seja a paz, que advém da prática da caridade. Trabalhem esforçadamente para
o progresso de seus espíritos, quer adquirindo conhecimento que os ilustrem na
ordem científica, quer, sobretudo, eivando-os dos dotes morais que lhe permitam
estar constantemente, face a face, com seus anjos da guarda e por eles assistidos
sem cessar. Tomem a sério e se compenetrem verdadeiramente da colossal responsabilidade
que lhes dá a mediunidade, que, por sua vez, é uma força especial que o Pai
lhes deu. Saibam ser reconhecidos ao nosso Pai, exercendo a mediunidade com o máximo
desprendimento; tendo sempre o cuidado de fazer desaparecer no caridoso exercício
a sua personalidade, que, efetivamente, nada é no caso. Exerçam, repito, com
todo o devotamento a mediunidade; tendo sempre em mira o cultivo incessante da
moral, como, de resto, exige a própria doutrina.
Assim procedendo, o médium atrairá para
si a assistência dos espíritos superiores e repelirá as insinuações dos espíritos
inferiores, que não poderão, ao menos, dele se aproximar.
Dos muitos compromissos tomados no
espaço por um espírito é o exercício e a prática da doutrina o maior de todos.
Convença-se desta verdade o crente.
O que venho de afirmar está
plenamente provado por tudo quanto a mais de trinta anos tem sido dito pelos espíritos
encarregados da direção da propaganda do Espiritismo no Brasil, mas que é
ignorado pela maioria dos espíritas, que - diga-se de passagem - não conhece a
história pátria da nossa santa doutrina, história compreendida em um conjunto
de comunicações grandiosas publicadas muitas em livros, como o intitulado “Trabalhos Espíritas de um pequeno grupo de
crentes humildes”, que corre mundo desde 1893; algumas nas “Elucidações Evangélicas” publicados pelo
nosso confrade A. Sayão; outro do
arquivo
da “Fraternidade”,
e mais algumas publicadas há dias no Reformador,
e outras tantas que existem por aí inéditas.
Nessa comunicações nos dizem os espíritos
que a nossa missão no Brasil é a do estudo e da prática do Evangelho. Para isto,
bem o sabeis, nos são fornecidos os médiuns apropriados, que se devem aparelhar
convenientemente para o desempenho de tão melindrosa quão dignificadora função.
As mediunidades psicográficas ou escrevente
e sonambúlica são as típicas; as
demais são esporádicas.
Os espíritos aplicam particularmente
estas duas espécies de mediunidade às curas morais e físicas; sendo que, em
regra, a psicográfica é, sobretudo, utilizada no receituários e comunicações
instrutivas e a sonambúlica na prática das conversões do espírito e elucidações
que a todos instruem.
O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade
parte
4
por Pedro Richardº
Reformador
(FEB) 16 Maio 1914
Sem
dúvida que a teoria precede à prática e o estudo à execução, como é das boas
normas; mas o fim de toda teoria e estudo é o seu aproveitamento prático.
Assim sendo, todo espírita tem o
dever de estudar a doutrina para poder compreender, em espírito e verdade, os
Evangelhos.
Todos sabemos que é o Espiritismo a
nova Revelação que, pelo mestre Allan Kardec, nos transmitiu a misericórdia do
Divino Mestre; é a chave para a compreensão, em espírito, dos Evangelhos.
À medida que formos compreendendo
este código divino cumpre-nos pratica-lo os seus belos ensinamentos, sobretudo
quem é médium. Esse, particularmente, tem o dever imperioso de tomar parte dos trabalhos
de caridade, pois, para isso é que lhe foi dada a luz, tendo, porém, o critério
de começar pelo princípio, e não por onde os outros acabam.
O trabalho de caridade divide-se em
vários ramos, porque diversas são as necessidades do espírito e muitos os estádios
por onde transita, na escola progressiva de sua rota.
O espírita, que se inicia nos trabalhos práticos de
caridade, não deve frequentar, nem mesmo comparecer às sessões onde são
chamados espíritos maus. Pode e deve frequentar os trabalhos onde roga-se a
Deus a presença de espíritos sofredores que, em regra, são mais levianos do que
maus. Esses tais espíritos foram, geralmente, vítimas do meio pernicioso em que
viveram e onde contraíram responsabilidades, do que das próprias maldades.
