É
preciso que isto mude
por Guerra Junqueiro
Reformador
(FEB) Janeiro 1920
Vai tudo pessimamente; as coisas não
podem continuar assim. É preciso que isto
mude!
Eis o grito que se ouve de todos os lados!
“É
preciso que isto mude!” - dizem os operários - “o capitalista explora-nos,
e
morremos
de fome.”
“É
preciso que isto mude! - dizem os capitalistas- “o nosso dinheiro já não
rende juros, os encargos vão aumentando todos os dias”.
“É
preciso que isto mude!” - geme a pobre esposa, que carrega sozinha com o
peso da casa, ao passo que o marido perde nas tabernas e no jogo o seu tempo e
o seu dinheiro.
“É
preciso que isto mude!” - Neste ponto estão todos de acordo: operários e
patrões, pobres e ricos, sábios e ignorantes, crentes e ateus, pais e filhos,
todos são do mesmo parecer, e tem razão, pois, com efeito - "É preciso que isto mude”.- Mas isto que se deve mudar exige corretivo
dos culpados. Quais são eles?
Aqui é que já não há unanimidade.
Os culpados são os ricos! Exclamam
uns.
A culpa tem-na o governo, dizem
outros.
A culpa tem-na os maridos!
A culpa tem-na as mulheres!
A culpa tem-na as tabernas!
A culpa tem-na...
Cada qual atira com a culpa para
aqueles que o estorvam, enquanto uns e outros se dirigem acusações, agravando o
estado das coisas.
Queixam-se das falta de dinheiro, e
todos continuam a fumar, beber, comprar bilhetes de loterias jogar no bicho e
frequentar o cinema... Doem-se de ver que a vida doméstica se vai perdendo dia a dia, e estão
sempre fora de casa... Criticam o preço do fato e não se resolvem a trajar-se
mais modestamente... Censuram a frequência de festas e espetáculos, e todos
concorrem a eles.. Choram a corrupção da mocidade e trabalham de mil modos para
a corromperem com os seus péssimos exemplos, torpes palavras, indecentes fitas,
pervertedores livros, e prejudiciais instituições, que só tendem a destruir a
moralidade e... Dizem com tristeza que já não há honradez nos negócios e enganam
os seus fregueses.
Sim, é preciso que isto mude!
Sabeis o que é preciso mudar? Não é o
exterior, mas sim o interior.
Não é a ordem social mas sim o homem.
Não é o mundo, nem os outros: SOU
EU, SOIS VÓS, quem deve mudar.
Não é a posição nem a família mas
sim o coração.
Era esta mesma a opinião de um pacífico
habitante de uma pequena cidade numa época de grande efervescência política.
Um homem, encontrando-se com ele na
rua, disse-lhe num tom brusco:
- O Senhor é radical?
- É claro que sou, meu caro amigo.
- Deixe-me, portanto, apertar-lhe a mão.
O senhor é cá dos bons.
- Espera, respondeu o outro: permita-me
que lhe explique o meu pensamento. É necessário que tenha lugar uma reforma
radical, porque os nossos corações estão radicalmente corrompidos. Não há tempo
a perder, o temos obrigação de dar início a esta desordem. Se todos nos
imitarem, todos ficarão satisfeitos e acabarão para sempre os queixumes. Mas, sem
esta nossa reforma individual serão inúteis todas as demais, pois não se conseguirá
com elas arrancar as raízes do mal.
Estou quase em dizer que tem razão, disse
o outro, admirado desta resposta e, cumprimentando cortêsmente, afastou-se.
A
regeneração do homem por meio do Evangelho é a única base possível da
regeneração social, e a única fonte de felicidade para os indivíduos, a família
e a sociedade. Sendo o que somos, maus, incapazes de nos reformarmos a nós
mesmos, como poderemos mudar os outros?
Comecemos por pedir a Deus que transforme
os nossos corações, que opere em nós aquela gloriosa mudança que se chama
regeneração, depois do que, então, poderemos trabalhar para a salvação dos demais
homens.
Todo o bem que o cristianismo tem
trazido ao mundo procede da santidade pessoal de Jesus. Ele foi aquilo que
queria que queria que fossemos; é deste modo que tem podido exercer sobre os
homens a sua portentosa influência.
A cada um de nós compete, com a
ajuda de Deus, fazer o mesmo.
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