domingo, 25 de abril de 2021

Espiritismo Cristão

 

Espiritismo cristão 

por M. Quintão

Reformador (FEB) 16 Outubro 1936

 

            Reiteradamente temos asseverado que, sendo o Espiritismo a Doutrina dos Espíritos, tal como o definiu Allan Kardec, e manifestando-se eles, os Espíritos, de todos os tempos e por toda parte, a sua doutrina não poderia deixar de ser universal.

            E como, por outro lado, manifesto e incontroverso é que os homens de todos os tempos, ao desencarnarem, levam para o plano espiritual as suas ideias e prejuízos terrenos, é também manifesto, incontroverso e natural que de lá continuem a transmitir e sustentar ideias e prejuízos, que tiveram na Terra.

            Entretanto, acima desta lei contingente, há uma lei imanente, providencial, absoluta e incoercível, que articula, aciona e ritma a evolução e o progresso da humanidade, mercê de reencarnações alternativas e sucessivas.

            Lei iniludível, ela forma, ostensiva ou latente, o lastro de todas as consciências, para cristalizar-se em sínteses filosóficas, religiosas, científicas, correspondentes a gradações de nível, ou ciclos de evolução coletiva.

            Variante nas fórmulas, nela se identificam, fundamentalmente, os princípios essenciais e dominantes de uma Proto Síntese, a integralizarem-se na existência de um DEUS, PRINCÍPIO CAUSAL, INTELlGÊNCIA SUPREMA, em função de atualidade na eternidade.

            Dizer que essa ideia provém da ignorância e do terror dos primitivos terrícolas, abrolhados para a vida consciencial do planeta; em face dos fenômenos cósmicos, não passa de mera hipótese simplista, incapaz de explicar, só por só, a evolução da consciência e inteligência humanas.

            De fato, ninguém atina como pudesse alguém sondar agora, para surpreender in natura, o pensamento Incipiente e brumoso de um troglodita do Cró-Magnon ou de... Furfooz (os primeiros humanos anatomicamente modernos do Paleolítico Superior europeu, ao lado do Cro-Magnon.).

            São teorias, pois, e teorias nebulosas, que nada ilustram, nem justificam, no dirimir a causa.

            Nós, os espiritistas, os que acreditamos, ou melhor - temos a certeza da imortalidade na eternidade, pela Revelação, só a Revelação podemos e devemos pedir meças (pedir explicações) para aclaramento do nosso raciocínio.

            E o que a Revelação nos diz, com Allan Kardec, aliás ratificado por todos os instrutores do plano espiritual, prepostos à prossecução (prosseguimento) da sua obra, progressiva ao indefinito, no tempo e no espaço, é que o Cristo, em não ser único no Universo, é único para nós, em relação a Deus, pela sua hierarquia de DIRETOR ESPIRITUAL do nosso planeta e da sua humanidade.

            Aliás, é o que se deduz, entre muitas outras passagens, desta que se encontra em João, cap. XVII, v. 5: E agora glorifica-me tu, Pai, em ti mesmo, com a glória que tive em Ti, antes que o mundo fosse.

            Nesse caráter, superintendeu Jesus a formação e evolução do nosso mundo, provendo-o de missionários oportunos e adequados a cada fase de sua história. Daí a fonte das ideias e sistemas religiosos, variantes na forma, mas sempre idênticos no fundo.

            E daí porque o Cristianismo, em ser Religião, no sentido etimológico da palavra, não será nunca uma religião, no sentido comum da ortodoxia sectária, com disciplinas mentais estritamente dogmáticas.

            Precisamos atender à circunstância de que, quando os desencarnados nos vêm redizer estas e outras coisas, em unanimidade de planos e de fins, nem por isso violentam a nossa consciência, senão que o fazem menos autoritariamente do que os nossos humaníssimos pontífices de batina ou de casaca, indigestados de quimeras para eructações (arrotos) mateológicas (conversas inúteis).

            Não, mil vezes não: o Espiritismo é simplesmente a confirmação do Cristianismo; mas, por isso mesmo que o Cristianismo não é, nem poderá ser nunca uma religião formalística e temporal, o Espiritismo só pode ser religioso no sentido que lhe atribuem os arautos de Jesus, fluente da fórmula única e iniludível, que não é apanágio de nenhum credo: - amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo.

            Há, certamente, preceitos outros que podem inquinar (poluir) de religiosidade o Espiritismo, pelo que de comum apresenta com os preceitos de todas as confissões sistematizadas.

            Nesse número estão a concentração e a prece; mas, é preciso convir em que estes atos cultuais, para o espírita esclarecido, não são requisitórios de uma convenção e sim consequentes de uma lei inelutável - a comunhão universal.

            Para resumir, diremos: espírita cristão, buscando nos Evangelhos a seiva que vivifica, em detrimento da letra que mata, feliz nos sentimos em praticar a Religião divina.

            Por templo - o universo; por altar - o coração; por Mestre - Jesus; por ídolo - Deus, na acepção de quanto podemos, através da sua obra, em nós e fora de nós manifestada, ver, sentir, compreender, amar, admirar e servir.

            E, em que pese a pequice (teimosia) do nosso entendimento, esta foi, em linhas gerais, a doutrina que aprendemos de Kardec, Denis, Delanne, Bellemare, Roustaing, Bezerra, Bittencourt Sampaio, Sayão, Gerniniano Brasil, Richard e tantos e quantos outros, que nos legaram, ainda melhor que a sanidade das suas ideias, o padrão das suas virtudes evangélicas.

            Honremo-lhes, assim, a memória, na esteira das suas pegadas.


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