São, mesmo, espíritos perturbados,
muitas vezes, que se julgam vivos; nessas condições procuram aqueles com quem tiveram,
perturbando-os, e destarte retardando seu progresso, ainda que, não raro, inconscientemente.
Relevem que conte um fato que tem
aplicação oportuna ao que acabo de dizer. Ei-lo:
Senhora de nossa velha amizade casou-se.
Um ano e tanto depois era mãe de uma linda criancinha...
Daí começou a manifestar sintomas de
alucinação. A vítima das suas alucinações era a pobre criança.
Num dos seus desvarios quase a
matou, justamente quando a amamentava aconchegada ao seu seio.
Desvairado o marido dessa pobre
senhora recorre ao médium Frederico Júnior solicitando-lhe os recursos do
Espiritismo.
Frederico, bom e caridoso como sempre,
realizou um trabalho prático de caridade onde manifestou-se o espírito de um
rapaz que aqui na Terra tinha sido noivo da senhora em questão e que fora muito
ciumento. Esse rapaz, tendo contraído varíola, morrera antes de realizar o casamento.
Despido de crenças religiosas, vai para
o espaço, coitado, sofrer naturalmente a perturbação devida aos espíritos nas
condições do dela: sem crença e sem o cultivo e a preocupação dos sentimentos
natos, de um Deus, que é o nosso Criador e Pai.
Mais tarde, passado o período da
perturbação, ele desperta, julgando-se, porém, ainda na vida material; procura
a sua noiva e a compreende com um filhinho nos braços. Considera-se traído pela
sua noiva! Sente necessidade de vingar-se, e, então, para isso, imprime-lhe
pela ação da vontade, fluídos, no intento malévolo de matar a criancinha, que
julgava ser o produto de um crime.
Nessas condições de desvario
manifesta-se pelo médium.
Procuraram persuadi-lo com provas irrecusáveis
que ele houvera passado pelo fenômeno natural, que, na Terra se denomina morte
e que se achava então no espaço simplesmente como espírito e que já então sua
ex-noiva estava legalmente casada com outro. Nesse momento ele compreendeu toda
a situação.
Sinceramente arrependido rogou a Deus
o perdão de seus desvarios e seguiu com o seu anjo da guarda com o fim de
preparar-se para uma nova jornada. E assim deixou o casal feliz e agradecido ao
Senhor pela misericórdia que d'Ele houvera recebido.
Há uma variedade infinita de
trabalhos de caridade, porque na estrada progressiva que o espírito percorre há
também uma variedade sem fim de estágios.
O espírito sensato, que deseja realizar trabalhos práticos,
de caridade, começa por educar o coração, procurando sentir; o trabalho é feito com lágrimas nos olhos e a emoção a
embargar-lhe a voz. Pouco a pouco vai ele habituando o coração a sentir e
assim, paulatim et gradatim - como
dizia o saudoso mestre Bezerra de Menezes - preparando e aparelhando o seu espírito
para maiores empreendimentos, estará um dia apto para a prática de trabalhos de
obsessão.
Esta ordem de trabalhos é, por sua
natureza, tão melindrosa, que o crente, para pratica-la, tem que oferecer o seu
coração como ante-mural à justiça de Deus, que se cumpre e ao sofredor em quem
ela se executa.
Nada adiantaria dizer-vos a respeito
de semelhantes trabalhos. Muito já eloquentemente nos disse o bom mestre Allan Kardec
em uma série de comunicações que o “Reformador” ultimamente publicou.
(*) Vide “Reformador” de 1 e 25 de Dezembro
de 1913. (Do
Blog: Serão publicados em breve)
Tudo quanto de grandioso e profundo se poderia dizer
ali está magistralmente dito.
Estudemos e tenhamos sempre em vista o que disse o
Divino Mestre a seus discípulos, quando lhe trouxeram um doente que não puderam
curar: “Para expelir essa classe de
espíritos é preciso muito jejum e oração”.
