As duas
rãs
por José Brígido (Indalício Mendes) Reformador (FEB) Julho 1947
Nada há pior para o caráter do homem do que o pessimismo.
Ele denigre tudo, corrompe as boas ações, ofende a virtude, destrói a tranquilidade,
mata a esperança e cultiva a desilusão. O pessimismo é como o mocho: foge à luz
e ama as trevas.
*
Se o homem desvirtua e envilece a vida - ensinava Hassein-Hassam, tal era o nome do filósofo - terá de recomeçar a jornada tantas vezes quantas se façam necessárias ao seu apuramento moral. Falando mais claro: se o Espirito encarnado não dignifica sua passagem pela Terra, terá de aceitar o jugo da carne em novas existências, até que se liberte de vícios e imperfeições. Para Hassem-Hassam, o pessimismo era, não apenas um vício, mas o pior dos vícios, porque enxovalha, amortece e anula todas as boas qualidades do ser humano.
*
Ali Benhadaz abriu mais os olhos avermelhados, demonstrando seu espanto e sua admiração. E o filósofo continuou, sorrindo docemente:
- “Sofri e sofro
ainda... Aprendi, porém, a perdoar, mas sei como é difícil adquirir-se o hábito
do perdão sincero. Mesmo assim, sofro. E sofro menos pelo que ainda me fazem do
que pelos males que os homens causam a si mesmos, por não quererem ser bons.
Abandona o pessimismo. Sufoca teu pranto, domina teu sofrimento e aprende que ninguém
sofre em vão, que a dor tem uma causa, que a dor tem um efeito também... Começa
perdoando e logo verás como tudo se modificará. Conheces a história das duas
rãs? Não? Então vou contá-la para que reflitas bem sobre ela.”
“- Era uma vez duas rãs: uma, otimista; outra,
pessimista. Um dia, elas tanto pularam que foram cair dentro dum boião (recipiente de boca larga) de creme de leite. A pessimista logo se desesperou.
Pôs-se a chorar e gritar: “ - Ah! Coitadinha de mim! Desta não escaparei!
Sinto-me sem ar, sem forças! Estou perdida! Não poderei sair daqui! Vou-me
afogar! Ai, que me afogo! Ai!.. “ E se afogou mesmo.
*
*
“- Ouviu, meu
filho? Essa lição da rã otimista prova que sempre é melhor fazer-se alguma
coisa do que cruzar os braços e não fazer nada nas horas graves... O desespero
não constrói: destrói, as lágrimas não mostram o caminho da salvação, mas representam
o itinerário do desespero... É nos momentos críticos da vida que o homem deve
mostrar o que vale. Estás também num boião de creme de leite. Reflete e age.
Não desesperes. Nem tomes qualquer decisão sem refletir. Faze o máximo para saíres
bem da situação em que te encontras e verás, depois, que é bem melhor viver nas
claridades do otimismo do que chafurdar-se no pântano escuro e mortal do
pessimismo. Eu te ajudarei a sair do boião, Ali-Benhadaz...”
E Ali-Benhadaz, com a fisionomia aliviada, mostrava certo desafogo na alma. Suspirou e, num impulso de gratidão, beijou as mãos encarquilhadas do filósofo. Desde aquele dia, nunca mais houve em Bagdá um coração mais cheio de esperanças do que o dele.
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