sexta-feira, 17 de maio de 2019

É preciso que isso mude



É preciso que isto mude
por Guerra Junqueiro
Reformador (FEB) Janeiro 1920

            Vai tudo pessimamente; as coisas não podem continuar assim. É preciso que isto mude!  

            Eis o grito que se ouve de todos os lados!

            “É preciso que isto mude!” - dizem os operários - “o capitalista explora-nos, e
morremos de fome.”

            “É preciso que isto mude! - dizem os capitalistas- “o nosso dinheiro já não rende juros, os encargos vão aumentando todos os dias”.

            “É preciso que isto mude!” - geme a pobre esposa, que carrega sozinha com o peso da casa, ao passo que o marido perde nas tabernas e no jogo o seu tempo e o seu dinheiro.

            “É preciso que isto mude!” - Neste ponto estão todos de acordo: operários e patrões, pobres e ricos, sábios e ignorantes, crentes e ateus, pais e filhos, todos são do mesmo parecer, e tem razão, pois, com efeito - "É preciso que isto mude”.- Mas isto que se deve mudar exige corretivo dos culpados. Quais são eles?

            Aqui é que já não há unanimidade.

            Os culpados são os ricos! Exclamam uns.

            A culpa tem-na o governo, dizem outros.

            A culpa tem-na os maridos!

            A culpa tem-na as mulheres!

            A culpa tem-na as tabernas!

            A culpa tem-na...

            Cada qual atira com a culpa para aqueles que o estorvam, enquanto uns e outros se dirigem acusações, agravando o estado das coisas.

            Queixam-se das falta de dinheiro, e todos continuam a fumar, beber, comprar bilhetes de loterias jogar no bicho e frequentar o cinema... Doem-se de ver que a vida  doméstica se vai perdendo dia a dia, e estão sempre fora de casa... Criticam o preço do fato e não se resolvem a trajar-se mais modestamente... Censuram a frequência de festas e espetáculos, e todos concorrem a eles.. Choram a corrupção da mocidade e trabalham de mil modos para a corromperem com os seus péssimos exemplos, torpes palavras, indecentes fitas, pervertedores livros, e prejudiciais instituições, que só tendem a destruir a moralidade e... Dizem com tristeza que já não há honradez nos negócios e enganam os seus fregueses.

            Sim, é preciso que isto mude!

            Sabeis o que é preciso mudar? Não é o exterior, mas sim o interior.

            Não é a ordem social mas sim o homem.

            Não é o mundo, nem os outros: SOU EU, SOIS VÓS, quem deve mudar.

            Não é a posição nem a família mas sim o coração.

            Era esta mesma a opinião de um pacífico habitante de uma pequena cidade numa época de grande efervescência política.

            Um homem, encontrando-se com ele na rua, disse-lhe num tom brusco:

            - O Senhor é radical?

            - É claro que sou, meu caro amigo.

            - Deixe-me, portanto, apertar-lhe a mão. O senhor é cá dos bons.

            - Espera, respondeu o outro: permita-me que lhe explique o meu pensamento. É necessário que tenha lugar uma reforma radical, porque os nossos corações estão radicalmente corrompidos. Não há tempo a perder, o temos obrigação de dar início a esta desordem. Se todos nos imitarem, todos ficarão satisfeitos e acabarão para sempre os queixumes. Mas, sem esta nossa reforma individual serão inúteis todas as demais, pois não se conseguirá com elas arrancar as raízes do mal.

            Estou quase em dizer que tem razão, disse o outro, admirado desta resposta e, cumprimentando cortêsmente, afastou-se.

            A regeneração do homem por meio do Evangelho é a única base possível da regeneração social, e a única fonte de felicidade para os indivíduos, a família e a sociedade. Sendo o que somos, maus, incapazes de nos reformarmos a nós mesmos, como poderemos mudar os outros?

            Comecemos por pedir a Deus que transforme os nossos corações, que opere em nós aquela gloriosa mudança que se chama regeneração, depois do que, então, poderemos trabalhar para a salvação dos demais homens.

            Todo o bem que o cristianismo tem trazido ao mundo procede da santidade pessoal de Jesus. Ele foi aquilo que queria que queria que fossemos; é deste modo que tem podido exercer sobre os homens a sua portentosa influência.

            A cada um de nós compete, com a ajuda de Deus, fazer o mesmo.

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