É preciso, pois, pureza e fé.
Ninguém que deseje desenvolver a sua
musculatura começa levantando grandes pesos, e se incriteriosamente o fizesse seria
vítima da sua ignorância e teimosia. Começará, sem duvida, por levantar pequenos
pesos, a fim de, paulatinamente ir-se
habituando e obtendo o desenvolvimento progressivo dos músculos de seu próprio
organismo, até que, mais tarde, possa levantar grande pesos.
Ninguém se lança na água sem que saiba nada.
A nossa missão é, pois, meramente evangélica,
isto é, o que nos compete é estudar a doutrina de Jesus e praticar os seus ensinamentos
de alta moral. Para isso se faz mister que o estudo e a prática desses ensinamentos
sejam gradativos; a natureza não faz saltos, quer na ordem física, quer no
ponto de vista científico, quer, finalmente, na ordem moral.
O que é preciso é o desenvolvimento
simultâneo e paralelo das duas asas com que o espírito sobe, como dizia o bom
Bezerra, a fim de que o espírito equilibrado possa voar, purificado, a aninhar-se
no seio de seu Pai.
Em resumo, estou convencido de que
esperar o homem tornar-se puro para poder trabalhar é utopia.
O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade
parte
5
por Pedro Richardº
Reformador
(FEB) 16 Junho 1914
Como,
suponho, ficou provado pela lógica, pela razão e pelos fatos, o médium, que
baixou ao mundo para exercer as suas próprias funções, deve instruir-se
convenientemente nos conhecimentos da doutrina, antes de dar começo ao
exercício de semelhantes funções,
à proporção
que for adquirindo novas instruções a tal respeito, deve simultaneamente ir
produzindo e se exercitando na prática de trabalhos de caridade.
Mas o médium, a não ser no exercício
do receituário, não é um instrumento isolado de trabalhos. O médium tem
necessidade de trabalhar em centros ou grupos que o auxiliem e defendam.
Desses centros ou grupos está
dependendo o bom êxito do trabalho, mais do que do próprio médium, porquanto o
centro é o fator fluídico do sentimento que, por sua vez, é - pode-se dizer - o
elemento único garantidor do êxito do trabalho. O sentimento de caridade provoca
a misericórdia de Deus.
Relevem que narre um fato a propósito,
já que o fato é a base da nossa doutrina.
Sabendo-se que é da contemplação dos
fatos que se deduzem as leis naturais, a narração de um fato é sempre motivo de
interesse e curiosidade. Ei-lo:
Quando o nosso saudoso mestre e prezado
amigo, Dr. Bezerra de Menezes, mantinha uma sessão de estudos e manifestações
espontâneas na rua de S. José, nº. 44 antigo, 2° andar, nesta capital,
manifestou-se um espírito com o propósito de refutar o estudo do dia. Disse
chamar-se Geoffroy, o conhecido fundador de um gênero de filosofia que corre
mundo.
Este espírito, então no espaço,
negava a existência do Criador-Espírito porque não podia compreender o incriado; admitia, no entanto, o éter como
causa primária da criação universal!
A manifestação desse espírito deu lugar
a uma série de sessões, cada qual mais interessante e nos proporcionou
oportunidade de ouvirmos debates científicos e morais a que jamais tive a
ventura de assistir.
As manifestações se faziam por um
médium de quase nenhum preparo intelectual, mas cujo espírito era dotado de cabedal
científico de raro valor.
Quero me referir no médium Britto,
já desencarnado.
Narrar detalhadamente o que eram
essas sessões, com as más peripécias e arrojos de alta ciência, é tarefa para a
qual me falece de todo a competência.
Todavia, vou tentar um pálido
esboço.
O que assistimos ai foi um
verdadeiro duelo entre mestres exímios. De um lado o espírito materialista de
Geoffroy, de outro lado a competência de Bezerra de Menezes encarnando com o
seu alto descortino a nossa doutrina. Eram dois campeões ilustres, que se
batiam em campos diametralmente opostos.
Geoffroy, espírito orgulhoso e
ilustrado, esforçava-se por sair vitorioso; Bezerra, não menos ilustrado, porém
humilde e afetuoso, teve ocasião de por em prova, mais uma vez, a sua grande
cultura científica.
