quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

Bilhetes


                                         Bilhetes

por G. MIRIM (Antonio Wantuil)   Reformador (FEB) Maio 1944

             Os velhos gostam de lembrar de fatos da sua infância, razão por que, de vez em quando, lá me vem à ideia antigas passagens daqueles bons tempos.

            O meu leitor, certamente, não conhece o caso do “carneiro preto”, e, assim, ignora que constitui ofensa, em minha terra, dizer que alguém é tal e qual carneiro preto.

            Vamos ao caso:

            Um cidadão da minha aldeia possuía um belíssimo carneiro. Animal muito dócil, extremamente manso, era estimado por todos os meus conterrâneos e conhecido pelo nome que lhe deu o seu pelo escuro.

            Manso e dócil para todos nós, tornava-se furioso ao ouvir o apito da locomotiva que, então, atingiu o meu pacato arraial. Era necessário prendê-lo até que passasse o “bicho corredor” da Leopoldina Railway.

            Um dia, em que se esqueceram de amarrá-lo, o nosso carneiro preto postou-se entre os trilhos da estrada, e lá ficou à espera da locomotiva que apitava ao longe. Corajoso e valente, o carneiro tomou posição, e... ao sair a máquina da curva, não pode o maquinista travar o comboio. Era tarde demais, o valente carneiro, resolutamente, atirara-se contra o “bicho corredor”, numa decidida cabeçada, lá ficando em frangalhos espalhado pelo leito da estrada.       

            Foi-se o carneiro preto, mas ainda vive até hoje, em minha povoação, como símbolo de teimosia e de falta de raciocínio.

            - Aqui, em Antropópolis, nesta cidade maravilhosa, eu me recordo, também, do carneiro preto que eu tantas vezes acariciava na minha meninice. Esses, que aqui se me deparam, não são dóceis e mansos, todavia, em tudo mais, são perfeitamente iguais àquele que ficou esmigalhado pela sua teimosia e pela falta de compreensão do que iria combater.

            Eu me refiro a esses pseudocientistas, que, nada entendendo da própria medicina que estudaram, querem, de qualquer maneira, combater o fenômeno espírita e acabar com a existência dos habitantes do Além.

            Se o luzidio lanígero se espatifou por se atirar contra o que desconhecia, os carneiros pretos daqui se esborracham cada vez que tentam combater aquilo que não conhecem, de cuja existência duvidam e cujo poder está para eles como a locomotiva para aquele. O ruminante era menos teimoso, porque combateu o que via, esses, porém, os nossos belos exemplares da cidade, leônicos, arroxeados e murídeos (semelhantes a rato), atiram-se contra os Espíritos produtores dos fenômenos, agentes que lhes são invisíveis e que se riem das suas cabeçadas inofensivas, ou melhor, produtivas, porque despertam nos leigos a vontade de conhecer o assunto.

            Pobres carneiros pretos!


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