Eram tais as argumentações aduzidas
por um e outro que a gente estasiava-se na contemplação de tanto saber e de tão
dilatada ilustração.
Poderia ser Bezerra vencido?
Por certo que não, porquanto, ele
era, naquele certame, o representante da boa causa e da verdade, que é Jesus.
Bezerra de Menezes, meus amigos, possuía e sabia
cultivar em alta escala a maior das virtudes que conhecemos na Terra, a
humildade.
Foi, principalmente, pela posse
desta virtude que ele conquistou a assistência dos espíritos de luz, que lhe
trouxeram o concurso de seus altos conhecimentos. E assim poderosamente ajudado
pelos obreiros de Jesus, Bezerra levou de vencida o ilustrado espírito de
Geoffroy, que, dobrando o joelho ante o adversário, disse-lhe com toda a
lealdade: “Venceste mas não me convenceste.”
Mas o intento principal e o
verdadeiro interesse do bom e meigo Bezerra era levar a espírito rebelde de
Geoffroy à convicção da existência de Deus; e, então, depois de ter esgotado todos
os recursos da ciência e da moral planetárias e, já exausto, apela o apóstolo da
verdade para a fé e convida o espírito a fazer uma prece.
Geoffroy não acede a tomar parte na
prece, porque, diz, espírito leal, não lhe era dado desempenhar uma farsa,
porquanto não acreditava na existência de Deus.
Bezerra não desanima. Antes, porém,
de orar, dirige-se aos seus companheiros presentes e fala-lhes: “Meus amigos,
tudo fiz; esgotei todos os recursos; dei tudo quanto podia dar; nada mais possui
o meu pobre espírito para dar. Mas, o que não pude fazer com o máximo esforço,
Jesus, a ciência das ciências, a ciência do amor, não custará a fazer. Vamos
apelar para Ele pedindo-Lhe que venha em nosso socorro.”
Assim falando, com as lágrimas a lhe
brotarem dos olhos e a emoção a embargar-lhe a voz, levanta-se aquela figura angélica
para orar.
Então, aquele tipo de apóstolo, barbas
espessas e. branqueadas pelo tempo, pelas lutas heróicas que constantemente
tinha de sustentar na Terra e pelas lágrimas que tantas vezes derramava; olhar
meigo, calmo e vívido, que atestava a fé e a bondade excelsa de seu meigo
espirito; aquele tipo de apóstolo, disse, balbuciou uma prece arrancada do íntimo
de sua alma, feita de amor c caridade,
Dizer o que foi essa prece, meus
amigos, é impossível, pois o sentimento de que foi ela ungida não se traduz por
palavras. Só a alma poderá sentir, mas ninguém seria capaz, nem de leve, de
traduzi-lo por palavras.
Era tal a pureza do ambiente
preparado pela nossa concentração e sentimentos cristãos, que me senti no ar.
Terminada a prece, volta-se para
Bezerra o espírito e diz-lhe:
“Basta! Para que vocês orem assim é
preciso que Deus exista.”
O que não pode a ciência, pode a fé;
o que não conseguiu o cérebro, conquistou o coração.
E por quê? Porque o enfermo era o espírito,
que, desquitado de seu Criador e Pai, cultivara o entendimento, descuidando-se
por completo do sentimento.
Era
preciso fazer-lhe sentir vibrar a corda sonora do amor, que aquele espírito,
como nos demais, fora doada por Deus, mas que ali estava atrofiada pelo cancro
do orgulho. O cancro corroía a semente e destarte o gérmen não encontrava
expansão para medrar.
A fé reinante no centro, fecundada
pela humildade invejável de Bezerra - qual outro Moisés - fendeu a rocha do
orgulho e fez rebentar a água cristalina da crença.
A imagem majestosa de Deus se lhe
estampou no espírito e nesse auspicioso instante ele sentiu o aroma extasiante
da primeira flor, que, até então em estado de hibernação, brotava agora
primaveril e bela: a fé.
Como se vê do que acabo de narrar,
foi o centro ali o grande fator; o médium foi mero expositor; quem agiu e esperou
fluidicamente foi o meio.
O mais original é que era franca a
entrada para essas sessões; a assistência era, pois, heterogênea.
Algumas pessoas iam ali por mera
curiosidade; outras, até, com espírito de animosidade!
Bezerra fazia que se sentassem em volta de uma grande
mesa os seus companheiros de trabalho, e destarte ele conseguiu isolar o resto
da assistência, que, assim, como que não existia.
A corrente isoladora era, como convinha,
completamente homogênea, porquanto o sentimento daquelas pessoas que se achavam
em torno da mesa era uno com o do seu presidente, em quem confiavam sem
tergiversação, pois o sabiam capaz dos mais nobres cometimentos.
Fatos como este provam que de
prodígios consegue a fé - do grão de mostarda pedido por Jesus!
Um centro assim organizado, mesmo quando servido por médiuns
medíocres, produz assombros. Centros deste jaez são fatores de grandes
produções e raras belezas morais e científicas.
É, antes de tudo, preciso lembrar
que o trabalho aí produzido é principalmente mecânico.
Isso indica que é mister e
imprescindível preparar-se um ambiente fluídico conveniente para envolver o
espírito moralmente enfermo, que, pela misericórdia de Deus é trazido ao centro
para ser curado pela caridade de Deus e a fé que n'Ele devemos ter, sem tréguas.
É vezo velho dos espíritas atribuírem
ao médium o mau resultado ou a improficuidade do trabalho, o que quase nunca é
a expressão da verdade!
Mas é que as condições precárias dos
nossos espíritos a tanto nos arrastam maxime
o orgulho, que, quase sempre, é quem comanda todas as noções contrárias à
caridade.
Estamos sempre dispostos a ver o
argueiro no olho do vizinho, não vendo, no entanto, a trave no nosso!
Sempre atribuímos aos outros os
males que nos afligem; isso porque as condições precárias de nossos espíritos
nos induzem a deprimir os outros e a nos inocentar ou, pelo menos, nos
desculpar.
Muito se exige do médium, mas nada
se lhe dá.
O médium, coitado, que quase sempre
é um abnegado, entrega-se ao trabalho comprometendo a sua saúde e, não raro, o
seu bem estar corporal, pois os maus espíritos, contrariados, sabendo que é ele
o instrumento de suas contrariedades, não o poupam: perseguem-no em toda parte
e por tudo.
É certo que, por isso mesmo que ele
é perseguido por amor da caridade, terá recompensa proporcional; mas também não
é menos verdade que, por isso mesmo, tem ele direito à nossa caridade, ao nosso
carinho e à nossa benevolência.
O médium, ligado a nós por sagrados
compromissos, é ele de jure um credor
que nos bate à porta reclamando o que lhe devemos.
O médium deve ser para o centro o
que é a donzela no lar: o alvo de toda a assistência e do máximo cuidado e
desvelo.
E a constituição do centro?
Será isso assumpto do meu próximo
escrito.
O que penso a respeito dos trabalhos de Caridade
parte 6 e final
por Pedro Richardº
Reformador
(FEB) 1º Julho 1914
Tende paciência, leitor amigo - vós
que tendes tido a condescendência de me ler; é este escrito o último da série
enfadonha com que tenho flagelado a vossa atenção nas páginas condescendentes
deste iluminado periódico. Vou terminar, mas, com a franqueza que me é
peculiar, confesso-vos que, mesmo sem atavios e fluência de linguagem, tenho me
esforçado por vos dizer e expor tudo quanto a minha longa prática de trabalhos
espíritas me tem facultado e a minha pobre memória tem armazenado.
Meditai sobre o que vos tenho dito.
Que o vosso anjo guardião faça com que retenhais no vosso espírito o que de bom
e útil aí tendes encontrado é o voto sincero e fraternal que faço a bem da
uniformidade da orientação dos nossos próprios espíritos.
O que posso vos confessar é que o
meu pobre espírito, na medida de suas forças, deu tudo quanto possuía, isto é,
tudo quanto a misericórdia de Deus lhe concedeu.
Prossigamos:
A constituição dos centros foi o assunto
prometido para este escrito de hoje. Digamos, pois, algo da constituição dos
centros que se propõem a trabalhos práticos de caridade.
Os centros, cientes e conscientes da
enorme responsabilidade que estão assumindo perante N. S. Jesus Cristo de quem
receberam a vara da abundância e a quem tudo devem, precisam de ter cuidado
especial consigo mesmos. Para isso precisam velar cuidadosamente todos os seus
pensamentos, palavra e obras pois devem saber que dessa vigilância é que lhes
advirá a boa ou má assistência determinante das condições fluídicas para
trabalhos espiritas de ordem moral, como soem ser os trabalhos de caridade.
Como acabamos de ver, as pessoas que compõem o grupo
formado para trabalhos espíritas tem tanto, ou mais, necessidade de ser
instruídas e educados na doutrina, quanto a tem os médiuns, pois o bom êxito do
trabalho fica dependendo mais do centro do que do próprio médium.
Coloquemos um médium bem orientado e
instruído num centro mal constituído e nada de bom obteremos.
Ao contrário, se o centro for bom,
ainda que o médium seja prejudicado, sempre colheremos alguma coisa de bom,
porque o ambiente formado pela assistência dos bons espíritos atraídos pelos
sentimentos puros do centro, dificulta o acesso aos espíritos maus e, atuando
sobre o médium, o envolverá em uma a atmosfera salutar saturada de sentimentos
de amor e caridade. Então, esses sentimentos agirão sobre o espírito do médium
despertando nele a necessidade do cumprimento de seus deveres morais para com
N. S. Jesus Cristo.
Assim sendo, sempre se obterá alguma
coisa de aproveitável, porque o bem é a lei.
Para que se realize com proveito um
trabalho de caridade imprescindíveis se fazem certas exigências, dependentes
principalmente do centro, que, como já disse, é o fator fluídico do próprio
trabalho.
O que não resta duvida é que o
centro necessita de profunda concentração, muita fé, amor, humildade e caridade;
e para possuir estes predicados é preciso que se saiba compreende-los, a fim de
que conscientemente os ponha em ação sem hesitar um só momento.
Não cabe nos estreitos limites deste
o desenvolvimento dessas profundas questões de alta filosofia espírita.
Tudo quanto sobre elas me foi
possível dizer já o fiz. No entanto, sinto que há necessidade de dizer algumas
palavras a respeito da concentração e da fé.
A concentração é um elemento
imprescindível em todo cometimento espírita, mormente nos de ordem moral;
entretanto, muitos espíritas nem sequer cogitam desse elemento primordial nos
trabalhos espíritas.
Por isso vou esboçar, ainda que
deficientemente, o que penso a tal respeito.
A maneira pela qual devemos fazer a
nossa concentração varia de acordo com a necessidade do momento.
Assim é que, para orarmos, devemos
erguer o nosso pensamento a Deus ou ao seu intermediário, a quem endereçamos as
nossas súplicas no sentido de que nos faça a caridade de deposita-las nos pés
do Senhor.
Para isso devemos fixar o nosso pensamento
imprimindo-lhe toda a energia de nossa vontade, a fim de que o nosso desejo possa
alar-se no fervor da crença fecundada pela fé, que, no caso, é a certeza da
existência de Deus, que se manifestará infalivelmente pela sua misericórdia e
justiça.
Se a concentração é para ajudar a um médium que se acha
recebendo um comunicado instrutivo, devemos dirigir o nosso pensamento a Deus,
suplicando-lhe luz e misericórdia para o nosso irmão que se está prestando ao
trabalho santo da caridade.
É preciso ter-se o máximo cuidado no
sentido de que não seja o pensamento desviado um só momento do objetivo da
concentração, a fim de que não se interrompam a corrente fluídica da boa assistência
com que caridosamente nos favorecem os espíritos mensageiros do Senhor, pois, é
sabido e inúmeras vezes tem sido verificado que, toda essa corrente, em consequência
de desvios do pensamento de algum ou alguns dos seus elos, os Espíritos
mistificadores, que sempre estão alerta e à espreita do momento propício, não
se fazem esperar pela sua perniciosa ação: mistificam todo o trabalho, e do tal
modo o fazem que, não raro, iludem os mais perspicazes.
Se a concentração é necessária para
auxiliar o irmão moralizador que confabula com o espírito sofredor, que no
momento se está manifestando, devemos levantar o nosso pensamento a Deus esforçando-nos
com todo o fervor de nossa alma por atuar sobre o infeliz espírito fornecendo-lhe
a força e o vigor de que necessita para reagir contra os seus erros e desvios,
e, dessarte, concorrermos com o nosso contingente moral no sentido de que ele
se volte para o nosso Criador e Pai, de quem tudo deve esperar, até mesmo o
perdão de suas culpas, por mais tenebrosas e carregadas que sejam.
Em tais condições deve o centro dar todo o apoio e
força à argumentação do moralizador, embora dele discorde em algum ponto ou
processo.
A assistência é chamada para ajudar fluidicamente
o moralizador e com ele colaborar nas suas opiniões e sentimentos de amor e
fraternidade.
Para melhor me fazer compreender cito
um caso quo se passou comigo numa sessão, caso que serve de exemplo elucidativo
para o que venho dizendo:
Num trabalho de caridade, para o
qual fui convidado pelo diretor de um certo grupo, assisti o moralizador ordenar
a um espírito orgulhoso que se metesse debaixo da mesa, a fim de humilha-lo e dar-lhe
uma prova da inutilidade do seu orgulho.
Eu não estava de acordo com semelhante
processo de provas - que, além do mais, não é cortês, nem digno, para quem se
presa e presa a seus irmãos - mas, como compreendia que a corrente fluídica não
devia ser interrompida pelo desvio do meu pensamento, colaborei com a minha
vontade na ordem que ao espírito foi dada pelo moralizador; e assim, não
havendo interrupção da corrente fluídica formada pelas vontades dos membros do
centro, o espírito viu-se forçado a cumprir a ordem do moralizador e meteu-se
humildemente debaixo da mesa.
Escusado é dizer que não mais voltei
a semelhante grupo tão mal orientado.
A homogeneidade, pois, de pensamentos
e vontades na concentração é condição essencial para que possa o trabalho ser
produtivo.
No trabalho de caridade o sentimento
é tudo; a palavra ocupa um lugar muito secundário.
O que, porém, é mister saber-se é que
a divergência de opiniões não pode ser profunda pois que o centro deve sempre estar
de acordo com o seu diretor. Do contrário não será nunca um centro bem constituído,
e desse modo a produção é má.
A fé é tudo; isto é, a certeza
absoluta da misericórdia de Deus que não podemos analisar porque para tanto nos
falecem todos os meios; é o que nos anima e nos alenta em todas as situações de
nossa existência espiritual.
É a fé que nos ensina e nos
aconselha a bater - que se nos abrirá, a pedir - que se nos dará.
Batei e pedi sem cessar.
Se até o juiz iníquo serviu à viúva,
para se ver livre da importuna, o que não nos fará Deus, que, antes de ser juiz,
é pai amoroso e bom?
Tenhamos, pois, fé n'Aquele que,
para estimular a seus filhos, lhos dá cem por um.
Tenhamos fé, que tudo pode, que transporta
montanhas e que nos impele a caminhar em demanda da felicidade, que é Deus.
Eduquemos
o médium e o façamos, principalmente, nos moldes da moral cristã e na resistência
que deve opor às pretensões perniciosas dos espíritos perturbadores e maus.
Mas, concomitantemente, eduquemos os
centros, tendo-se o máximo cuidado na escolha dos seus membros constituintes,
que devem ser homogêneos.
Os membros de um centro, tomam compromisso
muito sério e formal com o médium, pois que são eles os trabalhadores, que têm
de preparar convenientemente o campo onde vai o médium operar.
Cabem-lhes, pois, graves
responsabilidades.
E tenho concluído, leitor amigo.
Perdoas-me a ousadia de me ter proposto
a tratar de questões tão transcendentais: mas se o fiz foi arrimado no meu bom
Guia,
Obrigado.
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